Discurso no Senado Federal

REFERENCIAS A CONFERENCIA DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO, REALIZADA NA SEMANA PASSADA, EM SEATTLE, SOBRE A ATUAÇÃO DO BRASIL NO COMERCIO INTERNACIONAL.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMERCIO EXTERIOR.:
  • REFERENCIAS A CONFERENCIA DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO, REALIZADA NA SEMANA PASSADA, EM SEATTLE, SOBRE A ATUAÇÃO DO BRASIL NO COMERCIO INTERNACIONAL.
Publicação
Publicação no DSF de 07/12/1999 - Página 33871
Assunto
Outros > COMERCIO EXTERIOR.
Indexação
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, CONFERENCIA INTERNACIONAL, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), OBJETIVO, DEBATE, ARTICULAÇÃO, REDUÇÃO, OBSTACULO, COMERCIO EXTERIOR.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, VALORIZAÇÃO, AGRICULTURA, ATENDIMENTO, INTERESSE, PAIS, REDUÇÃO, OBSTACULO, COMERCIO EXTERIOR.

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, terminou a Conferência de Seattle e a mídia toda trombeteia que foi um fracasso.  

Parece-me que é um modo muito superficial e até provinciano de analisar um encontro como aquele e imaginar que terminaria com um amplo acordo em torno de uma questão tão complexa e tão polêmica como essa, de integração internacional, mediante reduções das barreiras tarifárias e não-tarifárias que atingem fundamente os interesses de todos os países ricos e pobres.  

Não é por outro motivo que as duas rodadas anteriores levaram anos, a rodada Uruguai se prolongou por cinco anos, Sr. Presidente, e a de Seattle terá desdobramentos. Não seria num encontro de uma semana que todos esses países encontrariam soluções para esse problema. O processo de globalização é uma arma de dois gumes. Como todos sabem, tem vantagens e desvantagens, há perdas e ganhos. E as perdas são maiores para os países mais pobres que não souberem fazer uma inserção competente nesse processo. O próprio Brasil fez uma abertura precipitada há alguns anos, escancarou as portas, e pagou um preço alto por isso.  

Quando o Presidente dos Estados Unidos clamou por cláusulas sociais nos acordos de comércio a serem discutidos em Seattle, todos reclamaram que era uma preocupação hipócrita com os salários dos trabalhadores dos países do Terceiro Mundo, mascarando os interesses de setores da indústria americana, que exigem protecionismo. Algumas vozes no Brasil, algumas não, muitas, clamam por medidas retaliatórias. Sr. Presidente, eu gostaria que a questão fosse tão simples, que, a cada medida dos Estados Unidos, nós retaliássemos. O problema é que o mercado americano representa mais de 20% do total das exportações brasileiras, e o mercado brasileiro apenas 1% das exportações americanas, ou seja, o erguimento de barreiras, nos Estados Unidos, a determinado produto atinge fundamente um setor do Brasil, como o de calçados, o têxtil, o de suco de laranja, por exemplo. Se erguermos barreiras para os produtos americanos, isso é uma alfinetada que não os incomoda nem um pouco.  

De forma que, repito: a questão é muito complicada! Quando se criticam os países europeus, por exemplo, pelos seus escandalosos subsídios agrícolas, subsídios dados aos seus produtos, e se exige que eles eliminem esses subsídios, é de se pensar que esses países não têm problemas, por serem ricos.  

Os europeus defendem o conceito da multifuncionalidade da agricultura. Eles entendem que a agricultura não é apenas um setor econômico, importante da sua economia, mas tem também outras funções, Sr. Presidente: funções sociais, funções culturais, funções ambientais. Eles entendem acertadamente que o desaparecimento do setor agrícola de países como França, Inglaterra e Alemanha, que desapareceriam sem o subsídio, causariam um impacto imenso em toda a sociedade francesa, alemã e inglesa. Esses setores não podem ser abandonados.  

Imaginemos que, de repente, os produtos agrícolas do Brasil, que são competitivos, perdessem a competitividade no mercado internacional, e os países concorrentes começassem a nos exigir a retirada dos subsídios. Deixaríamos a nossa agricultura morrer ou a protegeríamos?  

De forma, Sr. Presidente, que é preciso ser racional. Países defendem interesses, não fazem caridade. Os americanos defendem os seus interesses, o que é natural. O Presidente dos Estados Unidos não faz o que quer. Primeiramente, ele depende do Congresso, da aprovação das leis. Todos sabemos que está difícil ele arrancar o fast track para viabilizar a Alca. Em segundo lugar, o Congresso é um repositório de toda a sociedade americana. Há os lobbies dos interesses legítimos de todos os setores que se fazem sentir como no Congresso brasileiro e em qualquer outro Parlamento do mundo.  

De maneira que o Brasil deve, em vez de choramingar, verberar e vociferar, contra esses outros países que defendem os seus interesses, defender os seus. O Brasil deve continuar negociando, sem concessões unilaterais, tentar reciprocidade e, principalmente, preocupar-se com a integração econômica aqui no nosso continente.  

É claro que o Brasil sozinho tem um peso e, no Mercosul, tem um peso maior. Se for mercado comum de toda a América do Sul, terá um peso ainda maior nessas negociações internacionais. A sociedade brasileira precisa amadurecer, precisa deixar de ter uma mentalidade subdesenvolvida, terceiro-mundista e de se julgar sempre coitadinha, vítima de conspirações internacionais. Não é isso. O mundo é este: é de um brutal realismo, cada um defendendo seus próprios interesses. Nós é que temos de ser competentes e corajosos para defender os nossos.  

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/12/1999 - Página 33871