Discurso no Senado Federal

MOROSIDADE NO JULGAMENTO DOS ACUSADOS PELA MORTE DO EX-DEPUTADO ESTADUAL PARAENSE JOÃO CARLOS BATISTA, ASSASSINADO A ONZE ANOS.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. JUDICIARIO. :
  • MOROSIDADE NO JULGAMENTO DOS ACUSADOS PELA MORTE DO EX-DEPUTADO ESTADUAL PARAENSE JOÃO CARLOS BATISTA, ASSASSINADO A ONZE ANOS.
Publicação
Publicação no DSF de 08/12/1999 - Página 34052
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. JUDICIARIO.
Indexação
  • REPUDIO, DEMORA, CAPTURA, MANDANTE, JULGAMENTO, ACUSADO, MORTE, JOÃO CARLOS BATISTA, DEPUTADO ESTADUAL, ESTADO DO PARA (PA).
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, COMISSÃO, AMBITO, AMERICA, DIREITOS HUMANOS, TRATAMENTO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, VIOLAÇÃO, DIREITOS, ESTADO DO PARA (PA), ESPECIFICAÇÃO, HOMICIDIO, JOÃO CANUTO DE OLIVEIRA, PRESIDENTE, SINDICATO, JOSE PEREIRA, OZIEL PEREIRA, TRABALHADOR RURAL, VITIMA, CONFLITO, POSSE, TERRAS, RESPONSABILIDADE, CRIME ORGANIZADO, CAMPO.
  • DEFESA, URGENCIA, REFORMA JUDICIARIA, VIABILIDADE, AGILIZAÇÃO, EFETIVAÇÃO, DECISÃO JUDICIAL, IMPEDIMENTO, IMPUNIDADE.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) – Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, volto à tribuna do Senado Federal para fazer um registro de repúdio pela demora na captura dos mandantes e julgamento dos acusados pela morte do então Deputado Estadual paraense JOÃO CARLOS BATISTA.  

Faz onze anos que o hediondo crime foi cometido contra um parlamentar, líder de meu Partido, o PSB, na Assembléia Legislativa do Estado do Pará, que foi covarde e barbaramente assassinado, na presença de sua esposa e filhas, quando chegava em sua residência, após participar de uma Sessão da Assembléia Estadual Constituinte, onde acabara de denunciar mais uma, dentre tantas, ameaças de morte que vinha sofrendo.  

Este crime, Sr. Presidente, chocou e indignou a opinião pública e os meios políticos locais e nacionais, por seus requintes de violência e ousadia, de vez que o então Deputado encontrava-se em pleno exercício de seu mandato parlamentar.  

As lutas pela terra, pela justiça social e pela REFORMA AGRARIA vitimaram JOÃO BATISTA através da ação covarde levada a efeito pelo braço armado do latifúndio e da famigerada UDR, cuja organização ensejou o surgimento de uma "verdadeira indústria do crime organizado" , que se estabeleceu no Pará e em outros Estados da Federação, a partir de meados dos anos 70, alcançando seu apogeu na metade dos anos 80, época em que as estatísticas indicam uma significativa incidência de conflitos fundiários e assassinatos no campo.  

A "indústria do crime no campo" , lamentável e vergonhosamente, subsiste ainda hoje através da ação de pistoleiros e matadores de aluguel que continuam eliminando, indistintamente, lideranças políticas, sindicais e religiosas que "ousam" lutar pela Reforma Agrária e pela justiça social no campo.  

 

Recentemente a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA) tratou de três graves casos de violação aos direitos humanos, infelizmente todos ocorridos no meu Estado do Pará.  

O primeiro caso foi o referente ao assassinato de JOÃO CANUTO, Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rio Maria. Os executores e mandantes do assassinato ainda não foram julgados e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA entendeu que os recursos legais brasileiros não foram eficazes na solução do caso.  

Em relação aos outros dois casos julgados pela aquela Corte Internacional, tratam-se de violação aos direitos humanos de JOSÉ PEREIRA e OZIEL PEREIRA por, respectivamente, trabalho escravo e homicídio em conflito fundiário, este último na vergonhosa chacina de "Eldorado de Carajás".  

Os dados desses verdadeiros genocídios de trabalhadores rurais, líderes e religiosos que vêm sendo cometido sob a égide dos conflitos fundiários são alarmantes.  

Ainda que se possa destacar a recente vitória dos movimentos sociais no campo, com a prisão do fazendeiro JERÔNIMO ALVES DE AMORIM, preso na Cidade do México no dia 22 de novembro deste ano e transferido para Belém do Pará, acusado de ser o mandante do assassinato do presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Rio Maria, ocorrido em fevereiro de 1991, EXPEDITO RIBEIRO DE SOUZA, ainda assim, o que causa indignação e revolta, é que a grande maioria desses assassinatos, quase todos cometidos através de chacinas e emboscadas covardes contra trabalhadores rurais, se encontram sem nenhuma solução judicial no que respeita à condenação e prisão de mandantes e executores, reforçando assim a impunidade que acaba por estimular a ocorrência permanente de novos crimes.  

Srªs. e Srs. Senadores, o clima de ameaças e ousadia imposto pelo crime organizado no campo não respeita barreiras nem reconhece instituições, como foi o caso da morte por assassinato de JOÃO BATISTA, então parlamentar e representante do povo do Pará.  

Até hoje os mandantes e executores do assassinato de JOÃO BATISTA não foram à julgamento, e o processo se arrasta no Tribunal de Justiça do Estado do Pará numa tramitação lenta, provocada por inúmeros recursos impetrados na tentativa de proteger e garantir a impunidade dos acusados.  

Não nos interessam as filigranas jurídicas por onde escapam esses tecnocratas do judiciário, que se especializam nas "saídas" quando deviam defender o justo. Mas claramente percebemos os artifícios de que se valem. E os repudiamos. E esse repúdio começa a se estender, perigosa e infelizmente, a todo o Judiciário em vista da demora na Justiça.  

Os onze anos de impunidade dos responsáveis, nesse caso do Deputado JOÃO BATISTA, sugerem que é de fundamental importância identificar o rumo que a Justiça brasileira adotará no próximo milênio.  

Se buscará prestar um serviço mais eficaz, aproximando tanto as leis quanto as suas decisões da finalidade social que deve ser alcançada pela aplicação do Direito, ou se continuará mantendo as práticas que afastam essa aplicação de seus resultados sociais, tornando-a cada vez mais desacreditada e desatenta aos anseios da sociedade.  

Nesse contexto, avulta a importância do processo judicial como instrumento de exercício da cidadania, na medida em que é mediante a prestação jurisdicional efetiva, sobretudo na solução dos conflitos coletivos, que se estabelecerá a cultura da credibilidade na Justiça. Então, o processo judicial será um dos instrumentos principais de exercício da cidadania, um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito.  

Sendo a prestação jurisdicional uma função privativa do Estado, concretizada por intermédio do processo judicial, esse seria um poderoso meio de exercício da cidadania. No entanto, a demora no julgamento dos assassinos de pessoas que violam os direitos humanos demonstra que o processo não reveste a condição de instrumento pronto e eficaz de afirmação da soberania da sociedade. Deve-se ter presente, assim, que Justiça tardia não é Justiça, mas circunstância que a inutiliza como instrumento de cidadania.  

Ademais, não há dúvida de que, nas democracias, o comportamento das pessoas subordina-se à observação dos Direitos Humanos, o elenco de prerrogativas sociais, econômicas e políticas que espelha a cidadania. Por isso o Estado, ao se omitir da condenação daqueles que, segundo as provas, praticaram crimes da maior gravidade, deixa de corresponder a uma organização social eficiente, que atende e preserva os requisitos da mesma cidadania.  

Estamos concluindo, Sr. Presidente, esta breve intervenção, consignando que o décimo primeiro aniversário da tragédia de JOÃO BATISTA acrescenta outro forte argumento para que se processe a mais rápida reforma do Judiciário, a fim de dotar esse Poder dos meios materiais e legais necessários à agilidade e efetividade das suas decisões.  

A Reforma do Judiciário, que está aí na Ordem do Dia, deve fazer o País caminhar em direção à modernidade, com leis processuais que a todos assegurem a celeridade e eficácia das decisões, com o controle externo do Judiciário e com a instituição de um tribunal constitucional que, inclusive, julgue questões relacionadas aos direitos e garantias fundamentais do cidadão.  

Quer-se, assim, evitar a repetição de crimes como esses que repudiamos, e impedir que os seus autores, por certo criminosos da pior espécie, sejam beneficiados, como agora acontece, com uma década de imerecida liberdade e revoltante ausência de punição.  

Era o que tínhamos a dizer.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/12/1999 - Página 34052