Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

CRITICAS AO FISIOLOGISMO DA BASE GOVERNISTA NO CONGRESSO NACIONAL PARA APROVAÇÃO DA PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO QUE TRATA DA DESVINCULAÇÃO DAS RECEITAS DA UNIÃO.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO. REFORMA TRIBUTARIA.:
  • CRITICAS AO FISIOLOGISMO DA BASE GOVERNISTA NO CONGRESSO NACIONAL PARA APROVAÇÃO DA PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO QUE TRATA DA DESVINCULAÇÃO DAS RECEITAS DA UNIÃO.
Aparteantes
Amir Lando.
Publicação
Publicação no DSF de 15/01/2000 - Página 358
Assunto
Outros > ORÇAMENTO. REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • CRITICA, CUSTO, NEGOCIAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONGRESSO NACIONAL, REFERENCIA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, DESVINCULAÇÃO, RECEITA, UNIÃO FEDERAL.
  • COMENTARIO, POSSIBILIDADE, AUMENTO, CORRUPÇÃO, POSTERIORIDADE, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ESPECIFICAÇÃO, CRESCIMENTO, DESVIO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, GOVERNO FEDERAL.
  • COMENTARIO, APREENSÃO, CRESCIMENTO, DIVIDA EXTERNA, DIVIDA INTERNA, PAIS, POSTERIORIDADE, POSSE, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, GOVERNO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, ACELERAÇÃO, APROVAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, OBJETIVO, BUSCA, IGUALDADE, COBRANÇA, TRIBUTOS, SOCIEDADE.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Senadora Heloísa Helena, demais Senadores, quero aceitar e compreender a grande repercussão na imprensa nacional da demonstração de fisiologismo efetivada pelos Parlamentares da base governista do Congresso Nacional. A Oposição não participa dessa atitude.  

Entendo que a imprensa tem o dever de denunciar o que está acontecendo, mas gostaria de analisar a questão por um outro ângulo.  

A conta que a imprensa apresenta à Nação do custo que os Parlamentares da base governista, ou seja, os Parlamentares do PPB, do PSDB, do PFL e do PMDB, que negociaram com o Presidente Fernando Henrique Cardoso, para ver aprovada, em primeiro turno, a emenda constitucional que cria a Desvinculação de Recursos da União, esse custo foi apresentado como R$300 milhões e como algo efetivamente escandaloso. Creio que o tipo de negociação, realmente, é escandaloso e merece toda a denúncia da imprensa.  

Porém, fico a me perguntar, Senador Amir Lando, por que a imprensa também não se preocupa com uma questão que é muito mais grave do que essa. Se analisarmos o contexto do Orçamento e o que está acontecendo com esses 300 milhões, vamos ver que isso é uma gota d’água no oceano, que é algo absolutamente insignificante. E, a não ser que os corruptos do Congresso Nacional – pode existir algum, como V. Exª citou – estejam pretendendo ver liberadas as suas emendas, para terem comissão sobre as obras realizadas por essas emendas, tirando essas exceções – pode haver alguns casos no Congresso Nacional; V. Exª abordou muito bem isso em seu discurso -, o resto desses 300 milhões vai para obras, que foram destinadas, pensadas, solicitadas por Prefeitos, Deputados Estaduais, Assembléias Legislativas e Governadores de Estado. Esses recursos não vão voar e desaparecer; serão aplicados em benefício da sociedade. É evidente que com exceção – como bem citou V. Exª - de algum Deputado ou Senador corrupto que pretenda ganhar comissão sobre a obra para a qual ele destinou a emenda. Pode haver. Não estou aqui dizendo que haja isso, mas V. Exª lembrou bem. Mas, isso é migalha; R$300 milhões são migalhas. Além de ser migalha, pelo menos 90% serão aplicados em benefício da população.  

Eu queria que a imprensa, Senador Amir Lando, mostrasse ao povo brasileiro, diariamente, as contas desta Nação. Que mostrasse ao povo brasileiro que o Governo Fernando Henrique ampliou a dívida interna deste País de R$ 60 bilhões para R$400 bilhões, praticamente em sete vezes. E nós pagamos de juros aos banqueiros nacionais, aos investidores da especulação financeira, àqueles que sobrevivem não às custas do trabalho, mas às custas do dinheiro, gastamos com essa gente em média R$6 bilhões por mês, só com a dívida interna brasileira. São R$6 bilhões! E nós somos o único País do mundo cuja Constituição estabelece que não pode haver emenda no Orçamento para modificar o dinheiro destinado ao pagamento do serviço da dívida. Está no art. 166 da Constituição da República, quando se fala na possibilidade de mudança no Orçamento de emenda orçamentária. Reza o item II do §3º desse artigo:  

"II – indiquem os recursos necessários, admitidos apenas os provenientes de anulação de despesa..."  

Quando emendamos o Orçamento, o que nós podemos fazer? Tiramos de um setor e colocamos em outro, é lógico, pois nós não podemos aumentar despesas. Só há um setor do qual não se pode tirar dinheiro. Está na Constituição que não se pode tirar nenhum recurso, nenhum centavo destinado ao serviço da dívida. Aliás, essa regra foi definida, à época, de maneira irregular, porque não constava de nenhuma proposta básica às vésperas da elaboração do texto final. Eu já tentei tirar esse dispositivo da Constituição, mas não consegui aprovar emenda constitucional minha nesse sentido.  

O Sr. Amir Lando (PMDB - RO) – Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA) – Ouço o aparte de V. Exª, Senador Amir Lando.  

O Sr. Amir Lando (PMDB - RO) – Nobre Senador Ademir Andrade, antes que V. Exª mude a direção do sábio pronunciamento com que brinda esta Casa, para situar melhor a minha posição. Gostaria de dizer que as denúncias correntes sugerem a existência de uma segunda fase no processo de liberação de verbas do Orçamento: a negociação entre Executivo e parlamentares. É evidente que eu não posso acusar ninguém, mas essa é a leitura que a população faz do que vem acontecendo. Nós, parlamentares, temos a legítima faculdade de oferecer emendas, emendas que deveriam fluir naturalmente, atendendo, sobretudo, à excelência das respectivas propostas. Mas o que se observa é que nos deram a faculdade de oferecer emendas, mas a liberação das verbas a elas correspondentes faz parte de uma segunda rodada de negociações que me parece imprópria numa democracia, onde a vontade da lei deve talhar a conduta, deve ser soberana e submeter as ações do Poder Executivo que, mediante um cronograma, deve liberar esses recursos. Verificamos, porém, que se deixa essa liberação para o final para criar condições de barganha e esse comportamento é deplorável para ambas as partes – para quem se submete à negociação e para quem usa essa moeda de troca. Esse é o meu ponto de vista. Junte-se a isso a dependência brutal do parlamentar criada por meio de uma remuneração abaixo de suas necessidades. Temos que acabar com a hipocrisia de dizer que ganhamos demais diante do salário mínimo. É evidente que isso é verdade, mas é evidente também que as nossas obrigações políticas e econômicas são bem superiores às do cidadão. Não quero dizer que o cidadão deva estar satisfeito com essa miserável remuneração chamada salário mínimo, mas esse é outro ponto. Quero deixar muito claro que acho legítima a postulação desses recursos, pois sabemos que as nossas regiões precisam de recursos, mas a barganha é deplorável. Obrigado pelo aparte e desculpe-me por essa intromissão no raciocínio de V. Exª.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA) – Agradeço-lhe pelo aparte, Senador Amir Lando.  

Quero registrar que grande parte dessa sujeira parte do Executivo, pois nós trabalhamos um Orçamento que o Executivo nos manda, nós o estudamos bastante, passamos aqui noites em claro discutindo-o e analisando-o, propomos modificações nesse Orçamento, temos um trabalho cansativo de negociação, de reuniões nas comissões técnicas e nas nossas bancadas, recebemos dezenas e dezenas de prefeitos que vêm nos solicitar emendas individuais. Despendemos um esforço enorme no sentido de ver atendido o interesse do povo via Orçamento. Nada obstante isso, depois, o Governo simplesmente segura os recursos para fazer esse tipo de negociação, não cumpre a sua obrigação, o seu dever de obedecer o Orçamento, de respeitar a vontade dos parlamentares e a sua própria vontade - afinal, ele é responsável pela elaboração de mais de 90% do Orçamento. Portanto, o Executivo tem a maior parte da culpa nesse processo. O que lamento é que a base governista, os parlamentares do PMDB, do PFL, PPB, do PSDB – com exceções, Senador Amir Lando – deixem-se seduzir por tão pouco.  

E vejam o que aconteceu ontem: foi aprovada, em primeiro turno, uma emenda constitucional chamada Desvinculação de Receitas da União. Vejam a falta de lógica desses parlamentares: aprovaram ontem uma emenda constitucional em primeiro turno – ainda vai haver o segundo turno e depois dois turnos no Senado Federal – que permite a desvinculação de 20% das receitas para a União para que o Presidente da República os use como bem quiser e entender. Quer dizer, nós liberamos os recursos para o Presidente Fernando Henrique Cardoso usar da maneira lhe aprouver. O interessante é que foi estabelecido que essa regra duraria até 2003...  

O Fundo de Estabilização Fiscal foi criado em substituição ao chamado Fundo Social de Emergência – depois que descobriram que os recursos eram usados em banquetes palacianos, mudou-se o nome para Fundo de Estabilização Fiscal. Havia o compromisso do Presidente da República de não continuar com esse Fundo de Estabilização Fiscal, mas agora ele traz essa mesma medida com um novo nome: Desvinculação de Receitas da União.  

Quer dizer, os parlamentares da base governista trocam a aprovação de suas emendas por muito pouco – suas emendas são muitas vezes pequenas, emendas de R$75 mil, R$50 mil, R$100 mil, para a construção de obras nas suas bases. Agindo assim, dão liberdade ao Presidente da República de abocanhar, de trazer para si, para o seu comando e para a sua direção, 20% das receitas vinculadas da União. Com isso, Sua Excelência pode fazer a política que quiser.  

Se um governador de oposição o critica ou lhe faz uma sugestão com a qual não concorda, Sua Excelência persegue esse governador e não libera convênios, dinheiro, obras etc., para o estado daquele governador. Se um prefeito não faz parte da base governista, ele também é perseguido e não tem liberados recursos; se é da base governista e se submete às determinações e às imposições do Poder Executivo e daqueles que dão sustentação ao seu desempenho aqui no Congresso Nacional, são liberados os recursos.  

O parlamentar está entregando mil por dez, os parlamentares estão entregando ao Presidente da República mil e recebendo dez. Essa é a negociação que está sendo feita e que está sendo tão criticada pela grande imprensa nacional.  

Concordo com as críticas, acho que é dever da imprensa fazer o que está fazendo, mas eu ficaria muito mais feliz se a imprensa brasileira, diariamente, denunciasse os juros do serviço da dívida que o Governo está pagando, o crescimento da dívida externa brasileira da época em que o Presidente assumiu até os dias de hoje, o aumento da dívida interna da época em que assumiu até os dias de hoje. Tem que ser denunciada essa regra imoral da Constituição brasileira que não permite – é a única Constituição do mundo que diz isso – remanejar recursos destinados ao serviço da dívida, ao pagamento do serviço da dívida pública brasileira.

 

A imprensa deveria bater nessa tecla também, porque assim levantaria o povo brasileiro, chamaria a atenção daqueles que não estão dando a devida importância ao processo político. Afinal de contas, este País é do povo, este País não é de um cidadão em particular, não é de um rei, não é de um presidente, de um senador ou de um deputado: este País é do povo brasileiro e o povo brasileiro precisa ter acesso a essa informação para fazer crescer a sua indignação e fazer mudar essa triste realidade que estamos vivendo.  

Eu também gostaria de falar sobre a questão da reforma tributária, que deveria ter maior atenção por parte da imprensa. Nesse fim de ano, tive o grato prazer de fazer uma viagem ao país que tem o domínio do planeta hoje: os Estados Unidos, que têm as maiores forças armadas do planeta. É um país com princípios louváveis, especificamente o princípio da democracia, do respeito aos direitos das pessoas. O capitalismo existente naquele país leva a um outro processo de discussão.  

Visitei o interior dos Estados Unidos, andei de carro, andei pelas estradas, visitei as cidades. É realmente um outro mundo, uma outra realidade. Aquele é um país rico não só porque explora os países mais pobres do Terceiro Mundo, mas também porque têm regras fundamentais. Estou me referindo à reforma tributária. Nos Estados Unidos, há milhares de estradas, milhares de casas, conforto por todo o lado. Lá também existe gente pobre, abandonada, mas não existe favela. É um país extremamente avançado. Por quê? Porque existe um processo de tributação que é lógico e que não permite essa indecência existente no Brasil: de um lado, a sonegação e, de outro lado, a corrupção do aparelho arrecadador.  

Ao assumir a Presidência da República pela primeira vez, o Presidente Fernando Henrique Cardoso deveria ter-se preocupado com a reforma tributária ao invés de querer acabar com o monopólio do petróleo, com o monopólio das telecomunicações, com a cabotagem.  

Nos Estados Unidos, quando se compra algum produto em qualquer loja, por mais humilde que esta seja, há um preço e, em cima do preço, a taxa e a nota fiscal. Não se compra nada naquele país sem que seja emitida uma nota fiscal. Hospeda-se em um hotel com uma diária de US$80, por exemplo, mas, quando se paga, verifica-se que o preço final é de US$92 ou US$93, porque a taxa do Governo já está incluída. Compra-se uma máquina fotográfica, um sapato ou uma gravata, lancha-se num restaurante, e, quando se efetua o pagamento, verifica-se que, no preço final, está incluída a parte do Governo.  

É um Governo que tem muito dinheiro, porque o povo gasta. Portanto, é preciso que o Governo arrecade de uma maneira simples e fácil, com a cobrança de uma taxa por fora. E não vamos dizer que isso só acontece nos Estados Unidos, que é um país de primeiro mundo. No Uruguai, um país de três milhões de habitantes, o mesmo acontece: compra-se e, na mesma hora, paga-se o percentual do Governo, ou seja, no preço final de qualquer produto está incluída a taxa do Governo. Isso evita a sonegação, a corrupção do aparelho arrecadador.  

E há mais, Senador Amir Lando. V. Exª falou dos Parlamentares que, às vezes, têm de se valer de outras formas para compensarem o salário que recebem. Vamos analisar o que acontece nos Estados Unidos: o salário de um parlamentar como nós é de US$6 mil por mês, e o salário mínimo é de US$700. Portanto, naquele país, o salário de um parlamentar é nove vezes maior que o salário mínimo. Os imigrantes ganham quase US$700. Refiro-me aos mexicanos, espanhóis e latinos que vão para lá para serem lavadores de prato, varredores de rua, pedreiros ou carpinteiros. Mas a diferença dos salários é de um para nove. Ganhamos, Senador Amir Lando, quase 60 salários mínimos. Se é pouco para nós, imagine para o pobre coitado que mantém a família e os filhos com esse mísero salário mínimo! Isso não pode ocorrer. Não podemos pensar ou falar em aumento para nós sem antes pensarmos no aumento e na igualdade para todos. Podemos ir a qualquer país da Europa...  

O Sr. Amir Lando (PMDB - RO) – Permita-me V. Exª um pequeno aparte novamente?  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA) – Concedo o aparte a V. Exª.  

O Sr. Amir Lando (PMDB - RO) - Comungo inteiramente com a posição de V. Exª. Eu disse que o que remuneramos não é salário mínimo, não é salário de sobrevivência, mas uma mera representação ficta daquilo que seria essencial para a sobrevivência do cidadão. É evidente que sou favorável ao aumento do salário mínimo – não há dúvida quanto a isso –, como também sou favorável ao aumento do nosso salário. Não podemos ficar com essa hipocrisia, porque o que há por trás disso é um condão de submissão do Congresso, uma forma de dominar e de tornar o Congresso dócil, pois é um Congresso que não quer ofender ninguém na espreita de alguma vantagem. Essa é uma realidade. Evidentemente, existem exceções, e a grande maioria não está nisso, mas, na verdade, esse Congresso está muito acuado. Precisamos de um mínimo de independência, e a independência começa pelo menos com a satisfação daquelas obrigações inerentes ao cargo. É isso que quero dizer. Não estou querendo aumentar a nossa remuneração e deixar o trabalhador nessa situação irrisória do salário mínimo.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA) – Compreendi perfeitamente. Concordo com V. Exª. Comparando o nosso salário ao da maioria da população, sei que o que ganhamos é muito elevado, embora não seja suficiente para as nossas próprias despesas. Eu, por exemplo, tenho atividades externas, porque, se fosse viver apenas com o salário de Senador, eu teria muita dificuldade na minha vida. Apesar disso, não aceito e não admito qualquer discussão de aumento salarial nosso enquanto não se pensar no aumento do salário da sociedade brasileira.  

V. Exª pode observar que, em qualquer país europeu, em qualquer país do Primeiro Mundo, a diferença salarial, no máximo, é de um para dez; não existe diferença maior do que essa. Em países como a Suécia, a diferença é de um para três. Se nos Estados Unidos, que é o grande país do sistema capitalista, o salário mínimo é de quase US$700 e um parlamentar como nós ganha US$6 mil, não é justo que aqui queiramos aumentar o nosso salário. Não falo de mim e nem de V. Exª, mas muitos aqui trataram disso e até ameaçaram fazer greve no Congresso Nacional. Houve essa ameaça no ano passado, Senadora Heloisa Helena. Os juízes do Brasil fizeram isso, como também o fizeram os parlamentares.  

Todos nós podemos querer aumento de salário e melhoria das nossas condições de vida, mas, fundamentalmente, devemos ter a compreensão das dificuldades pelas quais passam o povo brasileiro com esse salário miserável, com esse salário de fome.  

O Presidente Fernando Henrique Cardoso, portanto, deveria tratar com mais cuidado da reforma tributária e não apenas analisar se o Estado, o Município ou a União vão ter mais, ou trazer todo o dinheiro para si para fazer política com ele. Fundamentalmente, Sua Excelência deveria acabar com a sonegação e com a corrupção do aparelho arrecadador no Brasil. Esse é o grande mal deste País. O Uruguai já superou esse mal. Os Estados Unidos, que é uma grande potência – ali há conforto por todo o lado –, superou esse problema, porque têm um aparelho arrecadador sério. Naquele país, quem não paga Imposto de Renda e não cumpre com suas obrigações vai para a cadeia. Não é um país de privilegiados, de ricos, onde um cidadão, por ter dinheiro, não é punido. Senadora Heloisa Helena, eu gostaria de ver se, no Brasil, o Mike Tyson iria para a cadeia! Tenho certeza de que isso não aconteceria. São esses exemplos que temos de observar, para mudarmos a nossa situação.  

O discurso de V. Exª, Senador Amir Lando, chamou-me muita a atenção. Estou falando de muitas questões com base no que V. Exª abordou.  

O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) – (Fazendo soar a campainha.)  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA) – Já vou encerrar o meu pronunciamento, Sr. Presidente.  

Também tenho elogios a fazer ao Presidente Antonio Carlos Magalhães, por S. Exª ter tomado a decisão de "tocar para a frente" a regulamentação da edição de medidas provisórias. Mas já estou preocupado, Senador Amir Lando. Não sei se V. Exª leu os jornais de hoje, mas o Senador Antonio Carlos Magalhães foi convidado para um jantar ontem com o Presidente Fernando Henrique Cardoso. E o assunto tratado foi a edição de medidas provisórias. O Presidente Fernando Henrique tenta convencer o Presidente do Congresso Nacional a admitir determinadas mudanças que lhe permitam fazer medidas provisórias sobre matérias tributárias e financeiras, que são as mais importantes.  

É evidente que o diálogo, a realização de um jantar são formas de se ter um bom tratamento...  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT – AL) – Espero que as escadarias da Igreja do Senhor do Bonfim sejam mais fortes.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB – PA) - O Presidente é um homem firme nas suas posições e o PFL, na Câmara dos Deputados, está firme na aprovação da emenda como ela saiu do Senado Federal. Mas, o Presidente já afirmou que, se os Deputados admitirem um acordo, S. Exª não será impedimento ao entendimento. Preocupa-me a interferência do Presidente Fernando Henrique Cardoso até nesse ponto, ou seja, além de tratar os Parlamentares de maneira geral com fisiologismo, prender os recursos que pertencem ao povo. A obrigação do Presidente da República é a de liberar esses recursos de maneira natural porque eles fazem parte do Orçamento, estão previstos nas despesas, e não retê-los para fazer negociações como as que estão sendo feitas.  

Os jantares, os assédios também preocupam-me. Temo que a Câmara dos Deputados não mantenha a posição adotada nesse longo processo de negociação. O projeto já permite que a medida provisória prevaleça por 60 dias, prorrogáveis por mais 60 dias e, ainda assim, o Presidente da República não o aceita.  

Finalizo meu pronunciamento dando um recado ao povo brasileiro. Apesar de todas esses acontecimentos, sou otimista com relação à vida do próprio povo, que, evidentemente, depende muito dele mesmo, da sua consciência, da sua compreensão. Ao invés de o povo pensar que o Congresso é uma Casa de incompetentes e de corruptos e que política é coisa de marginal - a televisão, infelizmente, passa essa imagem, e a classe dominante, às vezes, demonstra isso, mas, no fundo, ela é quem mais sabe fazer política porque o faz aproveitando-se da miséria alheia - o povo deve refletir no sentido de que não existe outra forma de corrigir os erros da nossa sociedade que não a da luta política. Não existe nação que não seja comandada por políticos. Não existe outra forma: para se corrigir os erros das nossas relações sociais tem-se de saber fazer política. O povo tem que compreender que saber fazer política é o que pode mudar a sua vida, e não se revoltar contra a política - votar em branco, não votar, não fazer campanha, ter ódio dos políticos. Não é esse o caminho; o caminho do povo é fazer política. Esse é o caminho da esperança. Esse é o caminho da mudança. Esse é o caminho para se construir uma sociedade mais justa e mais fraterna.

 

O povo comete erros, temos que ser claros nesse aspecto. Como podem ter sido eleitos Deputados corruptos, Deputados ligados a narcotráfico, como os que foram cassados recentemente, Deputados como o Sérgio Naya? Enfim, há Parlamentares que não têm a menor condição de estar aqui, por falta de ética e por uma série de outras coisas. Porém, quem os trouxe para cá? Foi a população.  

O apelo que faço é para que o povo preste muita atenção na política, valorize seu voto – discuta, analise, pense, reflita –, não o dê em troca de um benefício recebido à última hora, às vésperas da eleição.  

A minha palavra é de esperança e de fé no futuro deste País e na melhoria das condições de vida do nosso povo, pela sua própria consciência, pelo crescimento dessa consciência e pelo seu poder de participação nas mudanças que tanto almejamos.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 

q ÷


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/01/2000 - Página 358