Discurso durante a 12ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

PERPLEXIDADE DIANTE DO RELATORIO DO FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A INFANCIA (UNICEF), SEGUNDO O QUAL CERCA DE 53% DAS CRIANÇAS QUE TRABALHAM NO BRASIL PERTECEM A REGIÃO NORDESTE.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • PERPLEXIDADE DIANTE DO RELATORIO DO FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A INFANCIA (UNICEF), SEGUNDO O QUAL CERCA DE 53% DAS CRIANÇAS QUE TRABALHAM NO BRASIL PERTECEM A REGIÃO NORDESTE.
Publicação
Publicação no DSF de 26/01/2000 - Página 974
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • REGISTRO, OCORRENCIA, DIVULGAÇÃO, RELATORIO, FUNDO INTERNACIONAL DE EMERGENCIA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A INFANCIA (UNICEF), ESPECIFICAÇÃO, APREENSÃO, SITUAÇÃO, PAIS, SUPERIORIDADE, QUANTIDADE, FAMILIA, BAIXA RENDA, INFERIORIDADE, SALARIO MINIMO.
  • COMENTARIO, APREENSÃO, RESULTADO, RELATORIO, REFERENCIA, SUPERIORIDADE, CONCENTRAÇÃO, CRIANÇA, ADOLESCENTE, BAIXA RENDA, REGIÃO NORDESTE, EFEITO, EXISTENCIA, TRABALHO, INFANCIA.
  • REGISTRO, OCORRENCIA, VOTAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, FIXAÇÃO, HABILITAÇÃO, DIREITO CONSTITUCIONAL, CIDADÃO, PAIS, OBJETIVO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB – GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Sr as e Sr. Senadores, hoje, dois oradores, o Senador Eduardo Suplicy, que mais uma vez mencionou a luta incessante que tem travado nesta Casa a favor da garantia da renda mínima, e o Senador Maguito Vilela, homem voltado para os mais humildes e Presidente da Comissão que analisa a pobreza e a miséria no Brasil, discutiram intensamente o problema dos menos favorecidos. Volto ao tema agora, Sr. Presidente.  

A divulgação do relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância – Unicef –, em dezembro passado, estampou, uma vez mais, aos olhos de todos nós uma vergonhosa e perversa realidade: o Brasil tem um número imenso de cidadãos menores de 18 anos vivendo em famílias com renda per capita de até meio salário mínimo.  

Os números são trágicos. Em nosso País, uma das maiores economias do mundo, 21,1 milhões de menores de 18 anos – cerca de 35% do total dessa faixa etária – vivem abaixo da linha da pobreza. Desse total, 53% moram na região Nordeste; 21,8%, na Sudeste; 9,6%, na Sul; 6%, na Norte; e 5,2%, na Centro-Oeste.  

Tamanha concentração de crianças e jovens pobres no nordeste brasileiro coloca em evidência, e de forma contundente, quão grandes são as desigualdades sociais e regionais existentes em nosso País. A mesma estatística também está ligada à questão da moradia: o nordeste também é o campeão da falta de moradia para os seus habitantes.  

Apesar de o Brasil ter uma das mais progressistas leis existentes no mundo para a infância, o Estatuto da Criança e do Adolescente, sabemos muito bem quão visíveis são as disparidades entre a teoria e a prática. Os números apontados no mencionado relatório denunciam que nosso País está longe de garantir, de fato, os direitos sociais de sua população infanto-juvenil.  

A pobreza em que vivem tantos milhões de cidadãos brasileiros não só está privando nossas crianças e adolescentes de seus direitos humanos, mas também está afastando o Brasil do futuro promissor que poderia e deveria ter.  

Sr. Presidente, Srª s e Srs. Senadores, existem sólidos e conhecidos argumentos sobre o grande poder que as medidas de adequado cuidado e estímulo nos primeiros anos de vida, na infância e na adolescência, têm para fomentar o desenvolvimento humano.  

"Crianças e adolescentes vivendo em lares e comunidades estáveis que favoreçam seu desenvolvimento, com orientação e proteção dos adultos, têm amplas oportunidades de desenvolver integralmente suas potencialidades".  

Sr. Presidente, a Câmara dos Deputados vota hoje a emenda de nossa autoria que coloca a moradia como direito constitucional. Daqui a pouco estaremos lá.  

Vejo nessas estatísticas apresentadas pelo Unicef dados muito fortes, que vinculam a moradia à qualidade de vida das pessoas.  

Na semana passada, o ex-Ministro Celso Furtado, telefonou-me, de Paris, para cumprimentar-me pela emenda constitucional da moradia. Ele disse saber que é difícil, de um dia para o outro, resolver esse problema, mas reconhece que a moradia é o início de um processo de organização social baseado no apoio às crianças e aos adolescentes.  

O fato de existirem em nosso País tantas crianças e jovens vivendo em condições de extrema pobreza é motivo de vergonha e de imensa preocupação.  

Segundo a representante do Unicef no Brasil, Senhora Reiko Niimi, a pobreza atinge mais perversamente as crianças e adolescentes. Para ela, é a pobreza que faz as crianças morrerem na primeira semana de vida e que as empurra para o trabalho precoce, que as faz fracassar nos estudos.  

Pesquisa e prática sinalizam que as oportunidades que se apresentam durante a primeira infância, a fase escolar e os anos de adolescência são consideradas oportunidades únicas em virtude de seu potencial para promover mudanças benéficas e capazes de romper os grilhões da pobreza, da ignorância e do subdesenvolvimento humano.  

É dramático ver que chegamos ao ano 2000 sem que o Brasil tenha conseguido reduzir a níveis aceitáveis o vergonhoso e persistente desequilíbrio social que estigmatiza nosso processo de desenvolvimento e causa tanto sofrimento a cerca de 35% da população infanto-juvenil.  

As estatísticas que colocam o Brasil em 105º lugar entre 191 países refletem bem o que acabo de afirmar.  

Não obstante as conquistas alcançadas nos últimos anos, tais como a queda dos índices de mortalidade infantil e do número de crianças fora da escola, continuamos a disputar posição com países muito mais pobres que o nosso.  

Segundo o documento do Unicef, 2,9 milhões de brasileiros entre 5 e 14 anos trabalham para complementar a renda familiar. Somente 8% das crianças de 0 a 4 anos freqüentam creche e só 51% das de 4 a 6 anos vão à pré-escola. As crianças e adolescentes pobres também são privados de saneamento básico, de uma educação de qualidade e sofrem conseqüências da violência, da desnutrição, da miséria e, principalmente, da falta de moradia.  

Esse quadro constrangedor reflete, sem dúvida alguma, o desenvolvimento econômico concentrador e excludente, que tão bem conhecemos e tanto condenamos.  

Essa situação, porém, não é irreversível. O Unicef defende a tese de que padrões que se reproduzem de uma geração para outra, relativos à pobreza, à violência, às doenças, à discriminação e outras, podem ser alterados no espaço de uma única geração.  

Os estudiosos dos problemas sociais consideram que a família precisa ser fortalecida em seus alicerces, que são a renda e os níveis de escolaridade dos pais, para que se possa promover uma alteração significativa no quadro atual.  

A psicóloga Rosely Sayão, em depoimento ao jornal Folha de S.Paulo , de 24 de dezembro passado, enfatizou a necessidade de que a família seja fortalecida. Sendo responsável pela formação das crianças e dos jovens, a família transmite valores e influencia padrões de comportamento que podem propiciar ações individuais e coletivas relevantes no presente e no futuro.  

Para que tal ocorra são necessárias mudanças urgentes e significativas. Nos dias atuais, a formulação de políticas para os segmentos mais carentes da população não está sendo capaz de atender às reais necessidades desses brasileiros e não há muita expectativa positiva de que essa situação se altere, naturalmente, a curto prazo.  

Segundo a reportagem intitulada "Sessenta e nove por cento das crianças e jovens brasileiros acham que a vida não vai melhorar", publicada em fins de dezembro na Folha de S.Paulo , nossa população infanto-juvenil está vivendo "uma crise de futuro" e acredita que "no futuro, as condições de vida no País vão ser iguais ou piores do que as atuais".  

Jacobo Waiselfisz, coordenador regional da Unesco no nordeste acredita que "além da pobreza e dos problemas econômicos propriamente ditos, a própria estrutura social pode ser um fator gerador de pessimismo". Segundo ele, "há uma grande expectativa de sucesso, mas a sociedade não cria os caminhos para os jovens atingirem essa meta".  

Pesquisa do Unicef realizada em 20 países da América Latina e do Caribe coloca o Brasil em segundo lugar no ranking do pessimismo latino-americano, atrás apenas da Colômbia.  

Recentemente o jornal O POPULAR , de Goiânia, publicou resultado da pesquisa realizada via Internet com 122 jovens na faixa etária dos 18 aos 22 anos, residentes no Estado e também em outros países, com o objetivo de detectar quais seriam os " bugs da vida real". Os jovens demonstraram uma grande preocupação com as questões sociais, com a fome, com a pobreza, com a falta de moradia, com a corrupção nos sistemas políticos e econômicos mundiais, que enriquece poucos e abandonam muitos na miséria.  

Srªs e Srs. Senadores, sabemos muito bem que as nossas crianças e jovens têm o direito de viver num país em que possam prosperar sem injustiça, sem discriminação, sem pobreza.  

É preciso que sejam definidas, urgentemente, políticas mais efetivas para estas faixas etárias. Temos de nos empenhar nessa luta para que, no século XXI, o Brasil promova e proteja, de fato, os direitos sociais de sua população infanto-juvenil.  

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/01/2000 - Página 974