Discurso durante a 14ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

NECESSIDADE DE MUDANÇA NA ESTRATEGIA DA POLITICA ECONOMICA DO GOVERNO FEDERAL DIANTE DA BAIXA EVOLUÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO. POLITICA SOCIAL.:
  • NECESSIDADE DE MUDANÇA NA ESTRATEGIA DA POLITICA ECONOMICA DO GOVERNO FEDERAL DIANTE DA BAIXA EVOLUÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 28/01/2000 - Página 1213
Assunto
Outros > LEGISLATIVO. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • VOTO, RECUPERAÇÃO, SAUDE, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, PRESIDENTE, SENADO, CORREÇÃO, INFORMAÇÃO, IMPORTANCIA, PAUTA, SEMANA, CONVOCAÇÃO EXTRAORDINARIA.
  • ANALISE, ALTERAÇÃO, POLITICA CAMBIAL, AMBITO, CRISE, DESEMPREGO, POBREZA.
  • DEFESA, METODOLOGIA, PESQUISA, DESEMPREGO, DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATISTICA E ESTUDOS SOCIO ECONOMICOS (DIEESE), COMENTARIO, DADOS, MERCADO DE TRABALHO, REDUÇÃO, EMPREGO, PODER AQUISITIVO, REGISTRO, INDICE, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), AUMENTO, ECONOMIA INFORMAL.
  • URGENCIA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, POLITICA SOCIO ECONOMICA, GOVERNO, DEFINIÇÃO, POLITICA DE EMPREGO, EXAME, PROPOSTA, COMISSÃO MISTA, COMBATE, ERRADICAÇÃO, POBREZA, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, GARANTIA, RENDA MINIMA.
  • DEFESA, REFORMA AGRARIA, AMPLIAÇÃO, CREDITOS, MICROEMPRESA, COOPERATIVA, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, TRABALHADOR, LUCRO, DECISÃO, EMPRESA.
  • IMPORTANCIA, RECIPROCIDADE, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, AMBITO, POLITICA DE EMPREGO, CONTRIBUIÇÃO, IMIGRANTE.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Geraldo Melo, aproveito a oportunidade para pedir a V. Exª informações sobre o estado de saúde do Presidente desta Casa, Senador Antonio Carlos Magalhães. Obviamente, todos nós gostaríamos de saber como está S. Exª. Lemos a sua entrevista publicada na imprensa, em que se disse que S. Exª está bem de saúde. Essa é uma preocupação de todos nós. Que S. Exª possa recuperar-se o mais brevemente possível!  

Nessa entrevista, ainda estando em recuperação, o Presidente desta Casa esclareceu que, quanto ao coração, os exames foram maravilhosos e que só há um problema gripal. Porém, num certo trecho da entrevista, S. Exª disse que não haverá nada de importante a ser apreciado pelo Senado nesta semana, mas sim na outra semana. Ora, Sr. Presidente, será que nada há de importante na pauta dos trabalhos do Senado nesta semana? O País passa por problemas dramáticos. Há uma grave situação de desemprego e a necessidade de erradicarmos a pobreza. Agora mesmo, em São Paulo, 80 famílias estão na Rua Líbero Badaró, no antigo prédio do Banco Nacional, sendo objeto de despejo, aumentando o número dos milhares de sem-teto que estão em busca de moradia.  

Estamos no Senado vivendo sérios problemas, repercutindo o que ocorre no País. Estamos, inclusive, estudando a questão do desemprego, tema sobre o qual irei falar hoje, e o próprio projeto de emenda à Constituição do Senador Antonio Carlos Magalhães, que está sendo objeto de debates, nesta semana, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.  

Permita-me dizer o Senador Antonio Carlos Magalhães, que talvez esteja assistindo à sessão pela TV Senado , que estamos, sim, fazendo trabalhos da maior importância para o País.  

Sr. Presidente, ainda na semana retrasada, fiz aqui um balanço dos efeitos, para a economia brasileira, da mudança da política cambial. Hoje voltarei ao tema, mas, em especial, falarei sobre o que está acontecendo no mercado de trabalho.  

Em janeiro, a alteração da política cambial completou um ano. Já me manifestei sobre alguns aspectos, que considerei positivos, da evolução da economia, decorrentes do fim da sobrevalorização excessiva, que caracterizou o real até 13 de janeiro de 1999. Ressaltei, entretanto, que voltaria a esta tribuna para analisar o assunto sob outro ângulo: a grave situação do desemprego e da pobreza, que ainda perdura e que não mereceu do Governo o ataque suficiente.  

Quais os impactos, no plano social, da alteração da política cambial em 1999? Gostaria de apresentar a evolução de indicadores do mercado de trabalho nesse ano, segundo a Pesquisa de Emprego e Desemprego – PED, desenvolvida pela Fundação SEAD, em parceria com o DIEESE, bem como pelos dados do IBGE. Para avaliar a eficiência da política econômica, é essencial analisarmos a evolução das taxas de desemprego e dos rendimentos dos trabalhadores.  

O Ministro da Fazenda Pedro Malan tem afirmado que a pesquisa do SEAD/DIEESE está circunscrita à região metropolitana de São Paulo e, por conseqüência, não é representativa do mercado de trabalho brasileiro. E mais: S. Exª afirma que essa Pesquisa de Emprego e Desemprego, por usar metodologia diferente da de outros países, não permitiria uma comparação adequada das taxas de desemprego inter nações.  

Essas assertivas, em parte, são verdadeiras. Mas a metodologia SEAD/DIEESE parte do diagnóstico, correto a meu ver, de que o mercado de trabalho brasileiro é caracterizado pela baixa estruturação e/ou formalização, com escassos mecanismos de proteção social e com grande disponibilidade de mão-de-obra, e está inserido em uma estrutura produtiva heterogênea, cuja dinâmica escapa da dualidade emprego/desemprego. A Pesquisa de Emprego e Desemprego, dessa forma, está mais capacitada a descrever a evolução do mercado de trabalho brasileiro, que é distinto do de vários países desenvolvidos. Relembro, como o fez o Senador José Eduardo Dutra na semana passada, que a metodologia SEAD/DIEESE foi instituída durante o Governo Franco Montoro, quando eram seus secretários os hoje Ministros José Serra e Paulo Renato Souza.  

É verdadeira também a afirmação de que a pesquisa do SEAD/DIEESE investiga apenas a região metropolitana de São Paulo, não sendo mecanismo de aferição do desemprego em todo o território nacional, ainda que o DIEESE tenha estabelecido convênios com instituições de outras capitais, onde realiza levantamentos de natureza semelhante, que mostram a tendência grave à qual estou me referindo.  

Mas é necessário assinalar que a produção da região metropolitana de São Paulo representa parcela significativa do produto agregado nacional, com intenso encadeamento para todo o Estado e a Nação. Dessa forma, os efeitos da política econômica, ocorridos na economia da Grande São Paulo, constituem razoável aproximação, do ocorrido na economia brasileira, especialmente no que diz respeito ao emprego e à renda.  

Os indicadores do mercado de trabalho, em 1999, corroboram as trajetórias observadas ao longo dos anos 90, de baixo dinamismo na oferta de trabalho, incremento do desemprego e elevação do grau de escolaridade da população economicamente ativa.  

No ano de 1999, observou-se o incremento na oferta de empregos de 45 mil postos de trabalho, mas esse volume foi insuficiente para absorver os ingressantes no mercado de trabalho, 175 mil trabalhadores. O resultado líquido do ano foi a incorporação de 130 mil pessoas ao contingente dos desempregados. Em dezembro de 1999 - mês que normalmente é o de maior atividade econômica em função das festas natalinas e do 13º salário - o total de desempregados na região metropolitana de São Paulo atingiu o patamar de 1.715.000 (um milhão setecentos e quinze mil) desempregados.  

Entre os setores econômicos, em 1999, o segmento de serviço foi o único que ampliou a oferta de empregos, gerou 88 mil novos postos de trabalho. A indústria registrou um declínio de 6 mil vagas e o comércio empregou 36 mil pessoas a menos que em 1998.  

A taxa anual média do desemprego manteve a trajetória de crescimento desde 1994, passando de 18,2%, em 1998, para 19,3% em 1999. E essa taxa era da ordem de pouco mais de 13% em 1994 e em 1995. O incremento do desemprego não foi homogêneo em toda Grande São Paulo. No Município de São Paulo, a ampliação foi menos intensa vis-à-vis as demais administrações municipais dessa região metropolitana.  

A taxa de desemprego ampliou-se para todas as parcelas da população. Para as mulheres, essa taxa ampliou-se para 21,7% no seu quarto ano consecutivo de aumento; para os homens, a taxa variou de 16,1% para 17,3% de 1998 para 1999, em média. Quando se observa o desemprego por faixa etária, o incremento foi mais intenso para as pessoas com 18 anos ou mais. Para os trabalhadores com mais de 40 anos, a taxa passou de 10,8% para 12,2%. A taxa de desemprego dos chefes de família sofreu um incremento de 10,8% para 11,8%, de 1998 a 1999. O valor desse indicador para os cônjuges atingiu 19% neste ano de 1999.  

Em função do incremento contínuo e sustentado das taxas de desemprego, o tempo de procura por trabalho também ampliou-se. Em 1998, o tempo necessário para se obter um emprego era de 36 semanas, e, em 1999, o desempregado despendeu um período maior para obter um emprego, agora 45 semanas.  

Quando se observa os valores dos rendimentos dos trabalhadores, o quadro não é animador. O salário mínimo real, calculado pelo DIEESE, mostra uma queda do poder aquisitivo no ano de 1999. A despeito do reajuste concedido ao salário mínimo, em maio último, chegou-se em dezembro de 1999 com um valor 4,4% menor que o de dezembro de 1998.  

Esses resultados denotam a necessidade urgente de o Governo Federal alterar o atual desenho da política econômica e implementar medidas que permitam a melhora do quadro de pobreza em que vive a população brasileira. O Congresso Nacional acaba de publicar os resultados da Comissão Mista que investigou e propôs medidas alternativas às vigentes para a erradicação da pobreza. É mister o exame aprofundado dessas propostas e a determinação de implementar aquelas que avaliarmos como as que mais eficazmente contribuirão para resolvermos o problema do desemprego e da má distribuição de renda e riqueza.  

O Ministro Pedro Malan reiterou, na última semana, que essas estatísticas não aferem o desempenho do mercado de trabalho brasileiro como um todo. Disse, no encontro com os Senadores da Comissão de Assuntos Econômicos, dia 18 último, que os dados do IBGE é que seriam representativos. Todavia, o exame desses dados vem mostrar que a situação do desemprego no País continua muito séria. A taxa de desemprego aberto médio, segundo o IBGE, para as seis regiões metropolitanas principais, de 1998 a 1999, permaneceu estacionada no elevado patamar de 7,6%. Registrou-se uma elevação em três pontos percentuais, de 1995 a 1999, pois era de 4,6% em 1995, 5,4% em 1996 e 5,7% em 1997, estacionando-se no nível recorde de 7,6% em taxa média ao ano. Pelo menos por muito tempo não se agravava tanto essa situação.  

Nessas seis regiões metropolitanas, a população desocupada, segundo o IBGE, evoluiu de 1.103.933, em dezembro de 1998, para 1.119.344 em dezembro de 1999, o que significa claramente uma piora. Uma política econômica que nega oportunidades de trabalho a pessoas que querem dar de si para aumentar a produção de nosso País, e com a finalidade principal de darem sustento para si próprias e aos seus, não pode ser qualificada de política civilizada. Na acepção do eminente economista Paul Davidson, em seu livro Economics for a Civilized Society , essa política pode ser qualificada de bárbara.  

Concomitantemente, enquanto em janeiro de 1999 um trabalhador despendia 20 semanas procurando emprego, em dezembro, mês que ciclicamente é de maior atividade, esse tempo elevou-se para 24 semanas.  

Outra evolução grave é a redução do número de trabalhadores que possuem carteira assinada. Em 1995, 48,4% dos trabalhadores empregados possuíam carteira assinada e os benefícios daí decorrentes. Em 1999, esse número caiu para 44,5%, o que demonstra, além da precarização das relações de trabalho, a redução da oferta de empregos e a premente necessidade de reformulação da atual estratégia de política econômica.

 

É diante da gravidade desse quadro que nós, da Oposição, estamos dizendo da premência de o Presidente Fernando Henrique Cardoso, o Ministro Pedro Malan e toda a sua equipe ouvirem, com maior humildade e espírito mais aberto, as proposições que temos apresentado. Consideramos perfeitamente possível compatibilizarmos a estabilidade de preços com o crescimento mais acelerado da economia, o aumento das oportunidades de emprego, a melhoria da distribuição de renda e a garantia, a todos os brasileiros, de uma renda suficiente para as suas necessidades vitais como um direito de cidadania. Para isso, obviamente, temos de estar muito mais abertos aos clamores dos destituídos do que às incontáveis pressões dos que têm acesso fácil ao centro do poder. É inadmissível a postura passiva do Governo diante da péssima situação do Brasil em comparação a outros países do mundo. De acordo com estudo realizado pela Unicamp, sob a coordenação do Professor Márcio Pochmann, o Brasil é hoje o terceiro país do mundo com mais desempregados, em números absolutos, em comparação com outros 141. Esclareço que o estudo coordenado pelo Professor Márcio Pochmann é baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE, portanto, bem mais abrangente. Trata-se, portanto de estimativa para todo o País. No total, são 7,7 milhões de pessoas desempregadas, número inferior apenas ao da Rússia (9,1 milhões) e ao da Índia (quase 40 milhões) de desempregados. Em 1990, o Brasil ocupava o oitavo lugar.  

Dentre os instrumentos que avalio devam ser importantes para atacar o grave problema diagnosticado estão a aceleração da reforma agrária, que possibilita mais empregos na agricultura; a ampliação do microcrédito de forma muito mais desenvolta do que atualmente vem-se realizando, mesmo que reconhecendo moderado avanço nessa área nos três últimos anos; o estímulo às formas cooperativas de produção e maior participação dos trabalhadores nas decisões, em todas as empresas, sobre como repartir os resultados da criação da riqueza e a própria maneira de preservar empregos; a atenção ao crédito e formas de fomentar os investimentos que conduzam à expansão da produção de maneira a não contribuir para o agravamento do desequilíbrio externo; e a garantia de uma renda mínima como um direito à cidadania. Há de se ter um desenho dessa renda garantida que contribua para que se alcance o maior nível possível de emprego, vida digna para todos, inclusive com o objetivo de conseguir competitividade no mundo.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - V. Exª me concede um aparte, Senador Eduardo Suplicy.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Com muita honra. Eu já havia sinalizado ao Senador Roberto Saturnino que concederia a ele um aparte; em seguida, concederei a V. Exª, Senador Casildo Maldaner.  

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PSB - RJ) - Nobre Senador Eduardo Suplicy, o discurso de V. Exª, como sempre, é muito oportuno e esclarecedor. V. Exª refere-se à questão gravíssima do desemprego e aponta caminhos alternativos, capazes de compatibilizar a defesa da estabilidade da moeda, que, para nós, também é extremamente importante, é fundamental, com a preocupação de inverter a tendência do aumento do desemprego, que está levando angústia à nossa população. Queria observar, concordando com todas as expressões que V. Exª usa, que a esse quadro grave de desemprego da população de brasileiros acresce uma circunstância: com a desnacionalização das nossas empresas - empresas estatais, empresas de serviço público e mesmo empresas industriais, construídas com esforço e com poupança brasileira, que estão sendo vendidas a preços desvalorizados em relação ao seu patrimônio -, está ocorrendo o ingresso de centenas e, hoje, de dezenas de milhares de profissionais estrangeiros no País, que estão ocupando os espaços de administração, direção técnica e mesmo cargos intermediários nessas empresas. Tenho acompanhado, por exemplo, a preocupação do CREA - Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura - com essa questão. Engenheiros estrangeiros estão ocupando espaços antes ocupados por engenheiros e arquitetos brasileiros, e já aos milhares, fator que vem agravar o quadro de desemprego resultante do modelo econômico adotado pelo Brasil, pelo Governo Fernando Henrique, como muito bem salienta V. Exª. Queria, então, fazer apenas esta observação: é preciso restringir, de alguma forma, a concessão de vistos de emprego no País, o que já existe em outros países. Conseguir um visto como esse, hoje, nos Estados Unidos, é muito difícil, e o Brasil o está concedendo com a maior facilidade, em detrimento de profissionais brasileiros competentes, que estão ficando sem possibilidade de continuar exercendo a sua profissão dignamente. Parabéns pelo pronunciamento de V. Exª.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador Roberto Saturnino. Avalio que, sobre esse sério aspecto abordado por V. Exª, o de estarmos abrindo o nosso mercado para pessoas especializadas das mais diversas áreas, seria importante, talvez, o Governo brasileiro realizar entendimento com os outros países, para haver reciprocidade.  

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PSB - RJ) - Tem razão V. Exª.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Em vez de restringir, seria interessante, por exemplo, dizer ao Governo dos Estados Unidos da América que o Brasil é um País que acolhe pessoas de todo o mundo. Essa tem sido a nossa tradição, como, aliás, costumava ser a dos Estados Unidos, no século passado, quando recebeu de presente do Governo francês a Estátua da Liberdade, símbolo de que os Estados Unidos eram o país para onde as pessoas - às vezes perseguidas que eram em suas nações de origem, em função de seu credo religioso ou de dificuldades as mais diversas - poderiam se destinar, buscando um mundo melhor e evitando qualquer tipo discriminação. É interessante observar que os Estados Unidos, assim como outros países, passaram a restringir o ingresso de pessoas, inclusive de cidadãos brasileiros, que para lá têm ido em busca de emprego.  

Lembro-me, Senador Saturnino Braga, que registrei, da tribuna do Senado, a história daquele rapaz que muito queria ter uma oportunidade de ir para os Estados Unidos - ele tinha cerca de vinte e poucos anos - e para isso muito se empenhou. Ele era de São José dos Campos e se inscreveu para trabalhar na Flórida, na agricultura, na colheita de laranjas. Por três vezes teve negado o seu visto de ingresso nos Estados Unidos. Tendo tentado novamente e passado no concurso, resolveu ir até Campinas, de onde sairia o avião para a Flórida. Lá chegando, mais uma vez negaram-lhe a oportunidade. Ele, então, resolveu telefonar para sua mãe dizendo: "Mamãe, vou aos Estados Unidos daqui. Não vou nem voltar para casa. A senhora me desculpe, mas só volto a me comunicar depois de chegar lá. E vou de qualquer maneira: de carona, de caminhão, de ônibus, de motocicleta, da maneira que eu conseguir." E assim ele foi até a fronteira do Rio Grande, de onde telefonou para sua mãe para dizer que no dia seguinte telefonaria novamente para dizer que estava nos Estados Unidos. Feito isso, ele tentou atravessar - ele que era um exímio nadador - o Rio Grande, mas, infelizmente, veio a falecer. Procurou-se saber se ele teria falecido devido aos tiros da guarda costeira, mas não se descobriu completamente todos os fatos, pelo menos até a última notícia que recebi. Seu corpo chegou ao Brasil e seus familiares acompanharam tristemente o que havia ocorrido.  

Relato esse fato porque ele simboliza um pouco essa questão.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo. Fazendo soar a campainha) - Senador Eduardo Suplicy, quero apenas informar a V. Exª que seu tempo está ultrapassado em mais de três minutos.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Eu faço questão de conceder, para concluir, o aparte ao Senador Casildo Maldaner. Sr. Presidente.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Eu pediria ao Senador Casildo Maldaner que fizesse uma intervenção breve.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Mas ainda concluirei a reflexão sobre o que o Senador Roberto Saturnino me afirmou.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Senador Eduardo Suplicy, afora os dados estatísticos que V. Exª levanta e os caminhos que oferece para a diminuição do desemprego no Brasil, inclusive em sintonia com aquilo que diz o Senador Roberto Saturnino, gostaria de lembrar que se não houver compensação e reciprocidade, acabaremos perdendo com a globalização, mesmo no setor industrial, e com a vinda de mão-de-obra externa para cá. Mas independentemente disso, há também o lado sentimental, psicológico, que muito aflige. Em dados absolutos, o Brasil é o terceiro país do mundo em número de desempregados. Imaginemos um pai de família, no final do mês, não ter dinheiro para as necessidades básicas, ou sair de manhã e dizer aos filhos que vai tentar buscar um trabalho, ou, ainda, ver que o vizinho tem um trabalho e recebe no fim do mês, e ele não ter onde buscar. Isso é duro. Em função de tudo isso é que não pode haver paz, tranqüilidade. A grande insegurança que existe no Brasil decorre da situação de emergência em que a pessoa se encontra para sobreviver. Para isso ela faz até o que não gostaria de fazer. Portanto, essa preocupação deve estar em pauta. Por isso, gostaria de cumprimentar V. Exª, pois está levantando um tema de extrema importância para nós.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Agradeço o aparte, Senador Casildo Maldaner, e o incorporo ao meu pronunciamento.  

Sr. Presidente, gostaria de pedir novamente que V. Exª nos desse notícia do estado de saúde do Presidente Antonio Carlos Magalhães.  

Concluindo a reflexão...  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo. Fazendo soar a campainha) - A Mesa reitera o apelo a V. Exª, Senador Eduardo Suplicy, para que encerre, já que V. Exª ultrapassou em seis minutos o seu tempo e há outros oradores inscritos.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Com certeza, Sr. Presidente.  

Apenas quero reafirmar a importância de haver uma atitude de reciprocidade com os demais países e os seus cidadãos, realizando um esforço para que políticas que promovam o emprego possam caracterizar a nossa economia e a de outros países, de tal forma que possamos estar abertos à contribuição de médicos, engenheiros, professores, enfim, de pessoas de todas as áreas que possam contribuir para o desenvolvimento da tecnologia e do conhecimento no Brasil.

 

Muito obrigado.  

 

d


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/01/2000 - Página 1213