Discurso durante a 17ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REFLEXÕES SOBRE A NECESSIDADE DE ENVOLVIMENTO DOS JOVENS NA POLITICA NACIONAL.

Autor
João Alberto Souza (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MA)
Nome completo: João Alberto de Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • REFLEXÕES SOBRE A NECESSIDADE DE ENVOLVIMENTO DOS JOVENS NA POLITICA NACIONAL.
Publicação
Publicação no DSF de 02/02/2000 - Página 1539
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ANALISE, IMPORTANCIA, NECESSIDADE, PARTICIPAÇÃO, JUVENTUDE, POLITICA, PAIS, OBJETIVO, FORMAÇÃO, CIDADÃO, CAPACIDADE, EFICACIA, DIREÇÃO, DEFESA, INTERESSE, COMUNIDADE.

O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (PMDB – MA) – Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, durante as décadas de 60 e 70, o Brasil e o mundo conviveram com uma grande parte da juventude em efervescência, por causa das condições da sociedade. A vivência política dos jovens desse tempo era intensa e participativa. Centro de suas preocupações eram os problemas sociais, debatiam vias de solução num acalorado confronto entre direita e esquerda. Assumiam as teses do existencialismo e contestavam com o comportamento as tradicionais visões de mundo. Capitalismo e comunismo eram horizontes defendidos ou execrados, fontes de medo ou de libertação. Liam Marx, fascinavam-se com Sartre e Simone Beauvoir. Entusiasmavam-se com os hippies. Engajavam-se na arte e no teatro. Acreditavam em uma sociedade melhor e por essa sociedade foram à luta.  

Hoje, o panorama está profundamente mudado. Ao invés de idéias em contraposição, uma força quase que invencível pregando o pensamento único. Ao invés da construção da história, o fim da história. Ao invés de alternativas políticas, universalização da hegemonia. Ao invés de concepções diversificadas, globalização monolítica sustentada ou imposta pelo poder financeiro. Ao invés de debates ao redor de uma ética de procura de padrões de vida com justiça, a ética da conveniência, do momento, da oportunidade, do mercado e do dinheiro.  

A velocidade da locomoção, o incessante bombardeamento de mensagens, reforçado pela rápida alternância de imagens, o progresso da ciência e da tecnologia, o aumento da produtividade e a convocação para o consumo, tudo dá velocidade à vida, produzindo a sensação de que a realidade se reduz ao presente, onde tudo é provisório.  

Nesse contexto, a juventude, extremamente sensível à temporalidade, entrega-se ao pragmatismo imediato, à procura do útil em cada momento, inclusive com a construção de universos éticos lábeis e inconsistentes. Como resultado, forma-se uma personalidade priva de convicções sólidas, de certezas assimiladas pela vida, sensível ao apelo para a solidariedade e a ecologia, mas incapaz de opções e compromissos seguros.  

Na análise de Antônio Jiménez Ortiz, a hodierna situação cria um jovem de fraca consistência psicológica, portanto, em circunstância de extrema exposição. A procura da satisfação imediata condiciona a solidez do compromisso, portanto, o esforço duradouro não tem sentido. Por isso que a noite, para a atual geração de jovens, se revestiu de grande simbologia: "é o tempo "sem tempo", sem relógio e sem horário, o espaço da liberdade sem disciplina, sem exigências externas, o lugar da ambigüidade e da sedução, das emoções e da fragilidade, do prazer e da vulnerabilidade".  

Chamou-me a atenção pronunciamento do Nobre Senador Mauro Miranda, feito há poucos dias, em que reivindicou maior participação dos jovens na política nacional. Recuperando afirmações feitas em discurso comemorativo do Dia Internacional da Juventude do ano passado, o ilustre parlamentar lamentou "o envelhecimento precoce" da juventude, que vem adotando idéias e comportamentos conservadores e substituindo o anseio de mudanças que caracterizava os jovens dos anos 60 "por profundo estado de apatia".  

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, sobre a questão dos jovens em relação à política, trago dados de pesquisa realizada pela educadora Tânia Zagury, cujos resultados a autora apresentou e comentou no livro O Adolescente por Ele Mesmo, publicado em 1996 . Com a pesquisa, a educadora objetivou conhecer a motivação dos jovens nessa área e como eles se definem em referência ao assunto. A clientela consultada compreendeu jovens entre 14 e 18 anos de idade.  

De acordo com respostas obtidas, 68,9 por cento dos pesquisados acompanham o que acontece na política. Boa parte declarou interessar-se apenas pelo que acontece na política brasileira e outra parte pelo que acontece no mundo todo. Cinqüenta e dois vírgula oito por cento não souberam posicionar-se no contexto das tradicionais categorias de esquerda, centro-esquerda, direita e centro-direita. Cinqüenta e seis por cento confessaram-se neutros. E em face dos acontecimentos nacionais que culminaram no impeachment de um Presidente da República, - esquema PC, desvio de verbas públicas e o problema dos anões do Congresso, 29,3 por cento disseram ter recuperado a fé na justiça e no Brasil e 55,7 por cento afirmaram que o "Brasil não tem jeito".  

De acordo com as observações da pesquisadora, algumas conclusões podem ser tiradas.  

Em primeiro lugar, em boa percentagem, as respostas materializam uma realidade esperançosa: a maioria dos jovens interessa-se pela política e pelos problemas do País, e do mundo, embora não com a mesma intensidade do passado. Subsiste um horizonte aberto: os jovens se interessarão mais se lhes forem proporcionadas mais opções e possibilidades confiáveis.  

A temática relacionada aos conceitos de esquerda e direita perdeu grande parte de seu significado para um grande número de pessoas. Isso certamente é resultado das mudanças políticas internacionais, bem como da recorrente tentativa de unidirecionalidade de concepção do mundo na visão do denominado neoliberalismo, com o seu vigoroso chamamento para o bem-estar individual.  

Impressiona o percentual de jovens que se proclamam neutros, portanto, espectadores passivos. Para esses jovens, não existem perspectivas ou possibilidade de intervenção para transformar. Nem têm eles consciência da falácia subjacente à questão da neutralidade.  

As causas para semelhante atitude podem ser localizadas nas já mencionadas mudanças pelas quais passou o mundo político em nível internacional. Além disso, no descrédito em que caíram os políticos "envolvidos em esquemas de corrupção e conchavos degradantes do ponto de vista ético...". Acrescente-se a tudo isso a postura personalista e individualista hoje assumida, com a conseqüente visão de mundo em que a satisfação do eu, do indivíduo, a satisfação do ego se sobrepõe ao social, ao comunitário, ao conjunto, à humanidade, enfim.  

Por último, é constrangedora a posição revelada pelos 55,7 por cento que confessaram "total descrença na possibilidade de as coisas melhorarem" no Brasil. Sem dúvida, esconde-se nessa afirmação um pouco da irreverência que caracteriza os jovens, mas é reflexo também de um certo grau de desalento e desencanto diante de uma realidade nacional e internacional de estreitos horizontes quanto a espaços para o trabalho e para ação no campo político, social e econômico.  

O racionalismo e o tecnicismo, com o conseqüente desenvolvimento tecnológico, desvendaram a possibilidade concreta que o ser humano tem de inventar instrumentos e conceber novidades para proporcionar mais bem-estar à vida humana, Fracassaram, no entanto, em relação à capacidade de um atendimento mais abrangente. Implantaram estruturas voltadas para uma concentração hermética, fechando o caminho para a participação de nações e de pessoas, excluindo, dominando e exacerbando contrastes.  

Esse panorama todo, aponta para um desafio: o da necessidade de compreender a importância do envolvimento dessa parte da população na vida política. Não reivindico sua participação no sentido partidário. É manifesta a ausência dos jovens dos partidos políticos, pois nem todos têm a natural disposição para esse tipo de engajamento. Reivindico, sim, a participação na luta política, com o objetivo de formar bons cidadãos, capazes de bem conduzir a própria casa e de gerir, com eficácia, os negócios da coletividade, fazendo da política uma academia de ciências políticas, um campo de embate de idéias, de manejo da dialética, visando ao bem maior, ao bem da coletividade, um bem por si só complexo, exigente de controvérsias e de contraditórios, para ser o mais democrático e justo possível.  

A mocidade coletivamente não está hoje presente ao combate. Tenho dúvidas de que vícios políticos, visões menos acertadas na condução dos negócios do Estado possam ser corrigidas sem o ímpeto, sem o entusiasmo, sem a impertinência, sem as reivindicações materializadas no grito da juventude.  

Afastados da ação política, os jovens concorrem para o prolongamento dos vezos que se instalam na condução da coisa pública. Sem resistência ativa, os desvios condenáveis prolongam a permanência das práticas incompatíveis com o avanço das idéias transformadoras. Sem protesto, sem reivindicações, as mudanças não se fazem, não se consolidam, nem se ampliam. Os partidos não se corrigem. Os costumes viciados perpetuam-se. A responsabilidade política identifica-se com pragmatismo interesseiro e a ética reduz-se a preocupação acadêmica, na prática, a conceito volúvel, adaptável às mais diversas e contrastantes visões e comportamentos.  

Os jovens, por não estarem comprometidos com o passado, têm mais liberdade para a opção democrática inovadora, têm discernimento, capacidade de seleção e deliberam sem constrangimentos. São força de vanguarda. Sua opinião situa-se de preferência na esfera da renovação e da mudança, não da conservação. A juventude é energia de transformação, plaga de novas esperanças. Seu espírito de independência e de renovação projeta-a para decisões com liberdade, suprimindo procedimentos nefastos ou viciados.  

Sem dúvida nenhuma, a ausência de interesse juvenil pela política precisa ser vista e analisada em um âmbito mais amplo, no qual o jovem se insere. Resulta de um ambiente sócio-cultural, do qual a juventude é parte, e parte extremamente sensível. É na interação com o ambiente e com os seus semelhantes que o jovem, assim como toda pessoa, assume personalidade e a encaminha para a maturidade psicológica, emocional, intelectual, social e política.  

Infelizmente, esse contexto, no entanto, no Brasil e na América latina de nossos dias, não é dos mais alvissareiros para os jovens que almejam trabalhar e realizarem-se pessoalmente construindo uma vida digna. A pouca criatividade e o diluído espírito de luta em grande parcela das novas gerações dependem do espaço aberto que lhes proporciona uma sociedade fascinada pelo desenvolvimento tecnológico.

 

A participação política do jovem, não tenho dúvida, passa pela retomada da política como arena em que é discutida, com transparência e democracia, a pluralidade de interesses da Nação. É a política maior que provoca participação, a política que decorre da sociedade em movimento, onde todos estão presentes porque envolvidos na discussão e solução de problemas, visando à sintonia possível, sem exclusão da dialética que sempre repõe a discussão, numa rebeldia legítima voltada incansavelmente para o melhoramento.  

Neste ano, o País e a sua juventude terão oportunidade ímpar para uma retomada do exercício da política maior, quando serão realizadas as eleições municipais. No nível dos Municípios, descortina-se o espaço ideal para essa retomada, ao redor da problemática local, sentida e trabalhada diretamente pela população envolvida, no âmbito dos partidos ou das organizações. É o que almejo para a juventude do meu País.  

Muito obrigado.  

 

e y


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/02/2000 - Página 1539