Discurso durante a 20ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A OBRIGATORIEDADE DE REAPRESENTAÇÃO DOS DOCUMENTOS RELATIVOS A PROPRIEDADE DE TERRAS NA FAIXA DE FRONTEIRA.

Autor
Lúdio Coelho (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Lúdio Martins Coelho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A OBRIGATORIEDADE DE REAPRESENTAÇÃO DOS DOCUMENTOS RELATIVOS A PROPRIEDADE DE TERRAS NA FAIXA DE FRONTEIRA.
Aparteantes
Edison Lobão.
Publicação
Publicação no DSF de 05/02/2000 - Página 1807
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • COMENTARIO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), OBRIGATORIEDADE, PROPRIETARIO, TERRAS, APRESENTAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO, REGULARIDADE, PROPRIEDADE, MOTIVO, PROXIMIDADE, FRONTEIRA, PAIS.
  • CRITICA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), DESNECESSIDADE, DOCUMENTO, BUROCRACIA, PREJUIZO, PROPRIETARIO, COMENTARIO, EXISTENCIA, DOCUMENTAÇÃO, COMPROVAÇÃO, EXTENSÃO, PROPRIEDADE RURAL, POSTERIORIDADE, COMPRA E VENDA.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, GOVERNO FEDERAL, REDUÇÃO, CUSTO, PROPRIETARIO, PROPRIEDADE RURAL, OBJETIVO, INCENTIVO, AUMENTO, PRODUÇÃO AGRICOLA.

O SR. LÚDIO COELHO (PSDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho a esta tribuna para fazer algumas considerações sobre medidas adotadas pelo Governo do Presidente Fernando Henrique, meu companheiro de Partido, que vêm trazendo inquietação ao campo e nenhum benefício à Nação brasileira. Já tive oportunidade de tratar desse assunto com o Ministro Aloysio.  

Há pouco tempo, foi editada uma medida provisória determinando que os proprietários de terras situadas a 150 quilômetros da fronteira apresentassem uma série de documentos, a começar pelos referentes à origem dessas propriedades.  

Transmiti ao Ministro que a maioria de nossas fronteiras foi ocupada há mais de um século por brasileiros que asseguraram o domínio da Nação brasileira sobre essas terras. Disse também que essas terras passaram de mão em mão inúmeras vezes, por meio da sucessão, da morte dos pais, filhos, netos. Afirmei que, cada vez que essas propriedades mudavam de titularidade, era verificada a sua documentação e feita uma medição em sua área, o que não ocorre somente quando da sucessão – por meio da qual é feita a melhor reforma agrária brasileira –, mas também quando da venda. No Brasil, as propriedades rurais têm constantemente sido objeto de compra e venda.  

No entanto, essa medida continuou. O proprietário deve fazer despesas consideráveis para normalizar a documentação das propriedades numa área de 150 quilômetros da fronteira, atingindo uma enorme área da Nação brasileira.  

Agora, o Incra torna também inexistentes, para efeito de cadastro, todas as propriedades brasileiras. Uma medida interna, baixada pelo Sr. Ministro, determina que, só nas propriedades com área acima de 10 mil hectares, devem ser feitos esses levantamentos.  

As propriedades situadas nas regiões mais desertas do nosso País foram inicialmente ocupadas com a pecuária, porque não havia estradas de rodagem. Não há ferrovias, não há navegação de qualquer ordem, e o único produto que se transporta por conta própria é o boi, que segue a pé. Assim, as regiões mais desertas do País foram ocupadas inicialmente com a pecuária, pois o seu produto se locomovia de moto próprio. Não havia como o indivíduo ir para o sertão e enfrentar distâncias longínquas para trabalhar na agricultura, porque ele não tinha como escoar o seu produto.  

Há cerca de 40 ou 50 anos, foi aprovada uma lei segundo a qual os Estados brasileiros, para venderem propriedades com área superior a 10 mil hectares, com requerimento nas áreas de sertão, dependiam da aprovação do Senado Federal. Todas as vendas de propriedades brasileiras acima de 10 mil hectares foram submetidas à aprovação do Senado Federal. Agora, o Incra torna isso inexistente, determinando que seja feito um levantamento de toda a documentação de todas as propriedades, desde a sua origem, sob a alegação de irregularidades praticadas por cartórios e por pessoas.  

Ora cabia ao Incra verificar quais as propriedades irregulares e tomar essas medidas. Não cabe tornar isso inexistente, gerando trabalho e despesas enormes aos proprietários dessas terras.  

Estamos assistindo, principalmente nessa globalização, à fusão permanente de grandes empresas, de todas as áreas e atividades. O objetivo principal é reduzir custos. Agora, na agricultura e na pecuária, o indivíduo tem tratamento diferenciado no Brasil: na agricultura e na pecuária, não pode ser grande. Não entendo qual é o raciocínio, porque, para se reduzir custo em qualquer tipo de atividade, é preciso ter volume; na agricultura e na pecuária, todos os pronunciamentos e todas as medidas fazem restrição à grande propriedade.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a redução de custos para a grande propriedade é da mais alta importância. Quero alertar a Nação brasileira e o Presidente Fernando Henrique, em especial, a esse respeito. Há dois anos, eu disse a Sua Excelência, no Palácio do Planalto, que a política da agricultura com respeito ao milho iria retirar o agricultor do plantio, e o milho é importantíssimo para a criação de porcos e de aves, para a alimentação humana, principalmente, e para a alimentação de gado. Sua Excelência disse: "Não é possível". Então, eu lhe disse: "Quero dizer a V. Exª que, com a política do seu Governo, com esse preço do milho, o Brasil vai importar milho em larga escala. Ninguém pode plantá-lo para vender o saco a R$6,00".  

E o Brasil está assistindo ao que está acontecendo. Vamos importar milho, porque a próxima safra significativa de milho brasileira só vai ocorrer, se o El Niño não atrapalhar, em 2001, porque, neste ano, "ela já foi para o tacho". No Rio Grande do Sul, não chove; no Mato Grosso do Sul e em parte do Paraná, a safra de milho está sendo enormemente sacrificada. E vamos ter o reflexo disso. Estamos importando milho, que está chegando ao Brasil com o preço aproximado de R$14,00 o saco. Como os exportadores - os Estados Unidos, principalmente – vendem milho para o Brasil com um ano de prazo e a 6% ao ano, os importadores o importam, vendem-no e fazem capital de giro.  

Então, tenho a impressão de que ainda não chegou ao ponto certo a tomada de consciência da importância da agricultura brasileira para o nosso País.  

Nos Estados Unidos e na Europa, a agricultura é um dos setores mais importantes. Estive numa reunião em Bruxelas com representantes de todos os países do Mercosul. Presidi a Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul. Começamos a discutir, e os europeus estavam muito interessados em firmar convênio com o Brasil, para se contrapor ao desejo dos Estados Unidos de firmar o convênio da Alca. Durante a reunião, os europeus diziam que discutiriam todos os assuntos, menos a questão da agricultura. Em certo momento, eu disse: "Se vamos discutir tudo, menos a agricultura, temos muito pouco do que tratar, porque os países do Mercosul têm como principal atividade o setor primário. Se não vamos discutir essa questão, pouco temos a discutir".  

À noite, saí para jantar com um Senador de idade e lhe perguntei a respeito da proteção dada à agricultura na Europa. Ele me explicou que, logo após a última guerra, houve uma migração muito grande na Europa Ocidental, totalmente destroçada, da população do campo para a cidade. Ele disse que, assim, os governos resolveram desenvolver um programa de subsídio à agricultura, para que as pessoas ficassem no campo. Esse programa deu tão certo, que se fixou algo em torno de 12 milhões de habitantes das nações ocidentais no campo. Desenvolveram uma agricultura da mais alta qualidade e competência, de tal sorte que, atualmente, existe uma cultura de subsídio à agricultura na Europa, não interessando à população urbana a questão dos preços. Assim, eles manterão esse subsídio a qualquer custo.  

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) – V. Exª me permite um aparte?  

O SR. LÚDIO COELHO (PSDB - MS) – Ouço o aparte do nobre Senador Edison Lobão.  

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) – Senador Lúdio Coelho, V. Exª afirma que, nos Estados Unidos, há uma cultura de defesa à agricultura. Na verdade, essa cultura não se circunscreve àquele país. E V. Exª nos diz que também existe algo parecido na Europa. É uma realidade. Estamos negligenciando, paulatinamente, um setor de fundamental importância para o Brasil: a agricultura. Esse é o nosso caminho. Essa é a nossa avenida para o grande salto na economia. A soja, num passado recente, nada importava, mas, hoje, pesa fundamentalmente na balança comercial brasileira. Ou o Brasil se dá conta de que a agricultura e a pecuária são importantes para a sua economia e, inclusive, para a geração de empregos, ou vamos ficar patinando nessa economia com dificuldades, acertos e desacertos por muito tempo. Quero cumprimentar V. Exª por, mais uma vez, trazer esse tema ao debate no Congresso Nacional!  

O SR. LÚDIO COELHO (PSDB - MS) – Agradeço a V. Exª pelo aparte, nobre Senador Edison Lobão. Temos o dever de alertar o Poder Público para a importância da agricultura, como bem falou V. Exª.  

Na Europa, a população das cidades faz questão de aprovar um subsídio à agricultura, porque eles têm um produto da melhor qualidade. Não existe a hipótese - o agricultor brasileiro pode tirar o cavalo da chuva - de ser retirado o subsídio dos produtos primários na Europa ou nos Estados Unidos.  

Considero o agricultor brasileiro muito competente, pois, apesar de trabalhar, muitas vezes, em Estados localizados a mais de dois mil quilômetros dos portos por onde se onde escoa sua safra, como Mato Grosso, Amazonas e Tocantins; apesar de no Brasil não haver ferrovias e as rodovias-mestras, no geral, estarem sobrecarregadas e em condições precárias; apesar de praticarmos os maiores juros do mundo, a agricultura brasileira tem tido grande participação na balança de pagamentos da Nação brasileira.  

Não entendo essa reação contra o agricultor, contra o grande produtor. Trata-se, a meu ver, de uma demonstração de desconhecimento da realidade mundial. É um absurdo que os brasileiros residentes na fronteira tenham que fazer os documentos novamente. Eu disse ao Ministro Aloysio Nunes que o Governo está tomando medidas que incomodam o agricultor brasileiro e não trazem qualquer benefício à Nação. Não entendo por que estão fazendo isso.  

E agora tem a questão do Incra. Ora, o Incra que providencie a punição dos que têm propriedades irregulares e deixe de tomar medidas tais como considerar inexistente o cadastro das propriedades! O Ministro baixou uma portaria desfavorável a quem tem propriedades com mais de dez mil hectares. Ele que vá atrás delas ao invés de generalizar medidas, fazendo-as valer para todas as propriedades. O Ministro deveria fiscalizar se, nas construções de edifícios nos centros urbanos, os impostos foram recolhidos adequadamente. Ou será que é só o homem do campo que é suspeito de irregularidade?  

O Presidente Fernando Henrique Cardoso está desestatizando o País e estatizando o campo. Quero alertar a Nação para isso. A reforma agrária que está sendo feita não tem prazo para dar um fim ao subsídio ao assentado. Sem tempo determinado, a Nação continua fornecendo cesta básica e concedendo empréstimos que não serão pagos. E, como não há rentabilidade, o maior comprador de terras é o Incra.

 

Recentemente, o Presidente Fernando Henrique baixou uma medida, reduzindo, no dizer dele, os juros do FCO. Os juros foram fixados em 16% para os grandes proprietários, mas, dependendo da inflação, poderão subir ou baixar. Esses juros, sejam de 16% ou de 14%, são extremamente altos para o setor.  

A agricultura é importante demais. Estamos importando milho, a safra de soja não está boa, e essa situação vai refletir na economia. Segundo notícia que ouvi hoje pela televisão, o frango baixou de preço. Isso é muito bom, pois o preço do frango é um bom indicador; na realidade, foi uma alavanca do Plano Real. Os baixos preços dos produtos agrícolas, em geral, foram importantíssimos para o sucesso do Plano Real.  

Sr. Presidente, era o que tinha a dizer.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/02/2000 - Página 1807