Pronunciamento de Ronaldo Cunha Lima em 09/02/2000
Discurso durante a 23ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
PREOCUPAÇÃO COM NOTICIA VEICULADA PELA IMPRENSA SOBRE A PARALISAÇÃO DOS JUIZES FEDERAIS A PARTIR DO DIA 28 DESTE MES.
- Autor
- Ronaldo Cunha Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
- Nome completo: Ronaldo José da Cunha Lima
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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JUDICIARIO.:
- PREOCUPAÇÃO COM NOTICIA VEICULADA PELA IMPRENSA SOBRE A PARALISAÇÃO DOS JUIZES FEDERAIS A PARTIR DO DIA 28 DESTE MES.
- Publicação
- Publicação no DSF de 10/02/2000 - Página 2077
- Assunto
- Outros > JUDICIARIO.
- Indexação
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- ANUNCIO, IMPRENSA, GREVE, JUIZ FEDERAL, REIVINDICAÇÃO, REAJUSTE, SUBSIDIO, DEFESA, DIALOGO, PODERES CONSTITUCIONAIS.
- ANALISE, AUSENCIA, REAJUSTE, VENCIMENTOS, MAIORIA, SERVIDOR, UNIÃO FEDERAL, DEFASAGEM, SALARIO, INFLAÇÃO, REGISTRO, MANIFESTAÇÃO, PRESIDENTE, SENADO, NECESSIDADE, ESTUDO, SOLUÇÃO, PROBLEMA.
- ANALISE, SITUAÇÃO, MAGISTRADO, EXCESSO, CONCENTRAÇÃO, PROCESSO, INFERIORIDADE, REMUNERAÇÃO.
O SR. RONALDO CUNHA LIMA
(PMDB – PB) – Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, a imprensa noticia que os juízes das circunscrições federais mobilizam-se para promoverem a paralisação de suas atividades a partir do próximo da 28 deste mês. Tal paralisação é motivada, entre outros fatores, pela falta de reajuste dos subsídios que seria uma decorrência natural da lei, de iniciativa dos representantes dos três Poderes, que deverá fixar os valor do subsídio do ministro do STF, que também considerado constitucionalmente o limite máximo para percepção remuneratória de todos os servidores públicos.
É muito preocupante notadamente porque os juízes, antes de serem servidores públicos, são membros de um Poder, justamente do Poder ao qual é reservada a tarefa de zelar pelo cumprimento das normas, fiscalizando a sua execução. Mais ainda, preocupa a circunstância de ser um segmento importante de jurisdição especial.
A política governamental, na esfera da administração pública, tomou, nos últimos tempos, novos parâmetros e definições constitucionais: mitigou-se a visão tradicional do vínculo com a possibilidade de demissão de servidores; criaram-se mecanismos de controle de excessos remuneratórios; instituiu-se parâmetros para dispêndios globais com pessoal.
Na esfera previdenciária, foram alargados os períodos para aposentadoria, e estabelecidos limites máximos de proventos.
Tudo isso foi feito, passando pelo exame do Congresso Nacional, nos últimos seis anos. Mas, mesmo assim, os servidores públicos federais continuam sem merecer, de forma generalizada, um reajuste de vencimentos. É certo que algumas categorias tiveram reajustes que, de qualquer forma, representa aumento de despesa, embora, a grande maioria, ainda se ressinta da defasagem dos seus vencimentos em razão da pressão inflacionária ocorrida durante esse período.
Esse assunto já foi objeto do exame e de manifestação pública do Presidente desta Casa, o Senador Antônio Carlos Magalhães, para quem torna-se necessário empreender estudos que venham a indicar soluções que revejam os valores dos vencimentos e subsídios dos agentes públicos federais. É uma forma de incentivar o melhor desempenho da "máquina administrativa."
Com os magistrados não é diferente. Como a maioria dos servidores, nossos juízes não receberam nenhum reajuste nesse longo período de seis anos. A expectativa que foi criada com a possibilidade da chamada "lei do teto", que, em razão da vinculação entre as carreiras da magistraturas, provocaria um aumento em seus subsídios, não logrou o êxito esperado.
Para permitir um melhor estudo, e deixando aos Estados membros a possibilidade de examinar suas próprias condições, o Presidente da República encaminhou ao Congresso Nacional Proposta de Emenda à Constituição, permitindo que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios possam fixar outros valores como limite de percepção remuneratória de seus respectivos agentes públicos, incluídos todos os poderes. Essa proposta tramita na Câmara dos Deputados e o projeto de lei sobre o limite ainda não foi encaminhado.
Resulta de tudo que os magistrados federais indicaram uma paralisação de suas atividades. Esse indicativo reclama uma reflexão do Congresso Nacional por muitas razões.
De início, pela atipicidade que reveste uma "greve" de magistrados. Como podemos, em um mundo globalizado, explicar à comunidade internacional um fato tão incomum? Torna-se, assim, necessário que se convoquem os poderes constituídos para que se reestabeleça um canal de diálogo que leve à uma definição, até pelo tempo que ainda nos resta.
Salientando que não compreende paralisação da atividade judicante em razão de greve, o Presidente do STF, Ministro Carlos Velloso tem relevado as preocupações com os níveis dos subsídios da magistratura, seja pela capacidade de nossos magistrados – na maioria composto de jovens vocacionados – seja pela responsabilidade que lhes atribuem a Constituição e as leis.
Este é outro ponto preocupante. O amplo leque da competência gera uma demanda excessiva pela prestação jurisdicional, circunstância que, aliada ao pequeno número de juízes e os desvios da legislação processual, sobrecarrega os serviços, muitas vezes deixando em um único juiz um elevado número de feitos.
Como então exigir que alguém, mesmo que revestido de uma condição tão singular como a de julgador, possa desvincular-se de sua humanidade e abstrair-se de preocupações domésticas e, muitas vezes, de sobrevivência, para melhor e corretamente desempenhar suas funções ? Não é incomum que os mais jovens na carreira tenham sob sua administração servidores que percebem vencimentos muitas vezes maiores que os seus subsídios.
Como assegurar a carreira de um magistrado que pode ver que, em razão de uma sentença por ele proferida, um jovem advogado ganhe merecidos honorários que ele não ganhará em anos de trabalho ? À conta de fatos dessa natureza é que há uma evasão dos quadros da magistratura, chegando mesmo aos tribunais.
Tomo como exemplo o caso das duas Varas Federais de Campina Grande na Circunscrição Judiciária da Paraíba, que pode muito bem servir de base para essa reflexão que convidamos.
Em Campina Grande tramitavam em duas Varas, até dezembro de 1999, 33.546 processos, sendo que somente naquele mês foram distribuídos 1.347 feitos. Isso tudo para julgamento de apenas dois juízes. Nesse mesmo mês, em toda a Paraíba – com seis Varas ao todo – foram julgados 940 processos.
Em que pese o alarme que os números revelam, mais alarmante é saber que a clientela preferencial da justiça federal nos Estados da 5ª Região (SE, AL, PE, PB, RN e CE) é constituída de pessoas que buscam alcançar ou discutir benefícios previdenciários. Exatamente a mola mestra das economias das pequenas comunidades.
O que deve chamar mais a atenção dos membros do Congresso Nacional, do Poder Executivo, do Poder Judiciário, do empresariado brasileiro e de toda a nação é que essa paralisação implica em estrangular os meios que têm todos esses segmentos para elidir seus problemas. A União não pode ficar sem a possibilidade imediata e oportuna para a cobrança e a execução de seus créditos tributários. O empresariado se ressente de cobranças de créditos, muitas vezes irregulares, diante da balbúrdia que é o sistema tributário brasileiro. Os poderes constituídos e a população, pelo questionamento da instituição republicana que assegura a manutenção do Estado Democrático de Direito.
O momento convida à reflexão e a reflexão indica o caminho do diálogo. A par de não concebermos uma greve de juízes não podemos olvidar uma oportunidade de entendimento, como preconiza a Constituição Federal para o relacionamento entre os Poderes.
Creio no espírito contemporizador do Congresso Nacional, do Presidente da República e dos membros do Poder Judiciário, sob o argumento do cancioneiro Geraldo Vandré: "quem sabe faz a hora não espera acontecer."
Muito obrigado.
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