Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

INVIABILIDADE DA RENEGOCIAÇÃO DAS DIVIDAS DE 52% DAS EMPRESAS NACIONAIS POR MEIO DO PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL - REFIS JUNTO AO INSS E A RECEITA FEDERAL, EM VIRTUDE DA EXIGENCIA DE GARANTIAS REAIS DAS INSTITUIÇÕES CREDORAS AS EMPRESAS DEVEDORAS.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • INVIABILIDADE DA RENEGOCIAÇÃO DAS DIVIDAS DE 52% DAS EMPRESAS NACIONAIS POR MEIO DO PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL - REFIS JUNTO AO INSS E A RECEITA FEDERAL, EM VIRTUDE DA EXIGENCIA DE GARANTIAS REAIS DAS INSTITUIÇÕES CREDORAS AS EMPRESAS DEVEDORAS.
Aparteantes
Arlindo Porto, Lúcio Alcântara, Romero Jucá, Sérgio Machado.
Publicação
Publicação no DSF de 23/02/2000 - Página 3327
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • INJUSTIÇA, SUPERIORIDADE, JUROS, MULTA, DIVIDA, CREDOR, GOVERNO FEDERAL, APREENSÃO, SITUAÇÃO, EMPRESA, DEBITO FISCAL, DEBITO PREVIDENCIARIO.
  • NECESSIDADE, APERFEIÇOAMENTO, PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL (REFIS), CRITICA, EXIGENCIA, GARANTIA, IMPEDIMENTO, ADESÃO, EMPRESA.
  • DEFESA, MANUTENÇÃO, EMPREGO, EMPRESA, FLEXIBILIDADE, NEGOCIAÇÃO, DIVIDA.
  • REGISTRO, SITUAÇÃO, AGRICULTURA, RISCOS, PRODUÇÃO, PROVOCAÇÃO, INADIMPLENCIA, PRODUTOR RURAL.
  • ELOGIO, NEGOCIAÇÃO, GOVERNO, CONGRESSO NACIONAL, MELHORIA, PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL (REFIS), EXPECTATIVA, SOLUÇÃO, DEFICIT, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), RECEITA FEDERAL, PROVOCAÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO, PAIS.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, outro dia ocupei a tribuna da Casa para falar sobre o Refis, um plano quase genial.

Não é tão original, uma vez que outros países já o fizeram. Mas o plano permitiria que pelos menos 52% das empresas brasileiras hoje com dívidas homéricas junto ao Imposto de Renda e ao INSS pudessem continuar sua vida empresarial. Naquela ocasião, havia uma reunião do Palácio do Planalto e só pude ocupar a tribuna por cinco minutos. Mal tangenciei o assunto.

O Governo - é interessante - é o único ente neste País e talvez no mundo que pode fazer empenhos, mandar alguém construir uma obra, quando a obra já está quase terminada, dizer que o empenho não vale mais e cancelá-lo, deixando de pagar àquele que investiu, que empregou ali seu dinheiro. O Governo Federal pode fazer isso. Mas quando se trata de pagar às demais pessoas, o Governo Federal, pura e simplesmente, não se preocupa em fazer nenhuma correção, a não ser que a Justiça o faça.

De outro lado, Sr. Presidente, quando o Governo Federal cobra de qualquer pessoa, ele o faz com todos os juros devidos, além das multas. Não sou contrário às multas, porque têm efeito pedagógico. Se não fosse assim, ninguém pagaria. Mas, com toda certeza, os juros exorbitantes cobrados são para que nenhum cidadão cumpra seu dever. O montante de dívidas a receber é gigantesco.

O Senador Artur da Távola ri com toda certeza da situação que estamos vivendo no plenário neste momento. Ninguém está prestando atenção a discursos, a não ser quatro Senadores, incluindo Bello Parga, porque os demais estão ainda em polvorosa com os acontecimentos que antecederam o meu discurso.

A verdade, Sr. Presidente, é que, se não fizermos esse plano para valer, não teremos a continuidade dessas empresas. E o que poderia ser pior do que uma empresa fechar, desempregar e parar de pagar impostos, não só os do momento, mas também as contas passadas?

Não sei por que o Governo quer viver esse faz-de-conta de receber um numerário que sabe que ninguém tem condição de pagar. Se um cidadão foi multado por dez milhões, mais a multa, essa quantia chega a vinte; mais a correção, exponenciando isso, num minuto, ele estará devendo cem milhões, quantia essa impagável. O que será melhor: tentar receber essa dívida impagável ou continuar recebendo mês a mês, uma parcela dessa quantia impagável?

Com toda certeza, Sr. Presidente, para os cofres públicos, manter os empregos e as empresas seria o melhor. E, por um momento, parecia que esse sol ia brilhar no cenário da economia brasileira. Por um momento, saiu a idéia do Refis, que seria o refinanciamento dessas dívidas, fazendo com que o cidadão se obrigasse a pagar o atual, o dia-a-dia, e pagasse 1,5% do seu faturamento em relação à dívida passada, sem se preocupar com a quantidade de prestações.

Havia um progresso muito grande. O Ministério da Previdência e Assistência Social lutava por isso, pois tem mais de 35 bilhões a receber; o Ministério da Fazenda também parecia muito interessado, pois tem a receber quase 60 bilhões. E, de repente, alguém chegou com a idéia de dar garantia à dívida impagável.

Faço uma pergunta até inocente: se a dívida é impagável, se o cidadão sequer pode tirar suas certidões a fim de continuar negociando, como pode dar bens? Se possuísse bens, não estaria nessa situação. É uma atitude inclusive estranha, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores. No momento em que deixar de cumprir o Refis, de pagar o diário ou mensal atual e 1,5% do faturamento, imediatamente voltará à situação anterior, o que significa nenhum certificado. Pior: significa que, em qualquer falência, em qualquer solução, qualquer paralisação, a Nação será a primeira a receber a conta do espólio do que ali restar. Assim, as garantias já existem.

No entanto, insistem na garantia e permanecem na esperança de que alguém possa aderir ao plano. A solicitação de garantia real, com toda certeza, não terá sucesso.

            Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, é preciso que o Governo tenha coragem de fazer um refinanciamento para valer; e não um faz-de-conta. Pois, com a garantia real pedida, estamos brincando: faz de conta que o Governo vai facilitar e faz de conta que alguém vai aderir.

Estive, como Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado da República, nestes últimos dias, com dezenas de empresários que querem continuar empregando e querem continuar sobrevivendo; querem continuar pagando o imposto, mas não têm condição de pagar o imposto passado, porque se trata de dívida irreal, exponenciada por um juro cruel, que prostrou praticamente a nossa economia. Quase fomos ao fundo do poço.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB - CE) - Senador Ney Suassuna, V. Exª me permite um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Ouço-o com muita satisfação, Senador Lúcio Alcântara.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB - CE) - Senador Ney Suassuna, estou ouvindo o pronunciamento de V. Exª e preocupo-me com o fato de que não se tenha até agora chegado a uma fórmula que permita a adesão das empresas a essa proposta, conhecida com o nome de Refis, porque há toda uma perspectiva de crescimento do País. Mesmo os economistas de oposição, os mais céticos, acreditam que a previsão de crescimento da economia para este ano é razoável, tem tudo para se concretizar. Acontece que, com as empresas nessa situação a que V. Exª aludiu, é muito difícil que a economia dê essa resposta, seja no tocante ao passivo fiscal, tributos, impostos que não foram recolhidos, que as dificuldades levaram a empresa a procrastinar o recolhimento desses tributos, seja no próprio endividamento financeiro das empresas. Ora, há tempos, eu conversava sobre isso com o Senador Jorge Bornhausen, e S. Exª mostrava esta preocupação: como acelerar a economia, tendo as empresas suas finanças deterioradas e com um passivo fiscal que as inabilita para a concessão de novos créditos e para que sejam vendidas ao Governo. Trata-se de uma situação muito difícil. Creio que é preciso haver bom-senso. Vamos examinar o que é justo e o que é razoável para que as empresas possam aderir ao Refis modificado e para que possam, novamente, tornar-se contribuintes regulares, pontuais, do fisco. Creio que o pronunciamento de V. Exª seguiu uma linha de tentar buscar a conciliação entre o interesse da empresa, do Fisco e o crescimento da economia, que significa a criação de empregos, a perspectiva de que o País reencontre o rumo do desenvolvimento.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, Senador Lúcio Alcântara. O que V. Exª acaba de falar, realmente, muito me preocupa. Será mais barato criar uma nova empresa ou continuar com as que já existem, com as que já geram empregos, com as que já têm tradição, que custaram o sangue e o suor de muitos empresários, de muitos brasileiros? Fico assustado quando vejo os números.

Os débitos com a Previdência somam R$58 bilhões. As dívidas tributárias reconhecidas para com a Receita chegam a cerca de R$100 bilhões. Segundo o Sebrae, apenas as micro e pequenas empresas têm débitos previdenciários e tributários de aproximadamente R$50 bilhões. Se recebermos um pouco dessas quantias a cada dia, a cada mês, já será muito importante. Mas é impossível querer receber o imposto mês a mês - o que significaria abrir uma nova empresa -, com garantias de pagamento de dívidas antigas.

O Sr. Sérgio Machado (PSDB - CE) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB -PB) - Concedo o aparte ao Senador Sérgio Machado.

O SR. Sérgio Machado (PSDB - CE) - Senador Ney Suassuna, V. Exª está abordando um tema extremamente importante. Esta é exatamente a ponte entre o passado e o futuro, é o que pode permitir que as empresas regularizem sua situação e que o Estado arrecade mais. Não sei se V. Exª tomou conhecimento, mas, nesta semana, a Comissão aprovou uma regulamentação explicando a questão da garantia exatamente na linha que V. Exª defende, ou seja, retirando a obrigatoriedade da garantia. Arrolam-se os bens da empresa - o que será suficiente para fazer a operação -, e não será preciso garantia suficiente para cobrir toda a operação. Dessa forma, a questão que V. Exª levanta, que era vital, fica resolvida de forma clara pela regulamentação. Assim, fica resolvido o problema da garantia, permitindo que o Estado arrecade mais, porque as empresas, inadimplentes como estão, não terão condições. As empresas que não são sonegadoras, mas que deixaram de pagar exatamente pela crise econômica, poderão regularizar a sua situação, pagando uma prestação fixa de acordo com o seu faturamento. Com isso, será atingido o objetivo dessa medida quase perfeita: assegurar a saída dessas empresas do Cadin, que proíbe a concessão de empréstimos a juros adequados e a venda para o serviço público, colocando-as na informalidade. Essa foi uma medida adequada e correta, e a portaria publicada nesta semana resolve a questão da garantia. Essa é a informação que gostaria de dar a V. Exª.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Senador Sérgio Machado, pareceu-me que a emenda foi pior que o soneto. Por quê? Se a empresa tem apenas um bem, dará a garantia de apenas um bem; se tiver 100, serão dados 100 bens em garantia. Serão dois pesos e duas medidas, o que vai permitir uma negociação que poderá levar bons funcionários a ter uma oportunidade de se locupletarem.

Fico preocupado com isso. Hoje estamos vivendo a guerra do INSS, que não queria garantia alguma. Ele já tinha a garantia legislativa de voltar à situação anterior. Enquanto isso, a Receita insiste para que haja garantia e alega efeito didático. Ninguém deixa de pagar imposto porque quer. Ninguém quer ficar na situação de não conseguir um certificado para vender um imóvel, para participar de uma concorrência ou outra coisa dessa ordem.

Muitos ramos tiveram modificações em um mundo que está mudando rapidamente. E foram esses ramos que tiveram essas dificuldades - e são muitos -que deixaram de pagar.

Com essa medida, vamos julgar a capacidade ou a honestidade do empresário pela mudança da economia. A medida seria perfeita se não tivesse a garantia. Tenho certeza de que esses R$158 bilhões já estariam aderidos ao Refis se não tivesse havido a insistência pedagógica da Receita Federal.

O Sr. Sérgio Machado (PSDB - CE) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Concedo o aparte ao Senador Sérgio Machado.

O Sr. Sérgio Machado (PSDB - CE) - Senador Ney Suassuna, a filosofia do arrolamento evita que a empresa que deve ao Fisco possa vender ou se desfazer dos seus bens. O arrolamento impede, então, a venda do bem. A empresa pode dá-los em garantia, pode fazer toda a transação comercial, mas não pode vendê-los. Essa medida acautela o Estado, permitindo que a empresa faça todas as operações e proibindo a venda da garantia, que vai servir ao Estado caso ela deixe de cumprir o acordo. A medida não impede transação alguma. Cada empresa dará o patrimônio que tem. Não haverá dois pesos e duas medidas. O critério será o mesmo. Trata-se de uma medida puramente acauteladora, que não atrapalha a operação comercial da empresa. Com isso, daremos garantia real. V. Exª aborda com muita propriedade a importância desse projeto. É um grande avanço que permitirá maior arrecadação. Pelo Refis, as empresas são obrigadas a quebrar seu sigilo bancário, tornando as operações completamente transparentes, garantindo a diminuição de qualquer processo de sonegação, o aumento da arrecadação, a regularização das empresas e maior faturamento. Assim, teremos o que todos desejamos: mais emprego, mais renda, mais desenvolvimento. Muito obrigado pelo aparte.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Manter os empregos, nessa hora, é importante para o Governo e para todo o País.

O Sr. Arlindo Porto (PTB - MG) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Concedo o aparte ao Senador Arlindo Porto.

O Sr. Arlindo Porto (PTB - MG) - Senador Ney Suassuna, eu gostaria, em meu aparte, de comentar sobre uma realidade que vivemos a partir de 1994, com a implantação do Programa de Reestruturação e Recuperação do País, especialmente com o Plano Real, período em que houve muitas mudanças radicais, promovidas algumas pelo Governo, outras pelo mercado. Ao longo desse tempo, sentimos um processo de gestão na busca da eficiência. No entanto, isso custou muito. Custou aos bancos, organizados como sempre foram, manuseando sempre muitos recursos, pois tinham acesso às informações privilegiadas nos mercados interno e externo. Esses bancos também passaram por momentos difíceis. Entendendo essa dificuldade, o Governo criou o Proer, motivo pelo qual muitos bancos foram recuperados e outros trouxeram grande prejuízo à sociedade brasileira, especialmente àqueles pequenos poupadores, que encontraram portas fechadas e que ficaram até hoje sem receber as suas aplicações. Como conseqüência, o mercado, o comércio, a indústria, a agropecuária, o processo produtivo brasileiro, assim como o cidadão brasileiro, viram-se na mesma condição, em momentos de transformações, de juros elevados e baixos, de alta e baixa cotação do dólar, de ajustes do mercado à realidade. As pequenas e médias empresas, principalmente, sofreram de maneira drástica. A concorrência internacional, pela abertura desenfreada do mercado e especialmente pela cotação irreal do dólar, facilitando a entrada de produtos estrangeiros, fez com que o empresário brasileiro perdesse a competitividade. Os pequenos e, sobretudo, os microempresários viram-se ao relento, sem nenhuma possibilidade de competitividade, em virtude dos grandes grupos nacionais ou estrangeiros que aqui estavam instalados ou que cresceram ainda mais. Essa é a realidade que estamos vivendo. O Governo, no final do ano passado, anunciou o Refis. Eu estava presente, como V. Exªs, no dia em que o Presidente Fernando Henrique anunciava à Nação o programa. Na ocasião, ficamos empolgados com o Brasil empreendedor, com uma alternativa para a retomada do crescimento do País, que todos certamente defendemos. Com a geração de renda e riqueza, com a economia aquecida, poderemos reduzir a pobreza, dando dignidade ao cidadão e permitindo que os seus esforços contribuam para o crescimento da nossa economia e do nosso País. Felizmente, a regulamentação saiu na sexta-feira, com um certo atraso, a despeito de todos os seus pontos positivos. Não se pode conceber que o pequeno empresário, estando em uma situação difícil de inadimplência, sofra uma pressão enorme por parte da Justiça, da Fazenda ou do Ministério da Previdência de buscar receber os seus créditos, que também são legítimos. No entanto, vejo que o Governo não está perdoando dívida; está sendo coerente com o momento de desequilíbrio da economia, buscando ajustar as multas àquilo que é real. Não é legítimo imaginar que, com uma inflação de 8% ao ano, haja uma multa mensal de 10%, que depois se sobrepõe a 20%, chegando a 30%, e que, em seguida, como favor, reduz-se em 50%.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - E há a taxa Selic.

O Sr. Arlindo Porto (PTB - MG) - Entendemos que o Governo teve o discernimento - temos de reconhecer - de buscar corrigir essas distorções. Levanta V. Exª uma questão pontual importante, porque isso pode inviabilizar a participação dessas empresas no mercado. E o que nós precisamos é aproveitar essa massa crítica, esses empresários que ao longo do tempo não se formaram nas faculdades, mas na escola da vida, dedicando-se, anos e anos, a atividades que foram aprendidas com seus pais, avós e tios. Essas pessoas não podem ser relegadas, excluídas. Por isso, louvo e cumprimento V. Exª. Precisamos, sim, impedir o abuso, o excesso; não podemos facilitar aos espertalhões que desvinculem seu patrimônio para comercializar e não paguem o débito. Entendemos que formas exeqüíveis precisam ser implantadas, para que o pequeno empresário não se sinta frustrado quanto àquela expectativa e àquele momento que todos nós haveremos de reconhecer que foi importante. Desculpe-me alongar neste aparte, mas o entendia importante. Cumprimento V. Exª pelo tema que está levantando para debate nesta Casa.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Não tem V. Exª que se desculpar. Em seu aparte, V. Exª abrilhantou o meu discurso, ventilando importantes aspectos da legislação.

Quanto à preocupação com os espertalhões, a lei anterior já anulava qualquer venda fraudulenta. Volto a lembrar aqueles que deixaram de pagar impostos, enquanto outros continuaram pagando. Vamos à pobre da Paraíba, por exemplo, com três anos de seca: quem era da área da agricultura faliu. Por incompetência? Deixou de pagar porque quis? Foram três anos de falta de água! Agora, graças a Deus, começa a chover. Infelizmente, nesta semana, na minha cidade, Campina Grande, morreram três pessoas afogadas em uma chuva torrencial.

E aqueles que plantavam algodão? De repente, o Governo resolveu importar, e o custo, com o financiamento, ficou mais baixo do que o conseguido pelos produtores no Brasil. Todos quebraram. E quem produzia coco? Permitiu-se a importação de coco, e mais de dois terços dos que produziram no País foram à falência. Ninguém vai à falência porque quer; ninguém deseja o insucesso. Muitas vezes, os burocratas, sentados na cadeira de seu escritório, tomam as decisões. Não é bem assim; a guerra aqui fora é outra. Os Srs. Senadores que são empresários, como eu e o Senador José de Alencar, sabem quanto é difícil assumir o risco e quanto nos expomos para vencer o dia-a-dia e poder gerar empregos.

Muito obrigado, Senador Arlindo Porto.

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Ouço V. Exª, Senador Romero Jucá.

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Senador Ney Suassuna, como sempre, V. Exª traz ao Plenário um tema de extrema repercussão para a sociedade. Sem dúvida, o Refis é hoje uma bóia de salvação para grande parte do pequeno e médio empresariado nacional, que, vivendo percalços por conta de várias dificuldades econômicas, ficou inadimplente. É bem verdade que a sua preocupação é pertinente. V. Exª fala - tenho certeza - em nome de muitos pequenos empresários, de pessoas que querem continuar a exercer sua atividade, a gerar empregos e, eventualmente, não têm como equacionar um passivo extremamente doloroso para as suas empresas. Bem disse V. Exª: ninguém se torna inadimplente e demite um trabalhador, com 10, 15 ou 20 anos de empresa, porque quer; na verdade, é levado a isso. Por outro lado, temos de ressaltar que o Governo foi buscar caminhos, e essa nova regulamentação flexibiliza as garantias. Dará garantia quem pode e de acordo com o que tem. Esse já foi um passo. Anteriormente, tinha-se de dar garantia total, o que, de certa forma, inviabilizava a retomada dos financiamentos do Refis. É bom lembrar que o Refis estipula como teto máximo o pagamento de 1,5% do faturamento, que é um valor pagável, se se conseguir cumprir as chicanas burocráticas até a sua contratação. O Governo deu um passo grande ao flexibilizar, mas é importante que a Receita Federal, o INSS, os setores de arrecadação busquem avançar nesse processo de flexibilização, talvez com novos mecanismos que permitam que os que ainda não buscaram o Refis o façam. Penso que este é o momento de gerar empregos, de unir as mãos dos brasileiros que querem trabalhar, atuar como empresários para buscar a melhoria da condição do nosso povo. Quero aplaudir o discurso de V. Exª e ressaltar o empenho do Governo, o seu avanço ao flexibilizar a regulamentação, mas quero deixar aqui um pleito para que se tente ousar mais, incluindo-se garantias, evitando-se a dilapidação do patrimônio das empresas e a adesão ao Refis de algum sabido, que poderá desbloquear seus bens, vender tudo e deixar os funcionários e a União a ver navios, como se diz na gíria, sem pagar as dívidas. Não é isso que desejamos. Penso que, com a inteligência da equipe técnica da Receita Federal, do Secretário Everardo Maciel, novos caminhos haverão de ser buscados; com criatividade, ainda se poderá agregar ao Refis uma parcela de empresários que infelizmente não pôde pleitear esse benefício que retoma uma parte da atividade econômica do País. Meus parabéns pela sensibilidade e pelo discurso de V. Exª.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, nobre Senador Romero Jucá. V. Exª está na linha do que estou defendendo. Não estou criticando. Estou aplaudindo o que foi feito, mas dizendo que precisamos de mais aperfeiçoamento.

A primeira versão não era deglutível; esta segunda já está bem melhor, mas penso que poderíamos ousar um pouco mais. Cerca de 52% das empresas brasileiras estão nessa situação. Mais importante do que criar empregos é preservar os que já existem.

Certamente, Senador Romero Jucá, o Secretário Everardo Maciel, com sua eficiência e capacidade, encontrará a solução devida, se tiver um pouco mais de boa vontade.

O Refis, na verdade, é comandado pela Receita Federal, sendo composto por três membros: dois do Ministério da Fazenda - da Receita Federal - e um do INSS. Se V. Exªs prestarem atenção, verificarão que, na realidade, o comando, o piloto, aquele que monitora o Refis é a própria Receita Federal, talvez porque tenha mais dívidas.

Agradecendo os apartes até aqui, volto ao discurso.

São valores fantasticamente altos que, se significativamente reduzidos, nos levarão a um patamar de déficit fiscal aceitável, manejável, com todas as vantagens disso decorrentes: juros básicos menores na economia, ampliação de oportunidades de ação do Governo Federal no âmbito social e do desenvolvimento e um perfil mais saneado e mais justo do sistema previdenciário. Uma Previdência de contas equilibradas deixará de ser obstáculo para a elevação do salário mínimo brasileiro. Estamos lutando para que o trabalhador tenha o maior salário possível. Certamente, se a Previdência estiver equilibrada, isso será possível.

Do ponto de vista das empresas, avalia-se que o Refis tem o potencial de permitir a três milhões delas regularizar sua situação com o Fisco, limpar o nome junto ao Cadin - Cadastro de Inadimplentes, apresentar-se limpamente junto ao sistema bancário e preparar-se para, sistematicamente, gerar impostos, riqueza e empregos.

O Cadin deve ser a tortura daqueles empresários que se viram obrigados a atuar em condições anormais da economia brasileira.

Na Paraíba, um empresário procurou-me e disse que vivia principalmente da prestação de serviços à área pública e que não estava sendo capaz, havia seis meses, de tirar seu nome do Cadin e nem do Sicafi. Ele havia perdido todas as concorrências ocorridas naquele período. Mês a mês, ele perdia os contratos que venciam, não sendo possível renová-los. Seu custo fixo passou a abarcar toda a parte positiva e ele estava ameaçado de falência. Se essa situação perdurasse por mais três meses, ele perderia todo o patrimônio da sua vida, seus funcionários ficariam sem seus empregos, principalmente aqueles que cuidavam da administração, não os que prestavam serviço público de limpeza. Certamente, com a sua idade, não teria mais condições de recomeçar outro trabalho, porque não poderia ganhar recursos suficientes para honrar todo o seu passivo, que se originou de um problema: a revogação da ordem de pagamento de um serviço que prestara. Esse fato tornou-o inadimplente, pois não conseguiu pagar sua dívida, uma vez que deveria primeiramente cumprir o pagamento dos salários. Então, estava indo à falência.

Essa é a situação de três milhões de empresas no Brasil, empresas que precisam estar bem para poderem continuar gerando trabalho, gerando riqueza. Ao invés de quebrar empresas com a cobrança inflexível, é mais inteligente permitir que retomem o fôlego e voltem a pagar impostos, na medida possibilitada por seu porte. Afinal, as empresas devedoras, quase sempre, chegaram à situação de inadimplência pressionadas por fatores que delas independem, tais como as altas taxas de juros, a globalização da economia, a elevada carga tributária e a falta de uma política industrial efetiva. Há outros fatores ainda, tais como os resultantes do clima - como é o caso que citei da Paraíba - ou até de uma política insensível do Governo, quando este permite que produtos estrangeiros subsidiados venham concorrer com os produtos nacionais.

            Já se vê que a economia como um todo pode se beneficiar com o Refis. Se o programa for bem-sucedido, ele poderá mesmo tornar-se um marco na história econômica recente do País. É possível que ocorra um relançamento da economia. Sabe-se que programas similares adotados pela Itália e pelo México deram excelentes frutos.

Uma característica notável do Refis é que ele foi intensamente negociado entre Governo e Congresso, a partir do seu lançamento pela primeira versão de sua medida provisória, negociação que permitiu importantes aperfeiçoamentos no programa. A configuração assumida pelo Refis, conforme a Medida Provisória n.º 2.004 e o Decreto que a regulamenta, o de n.º 3.342, de 25 de janeiro, está muito melhor do que o desenho inicial que o Governo havia feito. Quanto a isso, estão de parabéns Congresso e Governo. Ficou demonstrado que os Parlamentares, com suas antenas voltadas para a realidade e para o bom senso, podem muito contribuir e aperfeiçoar, mesmo no caso de uma idéia, desde o início, bem formulada.

Apontarei alguns desses tópicos que foram melhorados por via de negociação entre Congresso e Governo. Na medida provisória inicial do Governo, as empresas tinham de pagar 2% do seu faturamento mensal para abater a dívida. Conseguimos convencer o Governo a adotar um critério mais flexível: 0,3% para as empresas que recolhem pelo sistema chamado Simples; 0,6% para as que recolhem com base no lucro presumido; 1,2% para as que pagam com base no lucro real, nas atividades de comércio, indústria, transporte, construção civil, ensino e setor médico-hospitalar; e 1,5% nos demais casos.

Outro ponto: segundo a idéia inicial, as empresas tinham de optar obrigatoriamente pelo sistema de tributação pelo lucro presumido; agora poderão optar pelo sistema de lucro real. Outro tópico, ainda: inicialmente, não estava prevista a modalidade de prestação fixa; agora isso tornou-se uma opção. As empresas que tiverem interesse poderão quitar seus débitos em sessenta prestações de, no mínimo, R$300,00 para as pequenas, ou de, no mínimo, R$3.000,00 para as grandes.

Finalmente, a questão das garantias, que é, a meu ver, o ponto vulnerável a ser aperfeiçoado no Refis. A idéia inicial do Governo era exigir, de todas as empresas que quisessem aderir ao programa, a prestação de garantias, que podem ser os bens integrantes de seu patrimônio. A versão em vigor, agora, atenuou um pouco essa exigência, isentando dela as pequenas empresas e aquelas com débitos inferiores a R$500 mil .

Acho insuficiente esse avanço admitido pelo Governo. A apresentação de garantias, por parte das empresas, poderá tornar-se o calcanhar-de-aquiles do Refis. A empresa com dívidas junto à Receita Federal ou à Previdência Social, caso queira aderir ao programa, teria de arrolar todos os bens, até atingir a equivalência do valor da dívida. Ora, nem sempre os equipamentos de uma empresa serão suficientes para pagar o que ela deve. A avaliação do valor desses bens é outro ponto a superar. Essas dificuldades relacionadas com a prestação de garantias podem impedir a adesão de um grande número de empresas, a ponto de inviabilizar parte do Refis, e mesmo de conduzi-lo ao caminho da frustração.

Por isso, Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, na questão das garantias que a empresa deve prestar ao Refis, apresentei emenda que considero apta a desatar o perigoso nó que aí se forma e permitir que o programa deslanche com todo o seu potencial.

Não convém impor às empresas um ônus adicional que lhes inviabilize a adesão ao Refis. O programa já é muito rigoroso em matéria de exigência. A par de lhes facilitar a quitação dos débitos passados, o Refis exige das empresas o seguinte: uma completa e minuciosa manutenção em dia dos compromissos tributários e previdenciários; a confissão irrevogável e irretratável dos débitos acumulados; a autorização de acesso irrestrito da fiscalização às informações relativas à sua movimentação financeira; o acompanhamento fiscal específico e minucioso; o cumprimento regular das obrigações para com o Fundo de Garantia e o ITR. A empresa pode ser excluída do Refis se ficar inadimplente por três meses, consecutivos ou não, ou se for constatada a não inclusão de débitos na confissão inicial de dívida, salvo se pagos no prazo de trinta dias. A exclusão da empresa do Refis implicará exigibilidade imediata da totalidade do débito confessado e ainda não pago.

Essas e outras exigências constantes do programa, quase todas leoninas, já deveriam ser garantia suficiente para impor às empresas o cumprimento dos seus compromissos junto ao Refis.

A cláusula de apresentação de garantias reais, como condição de adesão, é desnecessária. Daí a emenda que apresentei.

Sanado esse ponto, Sr. Presidente, o Refis poderá decolar e realizar todo o seu potencial. Possibilitará grandes benefícios às empresas, permitirá o saneamento da Previdência, um substancial alívio no déficit fiscal e o robustecimento das contas da União. Fará um grande bem à economia, relançando-a, como demonstra a experiência de outros países. O Refis é uma esperança renovada de desenvolvimento econômico, de criação de emprego, de preservação dos empregos existentes e da melhoria dos nossos índices sociais.

Espero, Sr. Presidente, que o Governo possa aprimorar um pouco mais e, como disse o Senador Romero Jucá, ousar um pouco mais em benefício de todo o conjunto da economia brasileira. Muitos empresários podem ter praticado atos desonestos, mas, com certeza, a maioria esmagadora deles só está nessa situação devido a um descontrole da economia, principalmente aquele gerado pelos nossos juros excessivos. Espero que, agora, o Governo, conhecedor dessa situação, possa se retratar por meio de uma legislação mais amena que permita uma sobrevida, se Deus quiser, muito grande das nossas empresas.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/02/2000 - Página 3327