Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

NECESSIDADE DE CELERIDADE NO PROCESSO DE FUSÃO DE EMPRESAS, COM A MODIFICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO EM VIGOR, EXEMPLIFICANDO O CASO DA AMBEV.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA POPULAR.:
  • NECESSIDADE DE CELERIDADE NO PROCESSO DE FUSÃO DE EMPRESAS, COM A MODIFICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO EM VIGOR, EXEMPLIFICANDO O CASO DA AMBEV.
Aparteantes
Geraldo Melo.
Publicação
Publicação no DSF de 29/02/2000 - Página 3677
Assunto
Outros > ECONOMIA POPULAR.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, OBJETIVO, MELHORIA, NEGOCIAÇÃO, FACILITAÇÃO, PROCESSO, FUSÃO, EMPRESA NACIONAL, GARANTIA, LIVRE CONCORRENCIA.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONOMICA (CADE), DEFESA, INTERESSE, SOCIEDADE, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, EXAME, PROCESSO, FUSÃO, EMPRESA DE BEBIDAS, OBJETIVO, PREVENÇÃO, POSSIBILIDADE, PREJUIZO, POPULAÇÃO.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, estamos assistindo, há algum tempo, a esse debate que se trava em todo o País, inclusive pela imprensa, sobre a fusão das empresas cervejeiras: Antarctica, Skol e Brahma. É importante aproveitar este momento para salientar alguns fatos que julgo merecerem nossa atenção.  

Em primeiro lugar, embora nossa legislação seja relativamente recente, parece-me que precisa de modificação urgente. Há sete meses, as duas empresas – Antarctica e Brahma – anunciaram ao País que fariam essa fusão. De lá para cá, temos assistido à tramitação do processo, primeiro, na Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda e, depois, na Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Agora o processo está sob exame do Cade.  

Na verdade, se essa fusão causa alguns efeitos deletérios sobre a economia ou sobre os interesses do consumidor, esses efeitos já estão se fazendo sentir, porque na prática ela ocorreu, quer dizer, a fusão deu-se de fato. Talvez ocorra, se o Cade não aprovar, a separação.  

Portanto, é preciso mudar a legislação até para acompanhar outros países, como os Estados Unidos, a Alemanha, o México e outros, onde isso tudo está reunido em uma única agência. O parecer deve ser prévio. Não se deve fazer a fusão para, depois, mandar para o Cade. Deve-se passar por todos esses outros órgãos do Ministério da Fazenda e do Ministério da Justiça antes de chegar ao Cade. Há, inclusive, um custo operacional e tudo o mais. Isso poderia ser evitado, caso a fusão fosse precedida pela autorização do órgão responsável.  

Em um editorial de 29 de janeiro de 2000, sábado, a Folha de S.Paulo , sob o título "Defender a Concorrência", se refere ao economista Rughvir Khemani, do Banco Mundial, o qual diz que "uma fusão é como fazer uma omelete: depois que está pronta, não é mais possível separar os ovos". A fusão, na prática, já se deu. Os possíveis efeitos negativos – não sei se existem – já incidiram sobre os distribuidores, os consumidores e a cadeia produtiva que atua no ramo da cerveja. Por outro lado, estamos assistindo a um duelo de gigantes. Há contra-informações, notícias em jornais e na televisão. Há muita publicidade. Disputam, agora, o Troféu do Nacionalismo, para saber quem é nacionalista, quem representa o verdadeiro interesse do País, se é que ele se identifica com alguma cervejaria. Pelo menos pelo que li na imprensa, o próprio Cade consultou o Ministro do Desenvolvimento, que estaria patrocinando um entendimento, um acordo, entre as empresas envolvidas nessa questão. E o Cade está sob suspeição.  

Tenho, sinceramente, a melhor impressão sobre o único dos membros do Cade que conheço, o seu Presidente, Dr. Gesner José de Oliveira Filho até porque S. Sª tem sido pontual nas informações que presta ao Senado, à Comissão de Assuntos Econômicos, mediante seus relatórios, expondo as suas dificuldades, bem como o trabalho que o Cade está desenvolvendo.  

De repente há um fogo cruzado de informações sobre possível abordagem de conselheiros que estariam dispostos a tomar determinada posição nesse caso, o que desqualifica o trabalho do Cade, colocando-o sob suspeita. Ora, se há um inquérito na Polícia Federal, ele deve ser concluído o mais rápido possível, para que se possa saber se há realmente algum culpado. Aparentemente, muitas notícias que estão sendo veiculadas pela imprensa não correspondem à verdade. Por exemplo, a de que uma conselheira teria ouvido de um advogado que dois outros advogados estariam informando que membros do Cade já teriam compromisso com essa ou aquela solução no processo sob exame. Essas informações terminaram levando à instauração desse inquérito, que deve ser concluído o mais rápido possível.  

Se queremos realmente a redução do tamanho do Estado e a sua maior eficácia, isto é, um Estado ágil, rápido, que defenda os interesses da sociedade e do consumidor, um dos órgãos que deve merecer a atenção do Governo é o Cade, porque é aí que ocorrem os grandes embates que se tornarão cada vez mais freqüentes na medida em que o processo de fusão de grandes empresas leva sempre ao risco do monopólio ou do oligopólio. Assim, há necessidade de que o Estado possa assegurar os direitos do consumidor.  

Portanto, não quero tomar partido nessa questão por entender que, para quem está acompanhando de longe, ela não está clara. Os interesses são muito grandes – alguns estão dissimulados e outros são ostensivos, mas todos não podem ser bem identificados, uma vez que não se está acompanhando atentamente e conhecendo o processo. De forma que não quero antecipar uma opinião a respeito do assunto, mas deixo bem clara a necessidade de se reformular rapidamente a legislação sob pena de tornarmos inócuo o Cade e os órgãos envolvidos nessas questões.  

Houve uma fusão anunciada e que, na prática, está ocorrendo entre duas grandes empresas cervejeiras há sete meses e, até agora, o processo sob exame não foi concluído. Segundo, a necessidade de que os fatos sejam esclarecidos para que se possa conhecer realmente se houve algo que afetasse ou que possa afetar a credibilidade do Cade e de seus integrantes, que julgarão o processo. Que o inquérito instaurado seja concluído o mais rápido possível. Houve até quem sugerisse a suspensão dos trabalhos do Cade uma vez que o inquérito tinha sido instaurado. Seria absurdo! Se já estamos achando excessivo o tempo entre o anúncio da fusão e a decisão do Cade, imaginem se propusermos a paralisação dos trabalhos! Precisamos de um esclarecimento definitivo para que não paire nenhuma dúvida sobre o Cade, que decidirá a respeito de uma questão que envolve grandes interesses.  

Era essa a razão da minha intervenção nesta tarde. Confio em que o Presidente do Cade conduzirá todas essas questões com espírito público, com o objetivo de fazer com que este delibere de maneira soberana. As pressões, muitas vezes, são manipulações que visam a atingir determinados objetivos que não podem nos impressionar. De outro lado, não pode ficar a menor dúvida sobre a clareza da decisão tomada. Para isso, esperamos que o inquérito da Polícia Federal seja concluído o mais rápido possível, para que os conselheiros deliberem com independência, liberdade e, em face do exame do processo, ofereçam a melhor decisão para a sociedade brasileira.  

O Sr. Geraldo Melo (PSDB – RN) – Permite-me V. Exª. um aparte, nobre Senador Lúcio Alcântara?  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB – CE) – Ouço V. Exª. com grande interesse, nobre Senador Geraldo Melo.  

O Sr. Geraldo Melo (PSDB – RN) – Senador Lúcio Alcântara, gostaria apenas de registrar a seriedade das preocupações de V. Exª. e minha incerteza quando se trata de discutir, neste caso, com quem está o interesse nacional. Na realidade - já disse e repito - a questão, que dura mais do que o País esperaria, da conclusão do debate em torno da fusão, me leva a pensar que em certos momentos raciocinamos e defendemos determinadas posições, inclusive certas transigências do Brasil na sua relação com o resto do mundo, em nome de uma realidade criada em virtude da globalização da economia. Em outros momentos, acreditamos que a criação de uma instituição econômica de grande porte representa uma ameaça às de menor porte. Ou agimos em função de uma coisa ou de outra. Se o processo de globalização é irreversível como parece, a competição, inclusive dos de menor porte, dar-se-á com os gigantes dos diversos setores industriais do mundo. Talvez devêssemos refletir onde está mesmo o interesse nacional quando vemos criar algum tipo de entidade privada em condições de resistir e de enfrentar esse tipo de competição. Talvez estejamos criando barreiras ao surgimento de uma grande empresa nacional para deixá-las, com a configuração que tinham antes da fusão, e todas as demais que têm medo da fusão, à mercê das poderosas concorrentes do mercado mundial. De maneira que penso que V. Exª. está levantando um problema que interessa ao País e que requer uma reflexão menos apaixonada.  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB – CE) – Muito obrigado, Senador Geraldo Melo. Quando esse tema veio a debate no plenário do Senado em outra oportunidade, quando, salvo engano, falava o Senador Eduardo Suplicy, inclusive trazendo informações que ele colheu junto ao próprio advogado, o ex-Deputado, meu colega e amigo Aírton Soares, V. Exª. disse que de fato não havia nada que configurasse comprometimento de conselheiros do Cade em relação a essa matéria. Mas V. Exª. faz uma análise mais abrangente, mostrando a relação com o mercado mundial e que posição adotarmos diante dessa questão. Pelo que li, parece que o Ministério do Desenvolvimento tem um condão de, em determinados casos, afirmando o interesse nacional, eliminar a questão do monopólio ou do oligopólio. Vamos dizer assim: se o Ministério do Desenvolvimento disser que essa fusão é do interesse nacional, mesmo que seja tipificado o oligopólio, ela poderá acontecer e o Cade terá que concordar com ela. Enfim, há algo aí que precisamos conhecer, lidar e nos aparelharmos melhor para enfrentar essa questão.  

Esse processo, essa seqüência de tramitação envolvendo a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, a Secretaria do Desenvolvimento Econômico e o Cade é um nunca acabar. Para mim, essa fusão já se deu, na prática. O que pode acontecer é a desfusão, se o Cade entender que ela não deve se efetivar. Daí por que acho que ela ou é prévia ou é célere, porquanto o mundo dos negócios é cada vez mais de decisões rápidas, ágeis, imediatas, em que há necessidade de que se adotem certas posições com muita pressa para que os acionistas, os responsáveis e detentores do controle dessas empresas não sejam prejudicados.  

Sr. Presidente, aqui fica meu apelo. Talvez essa fosse uma matéria que merecesse nosso cuidado, essa revisão da legislação para garantir a defesa da concorrência. O Estado brasileiro, cada vez mais, vai deixar de ser um Estado empresário, envolvido diretamente na atividade econômica. Então, ele vai ter que se cuidar e se aparelhar para essas coisas. Uma delas, sem dúvida importante, é essa questão da defesa da livre concorrência, que é também a defesa do interesse do consumidor.

 

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/02/2000 - Página 3677