Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REIVINDICAÇÃO DE VERBAS E AÇÕES DO GOVERNO PARA O COMBATE DA FEBRE AMARELA NO PAIS.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • REIVINDICAÇÃO DE VERBAS E AÇÕES DO GOVERNO PARA O COMBATE DA FEBRE AMARELA NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 01/03/2000 - Página 3835
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • REGISTRO, APREENSÃO, POPULAÇÃO, PAIS, AMEAÇA, EPIDEMIA, FEBRE AMARELA, MOTIVO, AUMENTO, NUMERO, VITIMA, DOENÇA.
  • ANALISE, NUMERO, VITIMA, FEBRE AMARELA, PAIS, COMENTARIO, NECESSIDADE, AUMENTO, EMPENHO, GOVERNO FEDERAL, MINISTERIO DA SAUDE (MS), COMBATE, DOENÇA GRAVE, IMPORTANCIA, MELHORIA, INVESTIMENTO, VIGILANCIA EPIDEMIOLOGICA, REGIÃO NORTE, REGIÃO CENTRO OESTE, AMPLIAÇÃO, VACINAÇÃO.
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, REITERAÇÃO, SOLICITAÇÃO, JOSE SERRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), ESCLARECIMENTOS, SITUAÇÃO, FEBRE AMARELA, PAIS, AUMENTO, ATENÇÃO, MELHORIA, COMBATE, DOENÇA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL – RR) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, desde os primeiros dias deste ano 2000, a população brasileira passou a ver estampadas, nos principais jornais do País, manchetes sobre ocorrências de casos de febre amarela, em áreas de ocorrência pouco freqüente.  

A partir de então, essa grave doença tropical infecciosa voltou a assombrar os habitantes das cidades e tem levado milhares de pessoas aos postos de vacinação.  

Percebe-se, agora, um temor latente de que possa estar em marcha, no Brasil, uma reintrodução, uma reemergência da febre amarela em meio urbano, doença erradicada a duras penas pelo obstinado Oswaldo Cruz, na primeira metade do século.  

A atualidade desse tema é tamanha que, pela segunda vez, em curto espaço de tempo, volto a fazer um pronunciamento sobre ele.  

Sras. e Srs. Senadores, ocupo agora a tribuna desta Casa para aprofundar um pouco mais minha análise sobre o assunto, trazer estatísticas recentes e também para cobrar mais verbas e ações mais enérgicas das autoridades da área de saúde, em função do aumento dos casos de febre amarela no País.  

Todos sabemos muito bem que a febre amarela é uma grave doença tropical infecciosa, transmitida por vetores alados característicos de determinado tipo de ecossistema. Os mosquitos do gênero Haemagogus são os vetores da forma silvestre da doença e os mosquitos do gênero Aedes aegypti são responsáveis pela transmissão do vírus nas áreas urbanas.  

Em nosso País, a febre amarela silvestre está em contínuo movimento dentro de suas áreas endêmicas e, esporadicamente, seu vírus é passado a seres humanos que penetram seu ecossistema viral: as florestas e as matas tropicais.  

Segundo recente Nota Técnica, divulgada pelo Ministério da Saúde em 3 de fevereiro passado, intitulada Febre Amarela no Brasil , não há registro de ocorrência do padrão epidemiológico urbano da doença no País, desde 1942.  

A partir de então, casos e surtos de febre amarela silvestre continuam a ocorrer em uma extensa faixa do território brasileiro, que inclui todos os estados das Regiões Norte e Centro-Oeste, além do oeste do Maranhão, considerada área endêmica desse padrão epidemiológico da doença.  

"O número de casos detectados apresenta grande variação anual, decorrente da própria variação cíclica na ocorrência da epizootia amarílica, bem como da capacidade dos serviços de saúde em diagnosticar e investigar casos e surtos".  

O mencionado documento aponta que, entre 1982 e 1997, "foram notificados 281 casos de febre amarela silvestre no Brasil (média de 17,5 casos/ano), variando entre o mínimo de 2 casos notificados em 1990, e o máximo de 83, em 1993". Nesse ano, 74 dos 83 casos correspondem a um único surto da doença, ocorrido no Estado do Maranhão.  

Se acrescentarmos aos 281 casos divulgados na referida nota os dados referentes aos anos de 98 e 99, o número total de casos no País sobe para 401, com o registro de 198 óbitos, e uma taxa de letalidade da ordem de 49,4%.  

Sras. e Srs. Senadores, essas estatísticas nos levam à conclusão de que, nos últimos anos, muito provavelmente em conseqüência de uma ação mais rigorosa da vigilância epidemiológica, têm sido constatados, em nosso País, não só um aumento no número de casos notificados da doença como também uma agilidade maior na investigação de casos e surtos e na adoção de medidas de controle pertinentes.  

Em 1998, foram notificados 34 casos e, no ano passado, 72 casos, enquanto em 1997, foram verificadas apenas 3 ocorrências, todas elas letais.  

Em 1998, foram detectados dois surtos de maiores proporções, um na região do delta do Rio Amazonas, em que foram registrados 18 casos na Ilha de Marajó, Estado do Pará, e outro na fronteira norte do País, com o registro de 7 casos em meu Estado, Roraima. Os demais casos ocorreram, isoladamente, nos Estados do Pará, Amazonas e Mato Grosso.  

Não obstante as medidas adotadas e a intensificação da vacinação, o surto verificado na Ilha de Marajó em 98 persistiu em 1999. Dos 72 casos registrados no ano passado, 31 ocorreram em pessoas procedentes de dois municípios localizados no oeste daquela ilha. Os demais pequenos surtos e casos isolados ocorreram principalmente nos Estados do Mato Grosso, Amazonas e Roraima.  

O surto atualmente registrado no Estado de Goiás segue, na verdade, uma trilha descendente e bastante previsível, pois, em 1999, foram registrados, pela primeira vez, casos em municípios do sul do Pará e do norte do Tocantins.  

No final do ano passado, outros casos surgiram no leste do Tocantins e no Norte de Goiás, prenunciando as ocorrências hoje constatadas em outros municípios goianos, após mais de 10 anos seguidos em que as notificações naquele Estado não passavam de 1 ou 2 casos (o último surto ocorreu em 1987, com o registro de 10 casos e 9 óbitos).  

Segundo a Fundação Nacional de Saúde – Funasa, "desde 1998, vem ocorrendo um período de epizootia entre os símios de várias regiões da floresta amazônica, e, posteriormente, em algumas regiões do cerrado do Centro-Oeste".  

Toda vez que ocorre essa epizootia, isto é, o ataque simultâneo da doença a numerosos macacos de uma mesma área geográfica, levando a óbito muitos desses animais, registra-se a ocorrência de um número maior de casos em seres humanos.  

Seria esse período de epizootia a explicação para a ocorrência do surto entre turistas que estiveram no Parque Nacional de Chapada dos Veadeiros, Município de Alto Paraíso, de onde são provenientes os primeiros 7 casos registrados nesse início de ano. Dos turistas contaminados, 4 eram moradores do Distrito Federal, 2 do Estado de São Paulo e 1 do Rio de Janeiro.  

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, os mais recentes dados estatísticos do Cenepi, referentes ao ano 2000, revelam que, desde o início do corrente ano, foram confirmados, no total, 14 casos de febre amarela silvestre, 12 deles com transmissão no Estado de Goiás, além de mais 2 casos, um no Estado do Tocantins e outro no de Mato Grosso.  

Das 14 pessoas infectadas, 5 já morreram.  

Seria faltar com a verdade, neste momento, não reconhecer publicamente que houve um incremento da sensibilidade da vigilância epidemiológica nos últimos tempos, registrando-se um significativo aumento no número de casos suspeitos notificados.  

Segundo a Funasa, somente no mês de janeiro deste ano, foram notificados às autoridades 115 casos da doença, dos quais 13 foram confirmados, 52 descartados e 50 ainda em fase de investigação.  

Entre os casos ainda investigados certamente muitos outros serão descartados, após os resultados dos exames laboratoriais. A maioria deles por não apresentar quadro clínico compatível e outros tantos devido ao fato de as pessoas investigadas nem sequer terem estado nas áreas consideradas endêmicas.  

Sras. e Srs. Senadores, todos nós estamos constatando que um grande esforço vem sendo realizado por todas as equipes envolvidas com a vigilância e o controle dessa doença. As três esferas de governo deram-se as mãos, nestas últimas semanas, para impedir que a situação saia de controle.  

As ações básicas de combate aos vetores ficam, em primeiro lugar, a cargo dos municípios, cabendo aos Estados e ao Ministério da Saúde a orientação sobre as medidas de combate e o fornecimento das vacinas.  

O Ministério da Saúde, por intermédio da Fundação Nacional de Saúde, aos quais estão subordinados o Centro Nacional de Epidemiologia – Cenepi e a Coordenação do Programa Nacional de Imunizações, tem intensificado a vigilância epidemiológica, a vacinação na área endêmica e nas áreas limítrofes às Regiões Norte e Centro-Oeste, e alertado as pessoas que se dirigem a essas áreas para que se vacinem e assim se previnam contra a febre amarela silvestre.  

Não resta dúvida de que, desde 1998, a população vacinada no País tem aumentado significativamente: 12 milhões de doses foram aplicadas em 1998 e 14 milhões de doses, em 1999, enquanto a média anterior era de cerca de 3 milhões de doses por ano.  

A vacinação realizada, entretanto, não foi tão ampla quanto deveria ser por motivos vários que vão desde a limitação do estoque de vacinas, passando pelas dificuldades de operacionalização da imunização em massa em regiões de difícil acesso, até se chocar contra o dramático e bem conhecido obstáculo do contingenciamento das verbas do setor de saúde.  

As metas iniciais de se estender a vacinação a áreas de risco de endemicidade em estados não integrantes da Amazônia Legal não foram totalmente cumpridas, havendo quem afirme que o total da população imunizada no Brasil é muitíssimo menor do que o que deveria ser.  

Sr. Presidente, embora seja inegável que as autoridades estão agindo e que a situação ainda está sob controle, isso não nos impede de reconhecer e denunciar a gravidade do recrudescimento da febre amarela em nosso País, e também a absoluta necessidade da tomada de medidas mais amplas para barrar seu avanço.  

Se no ano passado, quando se verificou que, do total de 72 casos, 74% deles ocorreram no Pará (36) e no Tocantins (16), tivessem sido tomadas providências mais concretas, o Estado de Goiás não estaria registrando tantos casos e as preocupações atuais seriam certamente bem menores.  

Essas preocupações serão ainda mais inquietantes se se consumarem as previsões do Orçamento deste ano que destina às ações de prevenção e controle da dengue e da febre amarela apenas a terça parte do que foi gasto com essas doenças, em 1999, como noticiou o jornal O Globo , de 16 de janeiro próximo passado.  

Nenhum de nós ignora que o mosquito transmissor da febre amarela urbana, o mesmo Aedes aegypti que transmite a dengue, é encontrado em quase todos os grandes centros urbanos do País.  

Há, portanto, riscos a serem evitados e medidas de controle a serem intensificadas. É preciso não esquecer que, quando existe abundância de vetores em uma determinada área, a transmissão da doença de uma pessoa que chega infectada para as pessoas residentes no local a que ela se dirigiu é significativamente facilitada.

 

A necessidade de se mapear focos da doença é tão grande que está sendo feito um trabalho de conscientização das populações das áreas em que existem macacos para que as autoridades sejam informadas de eventuais mortes desses animais, sinal claro de que há transmissão do vírus da doença no local.  

A população urbana também está sendo convidada a colaborar para a eliminação dos possíveis criadouros de Aedes aegypti em seus domicílios.  

Como médico, considero imperioso que haja um fortalecimento ainda maior do Plano de Intensificação de Vacinação contra a Febre Amarela, em todo o País, ampliando a parceria entre a Funasa e as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde.  

Se não existem mecanismos possíveis de controlar a doença nas florestas tropicais, nas matas, e nas zonas rurais, temos de intensificar a vacinação, a única forma eficaz de prevenção da febre amarela. Essa doença viral é tão grave que pode comprometer seriamente o fígado, os rins, provocar manifestações hemorrágicas, e até matar em uma semana, se não houver tratamento adequado e imediato.  

Sras. e Srs. Senadores, em 18 de janeiro, data em que me pronunciei anteriormente sobre o mesmo assunto, encaminhei à Mesa do Senado Federal um requerimento convidando o Ministro da Saúde a vir prestar esclarecimentos à Casa sobre esta questão tão grave e preocupante.  

Ao concluir este pronunciamento, gostaria de reiterar a solicitação e também de pedir ao Ministro da Saúde, José Serra, redobrada atenção para o problema da febre amarela e vacinação em massa nos municípios próximos às áreas em que foram detectados casos dessa doença.  

A vacinação de bloqueio será, sem dúvida, uma das formas mais eficazes de barrar a rota da doença, perceptível nos mapas do Cenepi como se fosse um rio que descesse em direção às regiões indenes de nosso País.  

Como não podemos impedir a circulação de macacos e vetores em nossas florestas, nem destruir nossas matas, apelo que seja ampliada a única forma possível de se evitar a reemergência da febre amarela no Brasil: a vacinação.  

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/03/2000 - Página 3835