Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CRITICAS AO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, PELO POSICIONAMENTO CONTRARIO A CONTRATAÇÃO DE MEDICOS ESTRANGEIROS PARA ATENDIMENTO A POPULAÇÃO ACREANA, DIANTE DA FALTA DE INTERESSE DOS MEDICOS BRASILEIROS.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. EXERCICIO PROFISSIONAL.:
  • CRITICAS AO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, PELO POSICIONAMENTO CONTRARIO A CONTRATAÇÃO DE MEDICOS ESTRANGEIROS PARA ATENDIMENTO A POPULAÇÃO ACREANA, DIANTE DA FALTA DE INTERESSE DOS MEDICOS BRASILEIROS.
Aparteantes
Ernandes Amorim, Geraldo Cândido, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 02/03/2000 - Página 3961
Assunto
Outros > SAUDE. EXERCICIO PROFISSIONAL.
Indexação
  • REGISTRO, ATUAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO ACRE (AC), MELHORIA, AMPLIAÇÃO, ATENDIMENTO, SAUDE PUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, PROGRAMA, SAUDE, FAMILIA.
  • COMENTARIO, INCAPACIDADE, CONSELHO FEDERAL, MEDICINA, ENCAMINHAMENTO, MEDICO, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, REGIÃO AMAZONICA, REGISTRO, SITUAÇÃO, CARENCIA, ESTADO DO ACRE (AC), NECESSIDADE, CONTRATAÇÃO, ESTRANGEIRO.
  • CRITICA, CONSELHO FEDERAL, MEDICINA, PROIBIÇÃO, CONTRATAÇÃO, MEDICO, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, PREJUIZO, VIDA, POPULAÇÃO CARENTE, ESTADO DO ACRE (AC).
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SENADOR, ASSUNTO, PROGRAMA DE INTERIORIZAÇÃO, EXERCICIO PROFISSIONAL, BRASIL.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT – AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, gostaria de fazer um pedido de apoio ao Senado Federal em nome do Estado do Acre.  

Estamos em uma caminhada incessante, sem atraso de um dia, na busca de atender às necessidades de saúde da nossa população. Vivemos um Governo que tem priorizado as áreas sociais de maneira clara, bem definida, trabalhando com as minorias, mesmo tendo encontrado o setor de saúde envolvido pelo manto da corrupção, da gestão equivocada, da falta de prioridades, da falta de organização. Este Governo tentou arrumar a casa, conseguindo o apoio, a solidariedade e a sensibilidade do Ministério da Saúde – faço questão de registrar esse ato de justiça.  

Agora, estamos implantando a fase mais ousada da política de saúde no Governo do Acre: o chamado Programa de Saúde da Família, que irá contemplar cerca de 70% da nossa população, com atendimento em casa, nas regiões pobres do nosso Estado.  

Além desse Programa, contamos com a adesão e o apoio do Ministério da Saúde no sentido de enviar os especialistas necessários para atender nas regionais do Estado do Acre, que são cinco áreas de desenvolvimento definidas pelo Governo Jorge Viana. Estamos precisando de mais 61 médicos especialistas para dar cobertura às regionais e, também, de 85 médicos para o Programa de Saúde da Família.  

Trata-se de uma busca incessante de parte de todos os parlamentares comprometidos com o Governo do Estado do Acre e das pessoas que trabalham e lutam pela saúde em nosso Estado. Fizemos contato com todos os Estados do Brasil, por intermédio dos meios de comunicação. Fomos ao Conselho Federal de Medicina fazer um apelo no sentido de conseguirmos apoio daquela instituição a fim de promover o entendimento de que nas regiões pobres do Brasil, como a Amazônia e o Nordeste, há efetivamente falta de médicos. O Conselho Federal de Medicina nos mostrou sua solidariedade. No entanto, fechou a discussão afirmando que não aceitaria, sob qualquer hipótese, a presença de médicos de outros países para prestar serviços no Brasil. Tal fato fere a política do Conselho Federal. O órgão crê que o Brasil possui médicos em excesso e que precisamos trabalhar a interiorização. O representante do Conselho Federal de Medicina do Rio Grande do Sul alegou que, se pagássemos um salário digno, teríamos médicos no Estado do Acre. Esse entendimento se deu no mês de setembro e outubro do ano passado. Mostrei a folha de pagamento dos médicos do Governo do Estado do Acre. O salário é da ordem de R$6 mil a R$9 mil. Pedi, então, ao Conselho Federal de Medicina que enviasse médicos para o Estado do Acre, para salvar vidas. Há pessoas morrendo por falta de profissionais e de uma atenção definitiva à saúde, que precisa do médico em algumas etapas. Sr. Presidente, o que ocorre é que, até hoje, o Conselho Federal de Medicina, lamentavelmente – e sei da seriedade e da sensibilidade dos seus membros – não nos respondeu com o encaminhamento de um médico sequer para trabalhar no Estado do Acre. O resultado disso é a necessidade de 135 profissionais de saúde para cumprir uma meta de atendimento à população. O Governo oferece condições de trabalho digno e não tem qualquer resposta de parte daqueles que estão negando uma alternativa para salvar vidas neste País.  

Não posso entender o corporativismo, a defesa de uma categoria se sobrepondo aos direitos humanos. Não posso entender que 30% dos Municípios do Estado do Amazonas não tenham médicos e o Conselho Federal de Medicina afirme que somente médicos brasileiros podem ocupar as respectivas vagas. Aceitamos de qualquer modo a tese da globalização. Entendemos que é necessário, moderno, atual e contemporâneo; todavia, quando falamos em globalização da solidariedade de um povo a outro, como é o caso da política de medicina de Cuba, que tenta exportar solidariedade a países que precisam de profissionais, o assunto muda. Neste caso, não se aceita a presença do profissional estrangeiro, preferindo-se deixar a população morrer para se defender o corporativismo de uma classe.  

Tive oportunidade de dizer, no Conselho Federal de Medicina, que, entre uma pessoa morrer por falta de assistência à saúde e a defesa do corporativismo, da vaidade médica, fico com a defesa do ser humano que esteja abandonado, precisando de apoio e de solidariedade. Lamentavelmente, não conseguimos superar esse impasse.  

Estamos com a meta de levar, no dia 13 de março, com uma missão do Ministério da Saúde, 45 profissionais para o meu Estado e, até agora, estamos com dificuldade de chegar ao número de 40 profissionais. Então, o impasse está criado. Falta sensibilidade do Conselho Federal de Medicina para tratar este assunto. Um profissional de outro país que venha atuar no campo específico da saúde pública, que não exercerá de maneira alguma a medicina privada e só atuará numa área que tenha carência comprovada de profissional brasileiro, jamais estará prejudicando os médicos do Brasil. Há uma dose exagerada de egoísmo, prejudicando um ação ética que diga respeito, primeiro, ao cidadão e, depois, à vaidade de um profissional.  

O Sr. Ernandes Amorim (PPB - RO) – V. Exª me concede um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) – Concedo o aparte ao eminente Senador Ernandes Amorim.  

O Sr. Ernandes Amorim (PPB - RO) – Senador Tião Viana, já fomos Prefeitos da cidade de Ariquemes, Rondônia, conhecemos o problema da Amazônia e dos nossos Estados. Essa situação nos deixa boquiabertos, até porque existem várias faculdades de Direito, de Administração e de outros cursos, mas ainda não há faculdade de Medicina nos Estados do Acre e de Rondônia. Importa-se tudo, aceita-se tudo o que vem de fora, por que não aceitar o trabalho dos médicos de Cuba, da Bolívia e de tantos outros lugares? Na verdade, a Região Norte tem exportado alunos para a Bolívia, levando divisas, para formar médicos que podem até não ser aceitos no Brasil. Por isso, é preciso muito empenho dos Parlamentares e do próprio Governo, a fim de que seja criada uma faculdade de Medicina na Região Norte, pois essa é uma área carente de profissionais e oferece um salário bom. Por que o Ministério da Educação não agiliza a instalação de faculdades ou universidades na nossa Região? Muito obrigado.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) – Agradeço, Senador Ernandes Amorim, pela contribuição de V. Exª que, por ser da Região, traduz também o sentimento do povo de Rondônia.  

E quem oferece um salário de R$6 mil a médicos e condições dignas de trabalho não pode estar indo contra a valorização desse profissional brasileiro.  

Tentei empenhar toda a minha solidariedade ao Conselho Federal de Medicina, para resolvermos o problema da interiorização de profissionais médicos no Brasil. Acreditamos que o único caminho é o incentivo e o estímulo.  

Existe um projeto de lei do Senador Antonio Carlos Magalhães, de 1996, que trata da dedicação civil em relação a regiões do interior do Brasil. Estamos defendendo com muita ênfase a sua aprovação, que pode resolver definitivamente essa situação. Todavia, enquanto não se ultrapassa o limite do processo legislativo, enquanto temos uma população inteira abandonada no interior deste País, não custa nada, não traz dificuldade ou prejuízo o exercício da solidariedade e da compreensão de que é preciso estimular a interiorização de profissionais médicos no Brasil, de imediato. Em cidades com 13 mil, 17 mil ou 20 mil habitantes, pessoas estão morrendo por falta de profissionais, e não se encontra uma solução.  

Há uma adesão do Ministério da Saúde, uma decisão política. Um Governo só tem quatro anos para implantar uma política social correta e ética, mas infelizmente a vaidade e a burocracia têm prejudicado o direito das minorias que vivem na Região Amazônica e em parte do Nordeste do Brasil.  

O Sr. Romeu Tuma (PFL – SP) – Concede-me V. Exª um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT – AC) – Concedo o aparte, com muita honra, ao Senador Romeu Tuma.  

O Sr. Romeu Tuma (PFL – SP) – Senador Tião Viana, V. Exª traz a esta Casa um assunto importante. Durante as minhas andanças pela Região Norte do País, principalmente pela Região Amazônica - onde o profissional formado nas grandes capitais não quer se aventurar, preferindo concentrar toda sua força, às vezes, num subemprego nas grandes cidades, deixando de levar um pouco do que o Estado lhe deu para servir ao próximo nessas regiões de difícil acesso - encontrei convocados do Exército, Marinha e Aeronáutica brasileiros. Essas pessoas, para prestar o serviço militar, fazem suas prorrogações durante o período de incorporação para, depois de formadas, servirem e saírem como oficiais da reserva. No hospital de Tabatinga, encontrei 28 profissionais de Medicina de várias especialidades, dentre os quais uma atendente cardiologista com pós-graduação na Universidade do Rio de Janeiro e com grande conhecimento médico. Os jovens que saem das faculdades, às vezes, precisam ganhar seu salário, mas não têm nem como fazer residência e não podem esperar, por isso procuram um meio de ganhar seu salário dentro dessa convocação. O Presidente, Senador Antonio Carlos Magalhães, elaborou um projeto que dispõe sobre o serviço civil alternativo, que há mais de ano saiu desta Casa.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) – Desde 1996.  

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) – Fui o relator e tinha muita esperança em que, pelo interesse público, seria aprovado com rapidez. Infelizmente, não conseguimos. Vale a pena lutarmos, fazendo até com que os rapazes que estudam nas escolas públicas tenham, pelo menos, um ano para se dedicarem e oferecerem ao Estado o seu trabalho, em contrapartida daquilo que deixaram de pagar. Quero cumprimentar V. Exª. Creio que é válida a vinda dos médicos do exterior para colaborar. Temos aqui várias experiências de equipes americanas que vêm operar lábios leporinos, inclusive acompanhei alguns casos de problemas de visão. Médicos das escolas de São Paulo se incorporam a esse projeto, exportando, também, os conhecimentos adquiridos nos grandes centros, beneficiando as populações menos favorecidas. Essa luta vale a pena, por isso estamos com V. Exª.

 

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT – AC) – Agradeço muito, Senador Romeu Tuma, e incorporo ao meu pronunciamento o seu aparte. Lamento apenas que, mesmo implantando esse programa, reduzindo no mínimo em 50% a mortalidade infantil em dois anos, ampliando a expectativa de vida dos idosos – a menor do Brasil está na Amazônia brasileira -, trabalhando a qualidade da saúde da mulher, prevenindo o câncer do colo de útero, e trabalhando com doenças específicas da região, não tenhamos o acesso, o estímulo e o apoio efetivo de algumas instituições. Lamento agora a ausência do Conselho Federal de Medicina em nos dar essa possibilidade.  

Se falamos em resolver o problema em definitivo, como a aprovação desse projeto, fica retido na Câmara dos Deputados; se falamos na interiorização, na melhor distribuição da formação médica do Brasil, somos derrotados. No ano passado, foram abertas quase dez escolas de Medicina apenas em um Estado do Sudeste do Brasil, mas não se deixa abrir nenhuma no Norte do Brasil. Mesmo que tenhamos todos os professores qualificados com doutorado, laboratórios em condições de funcionamento, os obstáculos da burocracia são enormes.  

Essa situação nos deixa aflitos, Sr. Presidente. Felizmente, temos a solidariedade de profissionais do Rio de Janeiro, de Mato Grosso, de Santa Catarina, de Minas Gerais, de São Paulo, mas ainda não há número suficiente para a primeira etapa - 45 médicos para Rio Branco, 40 para os municípios e 61 profissionais especialistas. Criou-se, portanto, esse impasse.  

Espero que o Conselho Federal de Medicina se sensibilize, nos procure e seja solidário, tendo em vista uma alternativa imediata, até que a solução definitiva proposta num projeto de lei do Presidente do Senado entre em vigor. Vidas humanas estão pagando um preço muito alto pelo jogo da vaidade e do excesso de uma visão corporativista.  

O Sr. Geraldo Cândido (Bloco/PT – RJ) – Permite-me V. Exª um aparte, eminente Senador Tião Viana?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT – AC) – Com muita satisfação, ouço o aparte de V. Exª, nobre Senador Geraldo Cândido.  

O Sr. Geraldo Cândido (Bloco/PT – RJ) – Senador Tião Viana, felicito-o pelo importante assunto que traz ao plenário. Solidarizo-me com V. Exª e com o Governo do Acre. Inclusive, por solicitação de V. Exª, entrei em contato com o Sindicato dos Médicos e outras entidades para difundir a proposta da contratação de médicos para o Estado do Acre. É essencial tratar da saúde da população, especialmente daquela que está distante dos grandes centros, que sofre graves conseqüências por falta de assistência médica. Há um paradoxo nesse aspecto. Existe Estado em que não há plano de saúde público, porque o Governo estadual não tem interesse em contratar médicos para assistir a população. No Acre, porém, está ocorrendo o inverso. Há um projeto do Governo local destinado à contratação de médicos, oferecendo-lhes bons salários, tendo em vista a dignidade dos profissionais de saúde. Porém, está enfrentando dificuldades. É importante insistir e persistir nessa proposta e lutar para quebrar essa barreira, que impede a instalação de uma universidade no Acre, em Rondônia ou em qualquer Estado ou região do Brasil, porque somos uma única federação. Por que alguns Estados têm privilégios e outros ficam sendo marginalizados e não têm os mesmos direitos? Portanto, temos que contratar médicos para essa atividade e conseguir a instalação da Faculdade de Medicina no Estado do Acre. Por isso, solidarizo-me com V. Exª. e com o Governo do Acre.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) – Muito obrigado, nobre Senador Geraldo Cândido. De fato, V. Exª. tem sido muito solidário nesse assunto ao tentar apoio junto ao Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro.  

Concluo, Sr. Presidente, lembrando que um salário de R$6 mil representa uma condição digna de trabalho e demonstra o compromisso e a decisão política do Governo e o apoio do Ministério da Saúde. Precisamos implantar, de maneira eficaz, um programa que vai salvar milhares de vidas, elevar a qualidade de vida do povo do Acre e da Região Amazônica. Devemos pensar que ali vale a pena construir uma relação social nova. Acredito que é o suficiente para que os demais Senadores da Casa possam, em seus Estados, nos ajudar na divulgação da busca de médicos que possam assumir a causa daquela região.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/03/2000 - Página 3961