Discurso durante a 10ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DISCUSSÃO DO PAPEL DAS FORÇAS ARMADAS, DESTACANDO O ARTIGO SOBRE O TEMA, DE AUTORIA DO EX-SENADOR JARBAS PASSARINHO, PUBLICADO NO JORNAL O ESTADO DE S.PAULO, EDIÇÃO DE 15 DE FEVEREIRO ULTIMO.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS.:
  • DISCUSSÃO DO PAPEL DAS FORÇAS ARMADAS, DESTACANDO O ARTIGO SOBRE O TEMA, DE AUTORIA DO EX-SENADOR JARBAS PASSARINHO, PUBLICADO NO JORNAL O ESTADO DE S.PAULO, EDIÇÃO DE 15 DE FEVEREIRO ULTIMO.
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/2000 - Página 4029
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS.
Indexação
  • ANALISE, FUNÇÃO, FORÇAS ARMADAS, PRIORIDADE, DEFESA, SOBERANIA, INTEGRIDADE, PAIS, INTEGRAÇÃO, POLITICA EXTERNA, VIGILANCIA, PAZ, DEBATE, ATUAÇÃO, COMBATE, TRAFICO INTERNACIONAL, DROGA, CRIME ORGANIZADO, CONTRABANDO, LAVAGEM DE DINHEIRO, QUESTIONAMENTO, PRESENÇA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), REGIÃO AMAZONICA.
  • SOLICITAÇÃO, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, DEBATE, PODER PUBLICO, SOCIEDADE CIVIL, FUNÇÃO, FORÇAS ARMADAS.
  • TRANSCRIÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, JARBAS PASSARINHO, EX SENADOR.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP. Para comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em regime democrático, a avaliação da segurança nacional pressupõe mudança de ótica. Passado o tempo em que se buscava reprimir ações tidas como atentatórias a um poder nacional instituído, para garantir a execução de objetivos nacionais permanentes, uma das indagações mais freqüentes na mídia refere-se ao papel reservado às Forças Armadas, ou melhor, ao modelo militar que nossa sociedade almejaria implementar diante da atual conjuntura mundial.

Enquanto se ampliam as liberdades públicas nos países desenvolvidos, os mais testados na História, há firme convicção quanto a modelo próprio de força armada, desde que zelar pela soberania e integridade nacionais continua sendo o objetivo nº 1 de qualquer Força Armada, seja no Brasil, no México ou no Canadá, e sobre esse aspecto não há divergências nem no campo político. A prioridade de cada exército varia de acordo com a realidade de cada país, mas é onde se afirma a necessidade de uma política de defesa sustentável, que se correlaciona de forma inequívoca à segurança do Estado e ao bem-estar da sociedade.

Essas vertentes convergem para a construção de um modelo de desenvolvimento que fortaleça a democracia, reduza as desigualdades sociais e os desequilíbrios regionais, de forma que as necessidades de defesa e de ação diplomática no campo externo estejam em harmonia com as prioridades nacionais internas. Nesse contexto, as Forças Armadas continuam a ser, fundamentalmente, organizações nacionais alicerçadas no rigor da hierarquia e da disciplina, equipadas, treinadas e remuneradas para defender essas nações pelas armas e vencer as guerras que possam acontecer. Todavia, em nosso meio, algumas variáveis político-ideológicas costumam ser inseridas no tema e chegam a alimentar acirradas discussões infensas à realidade.

Por essa razão é que a política de defesa não pode ser uma versão adocicada da política externa. Ambas buscam os mesmos objetivos, mas com instrumentos e métodos inteiramente distintos e, a menos que essas diferenças sejam preservadas, o soldado perderá a função e a Nação estará desprotegida, se amanhã o diplomata falhar.

No caso brasileiro, a tarefa dos formadores da política de defesa é tornada mais árdua pela falta de ameaças plausíveis e de riscos visíveis que possam ser neutralizados ou combatidos por forças militares. A ameaça difusa, nem sempre típica ou provável, deixa o planejador com responsabilidade de imaginar o imponderável e fazê-lo com equilíbrio.

Partindo-se do pressuposto de que a vocação do Brasil é pacífica e defensiva, voltada para a integração internacional e para os esforços de garantia da paz mundial, essa concepção não anula a capacitação do país para com as necessidades de defesa, que exigem definições estratégicas, capacidade dissuasória, aprimoramento tecnológico e disponibilidades materiais. Essa capacidade de defesa, em que pese às atenuantes que a globalização possa produzir sobre aspectos nacionais, continua sendo uma condição imprescindível da soberania do Estado.

A propósito dessa neopolítica globalizante, é verdade que as ameaças também se globalizam, como no conhecido conceito físico de ação e reação. Grosso modo, podem ser citados o narcotráfico, o contrabando, o crime organizado, a lavagem internacional de dinheiro e, por que não dizer, o contrabando de armas. A paz interna não depende de uma política de defesa, mas sim de um eqüitativo processo de desenvolvimento econômico e social e de um ambiente democrático de participação política. No plano militar, a reorganização das Forças Armadas, sua redistribuição geográfica e condições de acesso a tecnologias avançadas depende da mobilização de recursos materiais, sob pena de o assunto não passar de uma abstração acadêmica.

Pensar uma política de defesa para o Brasil é pensar a atualidade e o futuro de nossas necessidades e interesses de segurança. A tarefa cabe tanto ao Presidente da República e aos membros do Congresso Nacional quanto à sociedade brasileira. Como disse antes, o perfil pacífico do Brasil justifica essa política de defesa orientada menos pelas ameaças e mais pela vigilância. A esse respeito, dirigi ofício ao Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional desta Casa, no qual proponho seja aberto espaço ao debate e considerações acerca do papel de nossas Forças Armadas.

Como o tempo destinado ao meu pronunciamento já está esgotado, solicito à Mesa que todo o meu discurso seja considerado como lido. Antes de encerrar, porém, quero citar alguns tópicos importantes.

À guisa de exemplo, temos a desconfiança com que os nossos militares têm olhado a movimentação norte-americana no continente, notadamente no caso da guerrilha colombiana, largamente financiada pelo narcotráfico, que estende seus tentáculos à Amazônia brasileira. Pode-se até mesmo acusar os militares mais radicais de enxergarem aqui e alhures uma possibilidade concreta de internacionalização da Amazônia. Mas como deixar de atribuir-lhes razão quando sabemos que os guerrilheiros colombianos têm verba superior a US$700 milhões anuais, orçamento de dar inveja ao Exército brasileiro e a qualquer Força Armada?

Se considerarmos a biodiversidade, as riquezas minerais e, sobretudo, o fato de que 80% da água potável disponível no mundo - excluídas as calotas polares - estão nos rios e lagos da Amazônia e de que a água será uma commodity muito disputada no século XXI, não é exagero a preocupação dos militares. E faz sentido lançar uma discussão sobre o papel e a presença dos militares em todo o território nacional. Reitero que dessa discussão devem participar os poderes constituídos e a sociedade civil para garantir que, qualquer que seja a consideração geopolítica que venha a predominar, a democracia deve ser a pedra de toque do pensamento e ação das Forças Armadas.

Sr. Presidente, transcrevo aqui um artigo publicado pelo ex-Senador Jarbas Passarinho, importante figura da História contemporânea brasileira, que peço seja incluído no meu pronunciamento.

Para terminar, gostaria de dizer que, há mais de 2.500 anos, o filósofo e general chinês Sun Tzu escreveu A Arte da Guerra , obra reputada como o mais antigo e até hoje atual tratado sobre como defender um país, vencendo no embate das armas. Consta que Sun Tzu nunca perdeu uma guerra, e, entre os ensinamentos que nos legou, na condição de um dos maiores estrategistas já vistos, avulta o de que "os generais são assistentes da nação; quando sua assistência é completa, o país é forte; quando sua assistência é defeituosa, o país é fraco." E, entre as cinco maneiras que propõe para se identificar qual dos contendores tem condições de vencer, ressalta: "aqueles que têm generais hábeis e não constrangidos por seus governantes são os vitoriosos".

Sr. Presidente, muito obrigado pela tolerância. Gostaria que fosse transcrito, por inteiro, o meu pronunciamento.

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SENADOR ROMEU TUMA.

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O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, em regime democrático a avaliação da segurança nacional pressupõe mudança de ótica. Passado o tempo em que se buscava reprimir ações tidas atentatórias a um Poder Nacional instituído, para garantir a execução de objetivos nacionais permanentes, uma das indagações mais freqüentes na mídia refere-se ao papel reservado às Forças Armadas, ou melhor, ao modelo militar que nossa sociedade almejaria implementar diante da atual conjuntura mundial.

Enquanto se ampliam as liberdades públicas entre os países desenvolvidos, os mais testados na História, há firme convicção quanto a modelo próprio de força armada, desde que zelar pela soberania e integridades nacionais continua sendo o objetivo número 1 de qualquer Força Armada, seja no Brasil, México ou Canadá e sobre este aspecto não há divergências nem no campo político. As prioridades de cada exército variam com a realidade de cada país, mas é onde se afirma a necessidade de uma política de defesa sustentável, que se correlaciona de forma inequívoca à segurança do Estado e ao bem-estar da sociedade.

Essas vertentes convergem para a construção de um modelo de desenvolvimento que fortaleça a democracia, reduza as desigualdades sociais e os desequilíbrios regionais, de forma que as necessidades de defesa e de ação diplomática no campo externo estejam em harmonia com as prioridades nacionais internas. Nesse contexto, as Forças Armadas continuam a ser, fundamentalmente, organizações nacionais alicerçadas no rigor da hierarquia e disciplina, equipadas, treinadas e remuneradas para defender essas nações pelas armas e vencer as guerras que possam acontecer. Todavia, em nosso meio, algumas variáveis político-ideológicas costumam ser inseridas no tema e chegam a alimentar acirradas discussões infensas à realidade.

Por essa razão é que a política de defesa não pode ser uma versão adocicada da política externa. Ambas buscam os mesmo objetivos, mas com instrumento e métodos inteiramente distintos e , a menos que essas diferenças sejam preservadas, o soldado perderá a função e a Nação está desprotegida, se a manhã o diplomata falhar. No caso brasileiro, a tarefa dos formadores da política de defesa é tornada mais árdua pela falta de ameaças plausíveis e de riscos visíveis que possam ser neutralizados ou combatidos por forças militares. A ameaça difusa, nem sempre típica ou provável, deixa o planejador com a responsabilidade de imaginar o imponderável e fazê-lo com equilíbrio.

Partindo-se do pressuposto que a vocação do Brasil é pacífica e defensiva, voltada para a integração internacional e para os esforços de garantia da paz mundial, essa concepção não anula a capacitação do país para com as necessidades de defesa, que exigem definições estratégicas, capacidade dissuasória, aprimoramento tecnológico e disponibilidades materiais. Essa capacidade de defesa, em que pese as atenuantes que a globalização possa produzir sobre aspectos nacionais, continua sendo uma condição imprescindível da soberania do Estado.

A propósito desta neopolítica globalizante é verdade que as ameaças também se globalizam, como no conhecido conceito físico de ação e reação. Grosso modo, podem ser citados o narcotráfico, o contrabando, o crime organizado, a lavagem internacional de dinheiro. A paz interna não depende de uma política de defesa, mas sim de um eqüitativo processo de desenvolvimento econômico e social e de um ambiente democrático de participação política. No plano militar, a reorganização das Forças Armadas, sua redistribuição geográfica e condições de acesso a tecnologias avançadas depende da mobilização de recursos materiais, sob pena de o assunto não passar de uma abstração acadêmica.

Pensar uma política de defesa para o Brasil é pensar a atualidade e o futuro de nossas necessidades e interesses de segurança. A tarefa cabe tanto ao presidente da República e aos membros do Congresso Nacional como também à sociedade brasileira. Como disse antes, o perfil pacífico do Brasil justifica essa política de defesa orientada menos pelas ameaças e mais pela vigilância. A este respeito, dirigi oficio ao Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional desta Casa, no qual proponho seja aberto espaço ao debate e considerações acerca do papel de nossas forças armadas. Sugeri fossem convidados a expor idéias sobre este tema momentoso Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado da Defesa e os Senhores Comandantes da Aeronáutica, Exército e Marinha, além de outras autoridades.

O Brasil precisa discutir, com urgência o papel de suas Forças Armadas. Entendo ser essa discussão apenas um dos cenários que hoje ocupam as mentes dos altas escalões das forças armadas brasileiras. No momento em que o governo moderniza a cadeia de comandos militares, criando o Ministério da Defesa, como existe no países desenvolvidos, as Forças Armadas convivem com uma crise de meios. Que tipo de Exercito, Marinha e Aeronáutica é necessário para garantir fronteiras e ocupar o território? Sendo uma potência regional entre seus pares latino-americanos, tal situação implica responsabilidades e empenho, mesmo não tendo qualquer intenção imperialista dentro de sua área de influência.

À guisa de exemplo, temos a desconfiança com que os nossos militares têm olhado para a movimentação norte-americana no continente, notadamente no caso da guerrilha colombiana, largamente financiada pelo narcotráfico, que estende seus tentáculos à Amazônia brasileira. Pode-se até mesmo acusar os militares mais radicais de enxergar aqui e alhures uma possibilidade concreta de internacionalização da Amazônia. Mas como deixar de atribuir-lhes razão quando sabemos que os guerrilheiros colombianos têm verba superior a 700 milhões de dólares anuais, orçamento de dar inveja ao Exército Brasileiro?

Se considerarmos a biodiversidade, as riquezas minerais e, sobretudo, o fato de que 80 por cento da água potável disponível no mundo - excluídas as calotas polares -, estão nos rios e lagos da Amazônia e que a água será uma commodity muito disputada no século XXI, não é exagero a preocupação dos militares e faz sentido lançar uma discussão sobre o papel e presença dos militares em todo o território nacional. Reitero que desta discussão devem participar os poderes constituídos e a sociedade civil para garantir que, qualquer que seja a consideração geopolítica que venha a predominar, a democracia deve ser a pedra de toque do pensamento e ação das Forças Armadas.

Por isso, mais uma vez, precisamos render-nos ao tirocínio de uma ilustre figura da República, que muita falta faz nesta Casa, e felicitá-la pelo artigo lúcido e oportuno publicado no prestigioso jornal "O Estado de S. Paulo", edição de 15 do corrente, à página A2, sob o título "Papel das Forças Armadas". Refiro-me ao Presidente da "Fundação Milton Campos", ilustre ex-Senador e ex-Ministro de Estado Jarbas Passarinho.

Com clareza e concisão peculiares, o artigo analisa o passado e o presente de nossas Forças Armadas para, ao final, transformar-se numa séria advertência quanto ao futuro, com a firmeza que só se pode esperar de quem conhece o assunto na teoria e na prática. Assim, o texto dispensa comentários. Elucida-se por si mesmo e merece transcrição nos Anais do Senado. Diz o seguinte:

O constituinte de 87/88 discutiu amplamente o papel das Forças Armadas. Já na primeira Constituição republicana elas se destinavam, além de à defesa da Pátria, também à manutenção das leis (artigo 14). A Constituição de 1946 rezava: "Destinam-se as Forças Armadas a defender a Pátria e a garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem." A de 1967 repetiu o texto, sem alteração. Insurgiu-se a esquerda contra a destinação de garantir a lei e a ordem, atribuição que julgava exclusivamente policial. Não conseguiu o que buscava obstinadamente, mas obteve uma inovação: a de que as Forças Armadas se destinam "à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constituídos e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem" (artigo 142). A atuação dos militares na garantia da lei e da ordem fica condicionada à iniciativa de qualquer dos poderes constituídos. Para evitar impasse, no caso de iniciativa simultânea de dois poderes em conflito, a lei complementar regulou tal competência.

Agora, volta a discutir-se o papel das Forças Armadas, uma vez instalado o Ministério da Defesa. O que mal se disfarça, em essência, é o desejo de retirar definitivamente das Forças Armadas, em qualquer caso, o papel de garante da lei e da ordem interna, usado para golpe de Estado. Fala-se hoje de uma "mudança de mentalidade dos militares atuais", como se outrora prevalecesse a mentalidade intervencionista, de natureza política. Esquece-se que, historicamente, o apelo às Forças Armadas tem vindo de fora, da chamada sociedade civil, dos políticos, da imprensa e até da Igreja. Talvez isso haja correspondido a uma sociedade política débil, caracterizada por certa deliqüescência da organização do Estado. Então, antes seria preciso mudar a mentalidade política, useira e vezeira em bater às portas dos quartéis e sublevá-los, sob pretextos de eleição fraudada (1930), de ameaça esquerdista (1937), de corrupção (1954) e de irrupção de guerra revolucionária (1964). A intervenção militar, no passado próximo, evidencia o acompanhamento, pelos militares, dos apelos vindos de fora, das modificações de sentimentos e aspirações da classe média, que mudam de substância e de sentido. Uma única vez os militares brasileiros assumiram o poder político. Falo do passado porque, como disse Bobbio, o tempo do velho é o passado. Os que pretendem seja a polícia a encarregada da defesa da ordem e da lei internas desconsideram perigosamente os surtos insurrecionais, os chiapas em armas desafiando o Estado, no México, as guerrilhas comunistas na Colômbia e os movimentos separatistas na Europa, obrigando democracias estáveis a se socorrer de suas Forças Armadas.

O papel fundamental das Forças Armadas é preparar-se e adestrar-se para ganhar guerras. Somente os irenistas, que não acreditam em inimigos ou adversários, podem dar-se ao luxo de pensar num mundo solidário, sem o menor perigo de conflito. Como não temos, no momento, antagonismo externo, há quem julgue desnecessária uma força armada. O general MacArthur, à frente dos exércitos que invadiriam o Japão, ao tomar conhecimento de que Hiroshima havia sido destruída por uma única bomba atômica, disse: "Homens como eu ficaram obsoletos. Não haverá mais guerras. Elas passaram para as mãos dos cientistas, e não dos soldados." Poucos anos depois, ele comandava as tropas aliadas na Guerra da Coréia. Marx previra que, implantado o comunismo, todos os países seriam fraternos, não haveria mais guerras. A União Soviética de Kruchev imobilizou dezenas de divisões na fronteira com a China de Mao Tse- tung, prontas para o conflito armado. O Vietnã invadiu o Camboja e eram todos comunistas...

As atividades subsidiárias impostas por lei às Forças Armadas não se coadunam rigorosamente com a natureza da formação militar, como para participar de campanhas de saúde pública, de transporte de cestas básicas para flagelados nordestinos, para evitar a exploração política dos "industriais da seca", e até de segurança pública no Rio de Janeiro. Há pouco, o prefeito de São Paulo, não contando com a Polícia Militar no conflito com os "perueiros", disse publicamente que iria socorrer-se do Exército! Transformar as forças terrestres em combatentes contra o narcotráfico, como parece ter o general Colin Powell sugerido ao vir ao Brasil, eis outra atividade subsidiária só admissível em caso de apoio logístico.

A sociedade - disse o novo ministro da Defesa, naturalmente habilitado a dizê-lo - deve dizer que tipo de Forças Armadas quer e para o quê. Perdida nos séculos está a advertência romana da cólera das legiões, mas milícias armadas é que não podem ser. O presidente Fernando Henrique, há poucos dias, declarou ser constrangedora a situação de um juiz em início de carreira remunerado parcamente por R$ 5.2248,00 ao mês, quando um delegado da Polícia Federal ganha R$ 7.500,00. O presidente, que descende de ilustres militares, sabe que o militar, que jura dedicar-se inteiramente ao serviço da Pátria, mesmo com o sacrifício da própria vida, tem ciência de que jamais será rico na sua profissão, mas talvez desconheça que um general com mais de 40 anos de serviço e com todos os cursos feitos ganha menos que os "parcos vencimentos" do juiz de início de carreira. É isso que a sociedade quer? Forças Armadas manietadas e passivas nas questões internas de ofensas à ordem e à lei, efetivos meramente simbólicos na nova ordem mundial sem momentâneos antagonismos externos, mal pagas e mal equipadas?

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, a tão brilhante trabalho somente poderia acrescentar breve observação. Há mais de 2.500 anos o filósofo e general chinês Sun Tzu escreveu "A Arte da Guerra", obra reputada como o mais antigo e até hoje atual tratado sobre como defender um país, vencendo no embate das armas. Consta que Sun Tzu nunca perdeu uma guerra e, entre os ensinamentos que nos legou, na condição de um dos maiores estrategistas já vistos, avulta o de que "os generais são assistentes da nação; quando sua assistência é completa, o país é forte; quando sua assistência é defeituosa, o país é fraco." E, entre as cinco maneiras que propõe para se identificar qual dos contendores tem condições de vencer, ressalta: "aqueles que têm generais hábeis e não constrangidos por seus governantes, são os vitoriosos."

Era o que desejava comunicar.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/2000 - Página 4029