Discurso durante a 10ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A INDICAÇÃO DO SR. FRANCISCO GROS PARA A PRESIDENCIA DO BNDES.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A INDICAÇÃO DO SR. FRANCISCO GROS PARA A PRESIDENCIA DO BNDES.
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/2000 - Página 4083
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, INDICAÇÃO, FRANCISCO GROS, ECONOMISTA, PRESIDENCIA, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), MOTIVO, PARTICIPAÇÃO, PATRIMONIO, BANCO PARTICULAR, DEVEDOR, BANCO OFICIAL, SITUAÇÃO, CONFLITO, INTERESSE.
  • ENCAMINHAMENTO, REQUERIMENTO, COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, CONVITE, FRANCISCO GROS, ECONOMISTA, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, REFERENCIA, VINCULAÇÃO, DOLAR, MOEDA, ECONOMIA NACIONAL.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/ PT – SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, quero tratar do tema que há pouco foi objeto de comentário do Senador Roberto Requião, isto é, a posse e designação do Sr. Francisco Gros para a Presidência do BNDES.  

Ontem, o jornalista Roberto Cosso, da Folha de S.Paulo, apresentou uma reportagem muito bem-feita, relativa ao episódio de como o BFC Banco S/A, do qual foi sócio o economista Francisco Gros, tem uma dívida de R$32 milhões com o BNDES.  

Na semana passada, houve a indicação de Gros para a Presidência do BNDES no lugar de Andrea Calabi. Mas algo bastante preocupante acontece: o Sr. Francisco Gros diz não ter interesse financeiro no BFC, mas o fato concreto é que ele próprio, na sua entrevista, esclarece como é que ainda mantém pendente ações e patrimônio naquele banco. Como existe uma pendência entre o BNDES e o BFC, por que o Sr. Francisco Gros não percebe que há uma situação de conflito de interesses para quem vai presidir uma instituição pública da importância do BNDES?  

Leio aqui a pergunta de Roberto Cosso, da Folha de S.Paulo , para o Presidente Francisco Gros: "Quando há um banco liquidado, os pagamentos são feitos pelo administrador, que utiliza os ativos restantes para pagar os passivos. Esse pagamento exige negociação para que a dívida seja corrigida. O fato de o senhor estar na Presidência do BNDES, havendo essa negociação do BNDES com o BFC, constrange de alguma forma?"  

Responde o Sr. Francisco Gros: "Diria até o contrário: qualquer tipo de negociação, de flexibilização que o BNDES poderia ter tido anteriormente à minha presidência, talvez se torne inviável com a minha presença no BNDES. Uma negociação normal, dentro de padrões normais do BNDES, sem que ninguém prestasse nenhuma atenção nisso, hoje seria absolutamente inviável. Essa negociação, qualquer que seja, vai ter que ocorrer à luz do sol, com total divulgação e sujeita a toda e qualquer crítica. Eu diria que a minha presença no BNDES é frontalmente contrária aos interesses de qualquer negociador desse processo com o BNDES. Se eu for atuar nesse caso, só poderia atuar recomendando ao BNDES que qualquer coisa que seja feita nesse particular terá que ser feita à luz do dia, com conhecimento de todo mundo, com aprovação de alçadas superiores, sem o meu engajamento e de forma tal que não seja sujeita a nenhuma crítica."  

Ora, Sr. Presidente, de maneira alguma o Presidente do BNDES pode se abster de tomar parte em uma decisão sobre a qual tem a responsabilidade final. E, obviamente, há uma situação de conflito de interesses, pois S. Sª. não pode abrir mão da responsabilidade de tomar parte na decisão. Mas, na medida em que essa decisão é algo que pode estar influenciando seu próprio interesse, então S. Exª. estaria, de fato, numa situação de conflito e deveria, portanto, ter o senso ético de não aceitar sua designação para presidir aquela instituição, assim como teria sido próprio do Ministro Alcides Tápias e do Presidente Fernando Henrique Cardoso não designá-lo para uma função em que esse conflito de interesses quase que necessariamente vai ocorrer.  

Gostaria de registrar, Sr. Presidente, que apresentei requerimento na Comissão de Assuntos Econômicos - já entregue e assinado por quase todos os Senadores presentes à última reunião, na terça-feira passada, presidida pelo Senador Ney Suassuna - com o seguinte teor:  

Requeiro, nos termos regimentais, seja convidado o Sr. Francisco Gros, indicado pelo Presidente da República para assumir a Presidência do BNDES" – S. Sª. assumiu o cargo hoje de manhã – "para prestar esclarecimentos perante a Comissão de Assuntos Econômicos a respeito das diretrizes e planos que pretende colocar em prática à frente daquela instituição, assim como seu ponto de vista, expresso em 23 de fevereiro de 1999, em artigo publicado na Folha de S.Paulo , de que diversas nações latino-americanas deveriam abrir mão da sua moeda em favor do dólar. Muito embora tenham as autoridades brasileiras, a começar pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso e o Presidente do Banco Central, dito recentemente que a dolarização da economia brasileira é totalmente impensável, é preocupante a designação de presidente de uma das mais importantes instituições financeiras oficiais que tenha opinião contrária. Muito embora a Constituição não preveja que o Presidente do BNDES seja aprovado pelo Senado, é relevante que possa a Comissão de Assuntos Econômicos ouvir o ponto de vista do novo designado.  

O Presidente Ney Suassuna informou-me que, na primeira reunião da Comissão a ser realizada na terça-feira seguinte ao carnaval, o requerimento será colocado em pauta para votação.  

É importante que ouçamos o Presidente do BNDES o quanto antes, para que S. Sª. tenha oportunidade de esclarecer se ainda mantém opinião expressa em seu artigo: "Os argentinos e, logo atrás, os mexicanos estão cada vez mais convencidos de que é uma decisão que se impõe" – S. Sª. está se referindo à dolarização – "sob pena de continuarem tendo de competir, pagando um custo de capital de duas ou três vezes superior ao pago por seus concorrentes do Primeiro Mundo. São esses os padrões de boa conduta que se impõem a todos que desejem ter acesso aos mercados globais. Nada obriga o Brasil a aceitá-los". No entanto, o Sr. Francisco Gros mostra-se favorável a que o Brasil aceite esses padrões. Ora, ter uma pessoa com essa opinião à frente do BNDES certamente nos preocupa sobremodo.  

Em artigo publicado na Folha de S.Paulo de hoje, intitulado "Os Homens dos Cofres", o jornalista Jânio de Freitas assinala muito bem que Francisco Gros vive uma situação de grande dificuldade de interesses porque está assumindo a Presidência do BNDES e precisar ter condições morais e legais para assumi-la.  

Da parte dos Deputados Aloizio Mercadante e Walter Pinheiro houve uma iniciativa junto à Justiça para que se obstasse a posse do Presidente do BNDES em função desse conflito de interesses. Tendo ele assumido o cargo, teremos a oportunidade de argüi-lo a respeito desses assuntos.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/2000 - Página 4083