Discurso durante a 10ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

SITUAÇÃO DOS TRABALHADORES DA TELEMAR APOS O PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO.

Autor
Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MOVIMENTO TRABALHISTA. POLITICA SALARIAL.:
  • SITUAÇÃO DOS TRABALHADORES DA TELEMAR APOS O PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO.
Aparteantes
Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/2000 - Página 4086
Assunto
Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA. POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, SINDICATO, TRABALHADOR, TELEFONIA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ATUAÇÃO, EMPRESA, POSTERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO, TELECOMUNICAÇÕES DO RIO DE JANEIRO S/A (TELERJ), REPUDIO, DEMISSÃO, SERVIDOR, EXPLORAÇÃO, CORTE, DIREITOS, EMPREGADO, COAÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA.
  • DEBATE, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, CRITICA, POLITICA SOCIO ECONOMICA, GOVERNO, FAVORECIMENTO, BANQUEIRO, OMISSÃO, COMBATE, MISERIA, DESIGUALDADE SOCIAL, ALEGAÇÕES, DEFICIT, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • COMENTARIO, ESTUDO, AUTORIA, MARCIO POCHMANN, ECONOMISTA, PROFESSOR, UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS (UNICAMP), DADOS, DENUNCIA, FALTA, VONTADE, CLASSE POLITICA, MELHORIA, SALARIO MINIMO.
  • ANUNCIO, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, GRADUAÇÃO, AUMENTO, SALARIO MINIMO.
  • ELOGIO, GOVERNADOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ANUNCIO, REAJUSTE, SALARIO, SERVIDOR, REDUÇÃO, DIFERENÇA, REMUNERAÇÃO.

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, assomo à tribuna para abordar dois assuntos que considero importantes.  

Primeiramente, vou tratar de uma denúncia em relação à companhia operadora do sistema de telefonia no Rio de Janeiro, a Telemar, sucessora da Telerj, por solicitação do Sindicato dos Telefônicos do Rio de Janeiro.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desde a privatização do Sistema Telebrás, a Telemar vem fazendo um verdadeiro massacre contra seus empregados, com a demissão em massa de 4.500 trabalhadores só na Telemar/Rio e mais 1400 na Embratel; superexploração dos empregados para suprir a falta de mão-de-obra; pressão dos gerentes; e corte de direitos.  

Desde novembro de 1999, a categoria encontra-se em campanha salarial. Após quase quatro meses de cobranças e sete reuniões de negociação, a Telemar/RJ apresentou uma proposta pior do que a apresentada no ano anterior e que havia sido rejeitada em assembléia pelos trabalhadores, além de o Sindicato ter entrado na Justiça argüindo a Lei Barelli.  

Segundo o Sindicato, o acordo de 1998/99, apesar de não ter sido assinado até hoje, foi imposto arbitrariamente pela empresa. Com ele os trabalhadores tiveram as seguintes perdas:  

o     o tíquete-refeição foi reduzido de R$10,80 para R$8,17;

o     a cesta básica foi reduzida de R$116,32 para R$40,00 e limitada aos trabalhadores com salários até R$1.000,00.

o     o auxílio-creche foi reduzido de R$230,17 para R$126,00, sendo cortado o benefício dos empregados homens.

o     As horas-extras foram reduzidas em 75% e 100% para os limites da CLT, ou seja, 25 e 50%.

Foi essa mesma proposta que a empresa, este ano, reapresentou aos trabalhadores, com um agravante relativo às horas-extras. Embora a jornada de trabalho seja de 40 horas semanais, a Telemar/RJ propõe pagar as horas-extras sobre uma jornada de 44 horas.  

Segundo o Sindicato, a Telemar quer garantir a sua proposta e, para que ela seja aprovada de qualquer maneira, passou a utilizar expedientes intimidatórios e coercitivos. Nas assembléias convocadas pelo Sindicato para discutir a questão, a Telemar/RJ mobilizou todo o seu corpo gerencial, orientando-os a comparecer em massa às assembléias e ainda obrigando os trabalhadores a participarem e votarem a favor da sua proposta.  

Na tentativa de garantir a livre expressão dos trabalhadores acerca do acordo coletivo 1999/2000, o Sindicato propôs a realização de um plebiscito, proposta essa que foi combatida pela empresa não apenas com a invasão de assembléias, mas, também, com a produção de boletins mentirosos, com informações completamente deturpadas.  

Segundo informação do jornal do SINTTEL-RJ da última terça-feira, dia 29, foi realizado o plebiscito no dia 25 e venceu a proposta de assinar os acordos coletivos de 1998/99 e 1999/2000. Porém, o Sindicato afirma que a empresa organizou uma campanha de ameaças constantes sobre todos os empregados e houve coação na boca de urna por parte dos gerentes da empresa.  

Mesmo assim, a Telemar, não satisfeita em pagar hora-extra em cima da jornada de 44 horas semanais, tenta dar uma de "joão-sem-braço" incluindo no acordo um Banco de Horas que, em nenhum momento, foi discutido com o Sindicato.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) – Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ) – Concedo o aparte à V. Exª.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) – Senador Geraldo Cândido, não poderia deixar de fazer o aparte a V. Exª, até porque os problemas vividos pelos trabalhadores do seu Estado são os mesmos experimentados pelos trabalhadores do Estado de Alagoas. A "Telemaldade", como passou a ser chamada a Telemar em Alagoas, tem feito exatamente a mesma coisa que V. Exª conta aqui, e, com certeza, não é uma ação única e exclusiva dessa empresa. Quero me solidarizar com o seu pronunciamento. Há perseguição na escolha dos funcionários a serem demitidos; há perseguição em relação aos sindicalizados; há perseguição aos que participam das assembléias; há ainda a questão da qualidade de serviços, o zoneamento de tarifas que está sendo estabelecido nos Estados, que é algo absurdo. E mais absurdo ainda é o que já sabíamos desde o início: as agências – agora em moda no Brasil – não seriam capazes e não teriam autonomia e independência suficientes para combater esse tipo de abuso, como bem relatou V. Exª. No caso de Alagoas, a "Telemaldade" tem agido exatamente da mesma forma: há precariedade dos serviços, aumento abusivo das tarifas e uma perseguição implacável – tal qual os capitães do mato – aos servidores públicos e aos funcionários da empresa.  

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ) – Agradeço a V. Exª o aparte, Senadora Heloisa Helena, e o incorporo ao meu pronunciamento, reconhecendo o seu interesse, a sua luta e a sua solidariedade a todos os trabalhadores do Brasil, que são explorados por esse sistema capitalista, selvagem e injusto.  

O Sindicato informa ainda que a empresa pretende, no acordo que passou a impor à categoria:  

o     obrigar o empregado a trabalhar até 12 horas-extras por semana;

o     dessas 12 horas, pagar apenas duas. As demais vão para o banco de horas;

o     O banco pode acumular até 100 horas excedentes, o que significa que se o empregado fizer 10 horas-extras toda semana, ele pode trabalhar até três meses seguidos sem folga e sem receber um centavo;

o     A Telemar dá a si mesma um prazo de seis meses para compensar as horas-extras do banco de horas;

o     A compensação, quando for feita, só será permitida de segunda a sexta-feira.

Esse verdadeiro banco de exploração não foi discutido em nenhum momento da negociação. Se a empresa quer assinar um acordo, tem que respeitar o que ela mesma apresentou na mesa de negociações. Os trabalhadores não votaram esse banco de horas. O Sindicato não é contra esse banco de horas, mas entende esse banco como constava do último acordo assinado: 32 horas-extras mensais e o restante compensado com folga.  

Sr. Presidente, Srª Senadora, Srs. Senadores, é inaceitável que uma empresa do porte da Telemar, atuando num setor estratégico para o País, utilize esse expediente e é inadmissível que os direitos dos trabalhadores sejam de tal maneira espoliados.  

Ficam aqui registrados o nosso repúdio a essa atitude da empresa e a nossa solidariedade aos trabalhadores da Telemar/RJ.  

Dando prosseguimento ao meu pronunciamento, quero voltar a um assunto importante que foi tratado hoje neste plenário. Trata-se da questão do reajuste do salário mínimo.  

Vários oradores hoje já se posicionaram sobre essa questão, como a Senadora Heloisa Helena e os Senadores Eduardo Suplicy e Roberto Requião. Mas creio que é importante voltar a falar sobre esse assunto, que é de extrema importância, pela sua gravidade.  

Para o Brasil não manter o título de campeão mundial de injustiça social, bastaria cumprir a Constituição, que, em seu art. 7º, Inciso IV, define a questão do salário mínimo, conforme relatou a Senadora Heloisa Helena.  

Portanto, limitar um debate fundamental a uma questão meramente técnica, colocando um suposto rombo de R$3 bilhões na Previdência, como afirmou nesta terça-feira o Ministro Waldeck Ornelas, com grande empecilho para a concretização de um ainda pífio mínimo de R$177,00, na verdade é apenas uma falácia, pois o Governo FHC e sua equipe econômica quiseram e tiveram vontade política de transferir mais de 20 bilhões de reais para os banqueiros no famigerado Proer. É a lógica do Governo Federal: aos banqueiros, empreiteiros e latifundiários, tudo; ao povo mais pobre, nada!  

A mais recente confirmação da política econômica perversa do Governo brasileiro foi dada por um relatório do Departamento de Estado dos Estados Unidos, divulgado na semana passada. Constata o documento, que tem 52 páginas abordando a situação do nosso País, que o salário mínimo no Brasil é uma violação aos direitos humanos. No texto, o Governo estadunidense concluiu uma realidade conhecida por nós, brasileiros: "o salário mínimo de aproximadamente US$70,00 ou R$136,00 não é suficiente para dar um padrão de vida decente a um trabalhador e à sua família. Além disso, é suficiente para garantir um pouco mais de um quarto das necessidades de uma família de quatro pessoas" - imaginem que até o Departamento de Estado Americano reconhece o absurdo que é um salário mínimo de R$136,00!  

Hoje, vemos que o Departamento de Estado Americano, o Banco Mundial, o BIRD e o FMI estão todos preocupados com a situação de miserabilidade do nosso povo. Eles sabem que, se não houver uma melhoria na qualidade de vida, este País estará sujeito a explodir. O Brasil poderá ter uma eclosão de violência sem precedência na nossa história; poderá haver uma convulsão social se permanecer esse estado de coisas. A situação caminha nesse sentido porque o povo brasileiro não se vai deixar morrer de fome, porque, na história do mundo, nenhum povo se permitiu morrer de fome.  

Outros dados sobre o tema são trazidos pelo Economista e Professor da Universidade de Campinas Márcio Pochmann. Ele é autor de um estudo sobre a política do mínimo desde a sua adoção, em 1940. Afirma que, em termos relativos, o salário mínimo pago, em 1940, era 3,6 vezes maior do que o atual. Para ele, se tivessem mantido o poder de compra do mínimo, aliás, apenas cumprindo o que diz a Constituição, os trabalhadores ganhariam hoje R$489,00.  

Conforme esses cálculos, o impacto desse valor nas contas da Previdência seria de R$34,4 bilhões/ano. A contrapartida seria o retorno em itens como arrecadação e aquecimento no comércio de produtos tributados. Pode parecer uma cifra astronômica, mas não é, comparada aos mais de R$100 bilhões que o Governo FHC paga de juros da dívida. Reafirmo: é uma questão de prioridade, ou seja, de vontade política.  

Para Márcio Pochmann, "na discussão antecipada do novo salário mínimo, o Governo Federal derrama lágrimas de crocodilo". Os cálculos do Professor indicam que, "de 1989 a 1999, em termos reais, a carga tributária cresceu 32,5%, e a arrecadação previdenciária aumentou 55,1%. No mesmo período, o poder de compra do salário mínimo acumulou uma queda de 36,2%. A relação do mínimo com a carga de tributos e massa de benefícios tem tudo a ver. Os rombos na cobertura dos benefícios estão sendo bancados por transfusão de receitas dos tributos. Rombos da ordem de 4,2% do PIB, a despeito daquele aumento real de 55,1% nas contribuições da Previdência".

 

E mais: o salário mínimo de R$136,00 equivale a 28% da renda per capita do País. Na Dinamarca, o piso salarial, por lei, alcança 66% da respectiva renda per capita . Na Argentina, aqui ao lado, a mesma relação é de 43%. Ou de 51% na Venezuela, uma economia ainda mais desastrosa do que a nossa.  

Outra revelação da matemática de Márcio Pochmann, que serve para desmascarar propostas populistas e oportunistas do PFL: se o Governo rebaixar, sob certa medida, a taxa básica de juros, o vulgo Selic, ainda de 19%, haveria nos encargos da dívida pública federal – perto de 52% do PIB - um alívio financeiro do tamanho da sobrecarga previdenciária, resultante de uma correção do salário mínimo. Conclui-se, portanto, que um aumento real do salário mínimo, a partir de maio, tropeça menos na falta de arrecadação e mais na falta de imaginação e vontade política.  

Todos os anos, os burocratas de Brasília tentam enganar a opinião pública com argumentos falsos, como, por exemplo, que são poucos os trabalhadores brasileiros que ganham até um salário mínimo. Os que ganham até um mínimo são, isto sim, 14,6 milhões de brasileiros – mais de 20% da população economicamente ativa, e mais de 12 milhões de aposentados. São 54,2% dos trabalhadores do Nordeste e 24% dos trabalhadores do Sudeste. É por isso que o aumento significativo do salário mínimo representa um poderoso instrumento de distribuição de renda e elevação do nível de vida, justamente na faixa mais pobre da população.  

Sr. Presidente, Srs. Senadores, todos os anos, o Partido dos Trabalhadores e a CUT denunciam a vergonhosa situação do salário mínimo no Brasil e lutam por um aumento real e significativo. Mas sempre esbarram na má vontade do Governo com os trabalhadores e na política de sacrificar a questão social no Brasil. A novidade agora é que o PFL resolveu empunhar a bandeira e passou a defender o aumento do salário mínimo para U$100, tentando impressionar a opinião pública como "o paladino das causas populares". Mas é bom que não se esqueça que certamente isso está acontecendo em razão de divergências na aliança política conservadora, que sustenta o Governo FHC, principalmente com objetivos eleitoreiros, já que este ano teremos eleições municipais.  

O problema também esbarra na submissão do Governo FHC ao FMI. É necessário debater alternativas que impliquem a ruptura com as determinações da comunidade financeira internacional e gerem mudanças qualitativas nos rumos da economia, favorecendo a maioria da população.  

Nesse sentido, em breve estarei encaminhando uma proposta de aumento do salário mínimo, que alcançaria, no período de dois anos, com reajustes semestrais, o patamar de U$250, ou seja, de R$442,50. A partir desse valor, que além de dar melhor condição de subsistência ao trabalhador geraria um aquecimento na produção e consumo, conseqüentemente elevaria o nível de emprego. Poderíamos travar um debate com a sociedade brasileira sobre uma política efetiva de distribuição de renda. Dessa maneira, estaremos resgatando uma imensa dívida social e dando dignidade a quem constrói este País: os milhões de trabalhadores.  

Para concluir, Sr. Presidente, quero referir-me ao Estado do Rio de Janeiro. O Governador Anthony Garotinho anunciou que vai reajustar o salário do servidor do Estado para R$400,00 a partir de 1º de maio - atualmente é R$136,00. Isso significa que, se o Governo tiver vontade, é possível fazer. Se o Estado do Rio de Janeiro pode fazer isso, outros também poderão. Quer dizer, vai passar o salário mínimo do Estado para US$240, o piso dos servidores, e o teto para R$8 mil. Ou seja, é uma relação em que a diferença entre o salário maior e o menor é de vinte vezes, o que ainda é muito, mas é razoável. Poderíamos propor isso como uma base para o Brasil, pois é uma relação razoavelmente boa.  

Então, o Governo do Estado do Rio de Janeiro está de parabéns por essa proposta que apresentou ontem, à imprensa, dizendo que, a partir do dia 1º de maio, haverá esse reajuste: R$400,00 como piso salarial dos servidores e R$8 mil como teto salarial.  

Era isso que tinha a dizer.  

Muito obrigado, Srª Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/2000 - Página 4086