Discurso durante a 12ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A DECISÃO DA JUSTIÇA FEDERAL NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, QUE CONDENOU A UNIÃO A REFINANCIAR OS TITULOS DA DIVIDA MOBILIARIA DO ESTADO DE ALAGOAS, OBJETO DA CPI DOS PRECATORIOS. INDIGNAÇÃO PELAS DECLARAÇÕES DO PRESIDENTE ANTONIO CARLOS MAGALHÃES EM RELAÇÃO A SENHORA NICEIA PITTA.

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PRECATORIO. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A DECISÃO DA JUSTIÇA FEDERAL NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, QUE CONDENOU A UNIÃO A REFINANCIAR OS TITULOS DA DIVIDA MOBILIARIA DO ESTADO DE ALAGOAS, OBJETO DA CPI DOS PRECATORIOS. INDIGNAÇÃO PELAS DECLARAÇÕES DO PRESIDENTE ANTONIO CARLOS MAGALHÃES EM RELAÇÃO A SENHORA NICEIA PITTA.
Aparteantes
Amir Lando, Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2000 - Página 4230
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PRECATORIO. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, LEGALIDADE, DECISÃO, JUSTIÇA FEDERAL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CONDENAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, REFINANCIAMENTO, TITULO, DIVIDA MOBILIARIA, ESTADO DE ALAGOAS (AL), OBJETO, APURAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PRECATORIO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PRECATORIO, APRESENTAÇÃO, RELATORIO, ESCLARECIMENTOS, OPINIÃO PUBLICA, OCORRENCIA, FRAUDE, PROCESSO, COMPROVAÇÃO, CRIME, AUTORIA, ENCAMINHAMENTO, DENUNCIA, MINISTERIO PUBLICO.
  • CRITICA, OMISSÃO, GOVERNO FEDERAL, REFERENCIA, CONCLUSÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PRECATORIO, SIMULTANEIDADE, LEGITIMAÇÃO, ATO, FRAUDE, REMESSA, COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, SENADO, PROCESSO, ADIAMENTO, PAGAMENTO, DIVIDA PUBLICA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • PROTESTO, DECLARAÇÃO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, PRESIDENTE, CONGRESSO NACIONAL, DESRESPEITO, NICEIA PITTA, CIDADÃO, MOTIVO, DENUNCIA, PARTICIPAÇÃO, IRREGULARIDADE, GOVERNO MUNICIPAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srs. e Srªs Senadoras, o que me traz à tribuna na tarde de hoje é um tema suscitado na opinião pública diante das declarações de D. Nicéa Pitta, mas, de forma muito especial, quero tratar da questão dos precatórios relacionados ao meu querido Estado das Alagoas.  

Surpreendeu-nos a todos alagoanos uma decisão da Justiça Federal do Rio de Janeiro condenando Alagoas a resgatar sua dívida mobiliária de R$867 milhões. De fato, a condenação não é a Alagoas; de fato, a Justiça Federal condena a União a refinanciar a dívida mobiliária de Alagoas. E quando se diz "condeno a União", "condeno o Estado de Alagoas" – e como essas instituições não são discos-voadores –, quem acaba condenado a pagar a conta é o povo brasileiro. Não os senhores senadores, os grandes empresários, as grandes personalidades do poder político e econômico; quem realmente paga a conta desses processos de rolagem da dívida é a gigantesca maioria do povo brasileiro, especialmente os mais miseráveis, aqueles que, sempre, quando se cortam orçamentos, vêem os cortes na saúde, na educação, na agricultura, na segurança pública, e nunca naqueles montantes relacionados ao pagamento dos juros e serviços da dívida.  

E aí relembramos a questão da CPI dos Precatórios. É de conhecimento desta Casa – até porque a CPI dos Precatórios foi realizada aqui – o relatório apresentado pelo Senador Requião, aprovado na CPI presidida pelo Senador Bernardo Cabral. De acordo com o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito, houve uma prática comprovada de crimes, desde a montagem do que ficou corretamente chamado pela opinião pública de golpe dos precatórios. Estavam lá no relatório da CPI todos os delitos e suas autorias, que foram devidamente, fartamente apresentados à opinião pública: peculato, prevaricação, falsidade ideológica, crime do colarinho branco, enfim, tudo.  

No caso específico de Alagoas, Senador Amir Lando, além do relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa do meu Estado – de que tive a oportunidade de participar como Deputada – houve também uma importante participação do Ministério Público estadual, na pessoa do Procurador Dr. Luís Carnaúba. Além dessa comissão de inquérito que também apurou todos esses crimes, as autorias, houve uma ação popular apresentada por alguns companheiros do PT, pelo advogado Everaldo Patriota, dando conta da nulidade do processo; houve uma ação civil pública do Ministério Público estadual, para condenar os responsáveis ao ressarcimento dos prejuízos causados aos cofres públicos; houve uma ação penal contra os envolvidos no Superior Tribunal de Justiça, que, por sua vez, enviou a ação à Justiça alagoana, onde os acusados serão processados e julgados penalmente.  

O Poder Judiciário de Alagoas acatou a decisão do juiz Dr. Manuel Cavalcanti de Mello e decretou a nulidade do processo fraudulento. Daí, para surpresa de todos nós, os bancos, as corretoras e as empreiteiras recorreram da decisão da Justiça de Alagoas ao STJ e ao STF, questionando a competência da justiça alagoana para decidir sobre dívida mobiliária. Por sua vez, tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Superior Tribunal de Justiça reconheceram a legitimidade da justiça alagoana.  

Depois de todo esse processo, surpreende-nos uma decisão da Justiça Federal do Rio de Janeiro, fato no mínimo inusitado, porque imaginávamos que uma ação popular que tinha sido julgada pela Justiça de Alagoas atraísse para si todas as demandas judiciais envolvendo a mesma causa e os mesmos autores. Entretanto, os autores da ação – os bancos, as empreiteiras e as corretoras – maquiaram a ação intentada por eles mesmos junto à Justiça do meu Estado; ação essa que já tinha sido derrotada tanto pelo Superior Tribunal de Justiça quanto pelo Supremo Tribunal Federal. Com o argumento dado pelo Senado Federal, maquiaram a ação. A juíza alegou, acatando os argumentos dos bancos, das corretoras e das empreiteiras, que "a compra dos títulos fora efetuada com toda lisura, de acordo com as disposições legais e regulamentares vigentes, bem como as regras de mercado". Argumenta ainda a Justiça que a natureza da relação jurídica estabelecida está sujeita às regras legais de direito privado, nivelando-se o Estado de Alagoas em tal negócio a um particular e cabendo-lhe, por conseguinte, a obrigação de restituir aos investidores os valores pagos e a remuneração ajustada.  

Conversava há pouco com nosso querido companheiro ilustre Senador Amir Lando. Até então todos imaginávamos que cabia ao Estado, em nome do interesse público, o poder praticamente real de romper, inclusive unilateralmente, qualquer acordo ou contrato que lese o interesse público. O que eu imaginava também é que atos ilegais não geravam direitos, pois quando se julga qualquer ação de servidores públicos, imediatamente se repete a frase: "atos ilegais não geram direitos". E agora atos ilegais acabaram gerando direitos. De repente o direito passou a ser maior em função de um processo fraudulento com bases imorais e absolutamente insustentáveis juridicamente. O mais interessante é que o argumento utilizado para condenar a União a refinanciar a dívida mobiliária de Alagoas é o princípio da isonomia com o que ocorreu com São Paulo. Palavras da juíza: "Tendo o Senado autorizado o refinanciamento das dívidas de São Paulo por questões obviamente políticas, legitimou (ainda que se possa condenar tal atuação) os títulos regular ou irregularmente emitidos por entidades. Assim, por que não estender idêntico benefício àqueles contribuintes muito provavelmente dispersos pelo País, refinanciando, também, as Letras de Alagoas?"  

Aí eu me lembrei das discussões havidas aqui no Senado, quando da iniciativa desta Casa de alterar a Resolução nº 78, na qual se criou a possibilidade concreta de legitimar os títulos emitidos pela Prefeitura de São Paulo. Todos lembram o argumento usado na época. Lembro-me de que eu disse nesta Casa que aquilo era uma gigantesca esculhambação, e o Presidente do Senado inclusive ficou muito chateado com o termo utilizado. Nós, nordestinos, sabemos que esculhambação não é nenhum termo chulo, não é nenhum termo de baixo calão; é apenas uma forma simplória de a população identificar um ato que é imoral e inconstitucional. Portanto, um ato imoral, que contraria a ordem jurídica vigente, que contraria a legislação vigente, para nós, nordestinos, é caracterizado como esculhambação.  

O que se discutiu aqui? Todos lembram o argumento, todos lembram, porque a discussão ocorreu no ano passado nesta Casa. O argumento era o de que o Banco do Brasil tinha de possibilitar a rolagem da dívida de São Paulo, porque senão ele quebrava, porque havia comprometido todo seu patrimônio de praticamente R$10 milhões para colocar nas suas Carteiras um processo fraudulento dos títulos de São Paulo. Agora, essa mesma operação, que foi legitimada por esta Casa, abre as portas para estabelecer também, pelo princípio da isonomia, uma aberração, que é a de garantir a legitimidade do processo das Letras de Alagoas.  

E por que faz isso? Porque o Governo Federal legitimou esse processo fraudulento. O Governo Federal já mandou para a Comissão de Assuntos Econômicos – já está na Casa – o processo da rolagem da dívida de São Paulo. Portanto, um processo com bases imorais, absolutamente insustentáveis juridicamente, é, de acordo com o velho entendimento de que o crime compensa, legitimado pelo Governo Federal e entregue a esta Casa, como fez também em relação a Pernambuco.  

É exatamente por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que esta Casa precisa dar respostas à sociedade. Respostas que esta Casa não teve coragem de dar quando não aprovou o requerimento do Senador Osmar Dias, no qual se buscava identificar os possuidores finais desses títulos, os valores que estavam disponibilizados por possuidor final e instituições financeiras, bem como as corretoras que tinham se envolvido diretamente nessas operações. O Senado não teve a coragem política de aprovar esse requerimento. A base governista, certamente por orientação do próprio Governo, negou-se a aprovar tal requerimento. Agora a decisão deve ser tomada pela Comissão de Assuntos Econômicos. Cabe a ela a responsabilidade de acatar ou não aquilo que o Governo Federal já legitimou. Aquele processo fraudulento foi legitimado pelo Governo Federal a partir do momento em que o Banco Central encaminhou ao Senado o processo de rolagem da dívida de São Paulo.  

Exatamente por isso, Sr. Presidente, entendemos que as declarações no sentido da possibilidade de criar uma nova CPI Mista não são vazias, porque esta Casa, inclusive como parte desse processo, tem de responder à sociedade o que aconteceu depois da CPI dos precatórios. O que aconteceu depois do relatório apresentado pelo Senador Roberto Requião, que foi aprovado pela Comissão? O que ocorreu com todos os Estados que, conforme foi mostrado à opinião pública, fizeram um processo fraudulento? Foram identificados crimes de peculato, de prevaricação, de falsidade ideológica, de colarinho branco etc. E o que acontece hoje? O Governo Federal legitima um processo fraudulento dando as garantias legais que ele não teve em nenhum outro momento.  

O Sr. Amir Lando (PMDB – RO) – Senadora Heloisa Helena, V. Exª concede-me um aparte?  

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT – AL) – Ouço V. Exª com prazer.  

O Sr. Amir Lando (PMDB – RO) – Nobre Senadora Heloisa Helena, V. Exª, com brilho e emoção, trata de um tema que hoje volta, com estrépito, à imprensa nacional. V. Exª tem toda a razão: esse é um capítulo que, embora investigado por uma CPI, possui muitos pontos obscuros que precisam ser elucidados para que se possa punir os que auferiram vantagens ilícitas com a emissão de títulos para pagamento dos precatórios. O assunto é abordado não de forma didática, como V. Exª faz neste momento, mas com um amargo teor de frustração e, por outro lado, em um pacote que embrulham muitos aspectos. Aproveitando o brilhante discurso de V. Exª, quero dizer que o processo possui três bases. Em primeiro lugar estão os Estados e os Municípios que, realmente, detinham um estoque de precatórios. Em segundo lugar, o Banco Central, a quem cabia fiscalizar. A Constituição apenas autorizava a emissão dos títulos, que nada mais significa do que a busca de dinheiro no mercado; um empréstimo que Estados e Municípios poderiam fazer sob o limite do valor dos precatórios. Cabia ao Banco Central fiscalizar, mas os processos passaram em brancas nuvens e de maneira fraudulenta, como a CPI demonstrou. No entanto, ninguém do Banco Central foi chamado para responder sobre essa culpa ou essa imensa fraude que aconteceu. O Banco Central passa a uma outra instância de fiscalização, o Senado Federal, e ninguém levantou qualquer suspeita contra o Senado, mas certamente poderia ter havido alguns atos ilícitos praticados por aqueles que são responsáveis pelo setor, especialmente na CAE. Hoje, todos vêem que alguns nomes são citados – e não quero aqui me referir, de maneira nenhuma, a que os precatórios envolveram Senadores; mas, de repente, tudo pode voltar à tona, haja vista que, na época, esse ponto não foi devidamente explicitado. Ora, quem esconde uma parte da investigação não chega aos responsáveis, àqueles que realmente extraíram vantagens ilícitas, desde os primeiros compradores, os chamados "laranjas", aquelas empresas que se favoreceram fazendo as primeiras compras, as corretoras, as subcorretoras – e algumas sequer tinham o caráter, a dimensão e a estatura institucional necessários –; e depois, evidentemente, os compradores finais, aqueles que adquiriram os títulos por valores bem superiores àqueles pagos aos Estados e Municípios. Essa vantagem, esse delta, o que se chamou à época de "cadeia da felicidade", ao meu ver, foi exatamente a parte da locupletação, da roubalheira, sendo que ninguém esclareceu quem ganhou com essas vantagens. Foi o rato que roeu?! Este é o ponto: ou elucidamos e descobrimos quem são os responsáveis, ou esse capítulo dos precatórios marchará. O Senado e o Governo Federal têm convalidado essas operações, e, hoje, praticamente, abriu-se a porta. Quando se votou eu levantei a questão de que se estava abrindo a porta não apenas para a situação de São Paulo, mas para todo o escândalo dos precatórios. A porta está aberta; só não entra quem não quer. Lembrando o carnaval, sobretudo o de Pernambuco, onde a letra do frevo diz que "só não vai quem não quer". Muito obrigado, Excelência.

 

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT – AL) – Agradeço o aparte de V. Exª, Senador Amir Lando. Penso realmente que esta Casa deve dar uma resposta à sociedade em duas questões. Como V. Exª levanta, a CAE, efetivamente, tem permitido que o Governo Federal, erroneamente, legitime um processo fraudulento. Esta Casa tem, como tarefa nobre, fiscalizar os atos do Poder Executivo. Esta Casa precisa explicar à sociedade porque estabeleceu delitos, crimes, irregularidades de determinadas personalidades políticas numa CPI e porque, ao mesmo tempo em que fez isso, permite que o Governo Federal legitime uma operação fraudulenta. O Governo Federal está, pois, legitimando uma operação fraudulenta. Nós, do Senado, que temos como tarefa nobre fiscalizar os atos do Poder Executivo, efetivamente estamos nos omitindo, trabalhando como cúmplices diante de uma operação fraudulenta, a fim de encobrir outra operação fraudulenta, imoral e absolutamente insustentável juridicamente, como a que trata da rolagem da dívida, incluindo os precatórios.  

Eu não gostaria, Sr. Presidente, de entrar em todos os detalhes a respeito das denúncias feitas pela Srª Nicéa Pitta; aliás, de fato, a grande discussão que tomou conta da Nação brasileira foi menos as declarações dadas do que o instrumento utilizado para possibilitar que essas chegassem às casas de milhões de brasileiros.  

Com certeza, o que mais surpreendeu e gerou comentários nos subterrâneos da política foram menos as declarações do que o fato de a Rede Globo , a maior estrutura de comunicação do Estado, estar possibilitando que denúncias envolvendo inclusive grandes personalidades da política nacional fossem veiculadas.  

É evidente que essas denúncias serão apuradas, quer seja com a possibilidade de criação de uma CPI Mista do Congresso Nacional, para revisitar a questão fraudulenta dos precatórios, quer seja pela instituição de uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara de Vereadores de São Paulo, ou ainda, pelo Conselho de Ética do Senado Federal.  

Todavia, enquanto estabelecemos as instâncias nas quais a discussão deva ser desenvolvida, eu não poderia, Sr. Presidente, deixar de registrar na Casa o meu protesto diante das declarações do Sr. Presidente do Senado no sentido de deslegitimar as denúncias feitas pela Srª Nicéa Pitta.  

É evidente que as denúncias serão apuradas nas instâncias de decisão, nos fóruns em que efetivamente devem ser analisadas. Entretanto, é inadmissível que o Presidente do Congresso Nacional se dirija a uma mulher que lhe fez uma acusação pública chamando-a de prostituta. Quero, pois, que fique registrado o meu protesto! O Presidente do Senado não representa apenas S. Exª, mas as mulheres e os homens que compõem esta Casa. Não me sinto representada quando o Presidente do Congresso Nacional se pronuncia de tal forma. Que S. Exª se dirija com indignação diante de qualquer denúncia é compreensível. A indignação deve existir diante da acusação, jamais assumindo uma conduta preconceituosa, machista, conservadora, desqualificada, atribuindo a uma mulher o título de prostituta por ter feito uma denúncia. Que S. Exª responda às denúncias feitas com indignação, que qualquer pessoa pode ter, jamais utilizando-se de um comportamento desqualificado como esse.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) – V. Exª me permite um aparte?  

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) – Concedo o aparte a V. Exª.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) – Senadora Heloisa Helena, procurarei ser breve até porque também pretendo tratar do assunto que V. Exª levanta, no final da tarde, quando fizer meu pronunciamento. Em primeiro lugar, ressalto uma das afirmações de V. Exª em que disse que o relatório da CPI dos Precatórios se constituiu num trabalho extremamente sério, em que houve o empenho, o esforço, a inteligência, a capacidade, com a dedicação total ali consubstanciada do Senador Roberto Requião, que foi extremamente rigoroso durante todo o trabalho da CPI dos Precatórios e na sua conclusão. E foram encaminhados ao Ministério Público todos os fatos graves, objetos da averiguação, e as responsabilidades; verificaram-se quais os títulos emitidos com os recursos utilizados para outras finalidades que não o pagamento dos precatórios para diversas Unidades da Federação e Municípios, dentre os quais o Estado de Alagoas e o Município de São de Paulo. E isso foi encaminhado ao Ministério Público, que cumpriu o seu dever e formulou as denúncias. No caso do Município de São Paulo, inclusive, o próprio Prefeito Celso Pitta, em primeira instância, foi objeto de condenação; recorreu, e isso ainda está sendo objeto de exame pela Justiça. Ainda há um trabalho sendo realizado pela Procuradoria do Estado de São Paulo, no Rio de Janeiro, em Pernambuco e em Alagoas. À medida que o noticiário, inclusive da própria Rede Globo , não disse isso com muita clareza, nós precisamos aqui fazê-lo. Parece que o Deputado Miro Teixeira, ao propor a realização de uma CPI sobre os precatórios, não leu o relatório, pois fez afirmações como se o Senado Federal não tivesse realizado um trabalho sério e bem feito sobre os precatórios. Uma coisa é o que aqui foi realizado, concluído e encaminhado ao Ministério Público; outra coisa é aquilo que o Governo Federal e a própria Justiça têm feito. Há um outro aspecto muito importante, qual seja, a renegociação dos títulos do Município de São Paulo, que estão sendo objeto de decisão, nos próximos dias, pelo Senado Federal. Estranhamente, o Ministério da Fazenda aceitou que esses títulos fossem renegociados por trinta anos, quando aqueles que têm irregularidades quanto à emissão e utilização dos seus recursos, de acordo com o que o próprio Senado havia decidido anteriormente, não poderiam ser objeto de negociação por trinta anos. Essa é uma decisão muito importante que a Comissão de Assuntos Econômicos e o Plenário do Senado deverão tomar nos próximos dias. O depoimento da Srª. Nicéa Pitta constitui-se em algo de extraordinária importância política. Não é à toa, Senadora Heloisa Helena, que, ao sair às ruas hoje de manhã, na cidade de São Paulo, em todos os lugares, na esquina mesmo da minha rua, em outros quarteirões, num ponto de ônibus, num ponto de táxi, todas as pessoas me pararam para comentar da importância das revelações da Srª Nicéa Pitta sobre o comportamento do Prefeito Celso Pitta e dos vereadores. Segundo ela, muitos daqueles que constituem a base do Prefeito Celso Pitta acabaram aceitando presentes e pagamento em dinheiro para votar por conclusões de interesse do Prefeito e para que S. Exª não fosse impedido. Ela fez revelações sobre o procedimento de um dos ex-Senadores desta Casa, o Senador Gilberto Miranda, sobre diversos outros assuntos e, inclusive, relativamente ao próprio.  

O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) – Eminente Senador Eduardo Suplicy, V. Exª está devidamente inscrito e poderá se reportar a esse assunto posteriormente.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) – Vou apenas concluir em relação ao que a Senadora Heloisa Helena mencionou. No episódio relativo à revista IstoÉ, o Senador Antonio Carlos Magalhães, nosso Presidente, reagiu de maneira muito brusca e que pode ser considerada ofensiva. V. Exª chamou a atenção para esse fato, inclusive pela imprensa, dizendo que caberia um outro tipo de procedimento. Dessa vez, o Senador Antônio Carlos Magalhães reagiu de uma maneira que eu também não recomendaria. V. Exª, como mulher, ao chamar a atenção sobre o procedimento do Senador Antonio Carlos Magalhães, contribui para com o Presidente do Senado. S. Exª precisa estar consciente de que V. Exª, como mulher e Senadora, ao dizer aqui que o procedimento dele deve ser outro, diante de uma observação como a feita pela Srª Nicéa Pitta, está contribuindo para que pense na melhor maneira de realizar a sua defesa, e não com ofensas à mulher, à mãe brasileira.  

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT – AL) – Agradeço o aparte de V. Exª.  

Senador Carlos Patrocínio, sei da delicadeza de V. Exª, permitindo que eu permaneça na tribuna quase o dobro do tempo. Apelo mais uma vez a esta Casa que não se torne mais cúmplice do que já está sendo, diante da legitimidade que está sendo dada pelo Governo Federal a um processo fraudulento, imoral e insustentável juridicamente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2000 - Página 4230