Discurso durante a 12ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ANALISE DA SITUAÇÃO DA MULHER EM VARIAS PARTES DO MUNDO, A PROPOSITO DO DIA INTERNACIONAL DA MULHER.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • ANALISE DA SITUAÇÃO DA MULHER EM VARIAS PARTES DO MUNDO, A PROPOSITO DO DIA INTERNACIONAL DA MULHER.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2000 - Página 4252
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, MULHER, MUNDO, LUTA, OBTENÇÃO, DIREITOS, DIGNIDADE, RECONHECIMENTO, IMPORTANCIA, PARTICIPAÇÃO, SOCIEDADE, OPORTUNIDADE, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso.) – Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o núcleo principal de todas as minhas propostas e todos os meus atos na vida pública têm sido enfrentar e denunciar as injustiças, quaisquer que sejam, concentrando-me todavia naquelas que atingem os segmentos mais desprotegidos da sociedade, particularmente as crianças e as mulheres.  

Esta é uma postura inabalável. Como prova do que afirmo, cito o discurso com que inaugurei no já longínguo 8 de março de 1975, o meu primeiro mandato de Deputado Federal. Naquele dia, a Câmara festejava o Dia Internacional da Mulher. Com o ardor da juventude e uma consciência que a vida só fez consolidar desde então, fiz minha estréia enfocando os direitos da mulher, sua dignidade, sua importância em qualquer sociedade que se pretenda civilizada e moderna.  

Hoje, 25 anos depois, posso afirmar que pouco mudou: os cabelos estão brancos, o meu Partido é o sucessor do glorioso e vitorioso MDB, o Plenário a que falo é outro, como Senador da República, mas a disposição e a chama sagrada de não esmorecer continuam igualmente firmes. E é com esse espírito que convido os meus nobres Pares a comigo festejarem o muito que já foi conseguido neste meio século, mas também a exigir o que ainda está por ser construído para fazermos de todo dia o Dia da Mulher, como ela merece.  

A comemoração formal ocorreu no último dia 8, dentro do calendário internacional, que, inclusive, recebe o patrocínio da Organização das Nações Unidas, mas, em virtude da suspensão dos trabalhos legislativos no chamado "período carnavalesco", o Congresso Nacional optou por promover diversas solenidades na semana que hoje começa. O ponto alto será a sessão conjunta na manhã da próxima quarta-feira, após a qual será celebrado um ato simbólico com a presença das Senadoras e Deputadas Federais da presente legislatura, aguardando-se, também, o comparecimento de convidadas especialmente escolhidas.  

O programa oficial começará a ser cumprido amanhã, com a abertura de uma exposição sobre "Mulheres Indígenas", no Anexo II da Câmara dos Deputados. A meu ver, esse clima festivo e caloroso em torno do evento deve começar hoje mesmo, convicção que me conduziu à tribuna do Senado Federal.  

Acredito não estar incorrendo em hipérbole histórica, se afirmar que "tudo é uma questão de consciência e de tempo". Afinal, a discriminação que atinge a mulher é, no fundo, um problema cultural, e, portanto, exige tempo para ser efetivamente resolvido.  

Isso não implica, todavia, deixar tudo por conta do "tempo". É preciso lutar e avançar, a cada minuto do dia-a-dia; não ter medo de apontar, denunciando, com vigor e indignação, a condição de escravas, na mais tenebrosa submissão compulsória que muitas enfrentam nas regiões remotas e mais atrasadas do Planeta; lembrar às mulheres modernas e vitoriosas do Brasil que suas conquistas serão sempre precárias, enquanto persistirem situações como a do Afeganistão, onde suas semelhantes se vêem obrigadas a cobrir todo o corpo e, se dele deixarem expostas qualquer parte, podem ser apedrejadas até a morte.  

Há que protestar contra a barbárie da chamada "circuncisão" feminina, tão comum na África e nos países islâmicos, que mutila a genitália das meninas – e repudiar as alegações de que "isso não pode mudar, porque faz parte da cultura daquelas nações". Ora, se nos deixarmos levar por essa indigente simplificação, estaremos apoiando coisas que vão desde a chamada "lei da bofetada", nos lares dominados por ignorantes, até o canibalismo e o enterro de viúvas – vivas! – ao lado dos cadáveres dos maridos.  

A Declaração que rege a atuação ética e social da ONU tem sua forma justamente na universalidade, no fato de ser uma evolução do princípio básico da Revolução Francesa; vale para todas as nações e raças; não privilegia nem discrimina nenhuma cor de pele ou conformação genital. É o "Ser Humano", em sua inteireza, que merece o reconhecimento do direito à dignidade, ao trabalho, ao respeito em termos de cidadania e do papel a desempenhar no grande palco ao qual Deus nos conduziu.  

Quando uma afegã é lapidada por ensandecidos fanáticos, o crime atinge TODAS as mulheres do mundo, porque, até mesmo nas sociedades mais progressistas, sempre haverá um psicopata aplaudindo, ainda que silenciosamente, aquela covarde repressão.  

E, talvez, esses trogloditas sejam em maior número e estejam mais próximos de nós do que supomos. Basta consultar, em qualquer cidade brasileira, as notícias sobre torturas psicológicas e físicas de mulheres; lembrar que no próprio lar, não raro, as meninas ficam em patamar inferior aos irmãos, discriminadas até na própria educação; vítimas de conceitos arcaicos, fundados na insensatez de que "o homem pode tudo", enquanto se negam à mulher direitos iguais. Para elas, nem tudo é "adequado".  

Quantas esposas, embora livres de maus tratos físicos, sofrem pressões psicológicas, são obrigadas a assumir todas as responsabilidades do lar, mesmo tendo de lutar em suas próprias carreiras profissionais? Jamais esqueçamos que o direito de trabalhar, por incrível que pareça, é uma conquista, onde a mulher deu o primeiro passo para igualar-se ao homem em direitos e deveres – embora já tenha, hoje, a triste consciência de que se sobrecarregou com uma dupla jornada, doméstica e externa, e que seu salário é, quase sempre, inferior à média do que recebem os colegas masculinos.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, façamos um esforço de sincera lealdade a respeito de nossas companheiras: quantos homens assumem a existência dessa discriminação salarial e hierárquica em seus locais de trabalho?  

É importante, porém, afirmarmos os fatos positivos já registrados nessa luta, em prol da dignidade e da afirmação da mulher: ela, no Século XX, conquistou reais progressos familiares, sociais e profissionais. Vemos, com alegria e respeito, mulheres exercendo as mais importantes funções, no setor público e nas atividades privadas, notáveis pela competência, honestidade e responsabilidade.  

Mas nada foi gratuito: elas se prepararam e venceram; tudo o que têm foi arduamente conquistado.  

No campo institucional, a cidadania plena surgiu em 1926, quando, no Rio Grande do Norte, a mulher votou pela primeira vez. Pouco depois, em 1932, no Governo de Getúlio Vargas, proclamou-se a maioridade política de todas as brasileiras; e, desde então, elas, que eram consideradas "sexo frágil", passaram a ter um expressivo peso no processo eleitoral – peso, no mínimo, igual ao dos homens. Aliás, nunca perdi de vista uma lição do grande estadista de São Borja: "as mulheres decidem as eleições".  

O mundo inteiro está aprendendo a valorizar a mulher. No Irã, foi-lhe dada a prerrogativa de votar e ser votada – e muitas passaram a integrar o Parlamento. No Brasil, por seu talento e sua competência, ganharam o direito de, nas eleições, representar, no mínimo, 30% das chapas dos partidos, medida que mereceu meu mais dedicado e incondicional apoio.  

Agora, fazemos votos de que outros países sigam o exemplo que lhes damos e emancipem, civil e politicamente, suas mulheres, para serem dignos do título de "civilizados".  

Não posso deixar de fazer um registro particular sobre a condição afirmativa vivida pelas mulheres acreanas. É uma sucessão de momentos vitoriosos, que resultam na presença, hoje, neste Plenário, da Senadora Marina Silva. Mas todos sabemos que os caminhos trilhados por S. Exª foram, na verdade, abertos e consolidados por outras mulheres admiráveis, que reverencio mais uma vez, com o justo orgulho de afirmar: no Acre, as mulheres se impuseram em níveis muito acima da média das demais brasileiras e fizeram por merecer o pleno reconhecimento de sua importância social e política.  

A primeira governadora da História do Brasil, Iolanda Fleming, é acreana; uma das Senadoras pioneiras foi Laélia Alcântara, representante do Acre; hoje, Regina Lino, enfrentando covardes e injustificáveis campanhas, luta para implantar a democracia fundiária em nosso Estado. As acreanas Miraceli de Souza Lopes Borges e Eva Evangelista de Araújo Souza somam aos méritos de juristas e cidadãs exemplares a glória de terem sido as primeiras desembargadoras do País.  

Lamento que os inevitáveis limites do tempo regimental não me permitam relacionar tantas outras grandes conterrâneas que lutaram na Revolução Acreana, ombreando-se aos homens; e, nos seringais, dividiram com os maridos a tarefa de encaminhar os filhos no rumo do trabalho honesto. Muitas, inclusive, foram forçadas a assumir sozinhas a grande e nobre tarefa de criar as famílias.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estou verificando na lista de homenageadas pelo Congresso Nacional que as mulheres brasileiras, nesses cinco séculos, destacaram-se como guerreiras, intelectuais, artistas, líderes políticas, representantes das aspirações comunitárias e precursoras na conquista de direitos básicos quanto à gestão dos próprios destinos. É um mosaico onde encontramos, lado a lado, Ana Neri, Leila Diniz, Olga Benário, Cacilda Becker, Zuzu Angel, Xica da Silva. Todas, de fato, responsáveis por páginas importantes na história da afirmação da condição feminina em nosso País.  

Mas, no tocante às grandes heroínas, consagradas nos campos de batalha onde se forjou a nacionalidade, faltam as mulheres participantes da guerra que resultou na anexação ao Brasil das terras que hoje delimitam o Estado do Acre. Ao lado de nome famosos como os de Anita Garibaldi e Maria Quitéria, devemos reverenciar Angelina Gonçalves, combatente destemida e vitoriosa, que assumiu as armas do marido morto e enfrentou com galhardia as tropas bolivianas.  

Angelina Gonçalves, todavia, não foi a única acreana a assombrar o inimigo. Na região conflagrada, as mulheres, por uma forma ou outra, sempre se destacaram nos trabalhos de retaguarda. E afirmo com orgulho e convicção: sem elas, os combatentes do exército liderado por Plácido de Castro dificilmente teriam obtido as brilhantes vitórias que deram ao mapa da Amazônia brasileira seus atuais contornos.

 

Ao concluir, como sempre, olho para o futuro e nele encontro o desafio maior, que espera pela Humanidade, no Século XXI que se avizinha: conscientizar homens e mulheres, finalmente, de que não são competidores, mas sim, complementos um do outro. Que em todos os países, nas mais diversas nações, o respeito ao ser humano seja igualitário e incondicional.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2000 - Página 4252