Discurso durante a 15ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEFESA DA APROVAÇÃO DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E DA CRIAÇÃO DE UM PROGRAMA DE SANEAMENTO FINANCEIRO DOS MUNICIPIOS.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO FISCAL. ESTADO DO PARANA (PR), GOVERNO ESTADUAL.:
  • DEFESA DA APROVAÇÃO DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E DA CRIAÇÃO DE UM PROGRAMA DE SANEAMENTO FINANCEIRO DOS MUNICIPIOS.
Aparteantes
Carlos Wilson.
Publicação
Publicação no DSF de 17/03/2000 - Página 4627
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO FISCAL. ESTADO DO PARANA (PR), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • ELOGIO, GOVERNO FEDERAL, TENTATIVA, CONTROLE, DIVIDA PUBLICA, BRASIL, DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR (PLP), DEFINIÇÃO, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL, POSSIBILIDADE, INICIO, ORGANIZAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, BENEFICIO, EMPREGO, POLITICA SALARIAL.
  • EXPECTATIVA, CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE TRIBUTARIA, BENEFICIO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, PARTICIPAÇÃO, SOCIEDADE, PROCESSO, ORÇAMENTO, FISCALIZAÇÃO, REDUÇÃO, CONFLITO, NATUREZA FISCAL, ESTADOS.
  • CRITICA, ESTADOS, IRREGULARIDADE, ANTECIPAÇÃO, RECEITA, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO PARANA (PR), DESCUMPRIMENTO, RESOLUÇÃO, SENADO.
  • DEFESA, DISCUSSÃO, GOVERNO FEDERAL, MUNICIPIOS, PROGRAMA, SANEAMENTO, FINANÇAS.

O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB – PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o passado nos honrou com o pagamento de uma dívida pública insuportável. Não podemos permitir que o presente onere as gerações futuras com uma dívida pública impagável.  

Confesso que, pela primeira vez nesses anos, vejo o Governo Federal verdadeiramente empenhado em estabelecer mecanismos rigorosos de controle do endividamento público brasileiro, com a Lei de Responsabilidade Fiscal, que tive a satisfação de relatar na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. O parecer, acolhido integralmente pela Comissão, está sendo analisado agora pela Comissão de Assuntos Econômicos, cujo relator é o Senador Jefferson Péres. A continuidade da tramitação da matéria visa à aprovação dessa lei fundamental para o futuro do nosso País.  

Tenho dito – e creio ser necessário repetir sempre para calar fundo na consciência política nacional – que a dívida pública é inegavelmente a matriz dos maiores problemas econômicos e sociais que assolam a Nação brasileira. O crescimento exorbitante da dívida traz à população, sobretudo a trabalhadora, sacrifícios sem precedentes em nossa História. É evidente que o Governo é obrigado a praticar altas taxas de juros em função das exigências para a rolagem da dívida pública. Com a prática de altas taxas de juros, elimina-se a poupança interna e liquida-se a possibilidade de investimento suficiente no setor produtivo para atender à demanda necessária à geração de empregos. Portanto, Sr. Presidente, sem o controle das finanças públicas de forma rigorosa e competente, todo o esforço nacional pela estabilização econômica redundará em grande frustração. Sem que haja organização das finanças públicas, a luta pela geração de empregos em um país que é hoje considerado o terceiro do mundo com relação à taxa de desemprego será mais uma lamentável frustração. Sem o controle dos gastos públicos do nosso País e a responsabilização fiscal, o combate à miséria ficará no discurso.  

A conclusão do debate sobre política salarial, teto, salário mínimo será também mais um derrota dos bem-intencionados, porque, indiscutivelmente, sem organização administrativa competente, sem equilíbrio fiscal, sem controle de gastos, fatores que resultam num endividamento insuportável dos entes públicos brasileiros, não chegaremos à estabilização da economia e à solução dos problemas econômicos e sociais do País.  

É evidente que a inflação será sempre uma ameaça velada. A inflação é filha da desorganização financeira.  

Sem dúvida, Sr. Presidente, Srs. Senadores, esse instrumento poderoso, que é a Lei de Responsabilidade Fiscal, pode iniciar um processo de organização da Administração Pública brasileira pela força da pressão; pode, sem dúvida, significar a mudança da cultura da administração do País.  

O que pretende o projeto da lei de responsabilidade fiscal? Estabelecer normas de finanças públicas para a consolidação da responsabilidade na gestão fiscal para a União, os Estados e os Municípios; introduzir conceitos novos, como os de responsabilidade e de transparência; estabelecer limites e regras para as principais variáveis, inclusive regras mais rígidas para o final de mandato; criar mecanismos para o cumprimento dos objetivos e metas, prevenção de riscos e correção de desvios que seriam capazes de afetar o equilíbrio das contas publicas e estabelecer penalidades institucionais quando forem desobedecidas as regras.  

Quais são os principais objetivos da lei? Buscar o equilíbrio entre as aspirações da sociedade e os recursos que ela coloca à disposição do Governo, visando ao ajuste estrutural e permanente das contas públicas, a prevenção de déficits moderados e reiterados, a limitação da dívida pública a nível prudente, compatível com a receita e com o patrimônio público, propiciando margem de segurança para a absorção dos efeitos de eventos imprevistos; a preservação do patrimônio público, em nível adequado para propiciar margem de segurança para absorção de efeito de eventos imprevistos; adoção de política tributária previsível e estável; transparência na elaboração e na divulgação dos documentos orçamentários e contábeis em linguagem simples e objetiva.  

Eis a questão: cumprimento. Essa lei é para valer ou é mais uma que servirá para o deleite dos estudiosos, para enfeitar bibliotecas e prateleiras nas esferas administrativas do setor público? Digo isso porque infelizmente os dispositivos legais de que dispomos hoje nem sempre são respeitados. Há um descumprimento reiterado, que vai desde o Poder Executivo até o Congresso Nacional, especialmente o Senado da República, responsável pela avaliação do endividamento público do País, uma vez que compete a esta Casa autorizar a rolagem de dívidas e a contratação de novas dívidas pelos Estados e até pela União, incluindo os empréstimos externos.  

Tem sido, lamentavelmente, o descumprimento da legislação vigente um desestímulo a que se estudem e se aprovem novas propostas de lei que possam regular a administração pública no País. No entanto, agora, há também, nessa Lei de Responsabilidade Fiscal, um avanço e uma esperança de que poderemos chegar mais próximos daquilo que consideramos ideal relativamente ao respeito às instituições públicas brasileiras e sobretudo à legislação vigente.  

É a transparência e o controle social. A Lei de Responsabilidade Fiscal incentiva a participação popular no processo orçamentário, e esse é um passo inegável à frente.  

O relatório resumido da execução orçamentária será divulgado bimestralmente, conterá avaliação das metas e a ele se dará amplo acesso ao público, inclusive por meio eletrônico, bem como se dará acesso ao Ministério Público a todas as informações, também bimestralmente, possibilitando, já de imediato, uma ação pública que possa conter determinados abusos.  

O Poder Executivo será obrigado a avaliar o cumprimento de metas fiscais em audiência pública a cada quadrimestre. Os resultados não consistentes com as metas fixadas devem ser justificados, apontando as razões do afastamento, as medidas que serão adotadas para o retorno e o tempo necessário para que surtam efeito.  

Sem dúvida, Sr. Presidente, Senador Lúdio Coelho, há uma esperança de que a lei possa ser respeitada, cumprida, de forma absoluta, graças à fiscalização da sociedade, notadamente nesses tempos em que a imprensa tem tido o maior interesse em denunciar a classe política. Esse instrumento legal oferece espaços gigantescos à denúncia e certamente contribuirá para que a transparência proposta possa resultar numa constante fiscalização, por parte da opinião pública brasileira, dos atos administrativos dos governantes.  

Uma outra questão, ainda ontem aqui debatida, é a chamada guerra fiscal. Creio que a Lei de Responsabilidade Fiscal venha também para regulamentar e evitar essa batalha estúpida entre os Estados, que lutam desesperadamente, fazendo às vezes concessões até irresponsáveis para obter meia dúzia de empregos com a instalação de determinados equipamentos industriais.  

Haverá uma regulamentação, uma definição de anistia, de remissão, de subsídio, de crédito presumido, de isenção em caráter não geral, de alteração de alíquota ou modificação da base de cálculo que implique redução de tributos ou contribuições. E toda renúncia fiscal deve estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário- financeiro por três anos.  

O Sr. Carlos Wilson (PPS – PE) – V. Exª me permite um aparte, Senador Álvaro Dias.  

O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB – PR) – Com prazer, dentro em breve, Senador Carlos Wilson. Quero apenas completar este item do meu pronunciamento, e concederei o aparte a V. Exª.  

Alguns Estados têm sido até mesmo irresponsáveis ao não definir, estudar ou avaliar o impacto orçamentário e financeiro das concessões milagrosas que são feitas, atendendo, muitas vezes, o marketing político dos que estão trabalhando para gerar empregos, embora, na verdade, a conseqüência possa ser exatamente o oposto, ou seja, a redução das oportunidades de trabalho para os brasileiros desempregados.  

Toda renúncia deve demonstrar que foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária e não afetará as metas previstas na LDO. Deverá, também, haver compensação por aumento de receita proveniente de elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.  

É preciso sanção para quem não instituir, prever e arrecadar impostos de sua competência: suspensão de transferências voluntárias. Se essa lei estivesse em vigor, estaríamos assistindo à suspensão de transferências voluntárias do Governo Federal a várias unidades da Federação.  

Creio que a Lei de Responsabilidade Fiscal, devidamente respeitada, poderá, portanto, dar um paradeiro a essa guerra fiscal, em que, sem dúvidas, só há derrotados.  

Concedo um aparte, com satisfação, ao Senador Carlos Wilson.  

O Sr. Carlos Wilson (PPS – PE) – Senador Álvaro Dias, peço desculpas por interromper o belo pronunciamento de V. Exª, mas meu entusiasmo é grande, porque V. Exª toca em um ponto que reputo o mais importante que este Congresso votou nos últimos anos – no caso, a Câmara dos Deputados, já que o projeto ainda tramita aqui no Senado Federal –, que é a Lei de Responsabilidade Fiscal. Essa lei vai acabar com a farra de gastos exagerados por parte de governantes, mencionada por V. Exª com muita precisão, e também com a guerra fiscal, que não leva a nada. Enfim, como V. Exª diz, para fazer marketing usando a questão do desemprego, muitos atraem investimento para seus Estados, por hoje disporem de uma estrutura de comunicação muito forte, e passam para a população o falso alento de que estão gerando emprego para aquele Estado. No final, deixam o Governo, vão embora e o rombo fica no Estado. Então, a Lei de Responsabilidade Fiscal tem de ser agilizada, tendo de ser votada o mais rapidamente possível no Senado. Ela tem de entrar em vigor imediatamente, para inibir, já nas próximas eleições municipais, os abusos, as irresponsabilidades, principais marcas das eleições. Não acredito que ela vá, de uma forma precisa, coibir os abusos nas eleições municipais, mas, com certeza, vai inibi-los. Então, quando V. Exª trouxe esse assunto à tribuna, fiquei realmente interessado em aparteá-lo e parabenizá-lo. V. Exª, que pauta a sua atuação pela seriedade, mais uma vez traz uma grande contribuição ao Senado Federal e ao País.

 

O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB - PR) – Muito obrigado, Senador Carlos Wilson. V. Exª, que governou um Estado, sabe da importância de uma Lei de Responsabilidade Fiscal, especialmente porque, lamentavelmente, nem todos os governantes atuam com bom senso, com probidade, com sensibilidade pública e respeito à sociedade. Para esses, uma Lei de Responsabilidade Fiscal deve ser a mais rigorosa possível, principalmente nos anos eleitorais, nos anos de campanha eleitoral.  

Encontramos um exemplo desse abuso durante a campanha eleitoral especialmente no processo de reeleição, no item Restos a Pagar. Se analisarmos o quanto cresceu esse item em determinados Estados, chegaremos a ter uma visão do inferno. No Paraná, por exemplo, no ano eleitoral, esse crescimento foi de 38.000% em relação a anos anteriores. O projeto vai também estabelecer normas rigorosas em relação a esse item.  

Há outra questão, a da antecipação de receita, agora em debate no Congresso Nacional, porque irregularidades foram praticadas nos últimos anos por alguns governos estaduais. A lei estabelece também, rigorosamente, exigências para que se possibilite antecipação de receita. Essa questão está em debate e creio que devo trazer aqui um subsídio àqueles integrantes da Comissão de Assuntos Econômicos que haverão de interpelar representantes do Banco Central e da Petrobrás sobre ela.  

Trago aqui um documento técnico do Tribunal de Contas do Paraná que diz o seguinte:  

Ainda com relação à arrecadação estadual, insta ressaltar os Acordos por Antecipação da Receita , que, em 1998, somaram R$212.000.000,00 de recursos que ingressaram nos cofres públicos. Empréstimos estes contraídos junto principalmente à Copel e demais empresas privadas, em dezembro de 1998, numa demonstração clara de insuficiência de caixa principalmente para honrar compromissos com o funcionalismo público, cujos resultados foram sentidos neste ano de 1999, com o pagamento ou compensação desses recursos na arrecadação, vez que os recursos foram gastos antes de serem arrecadados .  

Valores:  

Indústria Brasileira de Bebidas – SPAIPA .............R$15 milhões;  

Companhia Paranaense de Energia – Copel.......R$122 milhões;  

Cimento Rio Branco S/A – Votoram.......................R$15 milhões;  

Petróleo Brasileiro S/A – Petrobrás........................R$60 milhões;  

Total de Acordos (1998)....................................R$212 milhões . 

No ano de 1999, outras antecipações foram concretizadas.  

Para firmar esses acordos, a Secretaria da Fazenda tem buscado o amparo legal do Código Tributário Nacional, em especial a figura da compensação do crédito tributário . Nessas operações, o Estado recebe antecipadamente os recursos das empresas, comprometendo-se a "compensar" esses valores nas guias de recolhimento do ICMS, ocasião em que também são compensados os encargos contratados (taxa média DDI + 2% sobre o saldo devedor).  

Como os recursos foram antecipados ao Estado e não compensados, reveste-se essa operação das características inerentes aos Empréstimos por Antecipação da Receita e, neste passo, observam-se as disposições contidas na Resolução nº 78/98 do Senado Federal, que veda aos Estados contratar operações de crédito, " captar recursos por meio de transferências oriundas de entidades por eles controladas, inclusive empresas nas quais detenham, direta ou indiretamente, maioria do capital social com direito a voto, ainda que a título de antecipação de pagamento ou recolhimento de tributos ." 

Ainda tais acordos foram liquidados em parcelas durante o exercício de 1999, ou seja, fora do prazo também definido por aquela Resolução: "até dez dias úteis antes do encerramento do exercício em que forem contratadas "; também "é vedada a contratação de operações de crédito nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do Chefe do Poder Executivo do Estado...".  

Outra agressão à Resolução, porque essa antecipação de receita, concretizando-se em verdadeiros empréstimos, deu-se exatamente no último mês da gestão do Governo.  

Portanto, conclui-se que o Estado, ao realizar esses acordos, distorceu a natureza da operação, a fim de não caracterizá-la como antecipação de receita e, dessa forma, escapar às imposições a que estaria sujeita, numa demonstração clara de insuficiência de caixa, principalmente para honrar compromissos com o funcionalismo público. Os resultados foram sentidos no ano de 1999, com o pagamento ou a compensação desses recursos na arrecadação, vez que os recursos foram gastos antes de serem arrecadados.  

Pois bem, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já recebo aqui a convocação para o encerramento do discurso. Concluo então afirmando que esses abusos serão rigorosamente punidos se essa Lei de Responsabilidade Fiscal – que, não tenho dúvidas, será aprovada no Senado Federal – for rigorosamente cumprida. No entanto, é preciso que o Governo, a fim de contribuir para o ajuste fiscal, discuta com os prefeitos municipais um programa de saneamento financeiro, porque muitos municípios brasileiros estão impossibilitados de cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal neste ano sem um programa de saneamento financeiro. O Governo Federal já o realizou com os governos estaduais, já o fez com prefeituras de capitais, entes públicos mais poderosos do que os pequenos Municípios brasileiros, arquejantes em função da crise que se abate sobre as finanças públicas no País.  

Seria justo, seria correto, sob o ponto de vista da estabilização da nossa economia, indispensável sob a ótica da organização das finanças públicas brasileiras e, por conseqüência, da Administração Pública brasileira, que o Governo discutisse um programa de saneamento financeiro para os Municípios do nosso País.  

Não podemos obrigá-los a milagres agora. Não podemos forçá-los ao impossível neste momento, já que existem situações insustentáveis, que não poderão ser solucionadas num curto prazo. Daí a necessidade de o Governo Federal, com sensibilidade política, entender a necessidade de um programa de saneamento financeiro para os Municípios do nosso País.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/03/2000 - Página 4627