Discurso durante a 15ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REGISTRO DE HOMENAGEM FEITA HOJE A COMUNIDADE INDIGENA PATAXO HÃ-HÃ-HÃE E A OUVIDORIA DA POLICIA DO ESTADO DE SÃO PAULO, AMBAS SENDO AGRACIADAS COM O PREMIO NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS. PREOCUPAÇÃO COM CONFLITOS NA DEMARCAÇÃO DAS TERRAS DOS INDIOS WAPIXUNA E MACUXI, NO ESTADO DE RORAIMA.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA INDIGENISTA.:
  • REGISTRO DE HOMENAGEM FEITA HOJE A COMUNIDADE INDIGENA PATAXO HÃ-HÃ-HÃE E A OUVIDORIA DA POLICIA DO ESTADO DE SÃO PAULO, AMBAS SENDO AGRACIADAS COM O PREMIO NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS. PREOCUPAÇÃO COM CONFLITOS NA DEMARCAÇÃO DAS TERRAS DOS INDIOS WAPIXUNA E MACUXI, NO ESTADO DE RORAIMA.
Publicação
Publicação no DSF de 17/03/2000 - Página 4752
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • REGISTRO, HOMENAGEM, COMUNIDADE INDIGENA, ESTADO DA BAHIA (BA), RECEBIMENTO, PREMIO, AMBITO NACIONAL, DIREITOS HUMANOS.
  • REGISTRO, RECEBIMENTO, PREMIO, DIREITOS HUMANOS, ORGÃO PUBLICO, OUVIDOR, POLICIA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENCAMINHAMENTO, DENUNCIA, FISCALIZAÇÃO, APURAÇÃO, PUNIÇÃO, POLICIAL, POLICIA CIVIL, POLICIA MILITAR.
  • GRAVIDADE, CONFLITO, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, ESTADO DE RORAIMA (RR), DENUNCIA, ABUSO, VITIMA, INDIO, GRUPO RELIGIOSO, TECNICO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), CRITICA, IMPUNIDADE.

A SR.ª MARINA SILVA (Bloco/PT – AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Sr as e Sr s Senadores, registro uma homenagem feita hoje à comunidade pataxó hã-hã-hãe. Essa comunidade está sendo agraciada com o Prêmio Nacional de Direitos Humanos, na pessoa do cacique Gérson de Souza Melo, no Auditório Nereu Ramos, da Câmara dos Deputados. Essa homenagem é prestada àquele povo por sua resistência na afirmação de seus direitos fundamentais, vítima de toda sorte de violência ao longo dos últimos 500 anos da História deste País.  

Sobretudo nos últimos três meses, um intenso conflito se desenrola na região tradicionalmente ocupada por aquela comunidade indígena no Estado da Bahia.  

Essa homenagem é mais do que justa, na medida em que temos ali várias lideranças que vêm sendo ameaçadas. Inclusive, o Senador Tião Viana também tem feito vários pronunciamentos e buscado dar sua contribuição ao conflito que ali vem ocorrendo.  

Na mesma solenidade será igualmente homenageada a Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo, criada em janeiro de 1995. A experiência de ombudsman de polícia é pioneira no Brasil e na América Latina. Aquela entidade já ouviu mais de 30 mil pessoas e encaminhou cerca de 15 mil denúncias às polícias civil e militar, o que resultou na punição de 2.533 policiais civis e militares. Além de fiscalizar e acompanhar as apurações das denúncias que encaminha, aquela Ouvidoria elabora, também, propostas estruturais para melhorar a eficiência das polícias estaduais.  

É uma justa homenagem, tanto aos índios pataxós hã-hã-hãe quanto à Ouvidoria da Polícia de São Paulo, que vem prestando um serviço à sociedade brasileira e à Justiça, a concessão desse prêmio por parte de entidades de defesa dos direitos humanos.  

Registro também aqui o caso difícil em que se encontram os índios wapixana e os macuxi, no Estado de Roraima. Ali, a demarcação das terras indígenas já identificadas, reconhecidas e homologadas se inviabiliza, devido a uma série de conflitos que vêm ocorrendo, gerando uma série de problemas tanto para as autoridades competentes que estão realizando esse trabalho quanto para as populações indígenas, contribuindo para que haja divisões e conflitos internos nas comunidades.  

Recebi, recentemente, por parte de várias entidades de defesa das comunidades indígenas e de suas próprias organizações, a denúncia de que religiosas, acompanhadas de crianças indígenas, foram humilhadas e ameaçadas por um grupo armado de mais ou menos 30 pessoas. Retiradas à força de uma pick-up, humilhadas, ameaçadas de serem atiradas de uma altura de seis metros de altura, foram obrigadas a caminhar 25km a pé até a sua comunidade. Trata-se de um abuso inadmissível, de uma atrocidade praticada por jagunços e fazendeiros.  

Também os técnicos da Funai que realizam o reconhecimento das áreas, prestando um serviço ao Estado brasileiro, foram ameaçados, estando sem condições de permanecer no local porque sua integridade física foi ameaçada.  

Sr. Presidente, apenas nos cinco minutos que me são concedidos, esse é o registro que faço. Há um pedido das entidades para que o Presidente da Funai, Sr. Carlos Marés, compareça àquela região para mediar esse grave conflito.  

Estão sendo realizadas campanhas em emissoras de rádio, de TV a cabo, com outdoors, além de ameaça física com terçados, pedras e paus às comunidades indígenas. A divisão está sendo praticada de forma induzida, seja pelo aliciamento, seja por algum tipo de proposta enganosa para tentar dividir as comunidades indígenas.  

Estamos no ano 2000, às vésperas de comemorarmos os 500 anos do Descobrimento desta Terra de Vera ou de Santa Cruz, e nossos índios continuam sendo massacrados da mesma forma. No início, foram massacrados porque não eram considerados gente, pois não tinham alma. Precisavam ser "domados", "civilizados", para que pudessem se transformar em brancos, em "gente". Hoje, eles são massacrados porque argumentam. Não são mais índios. Hoje, são civilizados tanto quanto nós, não precisam de terras tradicionais, não precisam reproduzir sua cultura. No início, ocorria o massacre para torná-los "civilizados"; hoje, ocorre o massacre porque eles são civilizados e, portanto, não precisam ser tratados como índios. É aquela velha frase: "se ficar o bicho pega, se correr o bicho come".  

Fico muito entristecida com o fato de atrocidades como estas estarem acontecendo em um dos Estados do meu País e nada ser feito: que autoridades da Funai tenham que se esconder, ficando impedidas de fazer seu trabalho porque recebem ameaças de morte; que religiosas e comunidades indígenas sejam obrigadas a caminhar 25 quilômetros, com crianças, depois de humilhadas, vilipendiadas e ameaçadas de serem atiradas de uma ponte por um bando de pessoas armadas. E não acontece absolutamente nada.  

Sr. Presidente, este não é um País do qual se pode falar que trouxe civilização aos índios. Este é um País que deve se envergonhar de trazer a morte e uma série de doenças a essas populações; de trazer uma das piores opressões que um povo pode impor a outro. De cinco milhões de índios, restam apenas 350 mil; de mais de mil línguas, algumas poucas continuam a ser faladas por esse tão rico povo que antes vivia nesta terra, que não era nem de Vera nem de Santa Cruz; era uma terra ricamente criada por Deus, onde havia espaço para que todos pudéssemos nos reproduzir com dignidade e respeito.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/03/2000 - Página 4752