Discurso durante a 18ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

APELO AO PRESIDENTE DA REPUBLICA PELA CONTINUIDADE DOS PAGAMENTOS DOS PROGRAMAS DE FRENTES DE EMERGENCIA NO SERTÃO PARAIBANO.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA.:
  • APELO AO PRESIDENTE DA REPUBLICA PELA CONTINUIDADE DOS PAGAMENTOS DOS PROGRAMAS DE FRENTES DE EMERGENCIA NO SERTÃO PARAIBANO.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Luiz Otavio, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2000 - Página 4972
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA.
Indexação
  • GRAVIDADE, INSUFICIENCIA, CHUVA, REGIÃO, ESTADO DA PARAIBA (PB), FOME, SEDE, POPULAÇÃO.
  • REGISTRO, REUNIÃO, BANCADA, CONGRESSISTA, REGIÃO NORDESTE, ENCAMINHAMENTO, DOCUMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CHEFE, CASA CIVIL, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO, INTEGRAÇÃO, MINISTERIO DO ORÇAMENTO E GESTÃO (MOG), NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, PRAZO, CONCESSÃO, AUXILIO, FRENTE DE TRABALHO, POPULAÇÃO, REGIÃO, EXPECTATIVA, SAFRA.
  • CRITICA, FALTA, SOLIDARIEDADE, AUSENCIA, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, DEFESA CIVIL, CALAMIDADE PUBLICA.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB – PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores...(Pausa)  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) – V. Exª está com a palavra, Senador Ney Suassuna.  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) – Eu sei, Sr. Presidente. Estou ocupando a tribuna. (Pausa)  

(Encena o gesto de entornar água de um copo vazio.)  

(Repete o gesto, agora utilizando uma xícara vazia.)  

Sr. Presidente, não vou ocupar muito tempo sem falar, mas existe mais de um modo de comunicação. A corporal, a gestual é também uma comunicação muito ouvida. Na realidade, a comunicação verbal talvez seja uma das menos ouvidas. Posso dizer algumas expressões e, com a expressão corporal ou gestual não condizente, não dar veracidade ao que falo.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) – Senador Ney Suassuna, a Mesa não criticou V. Exª, apenas não pôde ouvir o seu silêncio.  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) – Sr. Presidente, eu sei que não criticou. O que fiz causou espécie e estranheza, exatamente o que eu queria, porque já fiz inúmeros discursos aqui e não atingi o meu objetivo. Cansado, resolvi seguir esse recurso, ficando calado um tempo, mostrando que não temos água, nem comida em boa parte do Nordeste.  

Choveu em boa parte do Nordeste, uma chuva ligeira e, em alguns lugares, graças a Deus, juntou água. Em outros, nem isso ocorreu, como é o caso, por exemplo, do Vale do Sabugi, na Paraíba. Em cinco cidades não caiu água suficiente para molhar o fundo dos açudes, que estão secos, torrados, estorricados.  

Sr. Presidente, ficamos desesperados, e imagino como eles estão desesperados. Podemos entender quem está desesperado com água no açude para pelo menos beber. Agora, estar desesperado porque não juntou água no açude, enquanto todo mundo diz, no Brasil inteiro, que a seca não acabou, isso deve ser um desespero; estar sentindo a dor e ninguém acreditar. É isso o que está ocorrendo.  

Por isso, assomo à tribuna e uso um artifício como esse para chamar a atenção, porque não sei mais o que podemos fazer. Estamos realmente numa situação de desespero.  

A Bancada nordestina, Sr. Presidente, reuniu-se antes do carnaval, liderada pelo Deputado Inocêncio Oliveira, e tive a honra de também estar na coordenação desse movimento, quando fizemos um documento dirigido a quatro autoridades: ao Presidente da República; ao Ministro Bezerra, que não tem culpa – abro aqui um parêntese para dizer que S. Exª não tem culpa, porque não tem o dinheiro suficiente para fazer as ações; ao Ministro Martus Tavares, porque esse sabe das coisas do Orçamento; e ainda à Chefia da Casa Civil do Presidente, que coordena tudo.  

Ali, nós dizíamos que 800 mil nordestinos têm ajuda de R$56,00 por mês, para sustentar suas famílias, porque há 3 anos, no caso da Paraíba, não temos água; o mesmo fenômeno está ocorrendo em algumas regiões do Estado de V. Exª: 3 anos de seca, o mesmo acontecendo em Pernambuco. Duvido que, com a importância da TV Globo , V. Exªs não tenham visto uma cidade do tamanho de Recife, fazendo economia de água e só abrindo as torneiras nos bairros de 9 em 9 dias. Então, a situação ainda continua muito difícil.  

Dessas 800 mil pessoas, nem todas estão precisando mais, porque, em alguns lugares, começou a chover um pouco mais cedo, como foi o caso do Piauí. No caso da Paraíba, contudo, a chuva ocorreu há 2 meses, plantaram há um mês, são necessários mais 60, 80 dias para a colheita, e já estão suspendendo essa mísera ajuda de R$56,00/mês.  

Quem quiser saber a dor de ser nordestino nasça lá e veja a discriminação. Quando o desemprego atingiu níveis alarmantes, foram criadas frentes de trabalho para o Rio de Janeiro e para São Paulo. Aí, Sr. Presidente, quanto era o salário dessas frentes de trabalho do Rio de Janeiro, de São Paulo e de outros Estados? R$150,00/mês. Mas, para o nordestino, 1/3. E olhe lá: na primeira chuva, já se suspendeu. O milho está com dois palmos, mas ninguém colhe milho de dois palmos. É preciso que ele atinja a sua altura normal e pendoe. Após pendoar, vem a boneca de milho, que amadurece. São noventa dias, no mínimo, para a colheita.  

E milhões e milhões de pessoas, porque 800 mil vezes no mínimo cinco perfazem 4 milhões de pessoas, não têm a quem recorrer. E essa única e mísera ajuda está sendo suspensa!  

Eu não sei mais o que fazer. Há alguns anos, já tínhamos 90 cidades, das 223 da Paraíba, em calamidade. Usei a tribuna inúmeras vezes, fui às autoridades inúmeras vezes e só consegui despertar a atenção da imprensa, Sr. Presidente, quando juntei latas vazias com o nome de cada Município. E triste sina a nossa: não tivesse eu escorregado, não teria saído na imprensa, porque seria apenas um protesto. Mas havia o vexame de um Senador quase caindo – não cheguei a cair porque meu motorista me segurou quando fui colocar a última lata. Graças a isso, Veja, IstoÉ, toda a imprensa, todos os jornais noticiaram. Aí, foram ao Nordeste e verificaram que havia milhares de pessoas morrendo de fome e de sede.  

Discutíamos aqui o problema de outros países, era um desfile de Senadores a falar de Timor, a falar de vários outros países, com os quais me solidarizo. No entanto, temos aqui dentro das nossas fronteiras situações tão graves quanto essas.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) – Permite-me V. Exª um aparte, Senador Ney Suassuna?  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) – Concedo o aparte, com muita satisfação, ao nobre Senador Casildo Maldaner.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) – Senador Ney Suassuna, V. Exª dizia há pouco que é difícil saber a dor da seca. Eu diria que também é doloroso resistir à dor da enchente. Dentro do mesmo território, ocorrem os dois problemas. Há poucos dias, no sul do Brasil, vivemos o problema das enchentes, como também Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, o meu Estado, Santa Catarina. Os Municípios, os governos estaduais e até mesmo o Governo Federal foram pegos, como se diz na gíria, de calças curtas. E tudo isso porque somos um País imprevidente. A Defesa Civil do Brasil não é organizada, não temos um fundo específico para isso, Senador Ney Suassuna. Já me referi a esse tema da tribuna desta Casa, inclusive tendo sido aparteado por V. Exª. Quando Governador do meu Estado, houve enchentes, calamidades, e passei pelo drama de procurar a Defesa Civil e encontrá-la despreparada, sem recursos. Fiz duas propostas ao Congresso Nacional, que tramitam nas comissões. Precisamos unir todas as forças, para atendermos ao clamor de todas, inclusive da Paraíba, do Nordeste, que enfrenta problemas que precisam de solução. E quais são as duas propostas? Uma, Senador, é no sentido de destinar 2% do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e da Pessoa Física para um fundo de defesa civil nacional. E como seria essa distribuição? Um terço para o fundo de defesa civil nacional, outro terço para o fundo de defesa civil dos Estados e outro terço para os Municípios. E tudo isso para que a Defesa Civil se organize em todos os cinco mil e poucos Municípios brasileiros, em todos os Estados, enfim, no País inteiro. E por que faço essa defesa? Porque aplicamos em teatro, em cinema, ou seja, aplicamos em cultura, o que é justo; para isso temos a Lei Rouanet. E para enfrentarmos as calamidades? Não é possível buscarmos recursos, para socorrer milhares e milhares de irmãos em circunstâncias as mais adversas, conforme a que relata V. Exª sobre o que ocorre na Paraíba e no Nordeste, ou como ocorre constantemente em outras regiões do Brasil? A segunda proposta é que de todo seguro que se fizer no Brasil, por exemplo, o seguro de automóvel, 0,5% seja destinado a esse fundo de defesa nacional. Podem até dizer que assim vai haver aumento no custo do seguro do automóvel, por exemplo, ou de qualquer seguro. No entanto, não devemos pensar apenas na questão da segurança do automóvel; também o meio em que ele transita deve ser protegido, pois assim haverá menos desmoronamentos, menos catástrofes, menos sinistros. Com o tempo, as companhias de seguro vão ganhar, porque estaremos mais organizados e teremos um fundo, Senador Ney Suassuna, para socorrer essas calamidades. V. Exª sabe qual é a previsão de recursos para esse fim no Orçamento deste ano? R$2,5 milhões para o Brasil inteiro. Isso não dá para nada. Vamos ver se conseguimos aumentar com as emendas. Caso contrário, vamos deixar abandonados milhares e milhares de irmãos, vamos deixar de socorrê-los nessas calamidades. Por isso, Senador Ney Suassuna, quero cumprimentar V. Exª pelo pronunciamento. Há um movimento crescente no Brasil para que nos previnamos, porque somos imprevidentes e precisamos ser mais organizados. Temos que mudar a nossa cultura para podermos enfrentar esses problemas. Mesmo que não haja sinistros, esse fundo não vai ser jogado fora, pois cada vez mais vamos organizar melhor a Defesa Civil nas três esferas de governo. Meus cumprimentos, Senador Ney Suassuna, pelo tema tão palpitante que atinge o Brasil como um todo.  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB – PB) – Nobre Senador Casildo Maldaner, esses projetos a que V. Exª se refere foram apresentados aqui no Senado?  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB – SC) – Sim, já foram.  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB – PB) – Estarei respaldando V. Exª quando estiverem sendo discutidos.  

Senador Casildo Maldaner, triste de um país onde um Senador tem que dizer que a sua região é mais miserável que outra. Lamentavelmente, não posso deixar de dizer que a enchente é dura, mas é temporária. A seca, quando vem, normalmente dura um ano, mas, muitas vezes, dura três anos, como estamos vivendo agora. Tivemos um começo de chuva, que foi suspensa na grande maioria do Nordeste: Pernambuco, Paraíba, parte do Ceará, Rio Grande do Norte. E já estamos há três anos nisso, não há safra há três anos. Dá pena vermos o moral daquelas pessoas que ali vivem. Eu dizia isso ao Presidente da República, quando sobrevoávamos a região. Dizia: Presidente, olha aquele ranchinho ali embaixo, terra batida, de ponta a ponta. O açude só tinha a lama seca e rachada. E eu ainda dizia: como pode um pai de família acordar de manhã, olhar e dizer: não tenho o que fazer?! Não tem! Não tem recurso sequer para levar um filho à escola, não tem nem perto! O que faria um pai de família desse se fosse um homem acostumado, como nós, a ter uma vida relativamente confortável? É que eles já são tão brutalizados pela pouca sorte, pelo descuido que se tem com eles, que já estão um tanto quanto insensíveis, já acham que aquilo é até natural. Mas isso é uma desumanidade, é uma falta de solidariedade. E o que forma um país é a solidariedade. Está faltando solidariedade, solidariedade de se fazer fundos que possam resolver problemas como esses.

 

Lamento dizer isso, mas é verdade. Ano passado, a Comissão de Economia apresentou uma emenda alocando recursos para a Defesa Civil, mas, este ano, essa mesma emenda não foi aprovada. Se tivermos, então, uma calamidade, teremos que, correndo, desviar recursos de outras rubricas, porque não temos sequer os R$50 milhões destinados no ano passado.  

O Sr. Ramez Tebet (PMDB – MS) – V. Exª me permite um aparte?  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB – PB) – Ouço V. Exª com prazer.  

O Sr. Ramez Tebet (PMDB – MS) – Senador Ney Suassuna, quase todos os pronunciamentos de V. Exª, e isso aumenta a minha admiração pela sua atuação no Senado da República, são marcados por um conteúdo eminentemente humanitário. Realmente é muito difícil compreendermos que fenômenos que se repetem anualmente, constantemente, como a seca e as inundações, são possam ser prevenidos. A Defesa Civil precisa ser melhor organizada. Por exemplo, hoje, no meu Estado, a cidade de Aquidauana, tomada pelas enchentes, tem um número significativo, Senador Ney Suassuna, de pessoas desabrigadas. São cerca de duas mil pessoas sem teto, e o Poder Público não tem recursos para atender essas pessoas desabrigadas. Quando muito o espírito de solidariedade da própria população supre as deficiências e as dificuldades do poder público municipal, estadual e nacional. Quando muito há aquele atendimento momentâneo.  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB – PB) – As TVs mostram isso.  

O Sr. Ramez Tebet (PMDB – MS) – No caso das enchentes, por exemplo, as pessoas perdem o teto, perdem o fogão, perdem a geladeira, perdem a mesa, perdem a cama. Essas pessoas não têm recursos.  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB – PB) – Pior que isso, Senador Ramez Tebet, elas perdem a dignidade. Isso porque quando se perde tudo, quando não se tem a quem recorrer e não se tem ajuda, perde-se também a dignidade.  

O Sr. Ramez Tebet (PMDB – MS) – Essas pessoas vivem, como bem salientou V. Exª, em estado de extrema penúria. Penso que devemos encontrar uma solução para isso, que pode ser através de um desses projetos que estão tramitando nesta Casa. É preciso que se constitua um fundo que possa atender as populações de todas as regiões do Brasil. Se nos Estados do Nordeste ocorre a seca, em outros Estados ocorrem as enchentes, que se repetem a cada ano. Senador Ney Suassuna, meu aparte vale mais pela solidariedade que quero emprestar ao seu humano pronunciamento.  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB – PB) – Muito obrigado, Excelência. Farei com que o aparte de V. Exª conste como parte nobre da minha oração.  

O Sr. Luiz Otávio (Sem Partido – PA) – Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB – PB) – Senador Luiz Otávio, meu tempo está quase acabando, mas não poderia deixar de ouvir V. Exª.  

O Sr. Luiz Otávio (Sem Partido – PA) – Serei rápido, Senador Ney Suassuna. V. Exª sempre traz essa mensagem dura e difícil do Nordeste. Nós sempre ouvimos suas reivindicações – muito justas – e as de todos os representantes do Nordeste. Nós estranhamos o fato de haver solução para levar a energia elétrica para o Nordeste, para levar gasoduto e oleoduto para tantas regiões do País. Por que não um aqueduto? Com certeza, a partir da Região Amazônica, teremos condições de fazer não só o projeto divulgado pelo Senador Fernando Bezerra, a transposição do rio São Francisco, mas também um projeto mais barato, que forneça água à população carente. Este é o meu aparte. Agradeço a V. Exª pela atenção.  

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB – PB) – Muito obrigado, nobre Senador Luiz Otávio. É muito importante receber a solidariedade dos companheiros.  

Peço desculpas ao Presidente e aos demais companheiros por ter iniciado o meu discurso sem palavras, utilizando apenas a comunicação gestual e corpórea. Eu tinha a intenção de chamar a atenção, pois não tenho encontrado caminhos para sensibilizar os Poderes da República.  

Há 800 mil cabeças de família que estão perdendo uma ajuda miserável de R$56. Essa é a única ajuda de que dispomos. Está se na iminência da suspensão dessas frentes de trabalho em lugares que sequer choveu para se juntar água para beber e em outros lugares onde choveu, mas onde ainda não houve o período da safra.  

Agradeço a todos os companheiros pelo apoio feito por meio de seus apartes.  

Sr. Presidente, se não alcançar sucesso desta vez, espero encontrar uma outra forma de linguagem que possa sensibilizar as autoridades de Brasília!  

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2000 - Página 4972