Discurso durante a 18ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A MANIFESTAÇÃO DO MINISTRO PEDRO MALAN SOBRE A FIXAÇÃO DO SALARIO MINIMO.

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA SALARIAL.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A MANIFESTAÇÃO DO MINISTRO PEDRO MALAN SOBRE A FIXAÇÃO DO SALARIO MINIMO.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2000 - Página 5003
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, PEDRO MALAN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), CONFIRMAÇÃO, COMPORTAMENTO, GOVERNO, GARANTIA, MANIPULAÇÃO, APOIO, PROPOSTA, REAJUSTE, SALARIO MINIMO.
  • QUESTIONAMENTO, INCOERENCIA, GOVERNO, COMPROMETIMENTO, VERBA, PAGAMENTO, JUROS, SERVIÇO DA DIVIDA, IMPUTAÇÃO, RESPONSABILIDADE, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, AUMENTO, PREJUIZO, PREVIDENCIA SOCIAL, CONTAS, SETOR PUBLICO.
  • CRITICA, POLITICA, FOME, GOVERNO FEDERAL, IMPEDIMENTO, DIGNIDADE, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, LIMITAÇÃO, CONSUMO, CRIAÇÃO, EMPREGO, RENDA, PRODUÇÃO, PREJUIZO, ECONOMIA.
  • COMENTARIO, DADOS, ESTATISTICA, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), DEMONSTRAÇÃO, REDUÇÃO, RENDA, TRABALHADOR.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT – AL. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, embora compreenda que toda a motivação de hoje esteja voltada para a Comissão de Assuntos Econômicos, não poderia deixar de trazer a esta Casa uma preocupação gigantesca, sobre a qual muitos companheiros e companheiras do Bloco já tiveram oportunidade de falar: o salário mínimo.  

Vários debates já foram feitos em relação ao salário mínimo, mas uma frase dita ontem pelo Ministro Pedro Malan – não uma frase solta, vazia, jogada ao vento – expressa a forma de o Governo tratar a questão, e eu não poderia deixar de trazer esse debate a esta Casa. O Ministro disse, em recente encontro na cidade de Salvador, que não era contra a discussão emocional, desde que a maturidade e a racionalidade política prevaleçam.  

É claro que essa postura de uma confraria de auto-intitulados racionais não é nova, é um comportamento até costumeiro, construído para garantir a manipulação do consenso. Muitos desses que têm esse comportamento costumeiro são aqueles que arrotam independência, tecnicismo e racionalidade, mas deglutem subserviência aos próprios políticos que fingem não considerar e ao instrumento de política e de pensamento único do Fundo Monetário Internacional – sem dúvida o grão-mestre da ordem da qual fazem parte o Presidente da República, várias personalidades políticas e o próprio Ministro.  

Esse tipo de declaração de alguns que fingem estar acima dessa "coisa" que é a política, mas que têm, sem dúvida, como livrinho de cabeceira o Cardeal Mazarin não para desvendar os mistérios da demagogia e do parasitismo de alguns políticos, mas para utilizar todos os ensinamentos de manipulação numa engenhosa tática de enganação cujas cifras, estatísticas e dados devem percorrer o imaginário popular, os argumentos de alguns comentaristas políticos e um rosário de lamentações de uma verdadeira cantilena enganosa de muitos parlamentares da bancada governista sobre o salário mínimo.  

A discussão sobre o salário mínimo não é necessária apenas por sua conotação humanista, embora essa conotação seja fundamental para todos aqueles que acham que têm a obrigação de construir uma sociedade justa, igualitária e fraterna – e essa sociedade não se constrói com o salário de fome patrocinado pelo Governo Federal.  

Não se trata apenas de uma discussão legalista, apesar de esta Casa ter a obrigação fiscalizar o Poder Executivo no cumprimento da lei. O Art. 7º, inciso IV, da Constituição, prevendo como deve ser um salário mínimo, obrigaria esta Casa a defendê-lo. Várias vezes discutiu-se no DIEESE o salário mínimo de R$946,00. Duvido que os Senadores ou Deputados consigam viver com o salário mínimo que está sendo discutido pelo Governo Federal.  

Essas pessoas que muitas vezes se apresentam como sinônimo da racionalidade, do tecnicismo, dos que estão acima do bem e do mal fazem parte dessa confraria de eméritos calculadores do déficit. E esses que contrapõem a emoção à racionalidade tratam como racionais as decisões que perpetuam a miséria no País, condenando as pessoas à cesta básica eterna, certamente um castigo tão contundente quanto o fogo eterno.  

Essa mesma racionalidade defendida por alguns cria e inventa conceitos ao bel-prazer. E, assim, estabeleceram que a Previdência deve ser financiada apenas pela contribuição de empregados e empregadores sobre a folha de pagamento, pois as demais receitas não correspondem ao conceito que eles votaram, que eles inventaram, que está na Constituição, que trata das fontes de financiamento da seguridade social, quando todos sabemos que as contribuições pagas pelos trabalhadores asseguram, sim, os benefícios que receberão na inatividade.  

A velha Constituição, desobedecida e golpeada, estabelece um conjunto integrado de ações de iniciativa de poderes públicos e da sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência, à assistência social. Por isso, conta com várias receitas das contribuições dos empregadores e empregados, do Cofins, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, da CPMF, enfim, várias contribuições, que, ao bel-prazer daqueles que condenam o emocionalismo, mas que trabalham como meros seguidores do grão-mestre da ordem – o Fundo Monetário Internacional –, condenam e continuam golpeando a Constituição. Da mesma forma, esses que evitam discutir um salário mínimo à altura do que merece o povo brasileiro - não apenas os 20 milhões que recebem um salário mínimo, mas milhões de pessoas deste País que só têm a possibilidade de comer, quando um aposentado recebe seu dinheiro, quando um pai de família percebe esse salário miserável ou aqueles pouquíssimos protegidos pela Lei Orgânica da Assistência Social -, esses mesmos, os tais racionais não o são para identificar os números que o auge da racionalidade tem de estabelecer.  

Por que não dizem que desviaram e saquearam o dinheiro da Previdência em mais de R$50 bilhões, desde a criação do sistema previdenciário? Por que eles, racionais, ignoram que há outra dívida de mais de R$50 bilhões, decorrentes dos calotes aplicados pelas empresas? Por que os racionais esquecem que saquearam o dinheiro da Previdência, subtraindo mais de 20% das receitas da Seguridade Social?  

Ora, se é para tratar a questão com a frieza da racionalidade, com as frias estatísticas oficiais, com os números, é preciso apresentá-los também, e os racionais não o fazem. Por que não trabalham com a mesma racionalidade dos vários economistas do próprio Instituto da Previdência e do Ipea, que apresentam dados mostrando que o crescimento do déficit da Previdência deve-se a uma assombrosa, tremenda redução de receitas, resultante de uma política dos pseudos intelectuais, dos pseudos racionais, de uma política antiprodução, antiemprego, que tem jogado mais de 50% da população economicamente ativa na informalidade? Todos esses fatores, portanto, levam a uma redução gigantesca da contribuição previdenciária, deixando de contabilizar os gastos da aposentadoria por idade, a invalidez do trabalhador rural, que não contribui com o sistema também.  

É exatamente por isso, Sr. Presidente, Sr as e Sr s Senadores, que essa Casa não pode aceitar - até porque o Brasil tem acompanhado com atenção o debate. A discussão do salário mínimo trava-se não apenas no âmbito do Partido dos Trabalhadores mas com vários outros Parlamentares, inclusive com os da própria base de sustentação do Governo. Estamos trabalhando com os sonhos e as aspirações dos brasileiros em relações ao salário mínimo. Já é uma vergonha discutir um salário mínimo de US$100, porque ninguém aqui vive com R$180,00. Duvido! Quando passar a viver com R$180,00, aí, sim, terá que discutir com a população pobre e marginalizada deste País os R$180,00. Porque é justamente a população que não tem acesso a nada: à educação, à saúde, a vestuário, a transporte. Absolutamente nada!  

Já é uma vergonha discutir esse valor, porque, à luz da Constituição, tínhamos a obrigação de discutir um salário mínimo de R$946,00. Se não fazemos isso, mais grave ainda é aceitar a cantilena do Governo Federal, que compromete R$151 bilhões com o pagamento de juros do serviço da dívida. Essa cantilena, infelizmente, é reproduzida por muitos que se dizem analistas, que ficam fazendo aquela medíocre continha: cada dinheirinho que vai para o salário mínimo aumenta o rombo da Previdência. Que rombo?! O rombo que o Governo Federal fez, saqueando os cofres da Previdência ao garantir a impunidade para os sonegadores da Previdência?! Lá vamos todos repetindo que o miserável, o trabalhador, aquele que tem como única expectativa um salário mínimo não vai poder ter aumento, porque, senão, vai aumentar o rombo da Previdência.  

Se há rombo, obrigatoriamente temos de apresentar, sob pena de esta Casa estar prevaricando, porque é sua tarefa nobre fiscalizar os Executivos, quem são os arrombadores. Não são os trabalhadores brasileiros, não são os aposentados, não são as pessoas que precisam, conforme aprovado pela Lei Orgânica, como o deficiente, o trabalhador rural. Com certeza, se esses tivessem praticado qualquer ato de sonegação contra a Previdência, estariam atrás das grades. Agora, os saqueadores dos cofres públicos, os que golpeiam a Constituição saltitam alegremente, são recebidos nos salões da alta sociedade, como se não tivesse acontecido absolutamente nada.  

É por isso, Sr. Presidente, que, embora eu tenha feito várias considerações em relação ao significado de haver mais de 21% do mercado, algo como 15 milhões de pessoas, que recebem apenas um salário mínimo, algo em torno de 25% das pessoas ocupadas nas principais regiões metropolitanas do País têm remuneração próxima ao salário mínimo. A discussão sobre o salário mínimo já é antiga. Argumenta-se que o salário mínimo não é importante apenas para aquele que o recebe, ou para aquele que, de alguma forma, como família, acaba usufruindo dele. Ele funciona como parâmetro para o setor informal, para os trabalhadores assalariados sem carteira assinada, para os que trabalham por conta própria, os autônomos.  

O aumento do salário mínimo, portanto, não diz respeito simplesmente às contas públicas; significa a possibilidade de dignidade para a grande maioria da população e a dinamização da economia local: consumo, geração de emprego e renda, produção. O problema é a opção econômica do Governo Federal: matar o povo de fome, para que não consumindo não aumente a inflação. Isso é sempre o que eles dizem. Somos contrários, portanto, a essa política de fome do Governo Federal, a essa política irracional, absolutamente mergulhada na covardia e na insensibilidade.  

Sr. Presidente, como meu tempo está esgotado, peço que V. Exª dê como lido vários dados do meu discurso. Talvez as pessoas que os lerem possam sensibilizar-se. Trata-se de alguns dados, que não são novos, e que foram apresentados pela própria estrutura do Governo Federal, como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o IBGE. Ou seja, as frias estatísticas oficiais já demonstram histórias de vidas que estão sendo destruídas.

 

Portanto, faço um apelo ao Governo Federal para trabalhar com a racionalidade, o que não significa curvar a Nação brasileira aos saprófitas da humanidade que se encontram no Fundo Monetário Internacional.  

******************************************************************* 

SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DA SRª SENADORA HELOISA HELENA.  

********************************************************************** 

 

µ C


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2000 - Página 5003