Pronunciamento de Jefferson Peres em 03/04/2000
Discurso durante a 27ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
PREOCUPAÇÃO COM O LEILÃO DA COMPANHIA DE SANEAMENTO DO AMAZONAS, AMANHÃ, NA BOLSA DE VALORES DO RIO DE JANEIRO.
- Autor
- Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
- Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
PRIVATIZAÇÃO.:
- PREOCUPAÇÃO COM O LEILÃO DA COMPANHIA DE SANEAMENTO DO AMAZONAS, AMANHÃ, NA BOLSA DE VALORES DO RIO DE JANEIRO.
- Aparteantes
- Geraldo Melo.
- Publicação
- Publicação no DSF de 04/04/2000 - Página 6341
- Assunto
- Outros > PRIVATIZAÇÃO.
- Indexação
-
- MANIFESTAÇÃO, APREENSÃO, ORADOR, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA DE SANEAMENTO, AMBITO ESTADUAL.
- CRITICA, AUSENCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, LEILÃO, EMPRESA DE SANEAMENTO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), OCORRENCIA, BOLSA DE VALORES, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
- QUESTIONAMENTO, MOTIVO, GOVERNO, AUSENCIA, ESTABELECIMENTO, NORMAS, REQUISITOS, VIABILIDADE, FINANCIAMENTO, EMPRESA DE SANEAMENTO, IMPEDIMENTO, PRIVATIZAÇÃO, GARANTIA, SERVIÇO, SANEAMENTO BASICO.
O SR. JEFFERSON PÉRES
(Bloco/PDT – AM. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nos últimos meses, vários Senadores ocuparam a tribuna do Senado para manifestar sua preocupação com a privatização de companhias de saneamento estaduais.
Hoje, reuno minha voz a desses Senadores, porque amanhã, na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, será privatizada a Companhia de Saneamento do Amazonas.
Longe de mim, Sr. Presidente, a pecha de estatizante. Apoiei com entusiasmo a desestatização de várias empresas, porque entendi, como continuo entendendo, que o Estado brasileiro deveria ser desinchado com a alienação de algumas de suas empresas, visando ao abatimento da dívida pública.
Mas eu me alio aos que não concordam com uma privatização generalizada e a qualquer preço das empresas pertencentes ao Estado, principalmente quando se trata de água e esgoto, um serviço essencial e que constitui um monopólio natural. Como já foi dito anteriormente, o serviço de água não é como o de telefone. O usuário do serviço telefônico, disse o Senador Geraldo Melo, poderá optar entre duas ou três empresas que disponibilizem o serviço. Haverá, portanto, competição. No entanto, não existe a possibilidade de duas tubulações de água, de empresas diferentes, na mesma rua. O Senador Geraldo Melo – eu me lembro bem - mencionou o fato quando falava da privatização da Caern - empresa de água de seu Estado. Sendo monopólio natural, não há como evitar que uma única empresa forneça água aos consumidores de qualquer cidade do País.
Por outro lado, Sr. Presidente, preocupa-me a forma como está sendo feita a privatização: sem transparência. Não sei se a avaliação está correta e não sei se o preço mínimo estipulado equivale ao valor da empresa. Portanto, receio muito que, quando ocorrer – se ocorrer –, a privatização, esteja reservado para os consumidores, para toda a população de Manaus um futuro sombrio, tendo em vista que não sei, e nenhum de nós de Manaus sabe, o que pode acontecer.
O Sr. Geraldo Melo (PSDB-RN) – V. Exª me concede um aparte, Senador Jefferson Péres?
O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT – AM) - Cedo-lhe o aparte, com satisfação, Senador Geraldo Melo.
O Sr. Geraldo Melo (PSDB – RN) – Senador Jefferson Péres, quero mais uma vez manifestar minha opinião sobre o assunto, já que tenho dito muitas vezes que sou, por algumas das razões que V. Exª acabou de anunciar, contrário à idéia de privatização dos serviços de água e esgoto no Brasil, apesar de ter sido favorável à privatização de inúmeras outras empresas públicas em inúmeros outros setores de atividades. Era favorável, porquanto via nessas privatizações a possibilidade de aumentar a eficiência e o benefício para o usuário dos serviços por meio da competição que instalar-se-ia. Em telecomunicações, há um exemplo bastante nítido com o surgimento de empresas espelho que competirão com as empresas privatizadas, de tal maneira que o consumidor terá a opção pelos serviços daquela que lhe ofereça maior vantagem dentro do mesmo padrão de qualidade. Isso não é possível, como V. Exª acaba de destacar, nas empresas de água e esgoto. Além disso, com sinceridade, deve ser ignorância minha, mas não conheço em lugar nenhum do mundo a prestação desses serviços pela iniciativa privada. Mesmo nos Estados Unidos, país adotado como paradigma para a organização do capitalismo moderno no Brasil, só tenho conhecimento de uma experiência, que representa mais ou menos 10% do conjunto dos serviços de abastecimento de água e esgoto naquele País, por organizações que são privadas por pertencerem aos funcionários das empresas prestadoras dos serviços. E o resultado dessa experiência não é considerado satisfatório nos Estados Unidos. Embora me alongue um pouco mais do que desejaria, gostaria de destacar um ponto. A razão que vem sendo alegada para justificar a privatização é a seguinte: o Brasil precisa ampliar os serviços de água e esgoto oferecidos à sua população e não tem dinheiro. Para obter esses recursos, precisa privatizar essas atividades. Portanto, foi pensando nesse argumento – embora seja contra a privatização, não posso impedir que ela se faça - que apresentei uma proposta concreta ao Senado Federal. Veja-se o caso do Estado do Amazonas. De que forma será feita a privatização? Mediante a venda das ações do Estado a um investidor particular. Ou seja, há um investidor disposto a aplicar dinheiro no setor de água e esgoto, tanto que está comprando ações do Governo do Estado do Amazonas numa empresa desse tipo. Contudo, esse dinheiro será entregue ao Governo, mas não mais poderá ser utilizado na ampliação dos serviços de água e esgoto, pelo simples fato de que a empresa prestadora desses serviços, após a privatização, será uma empresa particular, que tem dono. E o Governo do Amazonas não pode pegar o dinheiro dele, que pertence a toda a população, e aplicar numa empresa particular. Por esse motivo, propus - já que não se pode evitar essa privatização - que o processo se faça mediante aumento de capital: que ficasse o Governo do Amazonas com suas ações, que se emitissem ações em quantidade maior do que as que ele tem, que essas ações novas fossem adquiridas pelo grupo investidor, que assumiria o controle da empresa. Mais adiante, o Governo amazonense poderia vender suas ações em Bolsa, como está vendendo amanhã. Dessa forma, se fosse adotada minha proposta, o dinheiro aplicado por esse grupo para aquisição das ações do Governo do Amazonas - dinheiro esse que sai do sistema - seria usado para expansão dos serviços de água e esgoto do Estado; portanto, em benefício da população. Seria uma maneira de captar recursos não onerosos, para um programa de importância crucial como esse. Quanto a essa privatização que está sendo feita, considero-a altamente danosa aos interesses do Brasil e dos brasileiros. Por isso - pedindo desculpas mais uma vez por ter-me alongado tanto -, aproveito o discurso de V. Exª para dirigir um apelo a esta Casa: que o Senado Federal, após se debruçar sobre o projeto de lei que está apresentado, tenha a iniciativa e, em seguida, consiga o apoio da Câmara dos Deputados para que se discipline essa privatização. E que pelo menos o Governo Federal, por meio de suas agências, em particular o BNDES, não se associe - apoiando, financiando, antecipando recursos - a quem quer que seja para facilitar uma privatização feita dessa maneira. Muito obrigado a V. Exª.
O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT - AM) – Muito obrigado digo eu, Senador Geraldo Melo. Muito gostaria que V. Exª fizesse a gentileza de me enviar cópia de seu projeto em tramitação nesta Casa. Desde já me associarei, com muito prazer, aos seus esforços para fazê-lo caminhar.
Senador Geraldo Melo, a empresa estatal que presta serviço de abastecimento de água em Manaus é deficitária. Por quê? Segundo informação de sua diretoria, porque 50% das unidades de consumo da cidade não têm hidrômetro. Além disso, 30% da água distribuída são desperdiçadas, segundo estimativa da própria empresa, porque ela não tem recursos para investimento, e o BNDES, por decisão do Governo Federal, não financia tais empresas. No entanto, ouço dizer que, se as ações forem vendidas amanhã pelo preço mínimo estabelecido, de R$175 milhões, o BNDES adiantará essa quantia ao Governo do Estado do Amazonas para aplicá-la não sei em quê, Senador Geraldo Melo. Certamente não será em saneamento básico.
Pergunto-lhe então, Senador: por que o Governo Federal não estabelece regras, condições estritas para que essas empresas recebam o financiamento? Por que não o faz, a fim de que essas empresas sejam saneadas – sem nenhum trocadilho, empresas de saneamento saneadas financeiramente – e pelo menos equilibrem suas contas, saindo do vermelho? Por que isso não é feito, Senador Geraldo Melo? Se existem dificuldades regionais por falta de vontade política, de se cobrar dos usuários pelo consumo efetivo, com tarifas sociais, por que o Governo Federal não impõe essas exigências para financiá-las e não faz o financiamento, talvez pela fórmula engenhosa proposta por V. Exª, mas de maneira que o Estado não se desobrigue do seu dever de atuar nesse campo básico para a população de qualquer cidade?
O Sr. Geraldo Melo (PSDB – RN) – V. Exª novamente me concede um aparte?
O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT – AM) – Cedo-lhe mais uma vez um aparte, Senador Geraldo Melo.
O Sr. Geraldo Melo (PSDB – RN) – Serei muito breve, Senador Jefferson Péres. Apenas acrescento mais uma pergunta às muitas indagações que V. Exª acaba de fazer: por que será que alguém se interessa em aplicar dinheiro bom, vivo, do seu bolso para comprar o controle acionário de uma empresa deficitária, como V. Exª acaba de informar?
O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT – AM) – Certamente a atividade deve ser lucrativa, para que um grupo francês, que hoje se estende por vários países do mundo, seja um dos participantes do leilão.
Há outras questões que me preocupam nessa privatização apressada, Senador Geraldo Melo. Não há um quadro institucional estabelecido. Não existe uma agência reguladora, não existe uma política de recursos hídricos, não existe um conselho estadual de recursos hídricos. Que órgão burocrático do Estado vai controlar e fiscalizar essa empresa, Senador? Os consumidores ficarão à mercê de uma empresa que, como é natural, visa exclusivamente ao lucro. Qual será a autonomia do órgão fiscalizador? Terá recursos humanos suficientes, qualificados, bem remunerados, para que não se deixem, por exemplo, corromper? Não existe. Não existe quadro regulador no Estado.
Portanto, Srs. Senadores, trata-se de uma privatização temerária, como eu já chamei, muito preocupante. Todos os esforços para adiar a privatização foram baldados, duas liminares concedidas na primeira instância foram cassadas pela instância superior, de forma que, se amanhã um dos lances cobrir o preço mínimo, o ato estará consumado e não sei quais serão as conseqüências para a população da minha cidade, principalmente para os mais pobres - que é o que mais me preocupa.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.