Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

INAUGURAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO BRASILEIRA DA ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL TRANSPARENCIA INTERNACIONAL.

Autor
Gilvam Borges (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: Gilvam Pinheiro Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL. :
  • INAUGURAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO BRASILEIRA DA ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL TRANSPARENCIA INTERNACIONAL.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2000 - Página 6422
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • REGISTRO, INAUGURAÇÃO, BRASIL, REPRESENTAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), COMBATE, CORRUPÇÃO, AMBITO INTERNACIONAL, METODOLOGIA, CAMPANHA, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO.
  • GRAVIDADE, NIVEL, CORRUPÇÃO, BRASIL, COMPARAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, REGISTRO, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CONGRESSO NACIONAL.
  • REPUDIO, CORRUPÇÃO, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO AMAPA (AP), INVESTIGAÇÃO, MINISTERIO PUBLICO, REGISTRO, PROCESSO, CASSAÇÃO, MANDATO, FRAN JUNIOR, DEPUTADO ESTADUAL.

O SR. GILVAM BORGES (PMDB - AP) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a inauguração da representação brasileira da organização não-governamental Transparência Internacional, no dia 15 do corrente mês, oferece excelente oportunidade para que se retome o debate do tema da corrupção, aliás sempre tão em evidência nos noticiários do nosso sofrido Brasil.  

A Transparência Internacional, também conhecida pela sigla TI, é uma organização que, desde a sua fundação, em 1993, se tem notabilizado no combate à corrupção. Criada por Peter Eigen, ex-diretor do Banco Mundial, e financiada por 108 instituições – entre as quais governos e empresas multinacionais -, a entidade tem entre seus fundadores, no Brasil, o ex-Procurador-Geral da República Aristides Junqueira e a Juíza Denise Frossard. Seu presidente é Eduardo Capobianco, presidente do Sindicato da Construção Civil do Estado de São Paulo – SINDUSCOM, que, por ocasião do lançamento da representação brasileira da organização, declarou: "Corrupção não acaba; corrupção se reduz".  

Com efeito, trata-se de posição realista, essa manifestada pelo Presidente da seção brasileira da Transparência Internacional. Sabemos que, por conta da imperfeição inerente ao ser humano, desvios de conduta, comportamentos delituosos infelizmente sempre haverão de existir. O que representa motivo de preocupação é quando a criminalidade começa a se generalizar em uma determinada sociedade; quando a corrupção, a propina, o favorecimento pessoal passam a se constituir na regra, e não mais na exceção; quando o locupletar-se, o fazer uso do cargo público em benefício próprio passa a ser visto como o comportamento aceitável e até aconselhável, enquanto a probidade é encarada como ingenuidade, tolice.  

Nesse sentido, evidencia lucidez a declaração do Secretário-geral da Transparência Brasil, o ex-vereador da cidade de São Paulo, Francisco Withaker, de que o importante é a sociedade criar uma atitude de repulsa, para reduzir o "caráter endêmico" da corrupção. Com essa preocupação em mente, o trabalho da TI não se voltará para indivíduos, mas sim para esquemas, que a entidade tentará identificar e desmascarar perante a opinião pública.  

Aproveitando a coincidência do início das atividades de sua seção brasileira com o ano eleitoral em curso, a Transparência Internacional tem pronta uma campanha publicitária que condena a máxima do "rouba mas faz" e associa a corrupção às várias faces da miséria. Para o desenvolvimento dessa e de outras iniciativas, a entidade vai receber apoio financeiro de grandes empresas, como a General Electric. O Vice-Presidente da TI no Brasil, Neissan Monadjem, explica esse apoio afirmando: "Os empresários descobriram que é melhor investir no combate à corrupção do que na propina", pois "concluíram que, a longo prazo, corrupção é um péssimo negócio para eles."  

O lançamento da representação brasileira na Transparência Internacional deve ser saudado, assim como merece nosso aplauso qualquer oura iniciativa voltada para o combate à corrupção. Na verdade, iniciativas dessa ordem são urgentes e não poderiam vir em melhor hora, pois o Brasil não suporta mais ser rapinado por políticos e funcionários públicos inescrupulosos.  

O último relatório da TI, divulgado em outubro do ano passado, coloca o Brasil em 45º lugar numa lista que classifica os países na ordem de menor para maior índice de corrupção. Essa lista – para cuja confecção são consultados empresários, analistas de mercado e cidadãos quanto á sua percepção da corrupção no setor público de 99 países – vem sendo encabeçada, há alguns anos, pela Dinamarca, reputado como o país com menores índices de corrupção no mundo.  

Os entrevistados pelos pesquisadores da Transparência Internacional atribuem notas numa escala que vai de zero – para um nível extremo de corrupção – a 10 – para um nível insignificante de corrupção. O Brasil, com nota 4,1, está no grupo de países com "altos índices de corrupção". Entre os países latino-americanos, a situação do Brasil é pior do que a do Uruguai, que teve nota 4,4, do Peru, 4,5, da Costa Rica, 5,1, e muito pior do que a do Chile, que teve nota 6,9, e ficou classificado em 19º lugar, logo após os Estados Unidos.  

É muito triste vermos o Brasil classificado entre os países mais corruptos por uma organização com a seriedade da Transparência Internacional. Mais triste ainda é sermos forçados a reconhecer que esse diagnóstico corresponde fielmente à realidade.  

Os escândalos vêm a público numa sucessão aparentemente interminável. A Nação já passou por repetidos choques. Assistiu boquiaberta à revelação de esquemas tão tenebrosos que não se poderia supor que outros, ainda mais repulsivos, viriam à tona a seguir. Sofremos o trauma da CPI do caso PC-Collor. Pouco depois, explodiria o escândalo da Comissão de Orçamentos, que envergonhou o Congresso Nacional e só não enxovalhou sua honra graças à pronta resposta da instituição, cortando na própria carne, mediante a cassação de numerosos parlamentares. O episódio do desvio de verbas públicas destinadas ao pagamento de precatórios judiciais deu origem a nova Comissão Parlamentar de Inquérito, que viria a comprovar graves irregularidades praticadas por prefeitos e governadores. Nas últimas semanas, a opinião pública vem tomando conhecimento – entre abismada e desiludida – do verdadeiro lamaçal em que se transformou a administração da maior cidade do País.  

No meu Estado do Amapá, episódios protagonizados pelo Presidente da Assembléia Legislativa servem como exemplo da mais absoluta desfaçatez, do mais completo despudor na rapinagem do dinheiro público.  

O Deputado Fran Júnior é objeto de investigações por parte do Ministério Público e de seus próprios colegas, já havendo sido determinada a quebra de seu sigilo bancário, telefônico e fiscal. Descobriu-se, inicialmente, que a folha de pagamentos do Legislativo Estadual abriga o impressionante número de 1 mil 445 funcionários fantasmas, mais de dois terços do total de 2 mil e 16 servidores, já que apenas 571 efetivamente trabalham. Caso todos os funcionários da Casa resolvessem comparecer ao trabalho, a maioria não teria onde se sentar nem saberia em qual gabinete deveria dar expediente.  

O descalabro na Assembléia Legislativa amapaense, no entanto, vai muito além da contratação de funcionários fantasmas. O Ministério Público já investiga essas contratações irregulares e o desvio de verbas da Assembléia por parte de seu Presidente. No dia 9 próximo passado, uma comissão processante da Assembléia iniciou o processo de cassação do mandato de Fran Júnior.  

Embora 6% do orçamento geral do meu Estado sejam destinados à Assembléia – repasse que é um dos mais elevados de todo o País -, o Presidente não quitou os compromissos da Casa, atrasou os salários de funcionários e deputados e nunca prestou contas dos recursos que recebeu. O desmando chegou a tal ponto que um Deputado teve que recorrer à Justiça para garantir o seu salário.  

E pasmem, Senhoras e Senhores Senadores: o Deputado Fran Júnior é acusado também de, em dezembro, ter sacado na boca do caixa os 2 milhões de reais do duodécimo repassado pelo Governo do Estado à Assembléia Legislativa! Até hoje, ninguém sabe onde foi parar o dinheiro. Graças à quebra do sigilo bancário do Presidente da Assembléia, descobriu-se que a retirada do dinheiro foi feita poucos minutos depois de efetuado o depósito. Como se esse despudorado assalto aos cofres públicos não fosse suficiente, conseguiu-se apurar, ainda, que Fran Júnior mandou construir uma pista de pouso particular em propriedade sua às custa do Legislativo Estadual.  

Em função de todos esses escândalos, a Assembléia do Amapá está paralisada desde o dia 15 de fevereiro, não tendo votado, desde então, um só projeto. É que a maioria dos Deputados não reconhece mais a autoridade de Fran Júnior para presidir uma sessão. Por duas vezes, os Parlamentares votaram e aprovaram o afastamento temporário do Presidente, mas, nas duas oportunidades, ele foi reconduzido ao cargo por decisões judiciais. Quando, no início do corrente mês, os Deputados se reuniram para votar pela terceira vez seu afastamento, Fran Júnior reagiu de forma grotesca: mandou trancar as portas do prédio da Assembléia Legislativa. A solução foi realizar a sessão no prédio do Tribunal de Justiça, ocasião em que se instalou a comissão processante que, agora, poderá cassar de vez o mandato do Presidente da Assembléia.  

Na verdade, Senhoras e Senhores Senadores, as estripulias do Senhor Fran Júnior já vêm de muito tempo. Trabalha em sociedade com o Governador João Capiberibe patrono da corrupção no Estado do Amapá.  

Essa situação generalizada de uso de cargos públicos para a obtenção de vantagens pessoais envergonha a Nação. O povo brasileiro está farto, não suporta mais a interminável sucessão de escândalos. A consciência pública se repugna ante a voracidade de administradores, parlamentares, magistrados e outros funcionários públicos desonestos que saqueiam impune e desenfreadamente o dinheiro que pertence a toda a população.  

Vale ressaltar aqui minha firme convicção de que a maioria dos ocupantes de cargos e funções públicas é constituída de brasileiros honrados, que se sacrificam para dar o melhor de si à Nação, embora recebendo remunerações irrisórias. Feita essa ressalva, não se pode deixar de admitir, contudo, que a corrupção vem assumindo proporções assustadoras, seus tentáculos estendendo-se pelos três Poderes da República, seus eflúvios contaminando os mais diversos níveis hierárquicos do Serviço Público.  

Trata-se de uma situação intolerável. É forçoso reconhecer que os mecanismos de que dispomos para fiscalizar a atuação dos agentes públicos, para apurar os eventuais desvios verificados e para punir os envolvidos não estão se mostrando eficazes para coibir a escalada da dilapidação do patrimônio nacional. As imoralidades veiculadas pelos meios de comunicação diariamente são a melhor comprovação dessa ineficácia. Urge, portanto, que se promovam os necessários ajustes nesses mecanismos, de modo que o País possa dispor de instrumentos aptos à prevenção e à repressão da rapinagem praticada contra o dinheiro do povo.

 

Na oportunidade em que saúdo o início das atividades da seção brasileira da Transparência Internacional, deixo registrado nos Anais da Casa meu firme posicionamento de repúdio, minhas mais veemente condenação à escalada da corrupção que se verifica no País e, também, no meu Estado do Amapá.  

Era o que tinha a dizer.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2000 - Página 6422