Discurso durante a 32ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

PROTESTOS CONTRA O COMPROMETIMENTO ORÇAMENTARIO DO GOVERNO FEDERAL COM O PAGAMENTO DA DIVIDA EXTERNA.

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA. POLITICA FISCAL.:
  • PROTESTOS CONTRA O COMPROMETIMENTO ORÇAMENTARIO DO GOVERNO FEDERAL COM O PAGAMENTO DA DIVIDA EXTERNA.
Publicação
Publicação no DSF de 11/04/2000 - Página 6762
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA. POLITICA FISCAL.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PROMOÇÃO, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, PAIS, INICIATIVA, DEMISSÃO, FUNCIONARIO PUBLICO, MOTIVO, EXCESSO, ENCARGOS GERAIS DA UNIÃO.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, INEFICACIA, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, SAUDE, PREVIDENCIA SOCIAL, INSUFICIENCIA, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, AUSENCIA, INCENTIVO, PROGRAMA, RENDA MINIMA.
  • CRITICA, PRETENSÃO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL, MOTIVO, INSTRUMENTO, GARANTIA, RECURSOS FINANCEIROS, FINANCIAMENTO, DIVIDA EXTERNA, EXCESSO, SUJEIÇÃO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI).

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT – AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, eu gostaria muito de ter paciência com a mentira. Certamente nossas coronárias ficariam bem mais felizes se assim procedêssemos. Mas, talvez pelo aprendizado nas velhas famílias sertanejas, onde aprendemos a deixar de mentir ou a não mentir com a tabica de cipó-fogo, e como não podemos aqui usar essa tabica para corrigir as mentiras dos outros, acabamos usando o "murofone" de lamentações para tentar comunicar-nos, ora com os Senadores, ora com a opinião pública, ora tentando de alguma forma interferir nas ações do Governo Federal.  

Hoje, vou tratar de mais uma das mentiras do Governo Federal que é a questão do Orçamento. Acho que qualquer pessoa de bom-senso, independente das convicções ideológicas ou partidárias, se parar um pouco para observar tanto o discurso das personalidades políticas que dão sustentação ao Governo – algumas, porque outras ficam até constrangidas de fazer essa defesa no que diz respeito ao Orçamento -, as declarações dos tecnocratas de plantão que nada mais são do que subservientes colegas, amigos do Fundo Monetário Internacional, fica muito difícil de agüentarmos a discussão do Orçamento.  

Sei que esta é uma semana-chave para todos nós. Nesta semana, discutiremos a questão do salário mínimo, e espero que consigamos colocar a discussão do salário mínimo no mesmo dia da do Orçamento; estaremos discutindo demissão de servidores - mais uma das alternativas fantásticas, mágicas que o Governo Federal sempre utilizou para disputar opiniões com a opinião pública, porque esse Governo Federal estabeleceu todo o seu mandato fazendo propaganda enganosa perante a opinião pública. Ora com a necessidade de privatização – agora, em abril, estaremos fazendo dez anos de privatização, dez anos do mais abominável desrespeito à Constituição, do maior exemplo, certamente na história do País, de entreguismo patrocinado pelo Governo Federal; e falta pouco para terminar o resto da privatização, com as hidrelétricas, os bancos, e com o que restou da Petrobrás.  

Outra questão que sempre fez parte da cantilena enganosa do Governo Federal é da questão da demissão dos servidores públicos. Esta semana estará sendo discutida e talvez aprovada nesta Casa mais uma propaganda enganosa do Governo Federal, que é mais uma possibilidade que se abre para demitir servidor público. Claro que quem teve a oportunidade, nesta semana, de ler o Diário Oficial e, portanto, o balanço do próprio Tesouro Nacional, viu como realmente o Governo é frio e cínico com a mentira. Ao mesmo tempo em que o cinismo do Governo Federal o leva a discursar perante a opinião pública sobre a necessidade da educação, da saúde, da segurança pública, da moradia popular, ao mesmo tempo em que faz isso, ele estabelece mecanismos de achatamento salarial, precarização das relações de trabalho, demissão dos servidores públicos, justamente aqueles que prestam o serviço. Já tive a oportunidade de dizer nesta Casa que, por mais que o Governo Federal diga que quem faz educação, saúde, segurança pública é algum disco voador, a lógica formal demonstra que não é, são os famosos recursos humanos. E aí, para surpresa de todos nós, está aqui no próprio balanço financeiro da União, publicado no Diário Oficial , que revela o quanto gastam servidores civis e militares, incluindo aposentados e pensionistas. Sabem quanto? Dezesseis por cento, apenas 16% da despesa global da União.  

Quem teve a oportunidade também de identificar todos os dados relacionados à privatização sabe que mesmo o Governo Federal tendo privatizado mais de 100 das suas empresas públicas, nos setores mais importantes da economia, qual era a desculpa que o Governo dava: "É porque há dívida demais, é porque há problema demais na economia!" A dívida pública mobiliária e contratual interna, que, no início do processo de privatização, era de R$20 bilhões, atingiu R$511 bilhões, em julho de 1999. Portanto, todo o processo de entreguismo, todo o processo de perseguição ao servidor público, não adiantou absolutamente nada.  

E o Governo continua fazendo demagogia. Quem teve a oportunidade de averiguar os discursos feitos tanto pelos que vêm a esta tribuna discutir e defender o Orçamento quanto pelos tecnocratas do Governo pôde observar que falam no Orçamento de um trilhão. É preciso realmente muita paciência para agüentar o Governo Federal dizendo que é um Orçamento de um trilhão, quando, nesse R$1 trilhão, há o "pó royal", Senador Gilberto Mestrinho, de R$860 bilhões, da enganação da rolagem da rolagem da dívida.  

O Orçamento que o Governo Federal diz para a sociedade que é de R$1 trilhão, de riquezas, de fato é de R$360 bilhões, com praticamente R$150 bilhões comprometidos com o pagamento de juros e serviços da dívida, fora R$41 bilhões que eles conseguiram aprovar aqui, na maior irresponsabilidade, tirando dinheiro da educação, da saúde, da Previdência, para a tal DRU - Desvinculação da Receita da União.  

Quando olhamos o Orçamento, olhamos o próprio relatório do BID, do Banco Interamericano de Desenvolvimento, que está lá apresentando todos os dados, dizendo que estamos mais pobres do que há 30 anos, dizendo que o fosso que separa os países mais ricos dos mais pobres e, dentre estes, o abismo que separa os mais ricos dos mais pobres é cada vez maior. São eles que dizem isso! São os próprios organismos internacionais que dizem isso!  

Até podemos falar a respeito do que os organismos internacionais dizem, mas o Governo Federal não pode, porque se ajoelha covardemente diante de tudo o que determina o Fundo Monetário Internacional.  

E aí vamos para o Orçamento propriamente dito. Nessa semana, na audiência que tivemos para discutir o salário mínimo com o Ministro Pedro Malan, que começa a dizer que nunca se investiu tanto na saúde, na educação, vamos para as frias estatísticas oficiais, para os dados, para mostrar efetivamente como têm diminuído, dentro do Governo Fernando Henrique Cardoso, os investimentos de educação, de saúde, da Previdência, da assistência social – nesse setor, realmente, é preciso muito mais paciência para agüentar.  

O Governo Federal, que diz que não pode aumentar o salário mínimo, porque quebraria a Previdência - e não falarei mais na Previdência, pois já falei várias vezes a respeito do significado da mentira do rombo da Previdência e dos dados apresentados -; o Governo Federal não tem autoridade moral para falar da Previdência como uma desculpa de não aumentar o salário mínimo. Também dizem que o problema é da Lei Orgânica da Assistência Social, que não podem aumentar o salário mínimo porque dão muito dinheiro aos pobres, aos idosos, às crianças do trabalho infantil. E o mais grave: sabem quanto o Governo, por meio da lei, investe no Programa de Renda Mínima? Apenas 2%. Em relação ao combate ao trabalho infantil? Apenas 10%. Portanto, 90% das crianças miseráveis, mais de um milhão de crianças no País, segundo dados oficiais, e não segundo Estatuto do PT ou do PDT, estão sendo submetidas ao trabalho escravo. Não estou falando aqui nos 78 milhões de pobres, identificados pelo próprio Governo Federal; estou falando apenas de um milhão e quatrocentos mil miseráveis, que deveriam, por lei, ter acesso ao Programa de Renda Mínima; apenas 2% estão sendo contemplados em toda a discussão acerca do Orçamento.  

Assim, torna-se muito difícil, Sr. Presidente, Sr as e Sr s. Senadores, que consigamos ter paciência diante do Governo Federal. Fica muito difícil agüentar a cantilena, especialmente nesta semana, porque amanhã será votada aqui a Lei de Responsabilidade Fiscal, último instrumento que o Fundo Monetário Internacional impôs à Nação brasileira.  

A Lei de Responsabilidade Fiscal, para uns, é apresentada como se fosse um tratado de moralidade pública. Mentira! Tratado de moralidade pública já é o Código Penal, a legislação vigente, que prescreve os crimes contra a administração pública, cujos culpados, quando identificados, são postos na cadeia.  

Srs. Senadores, o tratado de moralidade que está sendo apresentado pelo Governo Federal é uma mentira que impede que os Estados aumentem seus investimentos nas áreas em que milhões de pessoas têm como referência única o próprio Estado, o próprio setor público: a educação, a saúde, a política agrícola, a moradia, a segurança pública. A própria Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece mecanismos para que os Estados continuem se endividando, para que os Municípios continuem se endividando, desde que a dívida a ser feita seja para pagar os juros e os serviços da dívida e que continue financiando a agiotagem internacional.  

Sr. Presidente, nesta semana, matérias extremamente importantes serão discutidas nesta Casa. E espero que tenhamos o bom senso, a sensibilidade, de entender a repercussão do que estamos votando, neste País que compromete metade da sua riqueza para financiar a agiotagem internacional, simplesmente para se curvar, subserviente, ao Fundo Monetário Internacional.  

Senador Gilberto Mestrinho – que tão bem falou sobre a soberania da Amazônia –, a grande soberania que está sendo rasgada neste País não é só a da Amazônia; é a da política econômica, visto que a própria Constituição diz que a soberania nacional é requisito irrenunciável para o estabelecimento da política econômica.  

Srs. Senadores, infelizmente, quem manda no Brasil, com a cumplicidade do Congresso Nacional, é o Fundo Monetário Internacional!  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/04/2000 - Página 6762