Pronunciamento de Geraldo Cândido em 13/04/2000
Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
CELERIDADE NA APROVAÇÃO DE PROJETO DE LEI DE SUA AUTORIA QUE VISA COIBIR COBRANÇA DE TAXAS ABUSIVAS PELOS BANCOS. COMENTARIOS A ENTREVISTA CONCEDIDA PELO SR. EDSON ARANTES DO NASCIMENTO, O PELE, SOBRE AS DENUNCIAS DE CORRUPÇÃO ENVOLVENDO FIGURAS POLITICAS NO BRASIL.
- Autor
- Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
- Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
BANCOS.
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
- CELERIDADE NA APROVAÇÃO DE PROJETO DE LEI DE SUA AUTORIA QUE VISA COIBIR COBRANÇA DE TAXAS ABUSIVAS PELOS BANCOS. COMENTARIOS A ENTREVISTA CONCEDIDA PELO SR. EDSON ARANTES DO NASCIMENTO, O PELE, SOBRE AS DENUNCIAS DE CORRUPÇÃO ENVOLVENDO FIGURAS POLITICAS NO BRASIL.
- Aparteantes
- Eduardo Suplicy.
- Publicação
- Publicação no DSF de 14/04/2000 - Página 7273
- Assunto
- Outros > BANCOS. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
- Indexação
-
- CRITICA, SISTEMA BANCARIO NACIONAL, COBRANÇA, EXCESSO, TAXAS, CLIENTE, USUARIO, MOVIMENTAÇÃO.
- DEFESA, AGILIZAÇÃO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, IMPEDIMENTO, EXCESSO, TARIFAS BANCARIAS, IMPOSIÇÃO, CLIENTE, MOVIMENTAÇÃO, BANCOS, POSSIBILIDADE, OPÇÃO, ALTERNATIVA, OPERAÇÃO FINANCEIRA, REDE BANCARIA, AUSENCIA, OFERECIMENTO, FONTE PAGADORA.
- COMENTARIO, ENTREVISTA, EDSON ARANTES DE NASCIMENTO, EX MINISTRO DE ESTADO, CRITICA, SITUAÇÃO, PAIS, AUMENTO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, PARTICIPAÇÃO, AUTORIDADE PUBLICA.
O SR. GERALDO CÂNDIDO
(Bloco/PT – RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, abordarei no meu pronunciamento dois temas pertinentes. O primeiro é sobre o sistema bancário brasileiro, que divide os cidadãos em duas categorias: os clientes e os usuários do banco. Os usuários do banco são os que possuem a chamada conta salário. As empresas enviam os trabalhadores às agências bancárias para que abram uma conta, mesmo sem terem feito essa opção. Em vista disso, o cidadão é sacrificado com o pagamento de taxas abusivas, assim como os demais clientes. Hoje, o sistema bancário cobra taxas absurdas de todos os seus clientes e também dos usuários que têm conta compulsória.
Diante dessa realidade, apresentei um projeto de lei no dia 30 de abril de 1999 que visa corrigir o abuso na imposição excessiva de tarifas aos clientes compulsórios de instituições bancárias, cuja abertura da conta foi motivada por imposição do órgão pagador para crédito da respectiva remuneração.
Amparadas desde 1996 pela Resolução nº 2.303, de 1996, do Banco Central do Brasil, as instituições bancárias lançaram mão da cobrança indiscriminada de tarifas pelos serviços prestados e postos à disposição. Como se não bastassem o IOF e a CPMF, agora os clientes dos bancos ficaram reféns da imposição arbitrária de um número extensivo de tarifas pela manutenção de contas, pela emissão do segundo talonário mensal de cheque, por extrato de conta corrente, por cheque inferior emitido, pela compensação de cheques, por emissão de cartão, enfim, são tantos encargos que a receita de operações de crédito, que tradicionalmente deveria ser a principal fonte de receita, está sendo substituída pela ganância tarifária.
Essa prática revela o alto grau de despreparo de nossas instituições bancárias, que não souberam ser eficientes em tempo de inflação moderada. É sabido que os bancos antes ganhavam fortunas com o lucro inflacionário. Logo após a dormência desse "dragão do lucro fácil", verificou-se no Brasil uma grande pressão dos banqueiros no sentido de criar dispositivos que propiciassem a manutenção dos altos índices de lucro auferidos anteriormente. Isso redundou na aprovação da Resolução nº 2.303 do Banco Central, que atendeu ao clamor dos bancos ineficientes. Prova dessa ineficiência é o fato de que a maioria amargou prejuízos com a queda da inflação, e, ainda, boa parte dessas instituições quebraram.
Somado a tudo isso, há o vergonhoso "socorro emergencial do Proer" de mais de R$21 bilhões, que beneficiou um sistema bancário falido e manchado por inúmeras irregularidades. Favores como o do Proer e a referida resolução fazem parte das conquistas dos banqueiros, entre outras, para manter o status superavitário dos "tempos áureos" de inflação galopante. Ora, esse status não pode continuar, principalmente porque os grandes financiadores são, historicamente, aqueles clientes já tão explorados com altas taxas de juros.
Há bancos cobrando indiscriminadamente tarifas que variam de R$3,50 a R$30,00 mensais pela manutenção de contas – um absurdo; de R$9,00 a R$13,00 por cada cartão emitido; de R$0,50 a R$1,30 por cheque de valor inferior; de R$4,50 a R$8,00 por emissão do segundo talão por mês, etc.
Diante dessa variação nos valores cobrados, o correntista compulsório não tem como evitar a duplicidade na cobrança dessas tarifas e também da CMPF quando da escolha de outro banco que opere com valores menores.
Fato é que o meu projeto, o PLS nº 282/99, propiciará condições práticas para que esse cliente pratique a opção de operar com outros bancos que não o oferecido pela fonte pagadora. Hoje, ao cliente não é dado o tratamento de reciprocidade que lhe é devido, isso porque há a compulsoriedade de sua conta. Com isso, espero que os clientes venham a receber tratamento de clientes especiais, pois, do contrário, poderão retirar seus recursos, sem ônus, e transferi-los para outra instituição que lhes ofereça tratamento e taxas especiais.
A matéria encontra-se na Comissão de Assuntos Econômicos, e o Senador Eduardo Suplicy, na condição de Relator, apresentou um substitutivo que não alterou o conteúdo da proposta inicial, mas ofereceu uma redação mais adequada à terminologia técnica adotada pela área bancária.
Destaca-se que o Senador Bello Parga apresentou um voto em separado contrário à proposição argumentando que já existe a modalidade de conta salário, a qual assegura os direitos ora propostos no projeto. Nesse sentido, foi convocada uma audiência pública com o Diretor do Banco Central, Sr. Sérgio Darcy da Silva Alves, no último dia 04 de abril. Naquela ocasião, o diretor divulgou a intenção de propor, na próxima reunião do Conselho Monetário Nacional, uma resolução com idêntico teor ao do PLS nº 282/99 e, ainda, avocou para o Banco Central, juntamente com o Conselho Monetário Nacional, a prerrogativa de legislar sobre essa matéria, na forma de resolução, enfatizando que o próprio Congresso Nacional delegou poderes para isso na Lei nº 4.595/64, que "dispõe sobre a Política e as Instituições Monetárias, Bancárias, Creditícias e cria o Conselho Monetário Nacional".
Diante do exposto, fica evidente que há uma lacuna a ser preenchida pelo Projeto da Conta Pagamento Padrão, fato que está levando o Bacen a tomar a iniciativa de propor uma resolução ao Conselho Monetário Nacional, com idêntico teor do PLS 282/9, quando, de acordo com o art. 48, inciso XII, da Constituição brasileira, essa competência é exclusiva do Congresso Nacional.
Portanto, a criação da Conta Pagamento Padrão não só alcançara os abusos nas cobranças de tarifas bancárias, como também assegurará mais dignidade aos clientes, que hoje são tratados como insignificantes e compulsórios, passíveis de suportar todos os encargos a eles impostos.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) – V. Ex.ª me permite um aparte?
O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ) – Pois não, Senador Eduardo Suplicy.
O Sr. Eduardo Suplicy (PT - SP) – Senador Geraldo Cândido, em primeiro lugar, quero cumprimentar V. Ex.ª por esse projeto sobre a Conta Padrão e dizer de como o Banco Central reconheceu o mérito de V. Ex.ª na apresentação da proposta, garantindo que a colocará em prática de pronto, por resolução do Conselho. Avalio que, em decorrência disso, não haveria qualquer problema em também se votar a matéria aqui. Aproveito o ensejo para comunicar que mais de mil representantes de povos indígenas acabam de, por unanimidade, formular um convite ao Senador Antonio Carlos Magalhães para que compareça à assembléia a se realizar na reunião da Comissão de Direitos Humanos, da Câmara Federal, presidida pelo Deputado Marcos Rolim. Assim sendo, estaremos acompanhando o Presidente Antonio Carlos Magalhães, que ouvirá as reivindicações das diversas nações de povos indígenas, para que, logo, o Senado Federal, apreciando a Convenção n.º 169 da OIT, providencie, junto ao Poder Executivo, os passos necessários a completar a demarcação das áreas indígenas e, ainda, que o Congresso Nacional vote o Estatuto dos Índios, com base nos anseios de todas as nações indígenas. Meus cumprimentos!
O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT – RJ) – Obrigado, Senador Eduardo Suplicy. Porém, há um detalhe: há uma diferença entre a resolução e a lei. O fato é que a resolução poderá ser revogada, ou seja, o Conselho Monetário Nacional pode baixar uma resolução e, daqui a dois anos, com a pressão dos banqueiros, pode revogá-la. Portanto, mantenho o meu propósito de que o projeto continue tramitando nesta Casa, até que seja aprovado.
Sr. Presidente, passo, então, a falar sobre o outro tema que me trouxe à tribuna no dia de hoje. Trata-se da entrevista concedida há cerca de duas semanas pelo cidadão Edson Arantes do Nascimento, que todos conhecemos como o atleta Pelé. Suas declarações, muito polêmicas, foram bastante comentadas pela imprensa – aliás, não é a primeira vez que o Pelé dá declarações polêmicas. Em outra oportunidade, S. Sª se pronunciou dizendo que "o povo brasileiro não sabia votar". A nosso juízo, foi uma afirmação absurda. Primeiro, porque desqualificava o cidadão brasileiro, e, em segundo lugar, como vivíamos em pleno regime autoritário, onde os presidentes eram eleitos pelo voto indireto, significava um apoio à manutenção das eleições indiretas. Como o povo não sabia votar, como poderia escolher o seu presidente? Portanto, deveria permanecer a eleição pelo Colégio Eleitoral. Isso não foi lembrado pela imprensa, mas o faço agora, porque o Sr. Pelé é mestre em dizer coisas realmente bastante questionáveis.
Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, chocado com a onda de denúncias de corrupção envolvendo figuras públicas e autoridades de diversas esferas de governo, Pelé declarou que tem vergonha do Brasil. Tal declaração, partindo de quem partiu, não poderia deixar de ter grande repercussão, provocando reações as mais diversas pelo País afora, umas de concordância, outras de discordância.
É preciso concordar que as recentes denúncias envolvendo o Prefeito Celso Pitta, as revelações da CPI do Narcotráfico, as denúncias contra assessores diretos do Governador Anthony Garotinho, o envolvimento de membros do Poder Judiciário e do Congresso Nacional em desvio de verbas públicas, as trocas de acusações entre dois importantes membros desta Casa, entre muitas e muitas outras, revelam uma situação de degeneração do aparelho estatal brasileiro que não pode deixar de nos fazer sentir vergonha.
Na verdade, trata-se de uma crise generalizada do modelo econômico que o Brasil está enfrentando. Estamos vivenciando um processo de barbárie social; barbárie esta que se dá quando as categorias sociais não têm mais compromissos com as regras da sociedade, ou, como dizia Marx, quando se dá a lumpenização de certas categorias. Os lumpemproletários, que moram em favelas, em vilas rurais, apelam para a violência a fim de resolver os problemas de sobrevivência, partindo ora para a prostituição, ora para o narcotráfico. E os lúmpens de cima, da burguesia brasileira, como não têm mais compromisso nenhum com o modelo, tratam, cada um a seu modo, de abocanhar o máximo de dinheiro público que podem: ou na contravenção pelo narcotráfico, no bingo, ou no contrabando.
Mas por que Pelé não deu essa declaração há mais tempo? Será preciso relembrar os escândalos de Collor/PC Farias, do Orçamento, dos precatórios, da mandioca, das privatizações fraudulentas, do Proer, das barganhas com verbas públicas para a compra de votos que aprovassem a reeleição do atual Presidente e de tantos outros? Pelé não deveria se sentir, ele também, responsável por ter usado seu imenso prestígio para, mesmo depois de tudo isso, apoiar este governo e, inclusive, ter participado dele como Ministro?
A verdade é que a corrupção está na raiz desse sistema, é inerente a ele. Favorecimentos, superfaturamentos, uso da máquina e do dinheiro público para fins eleitorais e de enriquecimento ilícito, enormes somas de dinheiro para campanhas eleitorais em troca de favores posteriores, tal tem sido a tônica do processo político da classe dominante brasileira, na sua maioria viciada em favores do Estado para continuar reproduzindo seus lucros sem risco algum.
Faz-se da pobreza uma moeda de troca eleitoral e de demagogia barata; quanto maior a miséria, mais facilmente e mais barato se compra o voto. O que dizer então dessa vergonhosa e crescente dívida do Governo brasileiro, que sustenta os banqueiros nacionais e estrangeiros às custas do empobrecimento da população? E desta transferência de recursos públicos para o setor privado por meio de pagamento de juros e também da entrega, quase gratuita, do patrimônio estatal, que é uma forma de corrupção institucionalizada?
Muitos pensam, é verdade, que a responsabilidade, afinal de contas, é do próprio povo, pois é ele que elege e reelege os políticos. Os que assim pensam esquecem as distorções de nosso sistema eleitoral, que dão peso diferente aos eleitores de diferentes Estados, sempre favorecendo o voto conservador e mais sujeito às pressões de oligarquias locais. Esquecem, principalmente, que o eleitorado não tem acesso a informações que o permitam escolher com maior consciência seus representantes. Com efeito, os grandes meios de comunicação de massa estão nas mãos de um pequeno número de grandes grupos que controlam quais informações podem ser publicadas e como devem ser apresentadas. Isso sem falar na difusão da apologia da competitividade, que faz a pessoa ver a outra como um competidor que deve ser superado; da ideologia do sucesso, que as condiciona a buscar, a qualquer preço, a vantagem imediata e o acúmulo de bens materiais, enfim, todo o arsenal da ideologia neoliberal. Além do lucro fácil, impõem com isso um padrão de comportamento para toda a sociedade, que estimula o individualismo, enfim, a reprodução em larga escala da corrupção, institucionalizada ou não.
Como esperar, nessas condições, que o povo resista às inúmeras ofertas de todos os tipos com que compram seu voto e consiga escolher, com consciência política, seus verdadeiros representantes?
Mesmo assim, já não é de hoje que o povo se sente extorquido, espoliado. Por isso, vem progressivamente desacreditando das instituições públicas. Este povo construiu uma das maiores economias do mundo, continua produzindo riqueza, mas a vê, quotidianamente, indo parar no bolso e nas contas correntes dos mesmos que, há décadas, controlam o poder neste País. Esses vêm sendo vitoriosos, mas uma parcela cada vez maior da população vem-se contrapondo a tudo isso, lutando e se manifestando pelo fim desse sistema.
Prefiro pensar que a declaração de Pelé significa uma tomada de consciência e uma mudança de posição. Por isso, digo-lhe que não tenha vergonha do Brasil, mas de sua classe dirigente; que se orgulhe de pertencer a um povo que resiste bravamente, apesar do massacre a que tem sido submetido; e que se junte àqueles que lutam por um Brasil diferente, soberano, democrático e verdadeiramente livre.
Muito obrigado, Sr. Presidente.