Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

NECESSIDADE DE REFORMULAÇÃO NA LEGISLAÇÃO DOS FUNDOS DE PENSÃO.

Autor
Moreira Mendes (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Rubens Moreira Mendes Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • NECESSIDADE DE REFORMULAÇÃO NA LEGISLAÇÃO DOS FUNDOS DE PENSÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 14/04/2000 - Página 7300
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • ANALISE, HISTORIA, ESTATIZAÇÃO, OCORRENCIA, BRASIL, CRIAÇÃO, FUNDOS, PENSÕES, EMPRESA ESTATAL, EXCESSO, PRIVILEGIO, FRAUDE, IRREGULARIDADE, COMENTARIO, ATUAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PRECATORIO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).
  • DEFESA, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, FUNDOS, PENSÕES, AUMENTO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, FISCALIZAÇÃO, DESNECESSIDADE, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, SETOR PUBLICO.
  • REGISTRO, PREJUIZO, TESOURO NACIONAL, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, MOTIVO, DEFICIT, FUNDOS, PENSÕES.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, ORIGEM, CAMARA DOS DEPUTADOS, TRAMITAÇÃO, SENADO, DEFESA, SEGURANÇA, PREVIDENCIA PRIVADA, PREVIDENCIA COMPLEMENTAR.

O SR. MOREIRA MENDES (PFL – RO) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o exagerado processo de estatização que ocorreu no Brasil nas décadas de 60 a 80 possibilitou o surgimento de grandes empresas estatais que instituíram fundos de pensões com benefícios demasiado generosos para seus empregados.  

Trata-se, efetivamente, da utilização abusiva de recursos públicos, em benefício de alguns segmentos privilegiados e em detrimento dos demais cidadãos e contribuintes brasileiros.  

Muitas distorções, abusos, fraudes e irregularidades, ocorreram desde a implantação desse sistema no Brasil, em que escassos recursos públicos financiaram, direta ou indiretamente, grande número de operações desastradas ou fraudulentas realizadas por esses fundos de pensões.  

Muito disso se explica pelo fato de a antiga legislação que rege a matéria ter atribuído às entidades patrocinadoras públicas a fiscalização e o controle de seus próprios fundos de pensão, gerando corporativismo, excessiva generosidade na concessão de benefícios e uma verdadeira promiscuidade entre recursos públicos e particulares.  

Não há dúvida de que o atual sistema de fundos de pensões necessita de maior transparência, mais credibilidade, melhor fiscalização, mais tecnologia, melhores procedimentos internos, melhor gerenciamento e uma legislação mais adequada e mais estável, para que possa cumprir seu papel de gerador de poupança e investimento de longo prazo.  

O montante de recursos formado pelas contribuições das entidades patrocinadoras e seus empregados, acrescido dos rendimentos proporcionados por suas aplicações financeiras e valorizações de seus ativos, representa alguns bilhões de reais, o que torna os fundos de pensão os mais importantes investidores institucionais das economias modernas.  

Para que possam cumprir as obrigações decorrentes de seus planos de benefícios, os ativos componentes da estrutura patrimonial dos fundos de pensão necessitam de liquidez, rentabilidade, segurança e diversificação das aplicações.  

Os benefícios pagos pelos fundos de pensão deveriam guardar estreita correlação com as contribuições pessoais de cada segurado, a fim de que o sistema mantenha um permanente equilíbrio atuarial e financeiro, sem depender de recursos públicos.  

Os fundos de pensão foram utilizados como instrumentos de política econômica, o que acabou desvirtuando seus objetivos e gerando graves distorções, tais como: desvio de recursos públicos, troca de favores, corrupção, enriquecimento ilícito, envolvimento em operações suspeitas, além de outras práticas condenáveis existentes na vida pública brasileira.  

Diversas Comissões Parlamentares de Inquérito identificaram graves irregularidades relacionadas com os fundos de pensões das estatais.  

A Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou os precatórios demonstrou que diversos fundos de pensão de empresas estatais faziam parte do esquema de fraudes montado, desviando recursos dessas instituições.  

A Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a apurar " denúncias de irregularidades cometidas em fundos de pensões de estatais e na Petrobrás ", o chamado esquema PP , identificou uma rede de tráfico de influência articulada e usufruída pelo Sr. Pedro Paulo Leoni Ramos, antigo titular da Secretaria de Assuntos Estratégicos.  

Essa CPI apurou muitas fraudes e irregularidades praticadas por diversos fundos de pensões na compra e venda de ações, debêntures, títulos públicos, letras hipotecárias e imóveis.  

A relação financeira entre os fundos e suas patrocinadoras, o percentual de contribuição, as dívidas, os déficits e a regularidade da nomeação e demissão de dirigentes dos fundos também constituem focos de irregularidades existentes nessas entidades.  

Muitos desses fundos representam verdadeiros sorvedouros de recursos públicos: estima-se que o Brasil perdeu cerca de 10 bilhões de reais em decorrência de déficits atuariais dos fundos de pensões das empresas estatais.  

O rombo dos fundos de pensões das estatais reduziu o valor das empresas estatais privatizadas, pois esse prejuízo teve que ser abatido do preço final das empresas privatizadas.  

Trata-se de um dos maiores escândalos da história recente do Brasil, pois a incompetência, a negligência e a fraude andaram de mãos dadas na gestão temerária da grande maioria desses fundos. É impossível calcular com exatidão quanto o Brasil perdeu em decorrência de fraudes, abusos e irregularidades praticados em sua gestão.  

Não existe uma fiscalização efetiva desses fundos, não se sabe a verdadeira origem desses passivos, cujos responsáveis não foram identificados nem, tampouco, processados.  

Tudo ocorreu como em terra sem lei e sem ordem, sem administração e sem código penal: a grande maioria dos gestores dos fundos de pensões das estatais ultrapassaram o limite da irresponsabilidade , realizando operações que agridem frontalmente a lei e a ética.  

Grande parte do desequilíbrio estrutural existente nos fundos decorre do modelo de funcionamento concebido, que se baseia no chamado benefício definido , que independe do desempenho econômico-financeiro da entidade.  

A CPI dos precatórios demonstrou que muitas fraudes praticadas por quadrilhas das quais participavam bancos, corretoras, prefeituras e alguns governos estaduais terminavam em prejuízo transferido para as carteiras de fundos de pensões.  

A cumplicidade entre as diretorias dos fundos e as empresas patrocinadoras facilitam essas fraudes e irregularidades, propiciando o surgimento de empréstimos a juros negativos, transferência de pensões a herdeiros, financiamentos de imóveis com grandes vantagens e subsídios e outras formas de dilapidação do patrimônio dos fundos por administradores desonestos.  

O dinheiro público tem sido tratado com tal descaso que na privatização da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) , os compradores pagaram menos 450 milhões de reais em decorrência de terem assumido o déficit do fundo de pensão dos empregados da empresa. Posteriormente, a empresa renegociou esse déficit com os empregados, que assumiram parte do prejuízo (48%).  

O descaso com o dinheiro público deu um lucro de mais de 200 milhões de reais a um grupo privado, em cima de um rombo financeiro existente no fundo de pensão dos funcionários.  

A Petrobrás recentemente teve grande perda patrimonial ao provisionar 5,6 bilhões de reais para o fundo de pensão de seus funcionários, mais 2,2 bilhões de reais para planos de assistência médica e odontológica.  

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, não caberia aqui, neste meu modesto pronunciamento, arrolar todos os principais fatos que contribuíram para a situação deficitária em que se encontra a maioria dos fundos de pensão.  

No entanto, não podemos deixar de registrar alguns atos que se caracterizam pela ousadia, extravagância e graves prejuízos ao Tesouro Nacional.  

Um desses casos foi protagonizado pela ex-ministra Zélia Cardoso de Mello, que determinou que o fundo de pensões dos funcionários do Banco do Brasil ( Previ) adquirisse grandes lotes de ações da Sade Engenharia , a fim de salvar essa empresa de dificuldades financeiras.  

Na privatização da Light o Governo colocou 46 milhões de dólares para sanear o fundo de pensões dos funcionários e 270 milhões de dólares para o fundo da Usiminas.  

O fundo de pensão dos funcionários dos Correios comprou 4 pavimentos do Centro Empresarial Varig, em Brasília, por 7,1 milhões de dólares, em janeiro de 1992. A Caixa Econômica Federal avaliou o imóvel por apenas 4,9 milhões de dólares em dezembro do mesmo ano.  

São tantos os negócios inexplicáveis, as fraudes, as operações superfaturadas, as irregularidades que não teríamos tempo para expor neste nosso pronunciamento.  

Casos há que seriam cômicos se não fossem trágicos: o fundo de pensões dos funcionários da Light, Braslight, adquiriu 2005 túmulos no cemitério Jardim da Saudade, no Rio de Janeiro.  

A revista Veja publicou na edição de 17.11.93 uma importante matéria que, infelizmente, continua atual: " além dos deslizes de grande porte, que dão prejuízos milionários aos fundos, existem os deslizes particulares. Dois banqueiros contaram à VEJA na semana passada que os operadores dos fundos de pensão roubam dinheiro de duas maneiras. Quando o fundo vai fazer uma compra grande na bolsa de valores, o seu operador, ou o seu diretor, avisa um amigo. Na véspera, o amigo compra as ações que estão na mira do fundo. No dia seguinte, vende os papéis por um preço muito mais alto. O mercado dá a essa operação o apelido de "embonecamento". Todos sabem que ela ocorre quase sempre, mas, como os fundos não prestam conta a ninguém, fica difícil impedir a falcatrua. É comum, também, que uma corretora opere por ordem de um fundo de pensão, mas contabiliza um ou outro negócio mais lucrativo em seu próprio nome . Depois, divide o lucro com o amigo do fundo" . 

O Relatório Final da Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado Federal criada para apurar irregularidades nos fundos de pensões de empresas estatais afirma que: a) a alegada independência administrativa que um fundo de pensão, por lei, deve praticar, cai por terra diante da interveniência da direção da patrocinadora dos negócios – em geral nos grandes negócios – do fundo; b) associada a essa relação incestuosa entre patrocinadora e fundação, constata-se a vinculação do uso dos recursos financeiros do fundo a interesses políticos, inteiramente estranhos aos objetivos da previdência complementar; c) nasce desse caldo de cultura o tráfico de influência, as relações espúrias e a tão malsinada "comissão" que se transformará em propina nas mãos dos apaniguados, nascida da superavaliação em percentagem correspondente ao valor da operação.  

Para que tenhamos uma previdência realmente social, é necessário reformular completamente os fundos de pensões financiados com recursos públicos, que somente podem ser usados em obediência aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e transparência.  

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, queremos um sistema de previdência complementar que tenha condições de honrar os compromissos assumidos com seus beneficiários, respeitando o esforço de poupança, que muitas vezes representa toda uma vida de sacrifícios de milhares de pessoas.

 

Não queremos que o fruto do esforço de milhares de pessoas desapareça em decorrência de incompetência, desvios ou fraudes.  

Queremos uma previdência privada que seja um verdadeiro instrumento gerador de poupança e investimento de longo prazo.  

Queremos um sistema de previdência complementar que tenha padrões de segurança econômico-financeira e atuarial, garantia de solvência, liquidez, com reservas estabelecidas tecnicamente, de modo claro, transparente e fidedigno, com avaliação e auditoria permanentes e participação efetiva de todos os beneficiários.  

Queremos que os fundos de pensão cumpram sua importante missão social e econômica, complementando aposentadorias, gerando poupança, empregos e novos investimentos produtivos, de forma legítima, transparente e sem distorções dos seus objetivos.  

Já aprovado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, encontra-se, atualmente, na Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal, o Projeto de Lei n° 1-2000, originário da Câmara dos Deputados e que trata da relação dos fundos de pensões com suas respectivas entidades públicas mantenedoras. Faço um apelo a todos os eminentes membros desta Casa para que realizem um exame acurado dessa matéria e deliberem com a urgência que a importância desse assunto recomenda.  

 

Ü Y # 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/04/2000 - Página 7300