Discurso durante a 38ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

POSICIONAMENTO DO PPS A IMPLANTAÇÃO DO FINANCIAMENTO PUBLICO DE CAMPANHAS ELEITORAIS NO BRASIL. (COMO LIDER)

Autor
Paulo Hartung (PPS - CIDADANIA/ES)
Nome completo: Paulo César Hartung Gomes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • POSICIONAMENTO DO PPS A IMPLANTAÇÃO DO FINANCIAMENTO PUBLICO DE CAMPANHAS ELEITORAIS NO BRASIL. (COMO LIDER)
Aparteantes
Artur da Tavola, Casildo Maldaner, Edison Lobão, Heloísa Helena, Sebastião Bala Rocha, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2000 - Página 7599
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • APOIO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO POPULAR SOCIALISTA (PPS), APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, FINANCIAMENTO, SETOR PUBLICO, CAMPANHA ELEITORAL, JUSTIFICAÇÃO, BENEFICIO, DEMOCRACIA, AMPLIAÇÃO, ACESSO, CANDIDATO, MELHORIA, FISCALIZAÇÃO, COMBATE, CORRUPÇÃO.
  • DISCORDANCIA, PROJETO DE LEI, POSSIBILIDADE, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, RECURSOS, CANDIDATO, GASTOS PESSOAIS, MOTIVO, DISCRIMINAÇÃO, CANDIDATURA, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, RISCOS, TRANSFERENCIA, DINHEIRO, TERCEIROS.
  • DEFESA, REFORMA POLITICA, REFORÇO, PARTIDO POLITICO, RETIRADA, TUTELA, ESTADO.

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Câmara dos Deputados aprovou, na semana passada, o relatório do Deputado Carlito Merss, do PT de Santa Catarina, ao Projeto de Lei de autoria do Deputado Aloysio Nunes Ferreira, atualmente ocupando o cargo de Ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, que trata do financiamento público de campanha para eleições futuras. A retomada da tramitação da matéria na Câmara reabriu, Sr. Presidente, o debate nacional em torno da reforma política.

Na condição de Líder do PPS no Senado, trago com este pronunciamento a nossa contribuição às discussões. Como todos aqui já devem saber, é clara a posição do Partido sobre o tema. Por diversas vezes, o Senador Roberto Freire, Presidente Nacional do nosso Partido e uma das grandes autoridades do País no assunto, trouxe a público a nossa posição favorável ao financiamento público exclusivo, dentro de uma reforma política ampla e democrática. Suas opiniões foram explicitadas na tribuna da Casa, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, em debates e em dezenas de artigos e entrevistas publicadas em jornais e revistas brasileiras.

Não defendemos o financiamento público por uma questão tática, destituída de princípio, à semelhança de algumas iniciativas da base do Governo que apresentou propostas de reforma política apenas para reforçar o condomínio dos grandes Partidos existentes e para impedir a emergência do novo na política nacional. Se optamos sem vacilação pela instituição do financiamento público das campanhas é por entender que, assim, as eleições poderão se processar em um verdadeiro ambiente democrático, com condições iguais de disputa para todos os candidatos, um princípio que se afirma cada vez mais nas democracias modernas. Deixar o financiamento das campanhas nas mãos de empresa, públicas ou privadas, é comprometer a lisura do pleito e transformar os parlamentos em meras correias de transmissão de interesses particulares, por onde transitam a impunidade, a corrupção e outros tipos de ilícito.

Li a entrevista do Ministro no Jornal do Brasil de ontem e gostei da expressão "democracia não pode ser privatizada". Diria mais, a República não pode ser assaltada. Não estou aqui a formular um voto de desconfiança às empresas que concorrem para o desenvolvimento dos Estados federados e do nosso País. É uma questão de concepção: empresa, na nossa visão, é para gerar riquezas, renda, trabalho; a democracia deve ser obra, exclusiva, da consciência e da cidadania.

Manter a atual estrutura de financiamento de campanha, assentada em milhões de reais cuja procedência a Justiça Eleitoral desconhece, tornou-se ainda mais desastroso do ponto de vista da Nação e da democracia, quando sabemos que o Estado vem abandonando rapidamente algumas de suas funções produtivas através do processo de privatização. Antigas empresas públicas que tradicionalmente alocavam recursos nas campanhas dos Partidos majoritários e no Poder foram vendidas a empresas privadas. Como se a alteração de quadro não bastasse, o capital estrangeiro, que todos nós brasileiros queremos no nosso País, aumentou a sua área de ação no conjunto da economia brasileira. Mais do que nunca - e é importante ressaltar isso -, o público precisa prevalecer. A eleição é para provimento de cargos públicos. Não faz sentido que o financiamento das campanhas eleitorais não seja público.

Embora a Câmara esteja tratando de um projeto que traz em seu bojo razoáveis propostas, em relação a pelo menos uma delas, nós do PPS nos reservamos o direito de destacar a nossa divergência.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Permite-me V. Ex.ª um aparte, eminente Senador Paulo Hartung?

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Concedo-lhe o aparte com prazer, ilustre Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Ilustre Senador Paulo Hartung, pessoalmente, tenho uma posição fixada a esse respeito há muito tempo. Fui autor, juntamente com o Senador Pedro Simon, de um projeto em que propusemos exatamente isto: o financiamento público de campanha. Quando fui Deputado Federal, cheguei a fazer um estudo e apresentar uma proposta de emenda constitucional em que se destinava 0,002% da receita pública do Orçamento da União para financiamento de campanha. Aqui, no Senado, concebemos um projeto mais bem elaborado, mais ou menos à feição do que ocorre na Alemanha, ou seja, uma espécie de indenização pelos votos recebidos por cada Partido. Com isso, fazia-se uma distribuição eqüitativa dos recursos públicos para efeito de financiamento de campanha. Entendo que todos devem ter a mesma oportunidade na disputa eleitoral. Evidentemente, parece que os Parlamentares que apóiam o Governo estão em situação melhor para captar recursos legais para sua campanha do que os oposicionistas. Creio que todos devem ter a mesma oportunidade. Portanto, sempre fui favorável a essa iniciativa, à qual continuo fiel. Entendo que essa é a maneira de democratizar os pleitos neste País.

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Acolho o aparte que V. Exª me oferece, Senador Edison Lobão, e acho que esse é um debate que teremos que aprofundar. Volto a dizer, se não for um factóide - hoje, até uma brilhante jornalista levanta essa suspeita -, acho que tanto na Câmara como no Senado teremos que nos debruçar sobre a matéria. O PPS tem essa visão de financiamento exclusivamente público e estamos abertos à discussão, porque consideramos um grande avanço na vida política do País.

O Sr. Sebastião Rocha (Bloco/PDT - AP) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Concedo o aparte ao nobre Senador Sebastião Rocha.

O Sr. Sebastião Rocha (Bloco/PDT - AP ) - Senador Paulo Hartung, quero, primeiro, cumprimentá-lo pelo tema que V. Exª escolheu para trazer à tribuna na tarde de hoje, e dizer que o nosso Partido, o PDT, pensa da mesma forma. Não quero aqui ser a voz da desconfiança, como V. Exª mencionou em uma parte do seu pronunciamento, nem do ceticismo, e colocar dúvidas e até mencionar que, de repente, podemos aqui estar falando sobre uma utopia. Se de fato pudermos chegar a um texto final nas duas Casas que conclua com financiamento público de campanha, será um avanço extremo, inimaginável tempos atrás. Esse projeto tem o apoio do Presidente da República, que se posicionou e fez recentemente pronunciamento na imprensa a respeito disso. Entendo, Senador Paulo Hartung, que pode estar se tratando de uma utopia, pela dificuldade que se tem de se operar essa questão na prática. Há pessoas aquinhoadas, com posses. Como é que essas pessoas não vão incluir nos gastos de campanhas recursos próprios? Há, de outra forma, aqueles que vão tentar se prevalecer da legislação para, além dos recursos públicos, utilizar recursos de doações de campanha. Todavia, acho que nada disso invalida a tentativa do Congresso Nacional de buscar um mecanismo que torne mais justa a disputa eleitoral, que torne mais próximo o embate entre aqueles que nada têm para gastar em uma campanha política e aqueles que muito possuem ou que muito obtêm por meio de financiamentos do setor privado. Então, sou favorável - penso que o PDT também tende a que esse assunto deva prevalecer -, mas precisamos fazer um esforço muito grande para que o texto seja o mais equilibrado possível, inclusive com punições graves, severas, para quem deixar de cumprir e de seguir o estrito texto da lei de financiamento público exclusivo, se for este o texto final.

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Senador Sebastião Rocha, quero agradecer o aparte de V. Ex.ª, que, de certa forma, complementa o meu pronunciamento.

Sr. Presidente, não concordamos que o financiamento público abra um precedente para os candidatos que desejem financiar suas candidaturas com recursos próprios. Se tal premissa fosse adotada, a nova legislação eleitoral estaria abrindo uma brecha legal para beneficiar os candidatos ricos - e é isso que precisamos evitar -, em detrimento daqueles sem recursos, especialmente os saídos do universo do mundo do trabalho e da luta comunitária e popular. Correríamos o risco de viabilizar uma espécie de xogunato da plutocracia em nosso País, além de aceitar um mecanismo por onde os ilícitos e transferência de recursos de terceiros poderiam ocorrer.

As vozes conservadoras podem alegar que o sistema de financiamento público de campanha não é tão democrático quanto apregoamos e que contém falhas. Exemplo já citado seria o recente episódio ocorrido na Alemanha, onde um dos grandes líderes políticos deste século, o ex-Primeiro-Ministro Helmut Kohl, responsável pela unificação de um país então dividido, foi denunciado por receber ilegalmente contribuições para o financiamento do seu partido, o CDU, em eleições naquele país. O fato reafirma a nossa posição: Helmut Kohl só foi denunciado pela existência da instituição do financiamento público de campanha. Não existem modelos, na nossa visão, totalmente imunes ao ilícito, mas o de financiamento público é, seguramente, o mais democrático e também o mais transparente.

Outra discussão que o meu Partido considera equivocada é a afirmação de que o financiamento público de campanha retiraria recursos dos programas sociais. É muito comum ouvir isso, mas não é verdade. Trata-se de uma visão distorcida e com um viés, já que está na moda, mal-intencionado. É bom que se diga isso. Na verdade, o modelo, ao inibir a corrupção e a privatização da política, permitiria a canalização da totalidade dos recursos orçamentários para os programas sociais, vedando os ralos do clientelismo e dos lobbies que, segundo algumas estimativas, chegam a engolir, na penumbra do Estado, até 30% de todos os recursos destinados para a área social.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Concedo o aparte a V. Exª, Senador Tião Viana, por quem tenho uma grande admiração.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Meu caro Senador Paulo Hartung, quero cumprimentá-lo e externar a minha admiração pelo pronunciamento de V. Exª. O assunto abordado é de grande importância e muito atual, porque diz respeito a quem conhece o dia-a-dia da luta política, as desigualdades enfrentadas nos processos eleitorais, a falta de transparência e o manto que encobre a lucidez e a clareza do cotidiano dos embates políticos, que é exatamente o momento da eleição. Quem está por trás das eleições, muitas vezes, passa despercebido da sociedade e do juízo crítico. Penso que esse instrumento que V. Exª defende aqui fortalece e faz avançar a democracia e a transparência do processo eleitoral, diminuindo as desigualdades entre os poderosos e aqueles que combatem apenas por valores sociais e ideológicos dentro do pleito eleitoral. Acredito que esse será mais um instrumento. Quando vejo hoje o horário eleitoral, que muitos setores sociais consideram como atrasado, antipático, tenho uma posição totalmente divergente. Penso que pode até ser desconfortável um momento ou outro do horário eleitoral, mas contribui para um debate que se aproxima do direito de oportunidades, no mesmo nível de uma discussão política inserida na ordem do dia da sociedade para uma livre interpretação. O financiamento público é mais um instrumento de eqüidade e de aproximação de direitos iguais num debate político desse tipo. Nesse processo a que V. Exª se refere, o mais importante é que, de fato, seja ele feito sem possibilidade de subterfúgios e de caminhos escusos, que podem esconder outros privilégios e benefícios. No entanto, sem dúvida, o teor do seu pronunciamento aponta para uma visão clara, objetiva e que pode contribuir para o fortalecimento da democracia.

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Senador Tião Viana, agradeço-lhe o aparte, que complementa o meu pronunciamento. V. Exª afirma com clareza que a política e a democracia não podem ter donos.

Outro dia ouvi uma frase interessante, proferida pelo Prefeito da Capital do Espírito Santo, Sr. Luiz Paulo Velloso Lucas, que disse que ama os pobres, mas odeia a pobreza. Trata-se de assertiva muito correta, que leva à discussão desse tema referente ao conteúdo da política, das eleições e da forma pela qual se tutela o processo de decisão em nosso País.

V. Exª, de certo modo, reflete esse pensamento. Precisamos de uma democracia que permita igualdade de oportunidades. Pensar o socialismo e a igualdade nos tempos modernos é considerar o acesso à educação, à internet e também a possibilidade de acesso igualitário na vida política de um país nas decisões.

O Sr. Artur da Távola (PSDB - RJ) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Concedo o aparte, com muito prazer, a esse verdadeiro professor que temos no plenário da Casa, Senador Artur da Távola.

O Sr. Artur da Távola (PSDB - RJ) - Muito obrigado a V. Exª. Antes eu pudesse ser professor de mestres como V. Exª e tantos outros Srs. Senadores. O discurso de V. Exª é tão bom que ficamos seduzidos a interrompê-lo. A verdade é que sinto que a reforma política está a se aproximar de uma decisão por parte do Congresso Nacional, e temos realmente que entrar nessa matéria. O País está maduro neste momento para algo que é fundamental. O Brasil precisa criar uma representação política que mereça o respeito da Nação em cima da qual ele possa organizar a vida do País. Os escritores clássicos sempre diziam que a maturidade é cada vez mais solitária. É verdade. Eu me sinto, por exemplo, em algumas posições, hoje em dia, inteiramente solitário. Uma delas é a seguinte: creio profundamente na atividade política. Hoje vivo num país que foi ensinado a ter a atividade política como algo irrelevante, menor, o que é terrível, porque, em primeiro lugar, não atrai novos quadros para a política; em segundo lugar, retira de uma atividade que é fundamental a sua verdadeira razão de ser, e empana, inclusive, o trabalho, quando ele se faz. Repare V. Exª que os países que se saíram da Segunda Guerra Mundial fizeram a construção da sua organização institucional toda baseada na política. Vejam a Alemanha: saiu do autoritarismo - mais, muito mais, do totalitarismo nazista -; vejam a Itália: saiu do totalitarismo fascista da Segunda Guerra e monta sistemas parlamentaristas baseados na atividade política, uma vez que ela existe por uma só razão: para não haver guerra. A política é o campo onde os conflitos se estabelecem, às vezes de modo violento, para evitar que lá fora esses conflitos deteriorem o tecido institucional de um país. Ela é, por definição, a tarefa magna de um povo; existe para impedir que os conflitos se dêem na sociedade. Ela é uma representação da tendência do ser humano e da sociedade para o conflito. Portanto, é uma atividade altamente elevada. Eu vejo, por exemplo, o esforço que foi feito no Brasil para se institucionalizar, depois de 88 com a Constituição, eu reputo esse esforço notável; no entanto, ele é olhado como pejorativo por toda a Nação. Daí por que, se a política tem importância, tem importância tudo o que aprimore o processo de representação. E uma das máculas do processo de representação, que não se consegue vencer com legislações tópicas e específicas, é a questão do financiamento das campanhas. Assim, quando V. Exª toca na questão do financiamento público está a tocar no ponto central. A partir do momento em que o financiamento seja igual ou pelo menos percentual aos partidos existentes, nós vamos ter nenhuma interferência do poder econômico e de outras forças no processo eleitoral. Portanto, ele passará a ter legitimidade. As pessoas se apresentarão com suas idéias, com a sua pregação e não mais com o caráter estupefaciente de certas campanhas que são ilusórias, como ilusório é também o processo de votação no presidencialismo. Agora, eu me pergunto: como defendermos o financiamento público de campanha se vivemos massacrados pela idéia de que somos beneficiários de mil vantagens. Vão dizer: até para a campanha dele o povo vai ter que pagar? Ou seja, não há, possivelmente, condições concretas para que isso avance, tal a idéia que se fez da política no Brasil. Mas nós, quem sabe, seremos a geração com coragem de superar esse antagonismo e de apanhar muito - não tenhamos dúvidas de que vamos apanhar muito - e de deixar para o País esse legado, que é um legado de maturidade, de amadurecimento da vida política. Cumprimento V. Exª pelo discurso. Conte comigo nessa luta.

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Senador Artur da Távola, que nesta Casa representa o Rio de Janeiro, acolho, com satisfação e alegria, o aparte que V. Exª apresenta ao meu pronunciamento no sentido da construção de uma nova política, um novo padrão político. Temos de conseguir construir uma política de boa qualidade no País. E a reflexão que V. Exª traz é nesse sentido.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Concedo um aparte ao Senador Casildo Maldaner, digno representante do Estado de Santa Catarina.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Nobre Senador Paulo Hartung, eu não poderia ficar de lado num tema dessa envergadura. Tem razão o Senador Artur da Távola: precisamos enfrentar isso. V. Exª tratou com muita propriedade do tema da responsabilidade fiscal, lei que votamos recentemente e que é uma inovação, um avanço, sem dúvida alguma, e que servirá para equilibrarmos o Orçamento com relação ao que se arrecada e ao que se gasta no País. Quanto ao financiamento da campanha pública, vamos fazer prevalecer na política as palavras do Prefeito de Vitória que V. Exª citou há pouco: "ama os pobres mas odeia a pobreza". Assim, todos serão iguais, todos os Partidos e candidatos terão as mesmas oportunidades de defender suas idéias. Não mais prevalecerá a propaganda visível, a propaganda que induz as pessoas. Assim, vamos ter equilíbrio: nem um mais, nem outro menos. Idéias como essas vão prevalecer no debate com a Nação. Por isso, é uma inovação, sem dúvida alguma, profunda e importantíssima para todos nós. Gostaria, então, de me aliar a V. Exª e cumprimentá-lo por essa grande análise.

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Senador Casildo Maldaner, a reflexão de V. Exª é positiva, porque, na verdade, o sistema político hoje no País é uma fábrica de produzir delitos. Muitas vezes, as pessoas se assustam com o episódio de São Paulo. Mas eu creio que esse episódio ajuda o País a refletir sobre sua estrutura política.

É difícil discutir um tema como este, mas a crise moral que estamos vivendo na maior cidade do Brasil e uma das maiores do mundo ajuda-nos a fazê-lo. Na verdade, o sistema política brasileiro é uma fábrica de fazer "Pittas"; "Pittas" e outros. Ou rompemos com esse processo e colocamos tudo no lugar - e esse é um trabalho legislativo, é a construção política e legislativa que precisamos fazer - ou não vamos avançar com a política no Brasil, com a Democracia e com a cidadania.

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Paulo Hartung, V. Exª me concede um aparte?

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Concedo um aparte, com muita alegria, à Senadora Heloisa Helena.

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Paulo Hartung, quero saudar o pronunciamento de V. Exª. A grande maioria da população é constituída de pessoas que consideramos simples, sem capacidade de grandes convicções ideológicas e sem capacidade de profundas convicções políticas. Mas o senso comum em relação à política é motivado, como bem V. Exª disse, pela forma de fazer política. Trata-se de um espaço privilegiado para a prática da vigarice; um espaço sedutor para o enriquecimento ilícito, para a bajulação. É um espaço tão sedutor para a vigarice que é muito doloroso para os homens e para as mulheres de bem, independentemente de convicções partidárias, trabalharem na política, entendendo a política como um espaço importante, entendendo que, para a democracia, para o fortalecimento das instituições de poder e dos espaços de decisão política, é extremamente importante a participação da grande maioria da população. Sei que será um processo muito grande de transformação até conseguirmos conquistá-lo da forma que queremos. V. Exª traz à Casa o debate sobre a reforma política. É de fundamental importância que esta Casa faça o debate garantindo a participação dos chamados pequenos Partidos na hora eleitoral, para assegurar a disputa e qualificar o debate com a sociedade em torno de posições programáticas, decididas e objetivas. É extremamente difícil. O "pequeno" Partido tem um minuto na televisão; o "grande" tem cinco, dez, quinze minutos. É preciso assegurar que os pequenos Partidos que têm tradição ideológica possam continuar participando também. Sempre tive uma indefinição muito grande - e eu dizia isso ontem nesta Casa - a respeito do voto facultativo e do financiamento público de campanha. Pode parecer simplória a avaliação, mas em um País onde não se cumpre a lei, onde o estado de direito é desrespeitado todo dia, onde a Constituição é golpeada, onde a ordem jurídica vigente é fragilizada, pensamos que se institui o financiamento público e aqueles que continuam trabalhando nos subterrâneos da política, nas mágicas contábeis da prestação de contas eleitorais, acabam encontrando outras formas de competir legalmente com o financiamento público. Mas há algo extremamente relevante: ao menos o financiamento público possibilita que pessoas de bem, pessoas de paz, pessoas sem condição entrem no debate, tenham a possibilidade concreta de participar da disputa política. Apenas por isso já é relevante que busquemos mecanismos concretos, ágeis e eficazes a fim de, por meio da avaliação do volume de campanha, impedir o jogo subterrâneo, o jogo de porões, que acaba sendo uma forma mista, não formal mas concreta, do financiamento de campanha. Portanto, gostaria de saudar e parabenizar o pronunciamento de V. Exª.

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES) - Senadora Heloisa Helena, agradeço o aparte, comentando-lhe o conteúdo: a mesma política - refiro-me a instituição política - que é capaz de abrigar, na expressão de V. Exª, a canalhice, a bajulação é capaz também de produzir uma militância, uma ação, em benefício da cidadania, leis que respaldem a juventude, a infância, a terceira idade e o trabalho. É para a construção da política de boa qualidade que nós precisamos melhorar o nosso arcabouço jurídico e avançar na legislação nacional.

Sr. Presidente, ao externar a posição do meu Partido, PPS, aproveito a oportunidade para reafirmar também a nossa proposta a favor de uma reforma política mais ampla, democrática, que elimine definitivamente a tutela do Estado sobre os Partidos políticos - uma tradição no nosso País. Para nós do PPS os partidos só serão fortes realmente - e não artificialmente fortes - quando puderem se organizar internamente a partir dos seus estatutos e não em leis aprovadas para perpetuar o poder das grandes burocracias partidárias, como nós estamos assistindo no País nos últimos anos.

Quero, por último, falar ao Governo atual. Um Governo que tem em sua equipe tantos quadros oriundos da luta contra o regime militar e que assumiram a liderança do processo de democratização do País, na minha visão, definitivamente não pode defender uma reforma política estreita e com pouco conteúdo democrático, engessando os partidos nos mandamentos do Estado, como me referi anteriormente. Se o Governo quer ser contemporâneo, deve se referenciar pelo que existe de mais avançado nas grandes democracias do mundo, e não reafirmar propostas e teses criadas pelo laboratório do regime militar brasileiro, como o domicílio eleitoral, o prazo de filiação partidária, a fidelidade partidária e outros penduricalhos. Isso pode constar no Estatuto dos Partidos Políticos. O cidadão vai se filiar sabendo que há a condicionante A, B ou C na vida partidária, mas nunca em uma lei federal, tutelando a vida dos partidos políticos.

A ditadura, Sr. Presidente, e parte do seu instrumental jurídico, não pode, no limiar do séc. XXI, prevalecer e obter vitórias tardias em virtude da fadiga das outras democracias. A democracia, por definição, jamais deve retroagir.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2000 - Página 7599