Discurso durante a 38ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

LEITURA DE CARTA DO LIDER INDIGENA SABA MANCHINERY, SOBRE A IMPORTANCIA DA REGULAMENTAÇÃO DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE GARANTE AUTONOMIA DE DEFESA, EM JUIZO, AOS INDIOS. (COMO LIDER)

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • LEITURA DE CARTA DO LIDER INDIGENA SABA MANCHINERY, SOBRE A IMPORTANCIA DA REGULAMENTAÇÃO DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE GARANTE AUTONOMIA DE DEFESA, EM JUIZO, AOS INDIOS. (COMO LIDER)
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2000 - Página 7607
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • REGISTRO, CHEGADA, CAPITAL FEDERAL, REPRESENTANTE, COMUNIDADE INDIGENA, COROA VERMELHA, MUNICIPIO, PORTO SEGURO (BA), ESTADO DA BAHIA (BA), IMPORTANCIA, PROTESTO, DESRESPEITO, CULTURA, INDIO.
  • LEITURA, CARTA, AUTORIA, SEBASTIÃO ALVES RODRIGUES MANCHINERY, REPRESENTANTE, TRIBO, ESTADO DO ACRE (AC), OPINIÃO, DESRESPEITO, DESTRUIÇÃO, INDIO, BRASIL, AUSENCIA, MOTIVO, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO, DESCOBERTA, PAIS.
  • CRITICA, ESTATUTO, INDIO, TUTELA, ESTADO, NECESSIDADE, URGENCIA, REGULAMENTAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CONVENÇÃO, ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT), GARANTIA, DIREITOS, INGRESSO, JUIZO, DEFESA, INTERESSE.
  • EXPECTATIVA, REVISÃO, POLITICA INDIGENISTA, GOVERNO BRASILEIRO, OPORTUNIDADE, PAGAMENTO, DIVIDA, INDIO, AMBITO, HISTORIA, BRASIL.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT – AC. Como Líder. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ontem chegaram à Capital os representantes dos povos indígenas da Coroa Vermelha, Porto Seguro, Bahia. Foi um momento dos mais especiais da vida dos indígenas, porque representou, como diz a música, o lamento de um povo que – prefiro dizer – já foi muito feliz, quando no nosso País todo dia era dia de índio. Hoje, infelizmente, eles quase não têm dia, quase não têm oportunidade de construção de suas sociedades e de proteção de seus descendentes, de suas mulheres, de suas crianças e dos idosos, porque existe um claro equívoco da política de Governo, há uma agressão do ponto de vista cultural e um desrespeito às etnias presentes no cenário nacional.  

Trago ao Plenário do Senado uma lembrança desse momento dos 500 anos, que representa muito mais um lamento dos povos indígenas do que um momento de comemoração, como se divulga no dia-a-dia pela grande imprensa. E faço aqui a leitura da carta de um irmão índio, representante dos povos indígenas, chamado Sebastião Manchinery, representante de uma tribo do Estado do Acre. Em certa ocasião, estávamos no mesmo vôo e solicitei-lhe que manifestasse sua interpretação e seu sentimento em relação aos 500 anos que nós estamos vivendo de presença no território nacional. Então ele escreveu esta carta que passo a ler:  

 

Sou Haji Yine, conhecido por Sabá, registrado com o nome de Sebastião Alves Rodrigues Manchinery, pertencente ao povo indígena manchinery, nascido em 1970, na terra indígena mamoadade, no alto rio Yaco, no município de Sena Madureira, Estado do Acre.  

Através do Exmº Senador Tião Viana, solicito atenção aos membros desta Casa para o que exponho a seguir:  

500 anos.  

Nossos antepassados eram yine, ashaninka, hunikuí, popengare, mastanawa e tantos outros. Somávamos uma população em torno de 5 milhões de pessoas, 900 povos, distribuídos em todo o território que chamam de Brasil. Após 500 anos o povo brasileiro desconhece a diversidade étnica e cultural existente nos 215 povos, 170 idiomas indígenas falados, vivendo em 556 pedaços de terra.  

Graças à determinação de viver de nossos antepassados, hoje não desaparecemos totalmente. Hoje, chamam-nos pejorativamente de "índios, tribos, comunidades, sociedades silvícolas, caboclos", conceitos criados pela visão dos "civilizados", usados de forma preconceituosa em diferentes momentos da história. São conceitos que mascaram nossa diversidade, desvalorizam nossa sabedoria, encobrem nossa história e renegam o nosso valor.  

Comemorar os 500 anos significa apoiar a invasão de nossos territórios, desrespeitar a memória de nossos antepassados, legitimar a violação dos nossos direitos e negar a liberdade, a vida como povo indígena que somos. Pois este pedaço de chão, em que um dia reinou a liberdade e o direito natural do homem sobre o Universo, foi violado, e as populações que aqui habitavam, subjugadas e condenadas.  

Com a vinda dos europeus, veio consigo uma das formas silenciosas de morte, às vezes trazendo em uma mão a cruz e na outra, a espada. E, através dela, feriram, com ferro e fogo, os nossos antepassados. Os inúmeros massacres, atrocidades e escravidão foram as formas encontradas para exterminar as centenas de povos que resistiram a esse regime de servidão. Após 500 anos, não são mais os bandeirantes, e sim as empresas madeireiras e mineradoras, respaldadas pelos Poderes Legislativo, Judiciário e, em grande parte, pelo Poder Executivo.  

As comemorações pela passagem dos 500 anos, em nenhum momento, trarão resultados concretos para os povos indígenas e, sim, apenas servirão para fortalecer atores sociais não-indígenas que se apropriam do espaço e buscam respaldar suas ações usando nomes dos povos indígenas. Os grandes eventos são feitos, na verdade, para mascarar os interesses de autopromoção que setores vêm perdendo no cenário nacional. Os assim chamados "defensores indígenas, os heróis’. Nesta sociedade, vivemos em diferentes mundos: pobres, ricos e índios, sob o olhar de um mesmo huiakalu, pawa (Deus) - falando de direito, igualdade, paz e dignidade. Entretanto, é assim que vemos como esses valores e direitos são aplicados:  

Direito, aquele que não afeta meus interesses;  

Igualdade, eu tenho e posso te dar a sobra;  

Paz, eu controlo os demais com minhas forças nucleares; e  

Dignidade, viver à custa da miséria do outro. É o que fazemos, e é assim a civilização. É o que queremos?  

Tudo isso reflete em nossa justiça tão competente, e o ser humano tão igual. Porém, quando se tem poder (dinheiro) pode-se cometer as maiores atrocidades, e o direito é garantido, pois se trata de um cidadão respeitado. Quando não se dispõe de bens financeiros principalmente e se comete alguma falha, a lei deve ser cumprida e a justiça feita.  

Os presídios estão lotados de cidadãos que não têm como pagar um delegado ou mesmo um policial, diferentemente daqueles que compram juízes, que gozam dos direitos e dos benefícios da lei. E, como povos indígenas, imaginem qual a lei e a justiça que temos.  

Como exemplos de crimes contra povos indígenas com relação aos quais até o presente momento não foram tomadas as devidas providências, citamos massacres onde foram mortos 14 ticunas, 19 ianomamis e o assassinato do líder Galdino de Jesus dos Santos, queimado vivo, para não mencionar outros casos tendo a mesma gravidade.  

É como a sociedade reflete. Bom, quem são as vítimas? Índios. Nesse caso, a lei tem seus trâmites e a justiça é lenta e, às vezes, cega. Ah! Os índios são apenas 325 mil, uma parcela mínima frente aos mais de150 milhões de não-índios. Então, quem pesa, ou melhor, quem é mais importante? É claro, os outros milhões de brasileiros! Então, está explicado. É assim que sentimos quanto dependemos dos não-índios.  

O Estatuto do Índio tem como meta principal integrar o índio à civilização, e a Funai, a missão de tutelar-nos. Ou seja, após 500 anos, ainda somos vistos como incapazes, impossibilitados de conduzir os nossos próprios destinos e defender os nossos interesses.  

Essa situação poderia já ter sido mudada, pois a Constituição brasileira garante aos índios o direito de ingressar em juízo para defesa de seus interesses, mas deve-se regulamentar a Constituição por meio de lei complementar. Nesse caso, o projeto de lei que trata dessa matéria está, há quase dez anos, engavetado no Congresso Nacional – na Câmara dos Deputados –, e outros direitos também poderiam ter sido regulamentados, como a Convenção nº 169 da OIT, que há vários anos encontra-se no mesmo dilema do Estatuto do Índio.  

Para garantia de nossos filhos, netos e gerações futuras, devemos ter nas leis um instrumento de proteção dos direitos constitucionais e originários. As leis que queremos são certamente de interesse do Estado brasileiro. Em caso de não-regulamentação de leis de garantia de nossos anseios e perspectivas, caberá a nós, como povos indígenas que somos e donos de nosso próprio destino, independentemente se o Estado reconhece ou não, definirmos, de acordo com nossas necessidades, tendo em vista que o Estado, em sua totalidade de ações, apenas vem protelando e reduzindo os nossos direitos em nome da soberania nacional, mas entrega o País aos países desenvolvidos através ( sic) do Sivam e do FMI. Eles têm os maiores potenciais financeiros e nucleares, e nós, como brasileiros, temos que aceitar, porque é regra geral: o pobre obedecerá ao rico. Acontece que nós, como povos indígenas que somos, estamos dispostos a continuar sendo diferentes, porque, enquanto houver tanta indiferença, os resultados já sabemos, porque ninguém morrerá sufocado se puder respirar.  

Sabá Manchinery.  

 

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT – SP) – Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT – AC) – Concedo um aparte ao Senador Eduardo Suplicy.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT – SP) – Senador Tião Viana, V. Exª acabou de ler uma carta muito bem escrita pelo índio Sabá Manchinery, que é de Sena Madureira, no Acre, e nos trouxe um depoimento de grande profundidade. Todos nós, no Senado, precisamos ficar muito atentos às aspirações daqueles que, há 500 anos, estavam no Brasil em número significativo. Conforme V. Exª salientou, habitavam aqui aproximadamente cinco milhões de pessoas, correspondendo a 900 nações diferentes, que falavam inúmeras línguas e que tinham algo muito distinto daquilo que hoje caracteriza o Brasil. Naquele tempo, os que aqui habitavam não consideravam que havia fronteiras como as que hoje existem – a fronteira da propriedade privada, a fronteira dos muros. Os povos ianomamis, por exemplo, consideram a terra que lhes foi conferida e demarcada propriedade comum dos que ali estão. Na verdade, há 500 anos, a terra era propriedade comum de todas essas nações. Aos poucos, os povos que civilizaram o Brasil foram introduzindo sistemáticas – na sua compreensão, uma maneira de crescer, de desenvolver o Brasil – e escravizando índios e negros, deixando-nos nessa situação de tamanha desigualdade e de enorme desrespeito para com os índios, para com os negros e para com tantos cidadãos brasileiros. É muito importante que tenhamos a determinação de ouvir os anseios expressos na carta de Sabá Manchinery, de fazer a Câmara dos Deputados examinar logo o Estatuto dos Povos Indígenas e de solicitar que a Mesa do Senado coloque para nossa apreciação a Convenção 69 da OIT, que trata dos direitos dos índios, assim como cabe ao Poder Executivo e, sobretudo, à Funai – que parece estar reorganizando-se, na medida em que se trocou o Ministro da Justiça – evitar qualquer delonga no processo de demarcação das áreas indígenas no Brasil. Meus cumprimentos a V. Exª.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT – AC) – Agradeço, Senador Eduardo Suplicy, o seu aparte que incorporo, com imensa honra, ao meu pronunciamento. V. Exª, por ser uma referência ética, um exemplo de traços de solidariedade e de fraternidade no seu dia-a-dia como homem público, engrandece o meu pronunciamento.

 

Gostaria de dizer também da minha admiração por essa carta do Sebastião Manchinery, por ser um cidadão que conheço e que procurou defender o seu povo. Age como um bravo guerreiro, tentando defender as suas crianças, os seus velhinhos, as mulheres de sua comunidade, na tentativa de fazer algo de melhor para o seu povo. Acredito que para isso ele se esforçou tanto em tentar compreender melhor o mundo e a lógica da nossa sociedade contemporânea, como muito bem expressa na carta.  

Fico muito triste por ver a realidade de 500 anos após o primeiro contato, neste País, com os índios. Imagino aquele primeiro momento da chegada, da presença portuguesa na costa brasileira, a relação que se estabeleceu. Será que consta uma relação de mágoa, de sofrimento, de tristes momentos na lembrança dos irmãos índios? Ou o momento foi de alegria, de esperança no convívio, que poderia ter sido tão promissor, tão justo e tão bonito no futuro?  

Lembro-me da música que afirma que eles são incapazes de poluir a natureza, o rio e o mar. E o que nós podemos fazer em uma relação como essa? Será que o pouco que se fez tem o valor desejado e está à altura da dignidade da política pública? Será que o que o Governo brasileiro fez, ao longo de sua história, com os povos indígenas merece continuar no mesmo ritmo, na mesma velocidade? Seguramente, não, Senador Suplicy. Espero que este momento de 500 anos possa refletir uma mudança no comportamento da política pública brasileira em relação aos povos indígenas.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT – AL) – Concede-me V. Exª um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT – AC) – Ouço V. Exª, Senadora Heloisa Helena.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT – AL) – Senador Tião Viana, saúdo V. Exª por trazer, mais uma vez, a esta Casa um tema de tanta importância. Quando eu escutava a carta de Sebastião Manchinery, ficava lembrando de tantas cartas que já foram feitas por tantos representantes de comunidades indígenas, desde os índios norte-americanos aos índios da minha querida Alagoas, do Nordeste, da Amazônia, espalhados por este País. Agora, penso que não há nada que represente mais o gigantesco abismo entre o discurso oficial da comemoração dos 500 anos e a realidade dos festejos, do que aquilo que estão passando os índios pataxós, que é algo que V. Exª já teve oportunidade de debater nesta Casa. A Presidência da República se transfere para Porto Seguro, para dar à comunidade internacional uma demonstração do seu debate dos 500 anos, portanto do perdão diante das atrocidades cometidas. Mas, o que tem acontecido com a comunidade indígena do Estado da Bahia? Um massacre vergonhoso! Ontem à noite – V. Exª teve conhecimento –, por volta das 23 horas, cerca de 200 pataxós foram emboscados por um grupo de mais de 40 homens. Os pistoleiros chegaram atirando, com espingardas e metralhadoras, e 22 pessoas, entre homens, mulheres e crianças, ainda estão sendo mantidas presas em um quarto escuro. Dois pataxós foram feridos, e ninguém sabe onde eles estão. Ninguém consegue encontrar essas 22 pessoas. A Procuradoria-Geral da República saiu da conferência das comunidades indígenas, que está acontecendo na Bahia, para procurar essas pessoas. Vinte e duas pessoas – homens, mulheres e crianças – estão sendo mantidas em cárcere privado. Como se não bastasse, vejam a aberração: houve a destruição do Monumento Indígena em Coroa Vermelha e o impedimento das estradas, para que as comunidades indígenas e as organizações que as apóiam não possam transitar livremente, o que é um desrespeito à Constituição Federal. Não estou pedindo a compreensão para garantir a liberdade daqueles que a amam, que vivem dela, dos andarilhos, índios e índias; estou pedindo ao menos a liberdade formal. A comunidade do índios pataxós, como V. Exª já discutiu nesta Casa, tem uma população estimada em cerca de 800 pessoas, vivendo em condições miseráveis no distrito de Cumuraxitiba e na região. Poucos dispõem de terra para plantar e muitos trabalham irregularmente como diaristas nas fazendas da região. Eles disseram ao Ministério da Justiça, à Funai, ao Ministério Público, palavras deles: "(...) às vezes, somos impedidos até de pegar água para beber nos rios onde viviam os nossos antepassados. Não temos acesso às fontes de alimentos naturais, como os mangues e as matas. Perdemos nosso direito de caçar e de pescar. Diante dessa situação em que vivemos hoje, tomamos a decisão de retomar nossas terras, perdidas em negociatas, grilagens (...)". Eles foram expulsos, e os seus parentes não têm reconhecido hoje o direito indígena. Vejam que aberração: todos estão falando em 500 anos, o relógio marca a contagem regressiva dos 500 anos; certamente, serão fogos e mais fogos, e sequer fazemos a reflexão do peso terrível, perverso que a elite política e econômica representou para aqueles que são maioria de fato, embora estejam identificados como minorias – negros, pobres, índios. Justamente estes estão sendo louvados; aparecem nos carimbos oficiais, nos retratos, nas fotografias, nos painéis de comemoração, justamente em um Estado onde os povos indígenas não conseguem fazer absolutamente nada. Então, aproveito o pronunciamento belíssimo de V. Exª, que não é o primeiro, porque V. Exª, várias vezes, já trouxe a esta Casa o debate, a lembrança da necessidade de cumprimento do que existe na legislação, bem como de aprovação do Estatuto do Índio, de respeito àqueles que pensam e têm o direito de viver de maneira diferente, para solicitar que apareçam os pistoleiros. Onde há comemorações oficiais os pistoleiros estão prendendo, mantendo em cárcere privado mulheres, homens e crianças das comunidades pataxós. Portanto, parabenizo V. Exª, Senador Tião Viana.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT – AC) – Agradeço a contribuição de V. Exª, Senadora Heloisa Helena.  

Concluindo, Sr. Presidente, eu e, seguramente, a Senadora Heloisa Helena lamentamos profundamente que tenhamos de registrar tais fatos, no momento da lembrança de 500 anos de conquistas do desenvolvimento humano, socioeconômico e cultural, com avanços e respeito às etnias. No entanto, não é a verdade que está enraizada na memória e na História do Brasil. Acredito que é um momento de reflexão. Não gostaríamos de estar contribuindo com este momento de separação entre o Governo e os povos indígenas. O Governo deveria refletir de maneira decisiva e concreta a respeito do seu papel nesses 500 anos e o que pode fazer daqui por diante, já que não pôde fazer no passado.  

Seria uma injustiça dizer que não temos traços de mudança, por exemplo, quando se fala da saúde indígena nos últimos 12 meses de ação de Governo. Mas isso é tão pouco para a dimensão do desafio de fazer para pagar uma dívida com os povos indígenas, que temos o dever de refletir se não vale à pena o Governo Federal ir em busca de um abraço verdadeiro, colocando seu coração à frente dos irmãos índios, dizendo o tamanho da nossa dívida e como podemos resgatá-la de maneira imediata, para escrevermos com o mínimo de dignidade o nosso passado, o nosso presente e o nosso futuro.  

Hoje, assisti a uma apresentação de crianças no colégio em que a minha filha Marihá estuda. Foi uma apresentação muito bonita, em que lembraram a presença do negro no Brasil, a ajuda fundamental desses irmãos, que passaram por tanto sofrimento e tanta atrocidade, na formação de nossa sociedade, da nossa riqueza e dos nossos avanços sócio-econômicos.  

Será que é difícil, Sr. Presidente, pagar o tributo do desenvolvimento humano que temos com os índios? Seguramente, não. Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2000 - Página 7607