Discurso durante a 39ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

REIVINDICAÇÃO DE AJUDA GOVERNAMENTAL PARA FINANCIAMENTO DESTINADO A MODERNIZAÇÃO DA FROTA DO TRANSPORTE FLUVIAL DA REGIÃO AMAZONICA.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • REIVINDICAÇÃO DE AJUDA GOVERNAMENTAL PARA FINANCIAMENTO DESTINADO A MODERNIZAÇÃO DA FROTA DO TRANSPORTE FLUVIAL DA REGIÃO AMAZONICA.
Aparteantes
José Fogaça, Lúcio Alcântara.
Publicação
Publicação no DSF de 20/04/2000 - Página 7726
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, TRANSPORTE FLUVIAL, HIDROVIA, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, REGIÃO AMAZONICA.
  • COMENTARIO, EXISTENCIA, CRISE, SETOR, TRANSPORTE FLUVIAL, REGIÃO AMAZONICA, MOTIVO, OCORRENCIA, ACIDENTES, NAUFRAGIO, EFEITO, DESAJUSTAMENTO, ECONOMIA, SOCIEDADE, ESPECIFICAÇÃO, AUMENTO, DESEMPREGO.
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, APOIO, FINANCIAMENTO, MODERNIZAÇÃO, ESTALEIRO, MELHORIA, CONSTRUÇÃO, BARCO, OBJETIVO, SEGURANÇA, TRANSPORTE FLUVIAL, REDUÇÃO, ACIDENTES, REGIÃO AMAZONICA.
  • SOLICITAÇÃO, MESA DIRETORA, ENCAMINHAMENTO, DISCURSO, ORADOR, PRESIDENTE, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), OBJETIVO, NECESSIDADE, PROCEDENCIA, REFERENCIA, FINANCIAMENTO, MODERNIZAÇÃO, ESTALEIRO, REGIÃO AMAZONICA.

O SR. BERNARDO CABRAL ( PFL - AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é uma permuta de lugares apenas.

Na Amazônia, como se sabe, o meio de transporte amplamente dominante é o fluvial, em função das enormes distâncias, da precariedade e da pouca abrangência das vias terrestres - cuja manutenção é extremamente dificultada pelos rigores do clima - e, ainda, por conta da pujança das hidrovias. Nossos rios e igarapés são nossas estradas. No lugar de ônibus e caminhões, contamos com barcos para o transporte de passageiros e de carga.

No contexto da economia amazônica, o transporte fluvial constitui, portanto, atividade de grande importância. Uma crise, no entanto, ronda esse setor amazônico tão relevante para os Estados da Região Norte.

Recebi, recentemente, correspondência encaminhada pelo jornalista amazonense Orlando Farias, reportando a difícil situação que atravessam os proprietários de barcos que navegam pelos rios da Amazônia. O relato do ilustre periodista vem reforçar minha convicção na luta que tenho empreendido pela construção de barcos mais resistentes, com cascos metálicos.

Segundo informa Farias, o volume de anúncios de venda de barcos, nos classificados de jornais e pelos mais diversos meios, tem crescido nos últimos tempos. O motivo está no elevadíssimo número de acidentes náuticos registrados em 1999, inclusive com a volta da ocorrência dos chamados naufrágios-tragédias, que há muito não se registravam nessa proporção.

A tragédia representada por esses naufrágios que ocorrem nos rios amazônicos - com a perda de dezenas e, às vezes, centenas de vidas humanas - tem sido muitas vezes objeto de noticiário em nível nacional. Além da irreparável perda de vidas, é necessário entender também o drama que esses desastres representam para os proprietários dos barcos sinistrados.

Trata-se, invariavelmente, de pessoas que não detêm grande poder aquisitivo, que não possuem empreendimentos em outros setores da atividade econômica. São amazônidas que cresceram navegando nos rios da região, exercendo atividade comercial ou, em menor escala, de transporte. Após décadas de trabalho árduo, quando já estão numa faixa etária mais avançada, esses homens conseguem contratar a construção de uma embarcação. Garantida essa difícil conquista, os novos e pequenos empreendedores passam a explorar seu barco enquanto empresa familiar. Os filhos participam não apenas da administração do negócio, mas, também - por mais incrível que possa parecer -, do trabalho braçal de operar a embarcação, que é uma atividade bastante penosa.

O barco de transporte de carga e passageiros que circula nos rios da Amazônia, fruto de tantos anos de trabalho, constitui, quase sempre, o único patrimônio que seu proprietário conseguiu adquirir ao longo da vida. O que muita gente não sabe é que tais embarcações - construídas em madeira - estão excluídas do rol de bens para os quais as companhias seguradoras aceitam contratar seguros.

Dessa forma, quando acontece um naufrágio, o impacto humano e social não se restringe aos passageiros e tripulantes que perecem no desastre, nem às famílias enlutadas. A situação é também dramática para o proprietário da embarcação, que perde seu único patrimônio e ainda cai em desgraça definitiva perante a comunidade local, apontado que é como responsável pelo acidente.

No entanto, até prova em contrário, as causas de muitos e muitos desses naufrágios podem residir na estrutura frágil dos próprios barcos, construídos em madeira e portadores de falhas de engenharia náutica, visto que os estaleiros artesanais existentes na região não dispõem de atualizada tecnologia. Desse modo, não há mesmo como esperar que essas embarcações possam resistir a um choque contra um "pedral", como são chamados, na Amazônia, os afloramentos rochosos.

É urgente, portanto, a modernização dos estaleiros artesanais, que precisam ser mantidos, sob pena de aumento do desemprego em municípios importantes. Urge, também, que se adote a prática da construção de barcos mais resistentes, dotados de cascos metálicos.

Para uma e outra providência, mostra-se indispensável a ajuda governamental, sob a forma de oferta de linhas de financiamento ajustadas à realidade do setor. Tendo acesso a crédito a custos mais razoáveis, os barqueiros da Amazônia poderão partir para a aquisição de barcos metálicos, com o que muitos acidentes serão evitados e outros terão suas proporções reduzidas.

O Sr. José Fogaça (PMDB - RS) - Senador Bernardo Cabral, V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Ouço, com muita alegria, o eminente Senador José Fogaça.

O Sr. José Fogaça (PMDB - RS) - Senador Bernardo Cabral, é sempre uma satisfação, e um motivo de estímulo e de entusiasmo, ouvir V. Exª falar da Amazônia. V. Exª fala com tal riqueza de detalhes, com tal profundidade de conhecimento, com tal sensibilidade dos problemas que ali afloram que o seu relato é desfrutado por nós, seus Colegas do Senado. Os seus depoimentos são aqui recebidos como verdadeiros relatos histórico-geográficos desse mundo que é a Amazônia. V. Exª traz a realidade dos barqueiros, com seus cascos de madeira, frágeis, e a impossibilidade de serem incorporados a um sistema de seguro, de previsão. Realmente, fico impressionado ao ver que V. Exª detecta a fundo o problema humano na Amazônia, indo em busca dessa realidade profunda, fazendo-a emergir aqui, no Senado, aos nossos olhos, percebendo o drama do homem do rio, do homem amazônico. Cumprimento V. Exª pela linha de conduta que tomou ao longo de seu mandato. O Estado do Amazonas e a Amazônia devem ter orgulho de V. Exª. A cada semana invariavelmente vejo V. Exª subir à tribuna e levantar um tema em defesa de seu Estado, de seus amigos e conterrâneos, de sua gente, muitas vezes sofrida e marginalizada. Isso, quando visto por um gaúcho, como eu, que vivo lá no extremo sul do País, não deixa de causar comoção salientar a profunda noção de respeito pela postura de V. Exª e pelo problema que apresenta a todos nós. Registro, mediante este aparte, que a análise que V. Exª faz é realmente dramática. É preciso que haja recursos para financiar esse homem que, na verdade, é um homem de iniciativa privada, um empreendedor, um homem de coragem, um desbravador. Se o Estado o desconhece e não lhe dá condições de contratar seguro para a sua embarcação, de melhorar a sua estrutura de trabalho e a qualidade de seu instrumento de trabalho - a barca -, realmente, o Estado está descumprindo o seu dever. Cumprimentos a V. Exª, Senador Bernardo Cabral.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Senador José Fogaça, sou um devedor de V. Exª. Há algum tempo, venho escrevendo, com a cautela que o assunto impõe, a história dos trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte. Nessas memórias, registro a atuação de quatro pessoas, e V. Exª é uma delas. Ali, sem que eu revele agora tudo, declaro que, na qualidade de Relator-Adjunto, teria sido humanamente impossível que os trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte tivessem a conclusão que tiveram se eu não tivesse V. Exª ao meu lado, durante tanto tempo, varando noites, amanhecendo o dia no Prodasen - Centro de Processamento de Dados do Senado. V. Exª estava ali, como dizem na minha terra, à ilharga, dando a contribuição da sua inteligência. E esse débito a cada dia se avoluma, não tenho como resgatá-lo. Fica difícil para um companheiro seu, como eu, que o admira menos ainda do que V. Exª merece, possa resgatar esse débito. Por isso o aparte de V. Exª, do extremo Sul, capta com essa sensibilidade política o drama do ribeirinho, do homem do extremo Norte. Mais uma vez, Senador José Fogaça, meus agradecimentos a V. Exª pela solidariedade e pela forma com a qual V. Exª enriquece neste Senado os pronunciamentos dos seus Companheiros.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB - CE) - Senador Bernardo Cabral, V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Ouço o eminente Senador Lúcio Alcântara, com muito prazer.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB - CE) - Senador Bernardo Cabral, quero apenas dizer que esse tema que V. Exª traz ao debate é extremamente oportuno. Ninguém melhor do que V. Exª, que representa o Amazonas, pode falar sobre esse assunto. Realmente precisamos estimular de todas as formas a navegação interior no Brasil. Lemos periodicamente, nos jornais, notícias de grandes acidentes com embarcações em rios da Amazônia, grandes tragédias fluviais com muitos óbitos. Claro que isso ocorre por causa de todos aqueles fatores de que V. Exª falou: transportes precários, falta de fiscalização, irresponsabilidade em alguns casos, falta de conhecimento hidrográfico, entre outros. Tenho conhecimento de que há uma empresa que está estudando a possibilidade de importação de tecnologia espanhola, com barcos construídos com um tipo de material que resiste a colisões com pedrais ou outras formações existentes no leito dos rios. Essas formações baixam no período da seca, diminuindo a lâmina d’água e, conseqüentemente, afetando a navegação. O que é preciso mesmo - e V. Exª tem toda a condição de insistir nisso - é estimularmos a implantação de hidrovias. Voltamos as costas ao transporte hidroviário. Há dificuldades em relação a questões ambientais, ao impacto que essas hidrovias têm sobre o meio ambiente. No entanto, precisamos contornar esses obstáculos, usando técnicas mediante as quais se possa respeitar o meio ambiente. O Brasil não pode abdicar dessa forma barata e prática de transporte, porque, por seu intermédio, poderemos fazer a interligação de extensas regiões do País. Por meio deste aparte, chamo a atenção para isto: estamos muito atrasados na questão do transporte hidroviário. Precisamos estimular a construção dessas hidrovias. Sei do caso do terminal graneleiro de Itaquatiara, do Grupo Maggi, onde se está barateando o transporte da soja, barateando-o. Precisamos conhecer melhor essa realidade - poucos brasileiros a conhecem - e estimular o Governo e iniciativa privada a avançarem na construção dessas hidrovias.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - V. Exª tem razão, Senador Lúcio Alcântara, quando fala que esse é o transporte mais barato. Quem estuda o aspecto técnico do problema hidrográfico no Brasil não pode desconhecer uma obra de Leandro Tocantins - acabou se tornando clássica - chamada O Rio Comanda a Vida . É o que acontece no nosso Estado. Tive o prazer e a alegria de assistir a como o transporte em balsas é feito através do rio Mississipi. E o fiz na companhia de um velho amigo meu, jornalista Phelippe Daou. Observamos o quanto teríamos condições, nas calhas dos nossos rios - cito aqui somente o Estado do Amazonas -, de levar para outros lugares, com o transporte fluvial, mercadorias que produzimos. Hoje, os concorrentes de fora teimam em não permitir que avancemos para não baratear o custo desse transporte. Congratulo-me com V. Exª, acolhendo-lhe o aparte. Peço, já que o Sul se incorporou, que o Nordeste, a seu exemplo, o faça, para que as duas regiões possam, juntamente com a minha Região Norte, continuar nessa luta.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, vou concluir, mas quero fazê-lo, dizendo que muitas vidas já foram perdidas, nos rios da Amazônia, em naufrágios perfeitamente evitáveis. Além desse prejuízo maior e irreparável, deve-se também lembrar o drama dos pequenos empreendedores que, nesses acidentes, se vêem privados de todo o seu patrimônio e caem em completo descrédito operante as comunidades onde habitam. Em função da impossibilidade de contratar seguro para as embarcações com casco de madeira, seu prejuízo é total. Basta desse desperdício de vidas humanas! Basta de bancarrotas de esforçados trabalhadores! A solução, justa e de bom senso, reside no apoio governamental à aquisição de barcos dotados de cascos metálicos.

Diante do que, Sr. Presidente, requeiro a V. Exª, na forma regimental, seja encaminhada cópia deste pronunciamento ao Presidente do BNDES, a fim de que possa a Casa tomar conhecimento de uma manifestação oficial daquela ilustre entidade.

Aguardo resposta de V. Exª, Sr. Presidente, ao meu requerimento.

O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) - V. Exª será atendido, na forma do Regimento.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Obrigado. Com isso, concluo, agradecendo a V. Exª.

O Sr. Gilvam Borges (PMDB - AP) - Parabéns, Bernardo, eu gostaria de ter aparteado V. Exª, mas cheguei atrasado.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - A Taquigrafia registrará a sua manifestação.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/04/2000 - Página 7726