Discurso durante a 43ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEBATE SOBRE O REQUERIMENTO DE URGENCIA PARA OPERAÇÃO DE CREDITO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. COMENTARIOS A PERDA DE CREDIBILIDADE DOS LIDERES GOVERNISTAS COM O DESCUMPRIMENTO DE ACORDO PARA APRECIAÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA QUE DEFINE O NOVO SALARIO MINIMO.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MEDIDA PROVISORIA (MPV). GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • DEBATE SOBRE O REQUERIMENTO DE URGENCIA PARA OPERAÇÃO DE CREDITO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. COMENTARIOS A PERDA DE CREDIBILIDADE DOS LIDERES GOVERNISTAS COM O DESCUMPRIMENTO DE ACORDO PARA APRECIAÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA QUE DEFINE O NOVO SALARIO MINIMO.
Aparteantes
Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 28/04/2000 - Página 8249
Assunto
Outros > MEDIDA PROVISORIA (MPV). GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, DESCUMPRIMENTO, ACORDO, APRECIAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), DEFINIÇÃO, VALOR, SALARIO MINIMO, PROVOCAÇÃO, PERDA, CONFIANÇA, LIDER, GOVERNO, CONGRESSO NACIONAL, LIDERANÇA, PARTIDO POLITICO.
  • APREENSÃO, ORADOR, RELACIONAMENTO, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, POSTERIORIDADE, ROMPIMENTO, MEDIDA PROVISORIA (MPV).

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto a um assunto que já tratei de forma superficial, hoje, quando da discussão do requerimento proposto pela base governista para extinção da urgência no caso do Rio Grande do Sul.  

Falava do que aconteceu ontem na sessão do Congresso Nacional. Entendo que o mínimo que se exige de todos os Congressistas, Deputados e Senadores, independentemente do Partido político ao qual sejam filiados, é que os acontecimentos de ontem sirvam, pelo menos, como ensinamento.  

Ontem, inclusive, em aparte ao Senador Antonio Carlos Valadares, fiz questão de registrar que o Congresso Nacional teve alguns momentos memoráveis na sua história, quando seus Membros puderam exercer, na sua plenitude, suas prerrogativas e revelaram figuras memoráveis que passaram por esta Casa. Citei dois momentos, entre tantos, em que considero que o Congresso Nacional exerceu na plenitude a sua soberania e, em um caso especificamente, não se rendeu às pressões externas, às pressões de outro Poder. O caso da votação da autorização para impeachment do Presidente Fernando Collor de Mello, primeiro exemplo na História do Brasil em que um Presidente foi afastado pela via democrática, pela via constitucional, por uma deliberação dos representantes do povo legitimamente eleitos para exercerem na plenitude essas prerrogativas. E o pedido de autorização para que o Deputado Márcio Moreira Alves fosse processado.  

Naquela época vivia-se uma ditadura militar. A pressão sobre os Membros do Congresso não era mera pressão de ameaça de cargos de confiança, não era a simples pressão do Diário Oficial que existe hoje sobre os Membros da Bancada governista. Além da pressão do Diário Oficial, existia a pressão e a ameaça, inclusive física, a todo o povo brasileiro, incluindo os Membros desta Casa. Naquela ocasião, destacou-se a figura do grande liberal Djalma Marinho, que disse: "Ao rei, tudo, menos a honra". E, apesar de todas as pressões, o Congresso Nacional rejeitou o pedido de autorização para que o Deputado Márcio Moreira Alves fosse processado.  

Infelizmente, o dia de ontem não se enquadra nessa definição; infelizmente, o dia de ontem enquadra-se naqueles dias em que a maioria do Congresso Nacional rompe aquilo que deve ser um princípio fundamental para todos os Membros desta Casa.  

Muitas vezes, participamos de debates acalorados. Cada um de nós defende a sua posição política e ideológica; cada um de nós defende as suas propostas. Porém, um princípio fundamental que sempre orienta – ou pelo menos que sempre deve orientar - o comportamento de todos os Parlamentares, principalmente das Lideranças partidárias, é o cumprimento da palavra. Quando um acordo é feito entre diferentes Partidos, quando ele é explicitado, divulgado, tem que obrigatoriamente estar acima de quaisquer conveniências político-ideológicas ou acima do Governo, principalmente quando uma parte desse acordo já foi cumprida por um dos acordantes.  

Por isso, consideramos lamentáveis as manifestações sobre a questão, particularmente do Líder do PMDB, Geddel Vieira Lima, e, depois, do Líder do Governo, Arthur Virgílio. O Líder do PMDB disse que rompeu o acordo pelas circunstâncias. Ele estava presente quando o acordo foi anunciado; não colocou nenhum obstáculo. Justificou o seu recuo porque as circunstâncias o levaram a isso, porque disse que não teve tempo de reunir a sua Bancada para sentir-lhe o pulso em relação ao mérito da votação do salário mínimo.  

O Líder Arthur Virgílio, primeiro, confirmou a existência do acordo. Confirmou que se empenhou para que o acordo fosse cumprido, mas disse também que tinha lado; que era o lado do Governo, que era o lado das reformas e que, em função disso, o seu lado estava até acima do acordo.  

Essas duas intervenções, a das circunstâncias e a do lado, teriam toda a procedência se tivessem sido feitas posteriormente à realização do acordo, mas anteriormente à votação de uma das partes. Isso porque o acordo que foi feito há 15 dias, no plenário, explicitado e descrito pelo Líder Arthur Virgílio, envolvia a aprovação do Orçamento, que era o pleito do Governo, com as modificações apresentadas pela Oposição, que era o pleito da Oposição, e a marcação da data de votação da medida provisória relativa ao salário mínimo. O acordo não incluía, de forma alguma, por exemplo, o compromisso de a Oposição votar o salário mínimo em R$151. Da mesma forma não incluía o compromisso de o Governo votar um salário mínimo de R$177, mas incluía claramente que a data da votação, em que cada um dos Srs. Parlamentares e cada um dos Partidos políticos defenderiam as suas posições relativas ao salário mínimo, era o dia 26 de abril. Com quorum, segundo as palavras do Líder Aécio Neves, do PMDB, ao referendar o acordo. O cumprimento do mesmo valeria uma missa, segundo o Líder Arthur Virgílio.  

O problema é que a execução do acordo se iniciava exatamente na sessão em que foi feito, a execução das matérias abrangidas no acordo. E, naquela sessão, o pleito do Governo, que era a votação do Orçamento, foi atendido com a concordância da outra parte - a Oposição. Portanto, o Governo já havia recebido a sua parte no acordo. Nesse sentido, não há circunstância, não há posição ideológica, não há declaração de que tem lado que justifique o rompimento do acordo por parte da Liderança, da maioria. Infelizmente, foi isso o que aconteceu.  

Como disse ontem o Deputado Aloízio Mercadante, fatos como esse não se resumem a ele somente; não se resumem ao dia em que acontecem, mas têm repercussão profunda no funcionamento desta Casa, porque eles estabelecem legitimamente a desconfiança de todos os Membros da Casa com relação a acordos. Com que autoridade o Deputado Arthur Virgílio irá propor qualquer acordo no futuro? E isso não vale apenas para o Deputado Arthur Virgílio. É lógico que S. Exª foi o que saiu mais queimado, mais chamuscado, mas o Deputado estava ali, falando em nome do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, já que S. Exª é o Líder do Governo. Estava falando também em nome de todos os Líderes dos Partidos que formam a base governista, porque estavam todos presentes.  

Quem perdeu a autoridade para estabelecer qualquer acordo nesta Casa, Câmara e Senado – embora o mais chamuscado tenha sido o Deputado Arthur Virgílio -, a partir de agora, foi o Governo, as suas Lideranças e as Lideranças dos Partidos que compõem a sua base, porque, naquela sessão do Congresso, estavam presentes também Líderes dos Partidos que compõem a base governista no Senado, que não se manifestaram contra o acordo, mas que ontem nem se dignaram a comparecer. Eles podem alegar: "Mas não se pode cobrar do Senado, porque a questão foi votada primeiro na Câmara"! É um álibi interessante, porque, no Senado, objetivamente não foi medida a votação, mas apenas trinta e nove Senadores colocaram as suas presenças no painel. Entre os que não o fizeram estavam todos os Líderes dos Partidos que compõem a base governista, à exceção, se não me engano, do Senador Leomar Quintanilha, do PPB. No entanto, os Líderes do PSDB, do PFL, do PMDB e do Governo no Senado nem mesmo marcaram as suas presenças no painel do Senado, ontem.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) – Permita-me V. Exª um aparte?  

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) – Concedo um aparte ao Senador Romero Jucá, a quem propositadamente provoquei, porque este argumento que usei foi-me dado por S. Exª, hoje.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) – Meu caro Senador José Eduardo Dutra, gostaria apenas de fazer uma correção e um registro, até para que não se cometam injustiças. Como bem disse V. Exª, a Câmara votou a matéria e o Senado ainda não tinha sido chamado para fazê-lo. Quando há sessão do Congresso, o painel do Senado serve como marcador de presença para o início da sessão do Congresso. Ontem, havia painel marcado e todos os Líderes, inclusive eu próprio, como Vice-Líder do Governo e do PSDB, estávamos com presença registrada no painel do Senado, já que, pela manhã, houve sessão comemorativa do aniversário de Brasília. Assim, havia presença e a discussão foi feita. A sessão foi encerrada por falta de quorum na Câmara. É claro que, se chamados a votar, cada Senador o faria de acordo com sua consciência, sem qualquer problema, registrando o voto que desejasse.  

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) – Senador Romero Jucá, o argumento de V. Exª serviria em outras sessões do Congresso, quando, realmente, apenas o painel da Câmara é aberto para que os Deputados marquem a sua presença. No entanto, ontem, não havia sessão convocada nem para o Senado nem para a Câmara. No Senado só houve uma sessão especial e, por isso, foi aberto o painel do plenário da Câmara dos Deputados para que Senadores e Deputados marcassem a sua presença. Esse registro seria o válido.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB – RR) – Permite-me V. Exª outro aparte?  

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT – SE) – Concedo o aparte a V. Exª.  

O Romero Jucá (PSDB – RR) – Ontem, diferentemente de outras sessões comemorativas, o painel do Senado estava aberto, e nele marquei presença. É importante dizer-se que, havendo painel aberto no Senado, sem dúvida este vale para a sessão do Congresso, independentemente de ser sessão deliberativa ou não. Como eu e outros Líderes marcamos presença aqui, se o fizéssemos também lá seria, sem dúvida, uma marcação dupla.  

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT – SE) – Senador Romero Jucá, não vamos ficar nessa discussão, até porque a minha interpretação é diferente. A partir do momento em que se abriu o painel no plenário, esse é que vale.  

No entanto, como a discussão não é essa, mas o cumprimento do acordo, poderíamos solucionar isso se V. Exª dissesse qual teria sido a posição da Liderança do Governo no Senado, caso este fosse convocado a votar, ou seja, se encaminharia a favor do cumprimento do acordo. Isso é o que está em discussão, mas V. Exª não pode afirmar que as Lideranças do PMDB, do PSDB e do PFL iriam cumprir o acordo, porque sabe que não seria verdade.

 

Por isso, entendo que perdeu a autoridade e a credibilidade não apenas o Deputado Arthur Virgílio. S. Exª foi o mais "chamuscado" porque é o Líder governista, mas perderam-nas o Governo, o Presidente da República – já que, da tribuna, o Deputado falou em nome de Sua Excelência - e os Líderes de todos os Partidos.  

Temo pela convivência nas duas Casas do Congresso Nacional depois desse episódio. Isso ficou demonstrado pelo gesto de desespero da Liderança do Governo, na sessão da manhã, para garantir de qualquer forma a votação de São Paulo, até sem saber se tínhamos ou não a intenção de pedir verificação de quorum para a votação do requerimento de São Paulo. Eu não autorizo essa suposição porque se a intenção fosse essa, como eu disse anteriormente, eu esperaria que toda a pauta fosse votada e, então, pediria a verificação de quorum no momento da votação do requerimento de urgência. Eu disse isso no início. Ou, o que é pior, poderia tê-la pedido oportunamente, ou seja, esperaria que fosse votado o item relativo ao Rio Grande do Sul, que me interessava, e pediria a verificação no Item nº 2. Nesse caso, porém, eu estaria rompendo um acordo que fiz com o Senador Jorge Bornhausen, na Comissão de Assuntos Econômicos e nós temos princípios, independentemente da posição ideológica e do lado em que estamos. Como disse, ontem, o Deputado Arthur Virgílio, temos por princípio cumprir os acordos que fazemos.  

O acordo que fiz com o Senador Jorge Bornhausen não foi público, não está registrado nas notas taquigráficas. Ele foi feito na Comissão de Assuntos Econômicos e, mesmo assim, fiz questão de cumpri-lo e registrá-lo aqui.  

Sr. Presidente, vou terminar para dar oportunidade ao Senador Romero Jucá de falar também, já que o tempo está esgotando.  

Deixo esta reflexão e concluo dizendo que o que aconteceu vai continuar tendo repercussões nesta Casa por muito tempo, porque, hoje, não nos sentimos tranqüilos para estabelecer qualquer acordo de procedimento com qualquer Líder da base governista, já que S. Exªs não cumpriram a palavra no dia de ontem. Como era o nosso adesivo, ontem, "Palavra empenhada é palavra cumprida".  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/04/2000 - Página 8249