Discurso durante a 46ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

APELO PARA APROVAÇÃO, NA CAMARA DOS DEPUTADOS, DE PROJETOS DE LEI ORIUNDOS DO SENADO QUE VERSAM SOBRE O SIGILO BANCARIO.

Autor
Gilvam Borges (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: Gilvam Pinheiro Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • APELO PARA APROVAÇÃO, NA CAMARA DOS DEPUTADOS, DE PROJETOS DE LEI ORIUNDOS DO SENADO QUE VERSAM SOBRE O SIGILO BANCARIO.
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/2000 - Página 8800
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • COMENTARIO, GLOBALIZAÇÃO, AMPLIAÇÃO, TECNOLOGIA, INFORMATICA, PROVOCAÇÃO, ALTERAÇÃO, SERVIÇO BANCARIO, COMBATE, CRIME ORGANIZADO, LAVAGEM DE DINHEIRO, REGISTRO, REVISÃO, LEI ESTRANGEIRA, UNIÃO EUROPEIA, AMERICA LATINA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), PROPOSTA, EXTINÇÃO, SIGILO BANCARIO, MUNDO.
  • JUSTIFICAÇÃO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, REGULAMENTAÇÃO, SIGILO BANCARIO, AUTORIA, PEDRO SIMON, LUCIO ALCANTARA, SENADOR, ORADOR, BENEFICIO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, COMBATE, CORRUPÇÃO, IMPUNIDADE, EXPECTATIVA, AGILIZAÇÃO, APRECIAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS.

O SR. GILVAM BORGES (PMDB – AP) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a globalização que atinge o mundo moderno está a exigir modificações em estruturas e instituições consideradas seculares, a fim de que os cidadãos se adaptem à nova realidade. Modernas tecnologias, o avanço quase diário da informática, a lavagem de dinheiro, o crime organizado, tudo sugere alterações, especialmente nos sistemas financeiro e bancário, antes protegidos pelo sigilo absoluto, ou quase absoluto.  

O livro Le Secret Bancaire , do libanês Raymond Farhat mostra-nos que a discrição foi a primeira atividade bancária. Nos templos da Antigüidade nasceram os bancos. E acrescenta: "Os primeiros banqueiros eram deuses representados por seus sacerdotes. Seus estabelecimentos eram os templos. A atividade bancária gozava de um caráter sagrado e dispunha desse halo de mistério que cerca tudo que tem relação com o divino. Mais que uma simples discrição, as operações bancárias exaltavam a magia, o mistério e o desconhecido. Tudo era feito para os deuses e pelos deuses". Esta é a fase chamada por Sérgio Covello, especialista em sigilo bancário, de fase embrionária.  

No correr dos séculos surgiram mudanças. O desenvolvimento do comércio, na Idade Média, e as descobertas de novas terras influenciaram o setor bancário de forma decisiva. Conhecida como a fase institucional, foi caracterizada pela organização empresarial da atividade bancária. Surgiram alguns bancos, como o Banco de São Jorge, o Banco de Veneza e o Banco de São Marco, embriões das futuras casas bancárias. A confiança que sempre reinou entre o cliente e o banqueiro deu origem ao ordenamento jurídico sobre o sigilo bancário. O segredo é imprescindível nas relações entre cliente e banco.  

Foi a França, pioneira no reconhecimento do sigilo bancário, o primeiro país a garantir-lhe proteção legal. Na fase capitalista, os países preocuparam-se em garantir a privacidade de seus cidadãos e cuidaram para que o segredo das contas bancárias não fosse revelado. Entretanto, acontecimentos inesperados, como o inescrupuloso comportamento de ditadores que usufruíam o Tesouro de seus países e remetiam o fruto de improbidades administrativas para contas numeradas na Suíça e o crescimento do crime organizado, cujos membros especializaram-se em técnicas sombrias de lavagem de dinheiro, fizeram com que muitos Estados repensassem se proteção tão grande deveria ser mantida.  

Como alguns fatores estruturais facilitavam a lavagem de dinheiro, os países membros da Comunidade Comum Européia – CCE, resolveram, recentemente, introduzir modificações em suas legislações a fim de impedir a prática de ilícitos acobertados pelo sigilo bancário. As sanções penais estão sendo revistas e aumentadas. A própria Suíça, conhecida por sua tradição no assunto, introduziu, em 1990, alterações em seu Código Penal visando a reprimir a lavagem internacional de dinheiro e a punir o defeito de vigilância, considerado um delito de omissão intencional.  

A América Latina também está à cata de soluções que impeçam a lavagem de dinheiro. Na última década, a Argentina, a Colômbia, o Chile, o Equador, a Venezuela, o México, o Paraguai e o Peru introduziram modificações em suas legislações, sempre procurando, se não impedir, pelo menos dificultar as ações e os métodos utilizados pelo crime organizado. Os Estados Unidos contam com um verdadeiro arsenal de leis e regulamentos para combater a lavagem de dinheiro.  

Pino Arlacchi, Vice-Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas – ONU e diretor do Escritório para Controle de Drogas e Prevenção do Crime – ODCC, tem defendido a abolição total do sigilo bancário mundial, simultaneamente em todos os países, com a finalidade de apurar a lavagem de dinheiro de narcotraficantes e facilitar o rastreamento do dinheiro sujo, tese que tem provocado polêmicas calorosas.  

Só no Brasil estamos andando lentamente em relação ao assunto. E não se diga que por falta de iniciativas parlamentares. Por falta, talvez, de vontade política, sim. Vários projetos oriundos desta Casa do Congresso Nacional que tratam, cuidadosamente, do assunto encontram-se na Câmara dos Deputados, à espera de votação. Podemos citar, dentre eles, o Projeto de Lei do Senado n° 5/95, de autoria do Senador Pedro Simon, que exclui do benefício do sigilo bancário operações e serviços realizados por agentes públicos, incluindo, dentre tais agentes, Deputado Federal, Senador, Ministro de Estado, Presidente e vice-Presidente da República, dirigente partidário e presidente e diretor de entidade de administração direta e indireta; o de n° 219/95, do Senador Lúcio Alcântara, que trata do sigilo das operações de instituições financeiras e o de n° 67/96, de minha autoria, que define e regula os meios de prova e procedimentos investigatórios, destinados à prevenção e repressão dos crimes praticados por organizações criminosas. Aguardamos uma providência do Presidente da Câmara dos Deputados para rápida tramitação desses projetos.  

Algumas medidas, porém, já foram tomadas para liberalizar o sigilo bancário, protegido pela Lei n° 4.595, de 31 de dezembro de 1964, que cuidava da política e das instituições monetárias, bancárias e creditícias. Podemos citar a Lei n° 8.021, de 12 de abril de 1990, que dispõe sobre a identificação dos contribuintes para fins fiscais; a Lei n° 9.613, de 3 de março de l998, que dispõe sobre os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, a prevenção do sistema financeiro para alguns ilícitos e a criação do Conselho de Atividades Financeiras – COAF; e a Circular n° 2.852, de 3 de dezembro de 1998, do Banco Central, que trata dos procedimentos a serem adotados na prevenção e combate aos crimes previstos na lei anterior.  

Tanto o sigilo bancário, como o sigilo profissional encontram limitações legais e naturais. Daí a necessidade de regulamentar seriamente o instituto do sigilo bancário a fim de que não pairem dúvidas sobre quem deve estar sujeito à quebra do segredo. Nos projetos em andamento é permitida a quebra do sigilo para instruir a Receita Federal, o Ministério Público, a Polícia Federal e os Presidentes do Congresso Nacional e do Tribunal de Contas da União, sem que haja autorização expressa da Justiça, bastando a existência de um processo instaurado contra o alvo das investigações. As Comissões Parlamentares de Inquérito – CPIs instaladas no Congresso já usufruem esse privilégio.  

Sr. Presidente, o momento político brasileiro exige o abrandamento do sigilo bancário em praticamente todos os graus. Os funcionários públicos e os ocupantes de cargos legislativos não devem se beneficiar desse benefício legal. As contas dos servidores públicos devem estar à disposição da Receita Federal, do Fisco, do Ministério Público e das Comissões Parlamentares de Inquérito, toda vez que pairarem dúvidas sobre seus titulares. A tese é polêmica, mas devemos ter coragem suficiente para enfrentá-la e exigir, de uma vez por todas, o fim do sigilo bancário e fiscal de qualquer servidor público. Sempre dentro dos limites éticos e jurídicos que o assunto merece, sem excessos de qualquer natureza, lembrando que o sigilo bancário é um direito do cidadão e não do banco.  

Esse um fato comum, pois os funcionários ocupantes de cargos em comissão são obrigados a apresentar, anualmente, cópia de sua declaração de Imposto de Renda e de bens. Ora, se a declaração foi feita com seriedade, não há razão para a manutenção do sigilo bancário. Como o interesse público deve prevalecer sobre o privado, qualquer pedido bem fundamentado dos órgãos públicos sobre levantamento de sigilo deve ser atendido. A administração pública terá, desde que aprovada a quebra do sigilo, melhores condições para combater práticas ilícitas, como sonegação fiscal, corrupção, crimes de colarinho branco, narcotráfico e outros. A violação do sigilo bancário deverá também ser apenada, visando aos que fizerem mau uso das informações a que têm acesso, com a finalidade de se impedir condenações prévias perante a opinião pública.  

O aumento dos deveres de informação no âmbito financeiro está ligado ao crescente reconhecimento do princípio da cooperação com a administração pública e com a administração da justiça penal. Pelo exposto, Sr. Presidente, esperamos que os projetos de lei oriundos desta Casa e que se encontram na Câmara dos Deputados, retornem logo a fim de que possamos dar continuidade à matéria de tão grande relevância para o País.  

Era o que eu tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/2000 - Página 8800