Discurso durante a 51ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

TENTATIVAS DE DESMORALIZAÇÃO DO MOVIMENTO DO SEM-TERRA. (COMO LIDER)

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MOVIMENTO TRABALHISTA.:
  • TENTATIVAS DE DESMORALIZAÇÃO DO MOVIMENTO DO SEM-TERRA. (COMO LIDER)
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2000 - Página 8929
Assunto
Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA.
Indexação
  • CRITICA, TENTATIVA, GOVERNO, RETIRADA, LEGITIMIDADE, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, DEFESA, EFICACIA, IMPLANTAÇÃO, REFORMA AGRARIA, PAIS.
  • QUESTIONAMENTO, INCOERENCIA, GOVERNO, IMPUTAÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, RESPONSABILIDADE, DESTRUIÇÃO, PATRIMONIO PUBLICO, SIMULTANEIDADE, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA, OBTENÇÃO, LUCRO, INCOMPETENCIA, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT – AL. Como Líder. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Sr as e Sr s Senadores, em função dos episódios de ontem na Casa, do gigantesco debate, meio inglório para alguns, não tive oportunidade de me pronunciar sobre os últimos acontecimentos envolvendo o Movimento dos Sem-Terra. Senti-me contemplada pelo discurso feito por nosso querido Senador Eduardo Suplicy, que inclusive encontra-se no Estado do Paraná onde houve, e isso é do conhecimento da Nação, um episódio que certamente marcou todas as pessoas que lutam contra a violência no campo, pela paz e pela reforma agrária em nosso País. O Senador Eduardo Suplicy deve ter encaminhado um requerimento à Mesa, pedindo que sua ida ao Paraná seja administrativamente classificada como uma missão especial.  

Eu não poderia deixar de falar sobre a forma como o Movimento dos Sem-Terra tem sido tratado por alguns setores vinculados ao latifúndio, pelo Governo Federal, por personalidades políticas e órgãos de comunicação que têm feito uma campanha, há vários meses, para desmoralizar aquele movimento e retirar-lhe a legitimidade. Sem dúvida, o Movimento dos Sem-Terra tem sido a grande alternativa, a grande força, porque o Governo Federal insiste em não cumprir a Constituição, que preconiza a reforma agrária. O pouco de reforma agrária infelizmente tem sido feito pelo Estado, em meio à correria, na tentativa de resolver os problemas das ocupações de terra.  

Eu não poderia deixar de fazer algumas observações sobre termos que têm sido usados para desclassificar o Movimento dos Sem-Terra, formando na opinião pública a imagem de que este movimento é integrado por baderneiros, por pessoas que estão destruindo o patrimônio público.  

Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, o patrimônio público não pertence nem a Senador nem a Governador nem a Presidente. E devemos tratá-lo com o maior cuidado e carinho, porque é patrimônio público, não é patrimônio de uma ou outra personalidade política, mas do povo brasileiro.  

Dizer que o Movimento dos Sem-Terra é a grande expressão nacional de destruição do patrimônio público, convenhamos, Sr as e Sr s Senadores, é, no mínimo, um exagero contábil, pois se um vidro foi quebrado, se uma mesa de escritório foi destruída, fazendo-se as contas, chegaríamos a um valor absolutamente insignificante se comparado aos tantos danos causados por muitos que têm a ousadia de dizer que o Movimento dos Sem-Terra está destruindo o patrimônio público.  

Eu não vou fazer, Sr. Presidente, uma retrospectiva do processo de privatização, mas uma simplória retrospectiva da verdadeira baderna, dos danos contra o patrimônio público provocados com a privatização da Vale do Rio Doce. Todos se lembram de que entregaram a Companhia Vale do Rio Doce com a desculpa de que era para pagar os juros e o serviço da dívida. Que desculpa esfarrapada! A dívida aumentou e a empresa foi entregue com R$700 milhões em caixa!  

Não vou falar da Telesp, que entregaram com nada menos que R$1 bilhão em caixa. Não vou falar da Companhia Siderúrgica Nacional que foi "vendida" num suposto leilão por R$1 bilhão, pago com moedas podres financiadas, compradas com dinheiro emprestado do BNDES. Não vou falar da Aço Minas Gerais S.A, na qual o Governo Federal investiu mais de R$4 bilhões antes de privatizar, além de gastar mais R$2 bilhões na CSN. Não vou falar do processo de privatização da Telebrás, em relação ao qual, mais cedo ou mais tarde, vamos instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito para avaliar os gigantescos danos ao patrimônio público.  

Portanto, acusar o Movimento dos Sem-Terra de destruir o patrimônio público, efetivamente, contraria a lógica formal. O escritório, o vidro e o orelhão público não devem ser quebrados. Mas, convenhamos, é no mínimo desafiar a inteligência do povo brasileiro utilizar o aparelho de Estado e os meios de comunicação para tentar deslegitimar um movimento que efetivamente não é responsável pela incompetência do Governo em fazer a reforma agrária.  

Sr. Presidente, Sr as e Sr s Senadores, sair por aí dizendo que invadiram terras alegando o que determina a Constituição, convenhamos, a Constituição defende a propriedade privada desde que cumpra sua função social. Caso contrário, não há defesa da propriedade privada, que deve estar apta ao processo de reforma agrária. O problema é que o Governo Federal mostra-se incapaz de realizá-la. É evidente que o Governo Federal deveria enfrentar os invasores de terras públicas, aqueles que conseguem armar nos cartórios, muitas vezes com a cumplicidade do Estado, os supostos títulos de compra e venda. Esses grandes invasores de terras públicas não são considerados invasores. Então, o Movimento dos Sem-Terra é o grande responsável.  

Quanto a saquear, convenhamos, especialmente depois de ontem, neste Casa, em que promovemos a impunidade a favor dos saqueadores dos cofres públicos, que protegemos e cujas operações legitimamos. O Banco Central e o Governo entendem que isso está bem. Cada vez que ocorre um saque a um caminhão de comida, se diz que o Movimento Sem-Terra é isso ou aquilo. Portanto, Sr. Presidente, saques, invasão, destruição, baderneiros e foras-da-lei, efetivamente, não cabem no Movimento dos Sem-Terra.  

Se o Governo Federal quer acabar com o movimento Sem-Terra tem uma objetiva e concreta alternativa: a reforma agrária. Fazendo isso acabará com o Movimento dos Sem-Terra, com o MLST, com MT, com a Pastoral da Terra. Faça a reforma agrária para garantir não o cumprimento da Constituição, mas para fazer deste País uma gigantesca Nação; para fazer o desenvolvimento econômico; para produzir alimentos para combater a maior vergonha deste século, que é a fome; para gerar emprego e renda! Portanto, para a incompetência e a insensibilidade do Governo, não adianta fazer esse tipo de campanha com o Movimento dos Sem-Terra, porque, efetivamente, os saqueadores dos cofres públicos não estão, como trabalhadores rurais sem terra, perambulando pelas estradas deste País, vivendo embaixo de uma barraca de lona.  

Alguém sabe o que é ficar embaixo de uma barraca de lona sob um sol fervente sobre a cabeça? Durante o dia, o calor angustiante, e à noite, o frio gelado. Alguém aqui passa por isso? Não! Alguém aqui pensa na possibilidade de querer deitar e dormir com seu filho e não poder em função da lama embaixo da barraca de lona? Portanto, saqueadores dos cofres públicos, baderneiros, foras-da-lei não estão efetivamente no Movimento dos Sem-Terra, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2000 - Página 8929