Discurso durante a 51ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REPUDIO A ENTREVISTA DO DEPUTADO FEDERAL ALEKSANDRO DA SILVA, COM CALUNIAS E AMEAÇAS CONTRA MEMBROS DO PT DO ACRE. ARBITRARIEDADE DE AUTORIDADES PUBLICAS NA PROIBIÇÃO DA LIBRE MANIFESTAÇÃO DOS MOVIMENTOS POPULARES. CONSIDERAÇÕES SOBRE A REFORMA AGRARIA E A OPOSIÇÃO AO MST.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL. REFORMA AGRARIA.:
  • REPUDIO A ENTREVISTA DO DEPUTADO FEDERAL ALEKSANDRO DA SILVA, COM CALUNIAS E AMEAÇAS CONTRA MEMBROS DO PT DO ACRE. ARBITRARIEDADE DE AUTORIDADES PUBLICAS NA PROIBIÇÃO DA LIBRE MANIFESTAÇÃO DOS MOVIMENTOS POPULARES. CONSIDERAÇÕES SOBRE A REFORMA AGRARIA E A OPOSIÇÃO AO MST.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2000 - Página 8945
Assunto
Outros > ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • REPUDIO, DECLARAÇÃO, ALEKSANDRO DA SILVA, DEPUTADO FEDERAL, CALUNIA, EDVALDO MAGALHÃES, DEPUTADO ESTADUAL, LIDER, GOVERNO ESTADUAL, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO ACRE (AC), OFENSA, HONRA, FAMILIA, SUGESTÃO, AMEAÇA, GOVERNADOR.
  • CRITICA, GOVERNO, REPRESSÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, AMEAÇA, DEMOCRACIA, ESPECIFICAÇÃO, CONFLITO, ESTADO DA BAHIA (BA), ESTADO DO PARANA (PR).
  • DEFESA, URGENCIA, REFORMA AGRARIA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, ORDEM SOCIAL, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, GARANTIA, LIBERDADE, ORGANIZAÇÃO, MANIFESTAÇÃO, LOCOMOÇÃO, RESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, quero aqui fazer um registro de alguns acontecimentos que estão ocorrendo no Estado do Acre, que considero muito graves.  

Primeiramente, quero me reportar a uma entrevista dada pelo Deputado Aleksandro da Silva, suplente do ex-Deputado Hildebrando Pascoal, que foi cassado, numa das emissoras de TV do meu Estado, nesse final de semana, mais precisamente no feriado da segunda-feira. Ali, o Deputado assacou uma série de calúnias contra o Líder do Governador Jorge Viana, na Assembléia Legislativa, atingindo a sua honra e a honra da sua família.  

Não tenho coragem de repetir desta tribuna, pois tenho certeza de que ferem o decoro parlamentar as palavras ditas pelo Deputado Aleksandro da Silva. Mas desejo dizer que a sociedade acreana repudia com veemência todas as calúnias que feriram a honra do Deputado Edvaldo Magalhães e de sua esposa, Perpétua. Uma companheira de lutas, uma sindicalista que tem dado uma contribuição muito grande ao movimento social do Estado, que teve sua honra ferida pelas palavras maldosas e malignas do Deputado Aleksandro da Silva.  

Uma outra questão ainda nesse item é que o Deputado fez uma ameaça cifrada ao Governador Jorge Viana. Como é bem do seu estilo, na ameaça cifrada, hoje publicada no jornal Folha de S.Paulo , o Deputado diz que deseja e quer que o Governador Jorge Viana tenha sobre si o Salmo 109. Para quem não conhece o Salmo 109, devo dizer que faz parte dos Salmos do Rei Davi, que, à época, quando sentiu o perigo de guerra, pediu a Deus que fizesse acontecer com seus adversários uma série de maldades: o adversário deveria morrer, seus filhos deveriam ficar órfãos e sua esposa deveria ficar viúva e o lugar dele seria substituído por outro.  

O Deputado Aleksandro se diz evangélico, cristão conhecedor da Bíblia, e sabe o contexto em que o Rei Davi usou essas palavras. São do Velho Testamento, quando reinava a Lei de Talião. Hoje, qualquer pessoa que professa o cristianismo – e o Deputado diz professar - jamais utilizaria aquele Salmo pedindo a Deus que isso aconteça com seus adversários políticos.  

Conhecendo a prática do Deputado Aleksandro, junto com o Deputado Hildebrando, seu titular, tenho absoluta certeza de que ele estava dando um recado aparentemente cifrado. Alguém pode pensar que ele está entregando para Deus. Ele sabe que hoje as pessoas não vivem mais no tempo da Lei; vivem no tempo da Graça. Qual foi o mandamento de qualquer cristão? Não é mais a Lei; prevalece o princípio do amor e do perdão. Não se pratica mais "o olho por olho, dente por dente", e o Governador nunca desejou a sua morte.  

A única coisa que queremos é que ele responda na Justiça por todas as improbidades administrativas e as acusações criminosas que recaem sobre ele. E antes que ele queira passar à frente de Jeová, fazendo o mesmo – "olho por olho, dente por dente" - com o Governador e sua família, espero que ele seja cassado e preso.  

O segundo aspecto que eu gostaria de registrar é que estamos vivendo um momento de muita turbulência patrocinada pelo Governo.  

O episódio de Porto Seguro e Coroa Vermelha, na Bahia, e o recente de Curitiba, no Paraná, estão criando um precedente muito grave para a democracia. Está-se instituindo, neste País, uma espécie de passaporte ideológico. Se houver alguma manifestação, alguma movimentação, as pessoas são identificadas por suas posições. Se as pessoas estiverem indo para determinado local protestar contra o Governo, a Polícia imediatamente as sitiará, jogará bombas e atirará contra elas. Assim fizeram em Coroa Vermelha, Porto Seguro e, agora, no Paraná. Várias pessoas foram feridas. Em um único hospital foram atendidas 20 pessoas e houve - temos agora a confirmação - um óbito.  

Sr. Presidente, é preciso entender que, em uma democracia, agir preventivamente não significa impedir as pessoas de exercerem seu direito de ir e vir. A Constituição Federal, no art. 5º, assegura às pessoas o direito à livre manifestação da opinião. O que está acontecendo é uma arbitrariedade: estão ferindo os princípios constitucionais que asseguram aos cidadãos sua livre organização e manifestação.  

Meu tempo é pouco. Serei breve. Concordando com a Líder de meu Partido, Senadora Heloisa Helena, penso que se o Governo quer, de uma vez por todas, fazer com que o Movimento dos Sem-Terra não tenha qualquer apelo, nenhum seguidor, ele pode fazer algo. O Governo dispõe de duas fórmulas: uma é perseguir, mandar a Polícia soltar bombas, atirar nas pessoas, matar as pessoas, como está sendo feito, tentando colocar o movimento de trabalhadores, que é legítimo, na ilegalidade; a outra, a que advogo, é fazer a reforma agrária. Se o Governo fizer a reforma agrária, não haverá José Rainha, Pedro Stédile, Deolinda, ninguém conseguirá mobilizar as pessoas para manifestações por uma reforma agrária que já foi feita.  

Lamentavelmente, não há política fundiária; lamentavelmente o que está sendo feito não é reforma agrária. Estão assentando pessoas, divulgando propagandas enganosas, como a história de Cédula da Terra, a do Banco da Terra. Essa reforma agrária não alcançará o resultado apregoado. A pressão pela terra no Brasil é legítima e conta com o apoio da sociedade.  

A pesquisa feita à época da Marcha dos Sem-Terra dava conta de que de 70% a 80% dos brasileiros concordam com a reforma agrária. O que precisa mais o Governo além do apoio social? O que é preciso além da necessidade histórica e ética de fazer reforma agrária? Não há nenhuma desculpa para não fazer reforma agrária. Os quatro milhões de trabalhadores sem-terra precisam dessa atitude do Governo. Não podemos aceitar que a nossa Constituição seja rasgada a todo momento e que se criem precedentes de identificação ideológica para impedir a chegada das pessoas ao movimento. O movimento foi interditado a 27 quilômetros do lugar marcado. A desculpa para o interdito proibitório de ocupação de prédios públicos não se aplica à manifestação que estava nas estradas a caminho. Se a Polícia quer agir de forma preventiva, deve ficar nos locais das manifestações para garantir segurança também aos manifestantes e evitar que aconteçam excessos. Não pode fazer a proibição antes de os manifestantes chegarem ao local marcado para o ato de protesto.  

O que está acontecendo em nosso País requer por parte do Congresso uma observância. Não sei que tipo de ação poderemos tomar, mas somos responsáveis pela Constituição que aprovamos. A Constituição de 1988 assegura, em seu artigo 5º, a liberdade de organização, de manifestação e de locomoção. Nenhum cidadão pode ser privado desses direitos por discordar do Governo ou por ter posição diferente.  

Sr. Presidente, agradecendo a liberalidade de V. Exª em permitir-me fazer este registro, devo dizer que a proposta da CPT é a de que o Governo apresente uma proposta de reforma agrária, limitando o tamanho das propriedades. As propriedades precisam ter demarcação de limites, para que não aconteça como no Estado do Acre, de pessoas terem 1,5 milhão hectares ou 2 milhões de hectares, enquanto outras simplesmente são sem-terra.  

Se fizermos isso, repito, não haverá apelo para uma manifestação pela reforma agrária, porque não existirá a bandeira, pois, na prática, a reforma agrária terá sido realizada. Acontece que, lamentavelmente, o Governo não está fazendo reforma agrária, não está atendendo aos quatro milhões de trabalhadores sem terra. E os poucos assentamentos que faz estão condenados ao fracasso, porque não possui política creditícia, de saúde, de educação, de transporte e uma política voltada a inserir essas pessoas numa relação de comércio para seus produtos.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2000 - Página 8945