Discurso durante a 53ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM O CLIMA DE DESORDEM QUE HORA NORTEIA O MST. DEFESA DO DIALOGO PARA EVITAR CONFRONTOS EM TORNO DA QUESTÃO FUNDIARIA NO PAIS.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA. :
  • PREOCUPAÇÃO COM O CLIMA DE DESORDEM QUE HORA NORTEIA O MST. DEFESA DO DIALOGO PARA EVITAR CONFRONTOS EM TORNO DA QUESTÃO FUNDIARIA NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 06/05/2000 - Página 9324
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • APREENSÃO, TUMULTO, ORDEM SOCIAL, VIOLENCIA, INVASÃO, ORGÃO PUBLICO, AUMENTO, CONFLITO, PROPRIETARIO, TRABALHADOR RURAL, SEM-TERRA, OMISSÃO, GOVERNO.
  • DEFESA, DIALOGO, PROCESSO, REFORMA AGRARIA, REPUDIO, PROVOCAÇÃO, OPOSIÇÃO, INVASÃO, PROPRIEDADE PRODUTIVA, NECESSIDADE, DEFINIÇÃO, GOVERNO, POLITICA, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA).
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, REGINA LINO, SUPERINTENDENTE, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), ESTADO DO ACRE (AC).

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB – AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, a opinião pública brasileira vem acompanhando com grande apreensão, nos últimos dias, os seguidos episódios de violência e os atentados à ordem pública praticados em torno da questão fundiária, em diversos Estados, e que envolvem, até mesmo, invasão e depredação de órgãos federais, estaduais e municipais.  

Há muito tempo esse é um dos problemas que mais me preocupam, dentro do tumultuado cenário das relações sociais em nosso País. A falta de diálogo, de boa vontade entre as partes, pode levar a uma conflagração geral no campo, a partir dos choques de interesses que contrapõem os proprietários aos posseiros.  

Os donos das terras prometem, doravante, reagir com mais acentuada firmeza, usando, inclusive, armas e grupos de segurança especialmente formados. Em contrapartida, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, garante que também vai tornar mais agressivas suas ações - e o Governo, inerte, pouco ou nada faz, mesmo sabendo que será responsabilizado, perante a História, pelas tragédias diariamente anunciadas.  

Sr. Presidente, Srs. Senadores, temos acompanhado, em alguns dos mais expressivos veículos de comunicação do País, graves advertências sobre o crescimento das tensões rurais, atingindo diversas regiões brasileiras. Eram situações perfeitamente previsíveis e que, portanto, jamais poderiam ter sido desconsideradas como efetivamente foram. Tive essa preocupação diversas vezes, ao longo dos mandatos exercidos na Câmara dos Deputados, e, hoje, no Senado Federal, sempre ciente de que não administrar com firmeza e eficácia, significaria torná-lo insuperável.  

Esta é, como afirmei, minha sólida convicção sobre os problemas rurais e as tentativas de implantar uma verdadeira reforma agrária no Brasil: o diálogo é o ponto de partida e também o objetivo de tudo, porque, sem ele, a violência sairá de controle e estaremos mergulhando no caos social. Os provocadores de todos os matizes terão a macabra alegria de contar cadáveres, cuja exposição acirrará os ânimos até níveis inimagináveis.  

Já temos mortes a lamentar, na semana que chega ao fim. Mesmo em pequeno número, já são demais , porque não podemos deixar de denunciar cada vida perdida no confronto que se agrava, envolvendo os proprietários, os trabalhadores e as forças do Estado. Ninguém quer ceder!  

Nada se faz de positivo, de verdadeiramente útil, para superar os impasses - o que vem abrir porteiras para os aventureiros e carbonários de sempre, aqueles que se aproveitam dos impasses sociais para dar vazão à sua própria sanha destruidora e insana.  

Não é à toa que todos os líderes de direita e de esquerda, ao longo dos séculos, sempre advertiram os seus adeptos para o perigo da ação dos provocadores, que se aproveitam de temas sensíveis para fazer a única coisa de que são capazes e que lhes interessa: desagregar, destruir, causar o máximo de danos às estruturas da sociedade.  

Se o problema atingiu níveis tão graves e promete piorar ainda mais, o Governo Federal concorreu para isso, por não definir e negociar com eficácia seus programas ; por não assumir a obrigação maior, usar sua autoridade para evitar insegurança e ruptura do tecido social. Permitam-me esclarecer que essa não é uma proposta policialesca ou puramente repressiva, coisa que desmentiria toda a minha história de democrata convicto e combativo.  

É inegável, todavia, que algo ainda deve ser feito. E precisa ser feito , com serenidade e firmeza. Não podemos perder de vista a essência da questão: reforma agrária, ocupação de espaços rurais é questão de vontade política, de determinação programática e pragmática.  

Se não houver uma corajosa definição, continuaremos negociando nessa trilha errática, produzindo focos explosivos e colecionando cadáveres à margem das estradas e ao longo das cercas das fazendas.  

Não é possível admitir atentas contra propriedades produtivas, pois essa é a condição que legitima a posse desfrutada por seus donos. A invasão de glebas socialmente úteis é uma ameaça ao próprio abastecimento de víveres para os centros urbanos, porque pode transformar em campos de batalha os núcleos fornecedores de produtos de origem vegetal ou animal. Será que isso interessa ao Governo, guardião e executor das aspirações nacionais?  

Sr. Presidente, Srs. Senadores, reforma agrária é coisa séria, que deve ser tratada com prudência e equilíbrio pelos fatores sociais, políticos e administrativos nela envolvidos. Entregar seu comando a tecnocratas, ou a grupos ideológicos desprovidos de bom senso, significa detonar uma terrível explosão social, que espalhará estilhaços letais em todas as direções.  

Esse ponto, aliás, é digno da mais profunda reflexão: em 27 de março, o Ministério do Desenvolvimento Agrário, através da Portaria nº 99, de 2000, promoveu a demissão de todos os então Superintendentes Regionais do Incra e implantou nova sistemática para a escolha de seus sucessores, numa mirabolante operação similar a um concurso público – contraditoriamente centrado naquilo que, durante a ditadura, os militares chamavam de "público interno".  

As razões alegadas se prendiam, todas, a uma promessa que tem fácil apelo junto à opinião pública e à imprensa: "evitar pressões políticas para o preenchimento dos cargos". Isso não impediu, contudo, que a própria Portaria deixe abertas todas as portas para as velhas práticas, apenas tornando-as privativas dos tecnocratas contemporâneos.  

"Não preencher cargos por critérios políticos" foi uma das principais marcas deixadas pelo extinto Governo Collor, que se desdobrou, justamente, em agredir os políticos, fechando-lhes as portas de acesso às entidades públicas.  

Todos vimos, depois, que a alternativa adotada foi o malsinado e pouco saudoso "Esquema PC", que custou o próprio mandato àquele jovem político.  

Sempre que ouço ou leio declarações no sentido de discriminar a participação dos representantes do povo, na gestão da administração pública, vem-me um profundo sentimento de desconfiança e de preocupação – porque os cargos existem, têm de ser preenchidos, e deve haver critérios claros e mais transparentes para tanto. Será que existe algum critério mais claro e mais transparente que as negociações democráticas, envolvendo o Governo e os que lhe dão sustentação e apoio nos diversos níveis políticos?  

No caso da reforma agrária, então, devemos ter uma cautela ainda maior. O agravamento das tensões exigirá doses progressivas de diálogo e espírito conciliador – e essas, ninguém pode negar, são as grandes qualidades dos políticos.  

É um erro deixar por conta de tecnocratas o trabalho de buscar um denominador comum, de tentar quebrar os impasses decorrentes da radicalização e das disputa em torno de algo tão sensível e explosivo como a posse da terra.  

Tivemos, recentemente, no Acre, um exemplo da competência e do talento dos políticos, quando emprenhados em promover a causa pública: em quatro meses, como Superintendente Regional do Incra, a socióloga e ex-Deputada Federal Regina Lino pacificou a repartição, conciliou as facções em conflito, demarcou terras e promoveu programas educativos para os filhos dos colonos; mostrou que a ação política não implica, necessariamente, partidarização ideológica. No exemplo de Regina Lino, encontramos a receita para graves males que se eternizam e, pior ainda, crescem de tamanho e gravidade no meio rural.  

É o diálogo prudente e competente, centrado na consciência política e na determinação democrática de evitar que a grave questão da reforma agrária, da ocupação das glebas produtivas, venha a se converter num banho de sangue que envergonhará nossa geração.  

Espero que todos os homens e mulheres que se dedicam à vida pública, no Brasil, acordem para essa obrigação e, finalmente, dediquem-lhe a importância que ela exige nas consciências nacionais.  

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/05/2000 - Página 9324