Discurso durante a 54ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE AS AÇÕES DO MOVIMENTO DOS TRABALHADORES SEM-TERRA E A GREVE DOS CAMINHONEIROS. COMPARECIMENTO DO PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL A COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, AMANHÃ, PARA TRATAR DA INTERVENÇÃO NO BANCO DO ESTADO DE RONDONIA.

Autor
Ernandes Amorim (PPB - Partido Progressista Brasileiro/RO)
Nome completo: Ernandes Santos Amorim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA. BANCOS.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE AS AÇÕES DO MOVIMENTO DOS TRABALHADORES SEM-TERRA E A GREVE DOS CAMINHONEIROS. COMPARECIMENTO DO PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL A COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, AMANHÃ, PARA TRATAR DA INTERVENÇÃO NO BANCO DO ESTADO DE RONDONIA.
Aparteantes
Paulo Hartung.
Publicação
Publicação no DSF de 09/05/2000 - Página 9434
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA. BANCOS.
Indexação
  • APREENSÃO, OCORRENCIA, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, CAPITAL FEDERAL.
  • CRITICA, OBSTACULO, BANCO DA AMAZONIA S/A (BASA), APLICAÇÃO, RECURSOS, REGIÃO NORTE, PREJUIZO, PRODUÇÃO.
  • APOIO, MOVIMENTO TRABALHISTA, MOTORISTA, CAMINHÃO, GREVE, OPOSIÇÃO, PEDAGIO, INJUSTIÇA, DECISÃO, GOVERNO, COBRANÇA, EMPRESARIO.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO, AMBITO, MOVIMENTO TRABALHISTA, POLITICA SOCIAL, REFORMA AGRARIA, POLITICA AGRICOLA, DESVIO, RECURSOS, ARRECADAÇÃO, PAGAMENTO, DIVIDA EXTERNA, JUROS.
  • ANUNCIO, COMPARECIMENTO, ARMINIO FRAGA, PRESIDENTE, BANCO DA AMAZONIA S/A (BASA), ESCLARECIMENTOS, IRREGULARIDADE, INTERVENÇÃO, BANCO ESTADUAL, ESTADO DE RONDONIA (RO), SOLUÇÃO, DIVIDA.

O SR. ERNANDES AMORIM (PPB – RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr .Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero dizer a V. Exªs que estou bastante preocupado com os problemas que afligem a sociedade e que nós e o Governo Federal estamos tentando resolver.  

Chegando ao Senado, a 200 metros daqui, ao lado do palácio do Governo, vi uma invasão de sem-teto. Daqui a pouco, estarão os sem-terra. Existe também o problema do Basa, que deveria estar aplicando os recursos na região Norte. Entretanto isso não acontece. O banco tem os recursos e quer aplicá-los, por exemplo, na pecuária de corte. Em uma reunião na cidade de Ariquemes — Rondônia —, o gerente do banco disse que não aplicava o dinheiro que tem em caixa porque há muitos problemas. Por exemplo, um fazendeiro que há 20 ou 30 anos desmatou a área e tem pastagens ociosas não pode pegar o financiamento porque o Ibama não permite que a área desmatada seja financiada. Sr. Presidente, veja que incoerência! Daqui a pouco essas fazendas terão de ser desapropriadas em função dessa incoerência. Isso ocorre em conseqüência do próprio sistema estabelecido.  

Estou preocupado também com o problema dos caminhoneiros. Recentemente houve essa greve, que acredito necessária. Durante ela destacaram-se várias lideranças, entre elas o sindicalista do Rio de Janeiro, Nélio Botelho, e vários outros sindicalistas pelegos, que se movimentaram para buscar uma solução para milhares de caminhoneiros, que transportam, trabalham e necessitam de melhores condições de trabalho. Os caminhoneiros são barrados pelos pedágios.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quatro ou cinco empresas adquiriram, não sei como, a que preço, nem por quanto tempo, o direito de cobrar pedágio. Neste País, há milhares de pessoas transitando nas estradas e as empresas arrecadam fortunas. Apesar da inflação baixa e de os salários não aumentarem há mais de cinco anos, o valor do pedágio tem aumentado periodicamente. Os caminhoneiros já não agüentam pagá-lo. Em vez de o Governo Federal ficar do lado do povo, do trabalhador, do caminhoneiro que trabalha dia e noite, ficou do lado de cinco empresas que têm direito a esses pedágios, explorando a população, o cidadão que tem o seu automóvel, qualquer um que passe por aqueles pedágios. E as greves se espalham em todas as frentes e setores, transformando-se até em baderna. E aí está a falta de autoridade de quem comanda este País.  

Há poucos meses fiz um discurso, dizendo que o Presidente precisava estar à frente do processo para dizer quem está governando. E, para surpresa minha, ouvi alguns porta-vozes do Presidente da República irem à televisão durante esta semana – os Ministros Raul Jungmann, José Gregori e Aloysio Nunes –, ocupando aquele espaço, para dizer que era preciso "dar o golpe". Essa expressão "dar o golpe" foi repetida várias vezes.  

Em quem o Ministro quer dar o golpe? Naquele cidadão que, depois de uma vida inteira, possui as suas terras como renda, como patrimônio. E essas pessoas que possuem essas terras, fazendeiras ou fazendeiros, não as exploram porque o próprio Governo não lhes deu as mínimas condições para isso. Nenhum fazendeiro vai, com uma enxada ou trator, sozinho, com recursos próprios, talvez escassos, fazer a sua fazenda.  

Se ele tem uma empresa que se chama fazenda, é necessário que o Governo Federal abra algumas linhas de crédito para comprar maquinário, para financiar o plantio e o custeio. A área econômica não tem feito isso; não tem ajudado esses proprietários. E aí, na televisão, é veiculada a solução do Governo Federal: tomar as terras de quem tem para fazer a reforma agrária.  

A todo momento ouve-se o staff da área econômica, nos meios de comunicação, dizer que o Governo Federal nunca arrecadou tanto quanto está arrecadando agora. Ocorre que esse dinheiro não aparece para a reforma agrária; não aparece para o financiamento da casa própria; não aparece para o financiamento da agricultura ou para os investimentos.  

É com tristeza que ouvimos os representantes do Governo dizendo que vão "dar o golpe". Ora, Sr. Presidente, lembro-me de que, aos 18 anos, quando me incorporei ao Exército, tendo ainda pego um certo rescaldo da Revolução de 64, vi muitas pessoas presas em conseqüência daquele movimento militar, que, a meu ver, foi um golpe errado, que não tinha uma causa que surtisse os efeitos que objetivavam naquela época.  

Ainda há pouco, a Senadora Heloisa Helena disse, em seu discurso, que a revolução ainda não foi feita. Se o Governo Federal, por intermédio de seus Ministros, já está falando em "dar o golpe", o que dizer da população que está morrendo de fome? E os empresários, que estão sendo saqueados pelo sistema tributário vigente? O que dirão eles neste momento? O que a população pode dizer ao Governo Federal?  

Fico preocupado, Sr. Presidente, porque, daqui a pouco, haverá realmente um golpe, e não saberemos se será mais um golpe do Governo ou se será um golpe da população contra o Governo, pois a revolução, como diz a Senadora Heloisa Helena, ainda não foi feita. Aliás, se tivesse havido uma revolução verdadeira, hoje, não estaríamos com o País sofrendo como está, com os aposentados na situação em que se encontram, com a falta de investimentos, com o MST invadindo edifícios públicos de todas as esferas de governo – e esse é um movimento que poderia ter acabado quando começou se o Presidente Fernando Henrique Cardoso tivesse dialogado com essas lideranças com vistas a resolver os problemas, como deveriam ter sido resolvidos, ou seja, com a distribuição de terras, com apoio a esses assentados, e não com o Governo fazendo publicidade de uma reforma agrária inexistente.  

Ao contrário, acreditam que deve haver um golpe sobre a população que tem terras; terras essas que o Governo deveria tomar para distribuir a quem não tem, pensando assim resolver o problema. Todavia, não é desse jeito que se resolverá o problema, ainda porque as pessoas que integram esse Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra, na sua grande maioria, não entendem de agricultura, não precisam de terra. Essas pessoas precisam é de emprego, de patrões. E, para ser patrão, há que se ter meios, investimentos. Esses investimentos, hoje, estão sendo desviados para pagar a dívida externa e os juros absurdos da dívida. Mesmo com a grande arrecadação fiscal, o dinheiro não fica no Brasil, pois está saindo dos cofres públicos para o pagamento desses juros escorchantes.  

Diante desse estado de coisas, Sr. Presidente, estou preocupado. O Presidente da República deve estar pensando em uma solução para esse problema. Essa bomba de efeito retardado está para explodir, e o Governo Federal não pode ficar de braços cruzados, mandando seus Ministros dizerem publicamente que "darão o golpe" para poder resolver o problema!  

No caso da greve dos caminhoneiros, por exemplo, qual foi a solução do Governo Federal? Simplesmente dizer que ia cobrar dos produtores, dos empresários, das indústrias a diferença dessas tarifas. Imagine, Sr. Presidente: os empresários já estão falidos e, para produzirem, têm de pagar uma carga de 58 impostos, e vem agora, lamentavelmente, o Presidente e diz que vai tirar de toda a classe empresarial dinheiro para pagar essas cinco empresas de pedágio. Seria mais fácil regular a questão dos pedágios, rever esses contratos leoninos ou permitir que o País constantemente entre em greve, prejudicando toda a sociedade, toda a população, todo o empresariado, fazendo com que às vezes apodreçam mercadorias? Frise-se: há apenas quatro ou cinco donos de pedágios que comandam este País hoje.  

O Presidente Fernando Henrique tem assessorias, dispõe de serviços de informação, de setores competentes para buscar uma saída, e mesmo esse prazo de onze dias não resolverá esse problema, mesmo que Sua Excelência tenha agora encontrado um canal de diálogo com alguns sindicalistas, pelegos alugados, para poder dizer que está tudo bem, não ouvindo, contudo, as reivindicações do Sr. Nélio Botelho. Devo salientar que não me dizem respeito os seus interesses, mas posso afirmar que falava a verdade em nome da sua categoria; verdade esta que colocou nas ruas.  

Embora esse movimento – e sou contra as greves – tenha nascido com poucas reivindicações, o Governo deve ter gasto uma verdadeira fortuna com os meios de comunicações para diminuir, para sufocar essa manifestação. O Governo ocupou espaço na mídia para dizer que não havia mais greve, que o movimento havia acabado, que não havia dado certo. Todavia, Sr. Presidente, na Região Norte, a greve foi séria, fecharam as BRs, o trânsito foi paralisado, a movimentação econômica foi estagnada, causando prejuízos a muitos empresários.  

Por isso, Sr. Presidente, estamos aqui fazendo um apelo ao Senhor Presidente no sentido de que busque uma solução, haja vista não ser justo que os empresários arquem com esses encargos dos pedágios. Não podemos impor que milhares de empresas paguem pedágio a cinco empresas que cuidam de algumas estradas construídas com dinheiro público, 90% das quais continuam deterioradas, esburacadas, sem condições nenhuma de trânsito. A BR-364, que corta o meu Estado, está em estado de calamidade. O caminhão que passa lá é o mesmo que vai passar nesses pedágios, levando o dinheiro da Região Norte aos grandes centros, para pagar a minoria de privilegiados do País.  

Até pergunto, Sr. Presidente, se não há alguém no Governo que, indiretamente, é sócio dessas quatro empresas de pedágio. Será que tem alguém no comando maior que está recebendo alguma coisa de interessante dos donos de pedágio? Eu não posso imaginar que cinco empresas, apoiadas pelo Governo, venham a barrar um País inteiro. Se fosse um Governo sério, forte e de pulso, evidentemente, reveria esses contratos de pedágio. Não acredito que o Governo Federal, que vê os caminhoneiros trabalhando dia e noite - atualmente, trabalham quase de graça - pagando um combustível que sobe de preço de seis em seis meses e peças que aumentam a toda hora, permita que alguém, tomando conta de um pedágio, numa estrada boa, receba tanto sem investir nada. Está na hora de esses contratos leoninos serem revistos, porque isso é uma injustiça. Esse é o verdadeiro golpe sobre o qual os Ministros deveriam ter a coragem de falar na televisão, não o golpe que querem dar nos fazendeiros nem em quem possui terras, para resolver o problema dos sem-terra. Se há alguém sem terra neste País, a culpa não é de quem a tem; a culpa é governamental, estrutural, a culpa é de não se investir recursos corretamente. Em vez de tirar o ganho e a renda do trabalhador brasileiro para pagar juros altos, dever-se-ia dar mais atenção ao povo, fazendo investimentos para ajudar no nosso desenvolvimento e criar novos empregos.

 

Sr. Presidente, outro assunto que me traz à tribuna é a questão do Banco Central. O Presidente Armínio Fraga esteve aqui, na semana passada, na Comissão de Assuntos Econômicos, discutindo o problema da intervenção no Banco do Estado de Rondônia. Amanhã, voltará a esta Casa para dar satisfações e respostas, apresentando as medidas que serão tomadas para resolver o problema. Na época da intervenção, o Beron tinha saldo negativo, ou seja, necessitava de R$34 milhões para resolver o seu problema. Entretanto, o Banco Central interveio, e a Lei nº 2.321, de 1987, diz que, em caso de intervenção, sessenta dias depois os interventores têm que apresentar uma solução para o Banco. Então, a interventora, Drª Flora Valadares Coelho, enumerou as medidas a serem tomados para resolver o problema da intervenção. Ora, se naquele momento tivesse sido solucionado o problema, o Estado teria uma dívida de R$30 milhões a R$50 milhões.  

Não foi o que aconteceu, Sr. Presidente. Essa intervenção se prolongou por três anos e meio. Há interesse escuso nesse caso, algo que ninguém entendeu até agora. Essa dívida que citei elevou-se para R$500 milhões, e hoje, embora o Estado tenha pago cerca de R$80 milhões, resta ainda um montante de aproximadamente R$800 milhões a serem pagos. E, diga-se de passagem, essa dívida não é do Estado, foi contraída pelos interventores do Banco Central, Instituição que naquele momento deveria ter cuidado ou de liquidar o banco ou de buscar uma solução de viabilizar o seu funcionamento, emprestando-lhe recursos, uma vez que dispõe de dinheiro para tais casos. Todavia, não o fez. O que fez foi promover mais negociatas, mais jogo sujo, elevando a dívida do Banco em mais de R$350 milhões. Além do mais, o interventor comandou uma lavagem de dinheiro em uma pequena agência do Beron em São Paulo, fato confirmado pela CPI dos Precatórios, que detectou mais de R$2 bilhões de lavagem de títulos podres.  

O Banco Central tinha conhecimento de tudo, sem no entanto ter tomado nenhuma providência. Logo depois, jogou essa conta toda em cima do Estado de Rondônia, que era virgem em termos de dívida - quase não tinha dívida - e hoje está com a vida sacrificada. Com essa dívida, no próximo ano, a arrecadação do Estado não poderá pagar a folha de pagamentos e a rolagem da dívida.  

Por isso, a nossa Bancada de Deputados Federais, os Senadores Moreira Mendes e Amir Lando e eu estamos todos nesta luta para, junto ao Presidente do Banco, procurar resolver o problema. Se não resolvermos pelo diálogo, não há outro caminho que não seja entrar na Justiça Federal para fazermos a suspensão desse pagamento, até que se faça uma auditoria para realmente saber qual é a dívida do Estado e qual é a do Banco Central. Para isso, temos nesta Casa a Comissão de Fiscalização e Controle, que tem autoridade, quando requerida, para fazer o levantamento. Vamos fazer essa proposta se não for resolvido o problema.  

Assim, aguardamos a vinda do Presidente do Banco, amanhã, a esta Casa para tentar uma solução. Queremos uma saída para o problema do Banco Beron no Estado de Rondônia, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

 

alt ö @ 0J 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/05/2000 - Página 9434