Discurso durante a 56ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

LEITURA DE OFICIO ENCAMINHADO POR S.EXA AO GOVERNADOR ANTHONY GAROTINHO COM SUGESTÕES PARA RESOLVER AS DISTORÇÕES NO PROGRAMA DE RENDA MINIMA CONDUZIDO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • LEITURA DE OFICIO ENCAMINHADO POR S.EXA AO GOVERNADOR ANTHONY GAROTINHO COM SUGESTÕES PARA RESOLVER AS DISTORÇÕES NO PROGRAMA DE RENDA MINIMA CONDUZIDO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 11/05/2000 - Página 9639
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • LEITURA, OFICIO, AUTORIA, ORADOR, ENDEREÇAMENTO, ANTHONY GAROTINHO, GOVERNADOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DEBATE, PROGRAMA, GOVERNO ESTADUAL, RENDA MINIMA, GARANTIA, CIDADANIA, AMPLIAÇÃO, ACESSO, MUNICIPIOS.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, leio, da tribuna do Senado, ofício que encaminhei, na última segunda-feira, ao Governador Anthony Garotinho, do Estado do Rio de Janeiro. O ofício se refere a assuntos que serão objeto de debate nesta tarde e à noite, já que hoje estaremos examinando a questão do Fundo da Pobreza no Senado e, logo mais, à noite, a questão do salário mínimo.

            Eis o ofício:

Sr. Governador,

Parece-me oportuno enviar-lhe algumas reflexões a respeito dos programas de governo relacionados à garantia de uma renda mínima a todas as pessoas, como os de Bolsa-Escola e Compartilhar/Cesta do Cidadão, que começaram a ser aplicados no Estado do Rio de Janeiro desde 1999. Desde o início de sua gestão coloquei-me à disposição de V. Exª e da Vice-Governadora, Benedita da Silva, para ajudar a pensar a respeito do melhor desenho de um programa que pudesse, ao mesmo tempo, contribuir para erradicar a pobreza, erradicar o trabalho infantil, possibilitar a presença das crianças na escola, elevar as oportunidades de emprego e tornar mais eqüitativa a distribuição da renda.

Temo que as distorções que estão caracterizando a Cesta do Cidadão ou o Cheque Cidadão, que nas últimas semanas ganharam destaque na imprensa, estejam prejudicando as boas intenções e a eficiência do Programa.

O direito de todas as pessoas residentes num Município, num Estado, idealmente em todo o País e, um dia, na Terra participarem da riqueza deste lugar, conferindo a todos a possibilidade de receber uma renda suficiente para a sua sobrevivência, deve ser entendido como um direito à cidadania. Como tal, deve ser claramente definido em lei, não apenas em decreto, assegurando que ninguém sofra qualquer discriminação.

Tenho a convicção, compartilhada hoje por muitos economistas, filósofos e cientistas sociais, de que deveremos caminhar na direção de estabelecer que todas as pessoas, não importa a sua origem, raça, sexo, idade, religião, condição civil ou socioeconômica, recebam uma renda básica incondicional, modesta, mas suficiente para as suas necessidades vitais. Não haveria a necessidade até mesmo de perguntar quanto essa pessoa estaria ganhando. Todos, ricos e pobres, do mercado formal ou informal, receberiam R$X por mês. Naturalmente, no financiamento de um programa desse tipo, o ônus recairia sobre os mais ricos que têm capacidade contributiva.

O passo mais adequado em direção a colocar em prática essa proposição, que cada vez alcança mais adeptos nos fóruns especializados, é o de se instituir um complemento de renda, um Imposto de Renda negativo, que pode, por exemplo, estar relacionado às oportunidades de educação, a exemplo das experiências de Bolsa-Escola e de Renda Mínima, como as iniciadas no Distrito Federal e em Campinas, em 1995, que depois se propagaram por tantos outros Municípios.

Essas iniciativas acabaram fazendo com que o Congresso Nacional aprovasse a Lei nº 9.533/97, sancionada em dezembro de 1997, que autoriza o Governo Federal a financiar em 50% os gastos dos Municípios com renda per capita e arrecadação per capita menores do que a média do respectivo Estado. A cada ano, partindo-se dos 20% entre os Municípios mais pobres, quintil por quintil, os benefícios se estendem a cada grupo de Municípios. A partir do quinto ano, portanto de 2003, todos os demais Municípios deverão ter o direito.

Os benefícios são definidos de maneira muito modesta. Para as famílias com renda per capita até meio salário mínimo mensal, com crianças até 14 anos, desde que aquelas em idade escolar estejam freqüentando a escola, o benefício mensal é definido pela fórmula B = R$15 vezes o número de crianças até 14 anos menos metade da renda familiar per capita. O benefício mínimo por família é de R$15,00.

Estando em funcionamento essa lei - que certamente precisa ser melhorada, e, para isso, tomei iniciativa, já aprovada pelo Senado -, seria próprio que o Governo Estadual do Rio de Janeiro, como o de cada Estado, a levasse em consideração, pois pelo menos 60% dos Municípios do Rio de Janeiro poderão colocá-la em prática até 2002, e, a partir de 2003, todos os demais. Se tivessem a possibilidade de contribuição do Governo Estadual, em adição ao suporte do Governo Federal, não restaria dúvida sobre a possibilidade de universalização desse direito no Estado num curto espaço de tempo.

O projeto de lei que apresentei no Senado, já aprovado em novembro de 1999, que se encontra na Câmara dos Deputados para apreciação, modifica a fórmula do benefício (B) às famílias para B = 0,40 (número de pessoas na família vezes meio salário mínimo menos renda familiar), podendo o Executivo, de acordo com a disponibilidade de recursos e experiência do programa, alterar aquela alíquota de 0,40 para mais ou para menos. Note que a racionalidade da equação está em se considerar o tamanho da família, o patamar definido na lei de meio salário mínimo per capita, abaixo do qual as famílias passam a ter aquele direito, a renda familiar no período e, o que é importante, a permanência do estímulo para as pessoas naquela família, pelo menos ao seu chefe, de progredir, de procurar o trabalho, pois o mecanismo do Imposto de Renda negativo torna sempre vantajoso para a pessoa ter alguma atividade produtiva que lhe garanta alguma remuneração. Mas a nenhuma família, nesse caso com crianças, seria negada a garantia de uma renda mínima.

A sugestão que formulo a V. Exª é que estude a possibilidade de caminhar na direção de definir o direito a uma renda de cidadania mais próxima dessa fórmula. Que procure estabelecer que o direito seja de todas as famílias que efetivamente não alcancem um certo patamar de renda, como, por exemplo, meio salário mínimo por pessoa, não se atendo, até para não ferir os direitos constitucionais, apenas aos que professam determinados credos, por mais respeitosas e sérias que possam ser as suas organizações.

Pelo que pude observar, o Programa Bolsa-Escola, que institui o benefício de um salário mínimo às famílias com renda per capita de até meio salário mínimo, com crianças até 14 anos, desde que aquelas em idade escolar estejam indo à escola, ainda se encontra em fase experimental, atingindo cerca de duas mil famílias, possivelmente sendo ampliado para seis mil proximamente. Não se trata ainda de um benefício definido como um direito à cidadania para todas as famílias que estejam naquela condição no Estado do Rio de Janeiro. Já o Programa Compartilhar/Cesta do Cidadão define outro critério: é para as famílias que possuam renda de até um salário mínimo e mantenham as crianças em idade escolar na escola e vacinação em dia. O benefício, entretanto, é de R$100,00 por mês, que podem ser trocados por alimentos e produtos de higiene e limpeza em estabelecimentos previamente credenciados.

Não importa o tamanho da família, os dois Programas definem valores diferentes, porém fixos, como benefícios. A forma de distribuição, como é de conhecimento de V. Exª, por meio de igrejas de algumas denominações, tem dado margem a diversos problemas, já que a muitos o mesmo direito tem sido negado, ainda que tenham condições socioeconômicas semelhantes às de beneficiados.

            Sr. Presidente, solicito seja transcrito, na íntegra, o ofício enviado ao Governador Anthony Garotinho. Inclusive, continuarei a tratar desse tema na discussão do Fundo de Combate à Pobreza. Pergunto: “Por que, Sr. Governador Anthony Garotinho, não coordenar melhor os programas nos três níveis de governo, unificando os direitos de todos, da forma mais racional possível?”.

Sr. Presidente, requeiro - repito - seja transcrito, na íntegra, o ofício enviado ao Governador Anthony Garotinho.

            Obrigado.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/05/2000 - Página 9639