Discurso durante a 59ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

INDIGNAÇÃO ANTE O TEXTO DA REFORMA DO CODIGO FLORESTAL APROVADO PELA COMISSÃO MISTA DO CONGRESSO NACIONAL, QUE POSSIBILITA A LIMITAÇÃO DA SOBERANIA NACIONAL. (COMO LIDER)

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE. SOBERANIA NACIONAL.:
  • INDIGNAÇÃO ANTE O TEXTO DA REFORMA DO CODIGO FLORESTAL APROVADO PELA COMISSÃO MISTA DO CONGRESSO NACIONAL, QUE POSSIBILITA A LIMITAÇÃO DA SOBERANIA NACIONAL. (COMO LIDER)
Aparteantes
Geraldo Cândido, José Eduardo Dutra, Lauro Campos, Roberto Saturnino, Sebastião Bala Rocha.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2000 - Página 10012
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE. SOBERANIA NACIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCURSO, ROBERTO SATURNINO, SENADOR, GRAVIDADE, DESIGUALDADE SOCIAL, BRASIL, PROBLEMA, SEGURANÇA PUBLICA, AMEAÇA, ORDEM SOCIAL.
  • COMENTARIO, AUTORIDADE, AMBITO INTERNACIONAL, CONFIRMAÇÃO, LIMITAÇÃO, SOBERANIA, BRASIL, REGIÃO AMAZONICA, APREENSÃO, INTERFERENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).
  • CRITICA, BANCADA, UNIÃO DEMOCRATICA RURALISTA (UDR), LOBBY, APROVAÇÃO, ALTERAÇÃO, CODIGO FLORESTAL, COMISSÃO MISTA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), PREJUIZO, SOBERANIA NACIONAL, PROTEÇÃO, MEIO AMBIENTE.

A SRA. HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL. Como Líder, sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, a princípio quero compartilhar das observações feitas pelo Senador Roberto Saturnino. Todos sabemos que o problema não é de um burocrata como o Ministro da Fazenda a serviço do Fundo Monetário Internacional. O problema não é os burocratas nem os tecnocratas e infelizmente está dentro do Palácio do Governo e aqui no Congresso Nacional. Há uma falta de sensibilidade e visão em quem caberia defender os interesses nacionais para enxergar uma verdadeira guerra no Brasil. O problema não é o vidro quebrado pelo MST. Todos sabem que o MST disse que não o quebrou. O problema, de fato, é que a elite política e econômica deste País não quer visualizar a guerra civil que está acontecendo, a guerra silenciosa que mata milhares de pessoas de fome, que leva milhares de famílias ao consumo de droga, que joga milhares de brasileiros na marginalidade como último refúgio.

Ontem, no Rio de Janeiro, no auge de sua indignação por verem seus filhos assassinados, centenas de pessoas desceram o morro, onde moram, para mostrar ao Brasil que, mais cedo ou mais tarde, as instituições passarão a tremer. Essas são sinalizações dadas pela sociedade civil organizada, pelo povo brasileiro, submetido à fome, à miséria, ao sofrimento, mas, infelizmente, o Congresso Nacional e o Governo Federal não as entendem.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria de trazer a esta Casa parte de um debate sobre a reforma do Código Florestal aprovada pela Comissão Mista do Congresso. Nossa companheira Marina Silva, que há muito tempo acompanha esse debate na Casa, já nos contemplou com os aspectos técnicos, os aspectos ambientais, mostrando-nos todos os mecanismos estritamente competentes voltados para o desenvolvimento sustentável, para o manejo responsável da floresta, bem como as possibilidades concretas de desenvolvimento econômico, de geração de emprego e renda, por meio da responsabilidade com o meio ambiente.

Declarações feitas por alguns membros da Bancada ruralista dão conta de que tudo o que está acontecendo ao meio ambiente é resultado da conspiração de algumas ONGs internacionais que querem possibilitar a invasão americana na nossa Amazônia.

Não tenho dúvida disso, até porque compartilho inteiramente das preocupações como a nossa Amazônia e não de forma aleatória. Há várias declarações de Chefes de Estado, que, de forma irresponsável, negam, inclusive, a possibilidade de soberania do nosso País. Comentando a frase "A Amazônia é nossa!", dizem que o meio ambiente é uma bandeira universal. Há várias declarações nesse sentido, mas somente algumas poucas foram anotadas.

Cito apenas alguns exemplos:

"Em 1989, o Senador Kasten, dos Estados Unidos, afirmou: ‘Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos’.

Em 1993, o Presidente Mitterrand e a Primeira Ministra da Noruega, Groo Harlem Brundtland, em ocasiões distintas, declararam, pública e explicitamente, que a importância da Amazônia para o Planeta é tão grande - frase do documento aprovado - que o Brasil não teria o direito de soberania plena sobre ela, e que o status mais conveniente, em relação ao domínio sobre esta área, seria o da soberania relativa (ou limitada) ou ainda administração compartilhada."

São frases das grandes nações (soberania limitada, soberania relativa, administração compartilhada), de muitos países do Primeiro Mundo que querem fazer uma intervenção direta em nossa Amazônia.

Em 1994, Gorbatchev declarou: ‘O Brasil deve delegar parte de seus direitos sobre a Amazônia aos organismos mundiais competentes’.

Em 1996, defendendo a mesma tese de soberania limitada, vários diplomatas, inclusive o Secretário-Geral da ONU, em relatório oficial ao Conselho de Segurança da Organização, afirmou textualmente: ‘O tempo de absoluta e exclusiva soberania já passou. Agora, é tarefa dos líderes de cada país encontrar o equilíbrio entre as necessidades de seus governos e as exigências de um mundo cada vez mais interdependente’.

Não fica por aí, Sr. Presidente.

O Sr. Roberto Saturnino (PSB - RJ) - V. Exª permite-me um aparte, nobre Senadora Heloisa Helena?

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Pois não, nobre Senador Roberto Saturnino.

O Sr. Roberto Saturnino (PSB - RJ) - Senadora Heloisa Helena, ouvia com muito interesse o pronunciamento de V. Exª. Tudo o que V. Exª diz e relata não são suposições; são acontecimentos, são declarações. Tudo se fundamenta numa suposta irresponsabilidade brasileira para preservar a Amazônia. E agora, para fortalecer tais argumentos, vem o projeto emendado, ou desfigurado pela Comissão, que lamentavelmente aprovou o aumento da área passível de desmatamento. Srª Senadora, considero lícito para nós desconfiar da inspiração. Não estou dizendo que a inspiração seja a adoção consciente por parte desses Parlamentares que votaram esse projeto, mas há uma inspiração internacional motivada exatamente pela cobiça na Amazônia, que é a maior fonte de biodiversidade do mundo, para mostrar que o Brasil não tem responsabilidade e que, por conseguinte, tem que repartir realmente a administração dessas terras. O pronunciamento de V. Exª vem, muito oportunamente, mostrar esse fato, com essas declarações que repercutem mundialmente e que nos deixam numa posição de fragilidade. Como é que, nessa altura dos acontecimentos, nós, brasileiros, vamos admitir aumento do percentual de desmatamento da Amazônia? Nunca. Isso é uma loucura; é realmente uma posição de entrega a esses argumentos, a essas razões e a essas forças de cobiça da nossa Amazônia.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador Saturnino. É exatamente isso. A Bancada ruralista, que tanto vocifera contra as ONGs, dizendo que conspiram contra o Brasil, é que está conspirando contra a soberania nacional quando desmoraliza a gestão pública em relação ao meio ambiente, apoiando um projeto irresponsável como esse. Então, é ela que tem conspirado contra a soberania nacional não apenas nesse momento, porque a soberania nacional não é atingida apenas quando se trata da nossa Amazônia, mas também quando se dilapida o patrimônio público, que foi arrancado da gestão do povo brasileiro, com os procedimentos irresponsáveis da privatização.

O Sr. Sebastião Rocha (Bloco/PDT - AP) - Senadora Heloisa Helena, V. Exª permite-me um aparte?

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PDT - AL) - Senador Sebastião Rocha, com muita alegria, vou conceder o aparte a V. Exª, mas antes gostaria de ler um documento que diz:

"O Parlamento europeu... aprovou uma resolução com fortes críticas... à falta de ações concretas para a preservação da floresta amazônica."... "Não entendemos a demora do Governo brasileiro em aceitar o auxílio internacional",... o episódio de Roraima deixou claro -- palavras oficiais do Parlamento Europeu -- que o Brasil não consegue enfrentar esses problemas sozinho".

"Entre as quinze medidas elencadas pelo documento,... está uma solicitação ao G-8... que proponha medidas concretas, a fim de agir conjuntamente com as Nações Unidas para lutar mais eficazmente contra a exploração abusiva e ilegal da floresta amazônica". "Só o Governo brasileiro não é suficiente. Por isso, vamos propor uma ajuda interna. A Amazônia não é um problema só do Brasil. Mas um problema da humanidade...", afirmava o representante do Parlamento Europeu.

Recentemente, como para fazer eco ao ex-Primeiro-Ministro britânico, John Major, que já havia proclamado: "as nações desenvolvidas devem estender os domínios da lei ao que é comum de todo o mundo".

A Secretária de Estado dos Estados Unidos, Madeleine Albright afirmou taxativamente que "quando o meio ambiente estiver em perigo, não há fronteiras".

Concedo o aparte ao Senador Sebastião Rocha.

O Sr. Sebastião Rocha (Bloco/PDT - AP) - Senadora Heloisa Helena, quero aplaudir o discurso de V. Exª. Como homem da Amazônia, gostaria de colaborar com seu pronunciamento e, em nome do Amapá, Estado da fronteira norte do Brasil, em plena Floresta Amazônica, dizer que concordo com a abordagem feita por V. Exª. Já fiz desta tribuna, nos anos anteriores à chegada de V. Exª a esta Casa, no mínimo meia dúzia de pronunciamentos com o mesmo teor, mencionando os mesmos fatos. Entendo que V. Exª, oportunamente, traz a esta Casa o tema. Outros Senadores também o fizeram, como o Senador Tião Viana, que conseguiu realizar um seminário sobre a questão na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado. Todos os que acompanham a política no mundo sabem que os países ricos têm utilizado, como motivação para intervenção nas outras nações, da questão humanitária; e, para nós, está muito claro que, no futuro, a questão ambiental será também utilizada como motivação para esse tipo de intervenção militar nos demais países. A Amazônia é, de fato, um alvo, um foco pela cobiça que desperta nos países estrangeiros. O que queria acrescentar ao discurso de V. Exª - e digo isto porque não a ouvia desde o começo, portanto, não sei se este tema já foi abordado - é que o Governo brasileiro, no meu entendimento, também é co-responsável, já que, de certa forma, se omite no tratamento de alguns problemas graves da Amazônia, inclusive na questão da infra-estrutura. Se tenho discordâncias com os países ricos e com as ONGs, isto se evidencia quando os ouço falar sobre "um projeto de infra-estrutura para a Amazônia". Quanto à devastação, concordo plenamente com V. Exª: devemos todos ser contrários a ela, devemos preservar o meio ambiente e tentar garantir, dentro daquilo que é necessário, o equilíbrio, a harmonia entre o meio ambiente e uma vida de qualidade para o ser humano; todavia, na questão da infra-estrutura, acredito que o Governo brasileiro peca, o Governo brasileiro erra, porque deveria prover a Amazônia de recursos de infra-estrutura. Vale salientar que ali, na fronteira entre o Amapá e a Guiana Francesa, um Departamento da França, está sendo construída uma estrada no meio da floresta, e ninguém está reclamando. Então, por que quando se pensa, no Brasil, na construção de uma hidrovia ou de uma rodovia que venha a prover a Amazônia de melhores condições para seu desenvolvimento, numa iniciativa pela qual o Governo brasileiro possa dar condições a que o homem do campo busque e conquiste uma melhor qualidade de vida, as ONGs reclamam? É com isso que não concordo. A minha divergência com as ONGs e com os governos dos países desenvolvidos nessa questão ambiental está em que eles pretendem privar o Brasil, privar a Amazônia de condições ideais a garantir o seu desenvolvimento, a melhoria da qualidade de vida do povo que habita a Amazônia. Volto a dizer: quanto à questão da devastação ambiental, palmas para V. Exª, porque concordo plenamente com o seu posicionamento. Estava na reunião da Comissão, onde, inclusive, tentei colaborar com a Senadora Marina Silva objetivando reverter aquela situação, o que, infelizmente, não foi possível. Espero que o Congresso derrube o que foi aprovado, modificando a situação criada, para que possamos, então, dar uma contribuição no sentido de que o Brasil continue buscando a melhoria da qualidade de vida do seu povo, preservando, dentro do necessário, o nosso meio ambiente.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Acato o aparte de V. Exª, ainda porque não tenho dúvidas - inclusive já o registrei no início do meu pronunciamento - da participação de V. Exª e da Senadora Marina Silva na promoção de um debate extremamente importante sobre a possibilidade do desenvolvimento sustentável, do manejo responsável da floresta, das possibilidades de geração de emprego, renda e da produção de alimentos. Por tudo isso, sinto-me extremamente contemplada pelo debate realizado por V. Exª e pela Senadora Marina Silva.

Apenas não poderia deixar de trazer a esta Casa a gigantesca preocupação que tenho em relação ao necessário debate sobre a soberania nacional. Todos sabemos que os norte-americanos já estão autorizados a instalar bases militares na América Latina: assim foi no Equador e está quase assegurada a autorização pelo Governo peruano. Também sabemos que existem aproximadamente cem mariners americanos sendo mobilizados em território peruano com a criação de uma escola de operações ribeirinhas, em convênio com a Marinha de Guerra do Peru, além de várias outras autorizações em outros locais. Há também a intervenção militar na Colômbia com a desculpa do combate à guerrilha ou ao narcotráfico - outra gigantesca irresponsabilidade. Diante de tudo isso, comentava com o Senador Tião Viana que devemos, ainda junto à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, discutir que papel terá a secretaria que está para ser criada, uma instituição com vida própria.

Quanto ao Tratado da Amazônia, sou completamente favorável, bem como quanto a vários tratados que o Brasil assina e à sua forma de operacionalizar esses tratados; todavia, precisamos saber, efetivamente, como essa instituição operará, mesmo porque o Brasil já ofereceu um espaço de 330m² no prédio do Ministério das Relações Exteriores e se dispôs a arcar com 35% dos gastos para manutenção do organismo. Até aí tudo bem! Contudo, declarações foram feitas que, no mínimo, servem para ficarmos atentos: "Não podemos considerar o acordo que temos como um escudo contra o mundo, mas como uma forma de interagir com a comunidade internacional". "A secretaria a ser criada e constituída por todos os países que integram a Amazônia terá personalidade jurídica própria e internacional, com permissão para assinar acordos com instituições internacionais e com direito a voz nos fóruns, podendo tomar empréstimos internacionais em seu próprio nome". Então, sabemos o que isso pode significar.

Queremos saber se as decisões serão tomadas por consenso ou por maioria, pois sabemos a pressão monstruosa que os Estados Unidos e a Comunidade Européia exercem sobre os países pobres da América Latina e como funcionam essas instâncias de decisão internacional. Então, não podemos deixar de lado a discussão em torno da soberania nacional, que já vem sendo golpeada a todo momento em função da política econômica do Governo Federal, que não tem como requisito irrenunciável a mesma soberania nacional; tem, sim, como requisito infame e próprio a subserviência ao Fundo Monetário Internacional.

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT - SE) - V. Exª me concede um aparte?

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Concedo um aparte a V. Exª, Senador José Eduardo Dutra.

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT - SE) - Senadora Heloísa Helena, quero me somar ao pronunciamento de V. Exª e acrescentar que, além da irresponsabilidade quanto à aprovação desse projeto na forma como está na Comissão Mista, há de ser registrada a forma como se deu essa aprovação. O Governo conseguiu se superar. Até o presente momento, temos visto serem utilizados, como moeda de troca no Congresso, cargos nos Estados, liberação de verbas e coisas do gênero. A prática agora é a de instituir, também como moeda de troca, a Amazônia brasileira e o que resta da Mata Atlântica. Quanto ao fato, o que se pode dizer é que, depois da votação, o Presidente da República disse que iria vetar o projeto, tentando assim, aparentemente, transferir a responsabilidade ou a irresponsabilidade da decisão para o Congresso Nacional. O Governo poderia, se quisesse, ter evitado a votação da matéria na Comissão, mas não o fez com medo de que a Bancada ruralista, à noite, votasse contra o salário mínimo proposto pelo Governo, em uma demonstração inequívoca de que a maioria e as Lideranças do Governo deixaram que se cometesse aquela irresponsabilidade na Comissão Mista que analisava a MP. Ou seja: não quiseram despertar na Bancada ruralista, que estava se empenhando bastante na votação daquele parecer do Deputado, alguma vontade de se colocar contra o Governo na votação da proposta do salário mínimo. Até esse fato, Senadora Heloisa Helena, por si, demonstra a irresponsabilidade do Governo, independentemente do mérito do projeto - e concordo plenamente com a análise de V. Exª. Contudo, as circunstâncias em que se deu a aprovação da matéria evidenciam a irresponsabilidade do Governo brasileiro e de suas Lideranças no Congresso Nacional. Muito obrigado.

A SR.ª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Eminente Senador José Eduardo Dutra, compartilho inteiramente do pensamento de V. Ex.ª, até porque nada mais vergonhoso para o Congresso Nacional e para o povo brasileiro do que o Presidente da República dizer publicamente que tráfico de influência é algo legítimo, normal. Foi isto o que Sua Excelência fez quando estabeleceu, como moeda de troca nas votações, quer seja a nomeação para cargos no Governo, quer seja a discussão e votação do Código Florestal, ou seja lá o que for. Aliás, os resquícios da Lei de Segurança Nacional, que tanto reivindicam contra o Movimento dos Sem-Terra, deveriam ser aplicados contra Sua Excelência, o qual fez graves ameaças ao funcionamento das instituições, pondo efetivamente em risco a integridade territorial e a soberania nacional.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT - DF) - Permite-me V. Ex.ª um aparte, eminente Senadora Heloisa Helena?

A SR.ª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Com muita alegria, ilustre Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT - DF) - Nobre Senadora Heloisa Helena, se o Senado Federal fosse um sodalício em que imperasse a consciência livre e desembaraçada dos representantes do povo que aqui se assentam, V. Exª, indubitavelmente, seria uma sentinela avançada, com sua bravura, seu denodo, sua garra, sua vontade de defender o que resta ainda do nosso velho Brasil. Para mim, não é surpresa alguma o que está acontecendo. Surpresa no sentido de que, finalmente, em alguma coisa parece que o Presidente Fernando Henrique Cardoso tem coerência. Disse Sua Excelência que no Brasil - e escreveu, nos tempos de sua lucidez - ia se formando o anti-estado nacional. Indústrias e bancos estrangeiros iam se aliando com políticos nacionais e comerciantes nacionais, com fornecedores de parques e peças, com o Exército nacional. Então, ia se constituindo no Brasil o anti-estado nacional, que está avançando a passos largos, nesses tempos em que o Presidente Fernando Henrique Cardoso comanda o Brasil, preside os nossos destinos para o pior, como nós estamos vendo. V. Exª, com muita precisão, acaba de apontar mais essa brecha que querem abrir no Brasil. Quando se propõe que 50% das florestas e da Floresta Amazônica podem ser derrubadas pelas madeireiras nacionais e internacionais, o que se está fazendo é criando justamente a desculpa para a etapa seguinte, essa que V. Exª, com muita precisão, acabou de apontar e de denunciar. Autorizarmos 50%, eles derrubam 60% ou 70%. Aí, vêm os poderes internacionais, o imperialismo externo, dizendo que o Brasil não pode ficar como administrador da Amazônia e que não pode ter a soberania sobre a região, porque ele está destruindo a Amazônia. Esse é um passo seguro e certo para acabarmos de vez com a Amazônia, dando o pretexto que eles querem para realizar o que V. Exª apontou e que já foi confessadamente declarado por várias autoridades internacionais: a invasão e o domínio crescentes sobre a Amazônia. Muito obrigado.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Agradeço o aparte de V. Exª.

O Sr. Geraldo Cândido (Bloco/PT - RJ) - Senadora Heloisa Helena, V. Exª me concede um aparte?

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Pois não, Senador Geraldo Cândido.

O SR. PRESIDENTE (Ademir Andrade) - Senadora Heloisa Helena, informo que o tempo de V. Exª já ultrapassou em cinco minutos e peço aos aparteantes que sejam breves, porque há outros oradores inscritos.

O Sr. Geraldo Cândido (Bloco/PT - RJ) - Senadora Heloisa Helena, serei breve, porque o seu tempo já se esgotou, mas não poderia deixar de parabenizar V. Exª por esse importante pronunciamento, trazendo a sua indignação, que também é a de todos nós. Felizmente, acabamos de sepultar esse projeto nefasto, enterrando-o junto com o ipê.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Com o ipê-roxo, de raiva!

O Sr. Geraldo Cândido (Bloco/PT - RJ) - Só estou preocupado que a cópia do projeto sepultada junto com o ipê possa matar a árvore, tão ruim que ele é. Enfim, vamos torcer para que a árvore sobreviva, cresça e seja frondosa e represente a nossa vitória em relação a esse projeto que conseguimos derrotar. Neste País, ainda bem que há algumas pessoas que defendem a nossa soberania, mas não pára de haver aqueles que sempre estão preparando os golpes, fazendo acordos espúrios, conspirando contra o Brasil. Agora, começa também a tramitar um projeto para privatizar, a pedido do FMI, definida na Cláusula 27, constante do Acordo do FMI, a questão do saneamento.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - E das hidrelétricas.

O Sr. Geraldo Cândido (Bloco/PT - RJ) - Sim, mas o que está por trás não é só o saneamento, mas também as hidrelétricas e as nossas águas, o que é pior.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PSB - RJ) - E a venda das ações da Petrobrás.

O Sr. Geraldo Cândido (Bloco/PT - RJ) - Pois é. Por aí estão sempre aqueles que considero os vendilhões da pátria, sempre traidores, fazendo acordos na calada da noite, tentando acabar com o restou do nosso patrimônio e da nossa soberania. Quanto à questão da ameaça dos Estados Unidos de intervenção na América Latina - e já está intervindo -, foi aprovada no Congresso americano uma verba de U$1,6 bilhão justamente para isso. Dizem que o objetivo é combater o narcotráfico na Colômbia, mas na verdade querem penetrar na Amazônia para montar suas bases de apoio e combater a guerrilha da Colômbia, que os está incomodando. É isso que eles querem fazer. Na época dos governos militares, era a chamada Operação Condor, que, na calada da noite, eliminava os opositores. Assim mataram os ex-Presidentes João Goulart e Juscelino Kubitscheck, o general Carlos Prates e sua esposa, o ex-Ministro Orlando Letilliêr e a sua secretária e outros. E foram por aí afora, eliminando todos os opositores. Hoje, eles fazem de outra forma, mas são os mesmos que tramam contra a nossa soberania, contra o povo da América Latina, escravizado pelo imperialismo. Infelizmente, temos governantes que não têm vergonha na cara e mantêm-se ajoelhados, lambendo as botas dos imperialistas. Muito obrigado, companheira. Felicito V. Exª pelo pronunciamento.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL) - Agradeço o pronunciamento de V. Exª, Senador Geraldo Cândido.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sei que não deveríamos mais ter nenhum estarrecimento diante dos fatos porque, efetivamente, não são fatos novos.

Recordo-me do início da irresponsabilidade na Amazônia e também do Senador Lauro Campos, certa vez, falando sobre o Projeto Sivam. Quem não se lembra do projeto ilegal e imoral, montado para entregar a uma empresa norte-americana a gestão? Quem não se lembra, inclusive, de outra empresa americana - E.E. Systems -, contratada para compartilhar serviços de espionagem com uma outra empresa, também americana, que tinha como presidente um coronel reformado do Exército dos Estados Unidos, com informações privilegiadas e sigilosas?

Sr. Presidente, não sei até onde o Congresso Nacional fará vergonhosamente parte desse processo de golpes contra a soberania nacional. Realmente, não entendo até quando o Congresso Nacional deixará o Governo Federal fazer deste País o que quer. São tantos os fatos e tantas as ações objetivas feitas contra a soberania nacional, como se o Brasil pertencesse ao Presidente da República. Não pertence, como também não pertence a nenhum partido político isoladamente, e, sim, ao povo brasileiro, que, nesse caso, tem de ser respeitado, ao menos nos limites que a Constituição, aprovada pelo Congresso Nacional, exige.

Assim, deixo mais uma vez esse protesto, para que o Governo Federal e a Bancada ruralista não conspirem mais ainda contra a soberania nacional, como estão fazendo, a partir do momento que desmoralizam muito mais a possibilidade de o Brasil dar conta da sua gestão ambiental, possibilitando que os interesses dos Estados Unidos e do Parlamento Europeu em invadir efetivamente a Amazônia sejam consolidados.

É só, Sr. Presidente. (Palmas)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2000 - Página 10012