Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

JUSTIFICATIVAS A APRESENTAÇÃO DE PROJETO QUE REVOGA A LEI 7.170 - LEI DE SEGURANÇA NACIONAL.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • JUSTIFICATIVAS A APRESENTAÇÃO DE PROJETO QUE REVOGA A LEI 7.170 - LEI DE SEGURANÇA NACIONAL.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/2000 - Página 10185
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, REVOGAÇÃO, LEI DE SEGURANÇA NACIONAL, ELABORAÇÃO, EPOCA, REGIME MILITAR, GARANTIA, DEMOCRACIA, PAIS.
  • LEITURA, VOTO EM SEPARADO, APRESENTAÇÃO, JOÃO GILBERTO, SERGIO MURILO, DANTE DE OLIVEIRA, TIDEI DE LIMA, DEPUTADO FEDERAL, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, GASTÃO MULLER, SENADOR, OPORTUNIDADE, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI, DEFESA, REVOGAÇÃO, LEI DE SEGURANÇA NACIONAL, MOTIVO, REPRESENTAÇÃO, EXCEÇÃO, NATUREZA POLITICA, COMPROMETIMENTO, DOUTRINA, SEGURANÇA NACIONAL, PREVISÃO, INSTRUMENTO, PROTEÇÃO, SOBERANIA NACIONAL, FUNCIONAMENTO, PODERES CONSTITUCIONAIS, ESTADO DEMOCRATICO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, APROVEITAMENTO, MOTIVO, VOTO EM SEPARADO, EPOCA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, GESTÃO, SENADOR, REVOGAÇÃO, LEI DE SEGURANÇA NACIONAL, ATUALIDADE.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT – SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente quero agradecer ao Senador Iris Rezende, que mesmo tendo chegado ao plenário, manteve a permuta que havia feito comigo, razão pela qual não usarei os cinqüenta minutos. Pretendia falar de dois assuntos, sendo que em um deles faria uma análise desse processo de privatização da Companhia Vale do Rio, que culmina com a manchete da Folha de S.Paulo de hoje: "Governo apoiará a troca na Vale com dois bilhões". Mas deixarei essa análise para fazer posteriormente, porque com certeza gastarei muito tempo.  

Quero informar a Casa que apresentei, hoje, um projeto de lei que estabelece: art. 1º - É revogada a Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983.  

A Lei nº 7.170 é a famigerada Lei de Segurança Nacional. É absolutamente injustificável a vigência da atual Lei de Segurança Nacional. Com efeito, essa legislação penal extravagante foi elaborada em pleno regime autoritário militar.  

Dentre seus dispositivos lê-se, a título de ilustração, a fixação da pena de reclusão para quem, com emprego de violência ou grave ameaça, tentasse mudar o regime vigente, isto é, quem, exercendo legítimo direito de resistência à ditadura, como nos ensina o ilustre jurista Arthur Machado Paupério, propugnasse a derrubada da Ditadura, por meios que a própria Ditadura considerasse grave ameaça, poderia ser condenado à pena privativa de liberdade de até 15 anos.  

É lamentável que a lei venha sendo considerada recepcionada pela ordem jurídica estabelecida após a promulgação do Constituição de 1988. Urge novo tratamento da defesa do Estado Democrático de Direito, o que deve ser feito no bojo da ampla reforma do Código Penal, ora em fase de estudo no Ministério da Justiça.  

Vale recordar que por ocasião da deliberação a cerca da Lei de Segurança Nacional ora vigor, Projeto de Lei nº 17, de 1983, o então Senador Fernando Henrique Cardoso assinou voto em separado defendendo a revogação da Lei de Segurança Nacional e a previsão de instrumentos legais protetores da soberania nacional, do funcionamento dos Poderes, das instituições democráticas do País.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, faço questão de ler o voto em separado apresentado pelo Deputado João Gilberto, Deputado Sérgio Murilo, Deputado Dante de Oliveira, Senador Fernando Henrique Cardoso, Senador Gastão Müller e Deputado Tidei de Lima, apresentado por ocasião da discussão do Projeto de Lei nº 17, de 1983.  

Solicito que este voto em separado e meu pronunciamento sejam anexados ao processo do referido projeto como parte da justificativa do mesmo.  

Voto em separado assinado pelos Parlamentares anteriormente citados:  

Sob apreciação do Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 17, de 1983, que define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social e estabelece seu processo e julgamento.  

Cabe-nos manifestar que os Partidos de Oposição - PMDB, PT PDT - têm posição definida sobre o assunto: a de que os crimes contra a segurança de Estado e contra as Instituições Democráticas devam ser previstos na legislação ordinária - Código Penal e o Código Penal Militar, este somente para os fatos que envolvam instalações ou interesses militares no País.  

A existência de uma Lei de Segurança Nacional apresenta-se como uma exceção embasada em motivações políticas e seriamente comprometida pela inspiração da Doutrina de Segurança Nacional, ideologia alienígena, internacionalizadora de interesses nacionais e, infelizmente, assumida por segmentos de opinião e do estamento nacional que nos últimos anos estiveram no Poder.  

Somos, pois, pela revogação da Lei de Segurança Nacional e a previsão de instrumentos legais protetores da Soberania Nacional, do funcionamento do Poderes, das instituições democráticas no corpo das leis penais codificadas do País.  

 

A visão é exatamente igual a que tenho e que apresento no meu projeto de revogação da Lei nº 7.170.  

 

Outra grave excepcionalidade da lei e do atual ordenamento jurídico brasileiro, inclusive constitucional, é submeter o cidadão, o civil, a julgamento na Justiça Militar por delitos ou fatos que nada têm a ver com as instalações, interesses e serviços militares.  

Esta previsão constitucional e legal, ainda mantida, tem sido instrumento para agravar o aspecto político, ideológico e excepcional da Lei de Segurança Nacional.  

Vemos, igualmente, no texto, a manutenção de muitos dispositivos contra os quais levanta-se a opinião jurídica do País e sobre os quais manifestamos divergência.  

Queremos, todavia, registrar que o projeto enviado pelo Governo e as emendas acolhidas pelo ilustre Relator representam um passo em relação ao que temos hoje no País como Lei de Segurança Nacional. Passo de alguma significação, assim recebido na consciência jurídica e política da Nação.  

Os Partidos de Oposição apresentaram substitutivos e emendas, na busca de aperfeiçoar o texto. Tiveram pouca acolhida em relação ao que apresentaram, apesar dos esforços do ilustre Relator em discutir com seu Partido e com o Governo as propostas oposicionistas.  

Há um imperativo, já acentuado pelas lideranças oposicionistas, de acelerar a tramitação do projeto de lei em estudo, para que o longo recesso parlamentar, de dezembro a março, não adie a decisão sobre reduções de pena a benefício a processados ou condenados.  

É com esse discernimento que votamos, com restrições na forma deste voto em separado, o parecer do relator, ressalvados os destaques apresentados para apreciação de emendas.  

 

O Voto em Separado, apresentado pelos Parlamentares que já citei, era a favor do Projeto de Lei nº 1.783, com as ressalvas e com as emendas, por considerar que, na ocasião - ou seja, em 1983 - o referido Projeto de Lei significava um avanço em relação à legislação existente, legislação essa feita num dos períodos mais duros da ditadura militar.  

Ora, na ocasião, o Senador Fernando Henrique Cardoso, o então Deputado Dante de Oliveira, João Gilberto, Sérgio Murilo, Senador Gastão Müller e Deputado Tidei de Lima apresentaram um voto em separado justificando o seu voto favorável ao Projeto de Lei nº 17, que instituiu a Lei de Segurança Nacional, por considerá-lo uma avanço. Mas já diziam, no seu voto em separado, que eram "pela revogação da Lei de Segurança Nacional e a previsão de instrumentos legais protetores da soberania nacional, do funcionamento dos Poderes, das instituições democráticas, no corpo das leis penais modificadas no País". Se isso era avanço em 1983, é inadmissível que permaneça em vigor a Lei nº 7.170, de 1983.  

É necessário tornar realidade o voto em separado do então Senador Fernando Henrique Cardoso, ou seja, a revogação da Lei de Segurança Nacional e a instituição, no corpo das leis penais codificadas do País, dos instrumentos necessários à defesa da nação brasileira e da sua soberania.  

Não adianta o Ministro da Justiça dizer que foi um absurdo enquadrar os líderes do Movimento dos Sem-Terra na Lei de Segurança Nacional, pois a lei ainda existe. Não adianta continuarem as boas intenções do pronunciamentos das autoridades deste País, repreendendo aqueles que utilizaram uma lei vigente para enquadrar manifestações públicas! Existe, no Ministério da Justiça, um amplo projeto de reformulação do Código Penal Brasileiro, em que deveriam estar - como disse, em 1983, o então Senador Fernando Henrique Cardoso - esses dispositivos para defender a segurança nacional em vez de procurar transplantar por osmose a segurança de algumas autoridades, segurança do Presidente da República ou segurança de quem quer que seja como Segurança Nacional.  

É inadmissível que permaneça, mesmo com esse discurso, a atual Lei de Segurança Nacional. Poder-se-á dizer que tem de haver algum dispositivo que preserve a segurança. Concordo plenamente, concordo nos termos em que se manifestou, no voto em separado, o então Senador Fernando Henrique Cardoso. Nunca é demais repetir suas palavras: "...a previsão de instrumentos legais protetores da Soberania Nacional, do funcionamento dos Poderes, das instituições democráticas no corpo das leis penais codificadas do País".  

É com esse entendimento que apresentamos o projeto de revogação pura e simples da lei nº 7.170. Esperamos que, a partir do momento em que o Senado se dispuser a discutir o projeto, isso sirva como instrumento para forçar o Ministério da Justiça a agilizar o processo de reformulação do Código Penal, que está lá há algum tempo e que reúne vários juristas, mas cuja tramitação está atrasada. Enquanto isso, continua vigendo a draconiana Lei de Segurança Nacional, a qual pode continuar sendo utilizada para enquadrar Lideranças populares que se manifestam.  

Este, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é o nosso projeto, o qual – reiteramos – enquadra-se dentro exatamente do voto em separado apresentando em 1983 por vários Parlamentares, entre os quais o então Senador Fernando Henrique Cardoso.  

Outro dia, quando citei aqui um trecho do discurso do Senador Fernando Henrique Cardoso relativo ao salário mínimo, o Senador Pedro Simon protestou - lógico que com a ironia que lhe é peculiar – que o Presidente Fernando Henrique Cardoso já havia apelado para todo mundo que esquecessem o que Sua Excelência disse ou escreveu. Mas os Anais do Senado estão aí para preservar para a posteridade as boas idéias, as boas opiniões, as boas causas. O voto em separado apresentado pelo Deputado João Gilberto, Deputado Sérgio Murilo, Deputado Dante de Oliveira, Senador Fernando Henrique Cardoso, Senador Gastão Müller e Deputado Tidei de Lima é um exemplo de boas idéias e boas causas.  

Por isso fiz – e faço - questão que Sua Excelência acompanhe a justificativa do meu projeto revogando a famigerada Lei de Segurança Nacional. A partir do momento em que esses instrumentos de defesa da segurança nacional estejam incluídos nas leis penais codificadas no País - e não em uma lei de exceção como continua sendo a lei de 1983 - aí sim, nós poderemos dizer que o Brasil está caminhando para a democracia.

 

Espero, Sr. Presidente e Srs. Senadores, que esse projeto possibilite ao menos um debate a respeito do tema e a agilização do estudo que está no Ministério da Justiça para que a Lei seja revogada.  

Assino em baixo. Concordo plenamente com as palavras do então Senador Fernando Cardoso, apresentadas em voto em separado em 1983.  

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.  

 

 ª


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/2000 - Página 10185