Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

NECESSIDADE DA REFORMULAÇÃO DA LEI PENAL.

Autor
Iris Rezende (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Iris Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • NECESSIDADE DA REFORMULAÇÃO DA LEI PENAL.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/2000 - Página 10191
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • COMENTARIO, EMPENHO, ORADOR, PERIODO, GESTÃO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE GOIAS (GO), INICIATIVA, CONSTRUÇÃO, HABITAÇÃO POPULAR, DESENVOLVIMENTO, SERVIÇO, SANEAMENTO BASICO, FORNECIMENTO, ENERGIA ELETRICA.
  • COMENTARIO, EMPENHO, ORADOR, PERIODO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), COMBATE, VIOLENCIA, TRAFICO, DROGA, PROTEÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, VALORIZAÇÃO, DIREITOS HUMANOS, INICIO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO PENAL.
  • APOIO, JOSE GREGORI, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), RETOMADA, TRABALHO, COMISSÃO ESPECIAL, REFORMULAÇÃO, CODIGO PENAL, CODIGO DE PROCESSO PENAL, LEI DE EXECUÇÃO PENAL, OBJETIVO, MODERNIZAÇÃO, COMBATE, CRIME.

O SR. IRIS REZENDE (PMDB –GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente, registro o meu agradecimento à Senadora Heloisa Helena, que, na condição Líder nesta Casa, teria o direito de fazer uso da palavra por vinte minutos no momento que lhe aprouvesse. Contudo, S. Exª, sabendo do meu interesse em usar a tribuna, me deu esta oportunidade.  

Sr. Presidente, durante toda a minha vida pública, sempre procurei estar sintonizado com as mais caras aspirações populares, notadamente no exercício de cargos do Poder Executivo no âmbito do meu Estado e, mais tarde, no pleno nacional.  

Como Prefeito de Goiânia, dei particular ênfase ao urbanismo, com a elaboração de um novo plano diretor para cidade. Dediquei-me especialmente à construção de moradias para as camadas de baixa renda, erguendo inúmeros complexos habitacionais que devolveram a dignidade a milhares de famílias. Diversos outros empreendimentos se tornaram realidade através da força viva dos mutirões, um instrumento eficaz na consolidação de obras e serviços que modificaram a paisagem social da época. Se mais não fiz, foi porque meu mandato acabou sendo interrompido, cassado que fui pela junta militar que tantas arbitrariedades praticou neste País.  

A conquista da democracia pelas memoráveis manifestações populares que sacudiram o Brasil possibilitou minha ascensão ao Governo de Goiás, com uma histórica vitória nas urnas. Imediatamente, nosso povo chamava a atenção de todo o País, construindo, num só dia, mil casas populares, despertando o interesse da mídia nacional e projetando o Estado como sinônimo de ousadia, criatividade e grandes realizações.  

Na segunda metade do meu mandato no Governo goiano, fui convocado pelo Presidente da República José Sarney para a chefia do Ministério da Agricultura. Ali foram empreendidas importantes conquistas. O País alcançou surpreendentes avanços no setor primário, colhendo três supersafras, elevando a produção de grãos de pouco mais de 50 milhões de toneladas para 72 milhões de toneladas, um feito histórico.  

No meu segundo mandato de Governador, prossegui o trabalho de construção de casas populares e, simultaneamente, cuidei de ampliar a infra-estrutura com o firme propósito de criar os mecanismos apropriados para atrair investimentos industriais. Asfaltamos milhares de quilômetros de estradas, dotamos o Estado de usinas hidrelétricas, incluindo a quarta etapa de Cachoeira Dourada, que nos potencializou no estratégico setor de energia. Dotamos todas as cidades goianas, exceto uma, de água tratada; muitas, de esgoto sanitário, ginásios de esportes em quase duas centenas de sedes de municípios.  

Senador da República, fui chamado pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso para ocupar a Pasta da Justiça, o mais antigo e o mais complexo dos ministérios. Uma vasta estrutura que possui inúmeras responsabilidades no plano social, sempre exigindo de seus dirigentes atenção redobrada para problemas crônicos do País, como a criminalidade e a violência; a proteção dos consumidores e das minorias, incluindo as nossas nações indígenas; a luta da mulher; o combate ao narcotráfico; a defesa intransigente de nossas crianças e adolescentes; a batalha incessante em prol dos direitos humanos.  

No Ministério da Justiça, dei especial atenção a problemas os mais graves que afligem a sociedade brasileira. Assim é que enfrentei, com firmeza, as rebeliões de policiais que, partindo de Minas Gerais, se alastraram por todo o território nacional. Por meio da Presidência da República, enviamos ao Congresso proposta de emenda constitucional permitindo aos governos estaduais a reestruturação e até mesmo a unificação das Polícias Civil e Militar, uma vez que ambas têm uma finalidade precípua: levar a ordem, a paz e o congraçamento ao conjunto da sociedade.  

Também cuidei de agilizar no Congresso Nacional a tramitação do projeto que se transformaria na Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, tornando realidade o novo Código de Trânsito Brasileiro. Este imprescindível instrumento em defesa da vida logo no primeiro ano de vigência reduziu em cerca de um terço o número de acidentes em todo o País.  

Nos contatos mantidos na Europa e nos Estados Unidos, estabelecemos acordos, visando principalmente ao combate sistemático dos tráficos de armas e de entorpecentes, resultando em ações conjuntas que reforçaram os propósitos de cooperação entre o Brasil e as nações amigas. Antes de minha saída do Ministério da Justiça deixei assinado o contrato entre o Governo brasileiro e os Governos francês e alemão trazendo recursos e dotando o Brasil de recursos suficientes para os dois Projetos o Pró-Amazônia e Promotec que têm como objetivo dotar a Polícia Federal de instrumentos suficientes para, na Amazônia e em todo o País, desenvolver um trabalho à altura das aspirações populares.  

Mas, Sr. Presidente, Sr as e Sr s Senadores, no Ministério da Justiça dediquei-me especialmente a dar uma contribuição significativa ao País, criando instrumentos eficientes para modernizar a nossa legislação penal que até hoje continua totalmente defasada, remanescente que é do Estado Novo.  

Sob a coordenação do ilustre jurista goiano, Dr. Licínio Leal Barbosa, então Presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, providenciei a formação de comissões especiais com atribuições específicas. Uma comissão para elaborar o anteprojeto de Código Penal, Parte Especial, sob a presidência do Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, do Superior Tribunal de Justiça. Outra comissão sob a presidência do Ministro Marco Aurélio de Mello, do Supremo Tribunal Federal, para elaborar anteprojeto do Código de Processo Penal. E uma terceira comissão sob a presidência do Dr. João Benedicto de Azevedo Marques, então Secretario da Administração Penitenciária de São Paulo para reformular a Lei de Execução Penal.  

Cada uma dessas comissões especiais foram constituídas de autoridades as mais expressivas do Direito Penal, do Direito Processual Penal, do Direito de Execução Penal e das ciências afins. Ficou estabelecido o prazo de 90 dias para apresentarem ao gabinete do Ministro os respectivos anteprojetos.  

Com o esforço que realizamos no Ministério da Justiça, a Comissão que se encarregou especificamente do Código Penal cumpriu a tarefa que lhe foi cometida. E, apesar de três de seus mais ilustres membros haverem, no início de 1998, resignado da designação, o trabalho foi primorosamente realizado. De tal sorte que a 24 de março de 1998, em sessão solene, o Ministro da Justiça entregava à consciência jurídico-penal do País um texto moderno, com profundas inovações largamente difundidas por meio dos meios de comunicação de massa. Já no dia 25 de março, o Diário Oficial da União estampava o anteprojeto na sua íntegra. Na mesma data, uma portaria ministerial designava nova Comissão Especial para, no prazo de 180 dias, receber as contribuições dos vários segmentos sociais, expressando o sentido altamente democrático que conduziu todos os trabalhos realizados.  

Meu ilustre sucessor, Senador Renan Calheiros, deu prosseguimento ao trabalho da Comissão de Juristas, e, para que a sociedade pudesse participar ainda com maior amplitude, prorrogou por mais dois meses o prazo para sugestões. Exaurida esta fase, a Comissão Especial retomou suas ações com intensidade, realizando reuniões em Brasília, São Paulo, Curitiba e Goiânia.  

Foi tamanho o arrojo dessa Comissão Especial que, no dia 08 de abril de 1999, o Ministro Renan Calheiros recebia um novo texto de anteprojeto de Código Penal – Parte Especial, disponibilizado no site do Ministério da Justiça. De imediato, o trabalho foi encaminhado à Presidente da República para seu envio ao Congresso Nacional.  

Esse novo texto trazia inovações compatíveis com a nova realidade nacional e mundial. Por exemplo: os crimes contra os costumes passariam a chamar-se "Crimes contra a Dignidade Sexual"; aos crimes contra a propriedade imaterial incorporavam as figuras típicas criadas pela nova Lei de Patentes. Criavam-se os títulos "Dos Crimes contra o Ordenamento Urbano", "Dos Crimes contra a Comunidade Indígena" e "Dos Crimes contra o Estado Democrático e as Relações Internacionais".  

Pelo seu avanço técnico e científico, era de se esperar que este magno trabalho fosse, de pronto, encaminhado ao Congresso Nacional. Todavia, com a ascensão à titularidade do Ministério da Justiça do ilustre advogado criminalista José Carlos Dias, tal esforço foi, injustificadamente, posto de lado. Em seu lugar, cuidou-se de formular o que se convencionou chamar de um "diagnóstico nacional" que, decorrido mais de ano, não se tem conhecimento de sua existência. Ou seja, de concreto, nada se fez.  

E, lamentavelmente, Sr. Presidente, o primoroso labor de uma equipe de juspenalistas de várias partes do País foi relegado ao nimbo da gaveta. O que se verificou, na verdade, foi um claro desrespeito a tantas mentes privilegiadas que, trabalhando gratuitamente por cerca de dois anos, ofereceram à cultura jurídico-penal de nosso tempo a melhor contribuição possível.  

Felizmente, Sr. Presidente, Srª s e Srs. Senadores, acaba de ascender ao comando da Pasta da Justiça um homem que conheço de perto, pois trabalhou a meu lado durante todo o período em que estive à frente do Ministério: o Ministro José Gregori. Como Secretário de Estado dos Direitos Humanos, ele teve a sua destacada atuação reconhecida pela comunidade internacional, especialmente pelas Nações Unidas, oferecendo significativa contribuição na defesa dos excluídos e colaborando positivamente para moldar uma nova imagem do Brasil no exterior.  

Tenho, pois, sólidas razões para acreditar que, agora, com a égide sábia do Ministro José Gregori, o Ministério da Justiça dará seqüência aos trabalhos realizados pelas comissões, uma vez que os elevados índices de criminalidade registrados no País devem-se, em grande parte, à persistência desses códigos penais obsoletos.  

O Ministro José Gregori já atua firmemente na solução dos diversos problemas do País, como bem demonstra o seu posicionamento seguro no trato de movimentos sociais relevantes, como a greve dos caminhoneiros e as atividades dos sem-terra. Agora, é tempo de o Ministro da Justiça fixar sua preciosa atenção na pendência de sua Pasta que aqui relatamos, retomando o ingente trabalho de dotar nossa legislação penal de textos modernos, como a reformulação da Parte Especial do Código Penal, uma vez que a Parte Geral já foi modificada pela Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984.

 

Esse apelo fazemos também ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, que saberá reconhecer a importância das reformulações numa lei primordial para a sociedade brasileira, que necessita com urgência desse reordenamento a fim de adaptar-se às novas características culturais de um país em constante mutação.  

No Senado da República bem como na Câmara dos Deputados, temos a mais absoluta certeza de que o texto do novo Código Penal fluirá rapidamente, como ocorreu no caso dos projetos que resultaram na nova Lei de Execução Penal, aprovados em menos de um semestre.  

Temos a convicção também de que ao nosso apelo junta-se toda a comunidade brasileira, angustiada com os abusos e com a ousadia dos que praticam a violência num cenário cada vez mais propício à impunidade.  

O novo Código Penal combaterá esses males com firmeza e com senso de responsabilidade, dotando o País de mecanismos eficientes para coibir a crescente onda de criminalidade que assusta a todos, criando condições favoráveis para sedimentar um ambiente de paz duradoura e de plena justiça.  

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/2000 - Página 10191