Discurso durante a 64ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ILEGALIDADE DO CONTRATO DE ANTECIPAÇÃO DE ROYALTIES ENTRE A ITAIPU BINACIONAL E O GOVERNO DO ESTADO DO PARANA.

Autor
Osmar Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO FISCAL.:
  • ILEGALIDADE DO CONTRATO DE ANTECIPAÇÃO DE ROYALTIES ENTRE A ITAIPU BINACIONAL E O GOVERNO DO ESTADO DO PARANA.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DSF de 24/05/2000 - Página 10671
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO FISCAL.
Indexação
  • DENUNCIA, ILEGALIDADE, ASSINATURA, CONTRATO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO PARANA (PR), UNIÃO FEDERAL, ANTECIPAÇÃO, CREDITOS, REFERENCIA, ROYALTIES, ITAIPU BINACIONAL (ITAIPU), POSTERIORIDADE, PUBLICAÇÃO, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE TRIBUTARIA, REVOGAÇÃO, LEI COMPLEMENTAR, OBJETO, UTILIZAÇÃO, FUNDAMENTAÇÃO, EMPRESTIMO.
  • DENUNCIA, AUSENCIA, PUBLICAÇÃO, CONTRATO, Diário Oficial da União (DOU).
  • ESCLARECIMENTOS, JORNALISTA, CUMPRIMENTO, ORADOR, DEVER FUNCIONAL, PRESERVAÇÃO, FINANÇAS, ESTADO DO PARANA (PR), IMPEDIMENTO, COMPROMETIMENTO, FUTURO, GESTÃO, ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB – PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senador Paulo Souto é um Senador que respeito muito, pelo que fez no Governo da Bahia e pelo que vem fazendo no Senado. Mas quero discordar da posição que S. Exª assumiu aqui. Não entrarei no mérito da discussão. Quero discordar da afirmação do Senador Paulo Souto de que a Lei de Responsabilidade Fiscal será desmoralizada. Não será, Senador Paulo Souto. Ela já foi!  

Serei muito rápido, Sr. Presidente, pois a hora é avançada e o assunto é pesado demais, mas é de extrema gravidade.  

Vejam a que ponto chegou o Ministério da Fazenda, na pressa, no açodamento de assinar o contrato de antecipação de royalties de Itaipu com o Governo do Paraná. Tenho, desde fevereiro, levantado esta questão aqui, não porque, como dizem alguns do Paraná, esteja querendo prejudicar o meu Estado. Pelo contrário, estou querendo proteger o Estado do Paraná do desastre para o qual ele está sendo carregado, pela irresponsabilidade daqueles que gerenciam de forma temerária as finanças públicas do meu Estado.  

No entanto, tenho batido em ferro frio, Sr. Presidente, porque, por mais que eu insista, o assunto não tem recebido na Comissão de Assuntos Econômicos o tratamento que merece. A Comissão de Assuntos Econômicos tem a responsabilidade de interpretar suas resoluções. A Comissão de Assuntos Econômicos, ao solicitar um parecer do Banco Central, transfere para ele a interpretação de uma resolução que ela própria criou.  

Refiro-me à Resolução nº 78, onde está escrito que todas as antecipações de receita e todas as operações de crédito devem ser autorizadas ou não pelo Senado Federal, mas devem ser apreciadas por esta Casa.  

A Lei de Responsabilidade Fiscal, no seu art. 37, trata diretamente desse assunto, Senador Paulo Hartung, quando diz: "Aos Estados e Municípios é vedado antecipar receitas de qualquer natureza".  

Não há o que discutir!  

Senadora Heloísa Helena, preste atenção no que vou dizer aqui, para ver, Senador Paulo, como V. Exª foi benevolente. A Lei de Responsabilidade Fiscal foi torpedeada pelo contrato assinado entre o Governo do Paraná e o Governo da União.  

A letra "L" do contrato – não vou lê-lo na íntegra – diz: "...que medidas dessa natureza são do interesse nacional, fundamentais para o ajuste fiscal do Estado, para o fortalecimento da Federação e para a manutenção da política de estabilização" – agora, prestem atenção V. Exªs – "com o atendimento da Lei Complementar nº 96, de 1999."  

Ora - e vejo à Mesa um advogado -, a Lei de Responsabilidade Fiscal foi publicada no dia 4 de maio de 2000. O contrato, que tenho em mão, assinado pelo Governo do Paraná e a União, para a antecipação dos créditos referentes aos royalties de Itapu, foi assinado no dia 10 de maio, portanto, seis dias depois da publicação da Lei de Responsabilidade Fiscal.  

E sabem qual é o último artigo da Lei de Responsabilidade Fiscal?  

Art. 75: "Revoga-se a Lei Complementar nº 96, de maio de 1999".  

Ora, o contrato foi assinado com base numa lei que foi revogada: a Lei Complementar nº 96, que não existia mais no dia em que o Ministro Pedro Malan e o Governador do Paraná assinaram o contrato de royalties.  

Então, o que é isso? Alguém pode explicar-me, porque não consigo entender!  

Obviamente, passaram por cima da Resolução nº 78! O que se faz aqui é uma operação de crédito, sim! É um financiamento, sim!  

Itaipu é uma binacional, eminente Senador Eduardo Suplicy, e os créditos não pertencem ao Paraná, mas à União. E a União está antecipando os direitos que tem sobre os créditos da Itaipu, fazendo um financiamento ao Paraná, concedendo-lhe, portanto, um empréstimo de três bilhões – e não estou falando aqui de ninharia, não.  

Hoje, disseram que há assuntos mais importantes para tratar do que este.  

Realmente, há tema mais relevante, como a questão da Petrobras. Mas não é por isso que vamos jogar este assunto debaixo do tapete e esquecer que Estados estão antecipando receitas, descumprindo a legislação.  

Aqui, Sr. Presidente, existe algo muito sério. Vou repetir: o contrato foi assinado citando uma lei revogada pela Lei de Responsabilidade Fiscal. O contrato é do dia 10 de maio; a Lei de Responsabilidade Fiscal é do dia 4 de maio. Seis dias depois, esqueceram que haviam revogado uma lei e assinaram um contrato com base naquela lei.  

Não sou advogado, Sr. Presidente. Mas, para mim, esse contrato não vale. A lei que fundamenta o contrato não existe mais! Logo, o contrato também não existe. Além disso, o contrato não foi publicado. Para que os efeitos de um contrato entre dois entes públicos possam concretizar-se, é preciso que esse contrato seja publicado. Ele não foi publicado no Diário Oficial da União . Tenho acompanhado tudo isso todos os dias, e não vi no Diário Oficial da União o contrato publicado. E pior do que isso, Sr. Presidente: a notícia divulgada pela imprensa do Paraná é que as primeiras parcelas já foram liberadas. Quanta transgressão em um caso só!  

E aí quero deixar claro que não sou contra a antecipação de royalties para o Paraná, como estão dizendo lá, da forma que propus. O Governador tem o direito de propor a antecipação do royalties para o período do seu mandato de governo e para captalizar o Fundo de Previdência porque esse é o objetivo. Agora, dispor do dinheiro de 23 anos, R$3 bilhões, e gastar como o fez até agora, como paranaense, não concordo. E quem é paranaense e preocupa-se com o Estado também não concorda com isso. Até os donos dos jornais, que em seus editoriais elogiam a antecipação de royalties para o Paraná, deveriam estar preocupados com o futuro do Estado.  

Antes de conceder o aparte ao Senador Casildo Maldaner, gostaria de dizer que reclamei da tribuna há alguns dias, dizendo que há muitos anos a Rede Globo não me entrevistava e não permitia levar uma entrevista minha ao ar. Sou Senador do Estado, e precisava dar outra versão. A Rede Globo chamou-me para ser entrevistado, depois que eu disse isso aqui. Fui entrevistado. O repórter da Rede Globo , então, perguntou-me: "Mas, então, você está contra a oposição do Estado porque essa antecipação vai beneficiar o próximo Governo, que pode ser, inclusive, um Governo do próprio PSDB. Esse Partido tem vários candidatos que podem ser eleitos governador." Não estou contra o candidato, não estou contra a antecipação dos royalties; estou contra aqueles que entendem que beneficiar o Estado por sete anos e esquecer que o Estado vai continuar existindo com os seus problemas e sem a receita estão fazendo uma boa ação para o Estado. Não! Estão comprometendo as futuras gestões administrativas do Estado, porque quem não consegue sobreviver com as receitas presentes está confessando que quebrou o Estado e, ao querer antecipar tanto dinheiro por tanto tempo, está comprometendo o futuro do Estado por longos anos. E quem vai pagar é o próprio povo do Paraná.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) – V. Exª me concede um aparte?  

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PR) – Concedo um aparte ao Senador Casildo Maldaner.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) – Senador Osmar Dias, a reflexão feita por V. Exª nesta tarde tem total procedência. Com a aprovação e a sanção da Lei da Responsabilidade Fiscal, o Brasil tem vibrado. Onde se vai, ouve-se dizer que agora vamos entrar nos eixos, que não se vai gastar mais do que se arrecada ou que, como diz um adágio popular, ninguém dará o passo maior que a perna. Por sinal, em 1995, criou-se no Senado uma comissão especial para analisar as obras inacabadas. Tive a honra de ser o Relator. Encontramos pelo Brasil afora mais de 1200 obras inacabadas do Governo Federal. Por quê? Porque alguns Governos começavam as obras, lançavam a pedra fundamental e não se interessavam por quem as continuaria, ficando as obras jogadas por aí. Com a Lei da Responsabilidade Fiscal, está-se dizendo que o Brasil vai entrar nos eixos, que agora todo mundo tem de obedecer. Mas ouvi há pouco o Senador Paulo Souto dizer que aos Estados está se impondo uma emenda desta Casa que diz que tem de se gastar X nisso e Y naquilo. Como é que um Estado, para se enquadrar na Lei de Responsabilidade Fiscal, vai poder seguir as normas, se o próprio Congresso está querendo votar alterações impondo novas regras? Fica difícil. Tem razão o Senador Paulo Souto, quando levanta essa questão. V. Exª também toda razão quando diz que há uma lei de responsabilidade fiscal já em vigor no Brasil e vem um dos Estados conseguir antecipação, como é caso do Paraná, comprometendo futuras administrações. Quer dizer, vem ultrapassando os limites do que prevê a própria legislação que foi sancionada recentemente. Não é possível isso. Vai virar uma anarquia, essa é a verdade. Se quiser antecipar dentro do próprio Governo, como diz V. Exª, tudo bem. Agora, não poderá, de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, comprometer futuro do Governo, seja o dele ou de outro. Penso que deve valer para todos, senão vai se transformar, como se diz comumente, numa baderna. Não é possível isso. Se for o precedente, se a lei foi sancionada, como diz V. Exª, no dia 4 de maio, e este contar com a antecipação de recursos - seja de banco, de empresa ou de multinacional, mas é antecipação que o Paraná vai deixar de usar mais tarde -, essa antecipação será baseada numa lei que já foi revogada. Isso não é correto, mesmo que fosse feito, não é possível existir isso. Penso que, no mínimo, temos que levar à reflexão e alguma coisa terá de ser feita ou a fazer, porque tem que se prestar informações sobre isso; caso contrário, vira uma baderna, repito, no Brasil inteiro e cai por terra uma negociação que tanto se debateu no Brasil inteiro.  

O SR. OSMAR DIAS (PSDB – PR) – Obrigado, Senador Casildo Maldaner.  

Quero deixar bem claro, ao concluir este curto pronunciamento, porque o assunto é grave e eu não poderia deixar de manifestar-me, que estou levantando as eventuais irregularidades sobre esse processo de antecipação de receitas desde dezembro. Tenho enfrentado muitas dificuldades dentro da Comissão de Assuntos Econômicos para tratar essa questão. Hoje, inclusive, tive um desentendimento com o Presidente daquela Comissão, que protelou a votação de uma matéria que poderia regulamentar as antecipações de receitas e, dessa forma, não pudemos votá-la.

 

Quero lembrar que a CPI dos Precatórios foi criada exatamente porque foram autorizados pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal no passado, processos que originaram a emissão daqueles títulos precatórios, que depois ensejaram a constituição de uma CPI.  

Essa questão dos royalties está muito mal explicada. Quero deixar claro, para finalizar, principalmente para alguns colunistas "amestrados", que escrevem o que não sabem porque escrevem apenas o que recebem do Palácio Iguaçu já escrito e daí publicam sem saber interpretar o que estão escrevendo, a esses colunistas "amestrados" quero dizer que cumpro meu dever de preservar as finanças do Estado no presente e no futuro. Caso esse contrato tenha conseqüência e essas antecipações continuem sendo feitas, quero ver a legitimidade e a legalidade desse contrato. Não moverei uma palha para impedir que o dinheiro vá para o Paraná, mas quero ver se está indo de forma legal, legítima e se a finalidade que consta no contrato, ou seja, capitalizar o Fundo de Previdência e Assistência Social, estará sendo obedecida. Caso contrário, não hesitarei em assinar como primeiro signatário, esperando ser acompanhado por pelo menos 26 outros Srs. Senadores, um requerimento pedindo uma CPI para investigar as antecipações que estão ocorrendo. Creio que já estão quase do tamanho dos precatórios, e os rombos que ficarão para os próximos Governos evidentemente serão muito grandes para serem encobertos da forma como estão querendo encobrir.  

Fiz uma denúncia: o contrato assinado baseia-se em uma lei que não existe mais. Não sou advogado, mas entendo que o contrato não mais existe.  

Muito obrigado.  

 

ro! \ iÀ Xà s da privatização fossem aplicados exclusivamente no abatimento da dívida - o que alguns vêem como uma medida salutar, mas muitos não pensam assim -, um dos Estados foi até o Supremo Tribunal Federal e derrubou esse projeto de resolução. Imagino que o Ministro que prolatou a sentença ainda em decisão liminar acreditou que se tratava de uma interferência na autonomia dos Estados, de se estar retirando a capacidade de gestão dos Estados. Isso me parece extremamente eloqüente. O problema não é saber se é emenda constitucional, se é simplesmente um projeto de resolução, se é uma lei ou uma lei complementar; a questão é saber se essa disposição interfere na autonomia dos Estados Federados. Fico perguntando, diante disso: para que Governadores? Para que Assembléias Legislativas, para que Prefeitos, para que Vereadores? Vamos substituir todos eles por um bom contador, que receberá aqui as nossas ordens - 10% para um setor, 20% para outro, 30% para outro qualquer. Fica tudo resolvido e não precisamos mais ter o trabalho de eleger Governadores, Assembléias Legislativas, Prefeitos e Vereadores, porque nós, que somos mais iluminados e que entendemos mais de tudo, vamos dizer exatamente o que pode e o que deve ser feito. Qual é a justificativa da emenda? É muito simples. Alguns Estados não estão aplicando recursos suficientes na área de saúde. Ora, isso não é bom. Não há nada mais relevante, esse é um dos setores mais importantes e, portanto, os Estados e Municípios deveriam estar aplicando recursos na saúde de forma suficiente para realizar um bom atendimento.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/05/2000 - Página 10671