Discurso durante a 66ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

APELO AO PRESIDENTE ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, PARA QUE COLOQUE EM VOTAÇÃO NA PROXIMA SESSÃO DO CONGRESSO NACIONAL, O REQUERIMENTO DE SUA AUTORIA QUE CRIA UMA COMISSÃO MISTA DESTINADA A INVESTIGAR AS CIRCUNSTANCIAS DA MORTE DO EX-PRESIDENTE JOÃO GOULART. CONSIDERAÇÕES SOBRE SESSÃO DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO AMAPA EM QUE FOI APROVADA A DENUNCIA CONTRA O GOVERNADOR DO ESTADO, DR. JOÃO ALBERTO CAPIBERIBE, POR IRREGULARIDADES NO FUNDEF.

Autor
Sebastião Bala Rocha (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AP)
Nome completo: Sebastião Ferreira da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO. ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL.:
  • APELO AO PRESIDENTE ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, PARA QUE COLOQUE EM VOTAÇÃO NA PROXIMA SESSÃO DO CONGRESSO NACIONAL, O REQUERIMENTO DE SUA AUTORIA QUE CRIA UMA COMISSÃO MISTA DESTINADA A INVESTIGAR AS CIRCUNSTANCIAS DA MORTE DO EX-PRESIDENTE JOÃO GOULART. CONSIDERAÇÕES SOBRE SESSÃO DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO AMAPA EM QUE FOI APROVADA A DENUNCIA CONTRA O GOVERNADOR DO ESTADO, DR. JOÃO ALBERTO CAPIBERIBE, POR IRREGULARIDADES NO FUNDEF.
Publicação
Publicação no DSF de 26/05/2000 - Página 10898
Assunto
Outros > LEGISLATIVO. ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, REQUERIMENTO, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, COMISSÃO MISTA, INVESTIGAÇÃO, MORTE, JOÃO GOULART, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, EXPECTATIVA, VOTAÇÃO, SESSÃO CONJUNTA, CONGRESSO NACIONAL, COLABORAÇÃO, SENADO, INICIATIVA, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • REGISTRO, DECISÃO, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO AMAPA (AP), ADMISSÃO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, ATUAÇÃO, GOVERNADOR, APREENSÃO, ORADOR, AMEAÇA, LEGISLATIVO, AMBITO ESTADUAL, DEPREDAÇÃO, EDIFICIO SEDE.
  • COMENTARIO, DESEQUILIBRIO, PODERES CONSTITUCIONAIS, ESTADO DO AMAPA (AP), AMEAÇA, ESTABILIDADE, DEMOCRACIA.
  • DEFESA, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, DESVIO, RECURSOS, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, ENSINO FUNDAMENTAL.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA (Bloco/PDT – AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna, na tarde de hoje, para fazer referência a alguns assuntos de relevante importância, em nível nacional e também em nível estadual, com relação ao meu Estado do Amapá.  

No âmbito nacional, quero fazer referência ao requerimento que encaminhei à Mesa do Senado da República, propondo a criação de uma Comissão Mista, composta por 11 Senadores e 11 Deputados, para investigar as circunstâncias da morte do ex-Presidente João Goulart.  

Como todos já sabemos, a Câmara dos Deputados, no dia de ontem ou na terça-feira, instalou uma comissão externa com esse mesmo objetivo. Considerando que o ex-Presidente João Goulart acumulava, à época em que obteve dois mandatos de Vice-Presidente da República, o cargo de Presidente do Senado. Era o que previa a Constituição vigente à época. Então, na condição de Vice-Presidente da República, o Sr. João Goulart exercia também a Presidência do Senado da República.  

Em razão disso, entendi que é importante que o Senado da República participe dessas investigações.  

Espero que, na próxima sessão do Congresso Nacional, haja vista que o requerimento foi proposto ao Congresso Nacional, por tratar-se de uma Comissão Mista, esse requerimento possa ser votado e aprovado e o Senado da República possa se aliar à Câmara dos Deputados na busca de esclarecimentos para os motivos, a causa que levou à morte o ex-Presidente João Goulart, que quando exerceu a Presidência da República, trouxe grandes esperanças ao povo brasileiro. Era representante do Partido Trabalhista Brasileiro e inovou com políticas sociais de grande relevância, reforma de base, reforma agrária, enfim, foram avanços e conquistas inestimáveis para o povo brasileiro.  

Veio a Revolução, o Presidente João Goulart foi exilado e, no exílio, morreu de parada cardíaca. Desde então, já se traz à tona a suspeição de que a morte poderia ter sido encomendada, poderia ter sido uma morte criminosa, e não natural, como se tentou aparentar naquela época e também hoje.  

Então, a imprensa nacional tem se debruçado em apoiar as investigações a respeito da operação Condor e considero de extrema importância que o Senado Federal esteja presente nessas investigações. Por isso, apelo ao Presidente do Senado Federal e do Congresso Nacional, Senador Antonio Carlos Magalhães, com quem já conversei e que manifestou total apoio a essa iniciativa, considerando ser fundamental que o Senado dela participe, que na primeira sessão do Congresso Nacional inclua na pauta, na Ordem do Dia, esse requerimento, para que, uma vez aprovado, essa Comissão possa se tornar mista.  

Conversei com o Líder do PDT, na Câmara dos Deputados, Deputado Miro Teixeira, autor do requerimento aprovado naquela Casa e obtive a concordância também de S. Exª, no sentido de que essa Comissão possa ser mista.  

Quanto ao aspecto estadual, que mencionei que traria também nesta tarde à tribuna do Senado, desejo referir-me a um episódio lamentável que denigre mais uma vez a imagem do já combalido Estado do Amapá, Estado generoso, de grandes riquezas naturais, Estado que certamente motiva o seu povo a ter esperanças. Infelizmente, nosso Estado em algumas ocasiões tem abrigado o crime organizado. Lá, também se desenvolve uma crise político-institucional de profunda gravidade. Neste momento quero fazer referência a um episódio acontecido na terça-feira, na Assembléia Legislativa do Estado do Amapá, episódio que foi inclusive noticiado pelos órgãos de comunicação – televisão, rádio, jornais -, em nível nacional. Esse episódio diz respeito a uma sessão da Assembléia Legislativa em que os Deputados votavam, naquela oportunidade, a admissibilidade de uma denúncia contra o Governador do Estado, Sr. João Alberto Capiberibe.  

Naquela oportunidade, quando a Assembléia aprovou, com 21 votos a favor e três abstenções, a admissibilidade da denúncia, houve um grande tumulto, que culminou com a depredação do prédio da Assembléia Legislativa e uma ameaça à segurança dos Deputados.  

Não pretendo entrar no mérito da questão, quanto a se a denúncia procede ou não. Certo é que há uma gama de denúncias contra o Poder Executivo do Amapá. Não quero entrar no mérito da discussão quanto aos repasses do Governo do Estado do Amapá para a Assembléia Legislativa, porque já muitas vezes mencionei aqui no Senado a relação que existe entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo no meu Estado.  

Entretanto, quero fazer referência à autonomia que tem o Poder Legislativo, no Amapá, em qualquer Município ou Estado da Federação, como tem autonomia o Congresso Nacional. Quero fazer referência à independência que deve existir entre os Poderes constituídos dos Municípios, dos Estados e da União. Portanto, não posso concordar que o Poder de um Estado seja ameaçado, amedrontado, encurralado ou submetido a qualquer ato de violência por parte de quem quer que seja.  

Nesse aspecto, o da institucionalidade, advogo contra o excesso inexplicável, inaceitável que houve por parte daqueles que invadiram o prédio da Assembléia Legislativa e ameaçaram a segurança e até a vida dos Deputados Estaduais. Se o Governador do Estado do Amapá discorda dos procedimentos da Assembléia Legislativa, deve-se ater à discussão política, deve buscar na Justiça os mecanismos para coibir os excessos dos procedimentos dos Parlamentares, mas não com violência.  

Houve neste País, recentemente, a cassação de um Presidente da República. Aqui neste Congresso Nacional houve admissibilidade de uma denúncia; aqui neste Congresso Nacional houve uma CPI que investigou um Presidente da República; aqui neste Congresso Nacional se aprovou a cassação e se cassou um Presidente da República. Mas não vimos depredação do Congresso Nacional.  

É nesse aspecto apenas que quero dizer que apóio completamente a harmonia, sim, entre os Poderes, mas com a total independência, a total autonomia e a total liberdade democrática do exercício das prerrogativas de qualquer dos Poderes.  

Infelizmente, hoje, no meu Estado, não se sabe mais o que é prerrogativa de um determinado Poder; não se sabe onde começam e onde terminam as prerrogativas constitucionais de cada um dos Poderes, haja vista que o eminente Governador do Estado tem dito na imprensa, por intermédio de sua assessoria jurídica, que não vai acatar decisões judiciais que porventura sejam tomadas por determinados desembargadores ou por determinado desembargador, numa afronta ao Poder Judiciário.  

Não quero aqui, de forma nenhuma, dizer que defendo os procedimentos da Assembléia Legislativa, em geral. Tenho discordância da forma como é administrada a Assembléia Legislativa do Amapá - e já mencionei isso aqui; tenho discordância da forma como é administrado o Tribunal de Contas do Amapá - e já mencionei isso aqui; mas tenho discordância também da atuação do Governador João Alberto Capiberibe, tanto quanto ao aspecto da democracia quanto ao aspecto da devida utilização dos recursos públicos. Várias vezes fiz declarações desta tribuna. E as faço com muita tranqüilidade, porque sou homem de paz, de democracia. Jamais vim à tribuna falar de forma leviana, tentar atingir de forma leviana qualquer autoridade do País. Fazemos uma oposição ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, a seu Governo, de forma construtiva, responsável. A minha atuação aqui no Senado é prova disso. Da mesma forma com que me posiciono com responsabilidade contra ações e decisões do Poder Executivo Nacional, eu o faço em relação ao Poder Executivo Estadual.  

Mas, se há excessos, desmandos administrativos, seja na Assembléia Legislativa, seja no Tribunal de Contas do Estado, há uma conivência extrema do Poder Executivo Estadual. Quer dizer, o Executivo Estadual foi tolerante e permitiu que determinadas ações, determinados fatos fugissem de seu controle. O Executivo Estadual transigiu.  

Citarei um exemplo do Tribunal de Contas do Amapá. O Governador Capiberibe, na Imprensa nacional e local, tem feito inúmeras denúncias de corrupção. Há mais ou menos dois anos, a Assembléia Legislativa do Estado do Amapá aprovou um projeto proibindo a reeleição da Presidente do Tribunal de Contas do Estado do Amapá, que está – parece-me - no quarto mandato de dois anos, que hoje é o principal alvo das denúncias do Governador Capiberibe. O que fez o Governador Capiberibe? Vetou o projeto aprovado na Assembléia Legislativa. Vetou – repito – o projeto aprovado na Assembléia Legislativa. Depois, por meio de entendimentos com Deputados, a Assembléia Legislativa manteve o veto do Governador do Estado, numa negociação que envolveu – segundo consta – a aprovação das contas do Governador, no Tribunal de Contas do Estado do Amapá. Por isso, permitiu-se a reeleição da Presidente do Tribunal de Contas do Estado do Amapá, que, por sinal, apoiou a reeleição do Governador Capiberibe.  

São fatos que demonstram que não há coerência entre o discurso e a prática do Governador Capiberibe. Mas, como disse, não pretendo entrar nesse mérito, porque acho que a questão agora é a grave instabilidade institucional que existe no Estado do Amapá. Queria aqui, com a presença da Líder do Bloco da Oposição, Senadora Heloisa Helena, dizer que fico muito preocupado em que o Amapá viva aquele reprovável momento por que passou o Estado de V. Exª, Senadora, Alagoas, onde foi necessária uma intervenção branca.  

Lamento, mas a minha previsão é a de que o Estado do Amapá caminha a passos largos para o processo de depreciação das relações institucionais, para o processo de destruição das relações interinstitucionais, o que agrava muito a situação.  

De certa forma, não fico muito preocupado, porque a Vice-Governadora do Amapá é do Partido dos Trabalhadores. Não se quer sumariamente tirar o Governador Capiberibe do cargo. Nem apóio isso sem uma investigação séria e responsável. Aqui mesmo, no Senado, já fizemos CPIs que atingiam o Poder Legislativo - como a CPI do Sistema Financeiro. Se ela deu em "pizza" depois, é outra história, mas o Senado instalou-a, ouviu quem tinha de ouvir e não houve ameaça contra o funcionamento do Senado.

 

É nesse aspecto que acho que há um equívoco do Poder Executivo estadual nas relações com a Assembléia Legislativa. Quando fui Deputado Estadual, éramos apenas seis Deputados de Oposição ao Governador, que era do PFL e que tinha dezoito Deputados. O Governador Capiberibe era nosso aliado. Ele tinha sido Prefeito, estava sem mandato, era aliado do Bloco de seis Parlamentares: PT, PDT e PSB. Aprovamos a admissibilidade de uma denúncia contra o Governador Barcelos, que era taxado pelo atual Governador Capiberibe como autoritário, antidemocrático, corrupto e uma série de outros adjetivos. Aprovamos a denúncia, afastamos o Governador Barcelos, na época. A denúncia foi votada e aprovada, na Assembléia Legislativa do Amapá. O processo foi feito de forma errada, sem amparo regimental, tanto que o Governador não deixou sequer o Palácio e nem foi substituído porque ingressou na Justiça e reverteu o processo. Não houve depredação da Assembléia Legislativa, não tive a minha segurança física e moral ameaçada, não tive a minha prerrogativa parlamentar tolhida e era, como se dizia, um Governador do regime militar. Foi Governador indicado, depois veio como Governador eleito, mas para nós, àquela época, era exatamente o grande espírito maligno do autoritarismo brasileiro. Hoje, o que se observa é que, infelizmente, o Governador Capiberibe está repetindo determinadas práticas que dizem respeito às que sempre condenamos, que nós, aqui no Senado, condenamos todos os dias.  

Era essa observação que queria fazer. Sei que este é um momento delicado para nós, que somos do bloco. O PT é aliado do Governador Capiberibe, o PDT faz uma oposição, pelo menos em nível de partido, madura, responsável. Na Assembléia Legislativa, sim, a Bancada do PDT é oposição ao Governador Capiberibe, mas também sem qualquer tipo de agressão. E uma oposição consistente, permanente, sem qualquer excesso.  

Por isso, não posso concordar que as prerrogativas dos Deputados Estaduais sejam impedidas de serem exercidas pelo Governador do Estado do Amapá. Espero que haja mais tranqüilidade, mais habilidade, mais responsabilidade na condução desse processo. Fala-se muito em intervenção no Estado do Amapá, banalizou-se, pela imprensa amapaense, essa possibilidade de intervenção. Advogo também que possa ser no futuro até necessária essa intervenção, desde que haja uma completa ruptura das relações institucionais e que os poderes não consigam se respeitar, se entender, ter uma inter-relação responsável e positiva. Nesse caso, é possível que a intervenção seja necessária.  

E como eu dizia, porque temos uma determinada segurança quanto ao exercício do poder futuro, fico, de certa forma, tranqüilo. Não estou fazendo qualquer cavalo de batalha pelo afastamento do Governador Capiberibe, mas creio que é legítimo que a Assembléia Legislativa do Estado do Amapá constitua uma comissão processante e investigue se, de fato, há culpa, porque as denúncias são de desvio de recursos do Fundef. Então, são denúncias graves.  

Eu mesmo, recentemente, fui ao Ministro Paulo Renato Souza, na quinta-feira da semana passada, e entreguei a S. Exª o conjunto dessas denúncias de desvio de recursos do Fundef. Se procedem ou não, não posso aqui afirmar que o Governador é culpado. Tem que examinar o material. Tanto que fui responsável de levar a S. Exª, pedir à sua equipe que analise o material, se tem procedência ou não. Tenho certeza de que agiria desta forma também, por intermédio desta comissão que foi criada e que não pôde ser instalada porque houve todo esse episódio de violência, envolvendo a Assembléia Legislativa, que teve os vidros quebrados, a cerca derrubada e até tiros para dentro do plenário sob o risco de atingir qualquer deputado. Então, foi um ato depreciativo que, infelizmente, mancha, mais uma vez, o meu Estado do Amapá, pelo qual tenho tanto zelo e tanto cuidado de bem representá-lo neste Senado da República.  

Era a comunicação que desejava fazer, nobre Presidente Thelma, insistindo nesta esperança que não é só minha, é do povo do Amapá, no sentido de que os ânimos possam ser acalmados e de que haja mais cuidado, mais zelo por parte desses entes institucionais do Estado nas suas relações, assim não comprometendo o desenvolvimento do Amapá, que, infelizmente, está estagnado, paralisado, em função dessas constantes crises políticas que hoje estão ocorrendo naquele Estado.  

Muito obrigado, Srª Presidente.  

 

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/05/2000 - Página 10898