Discurso durante a 68ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

APELO AO PRESIDENTE DA REPUBLICA PARA A VALORIZAÇÃO DOS SERVIDORES PUBLICOS.

Autor
Moreira Mendes (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Rubens Moreira Mendes Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • APELO AO PRESIDENTE DA REPUBLICA PARA A VALORIZAÇÃO DOS SERVIDORES PUBLICOS.
Publicação
Publicação no DSF de 30/05/2000 - Página 11036
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, EFICACIA, SERVIÇO PUBLICO, AUSENCIA, VALORIZAÇÃO, SERVIDOR.
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, APRESENTAÇÃO, PROGRAMA, MELHORIA, QUALIDADE, CONDIÇÕES DE TRABALHO, VALORIZAÇÃO, FUNCIONARIO PUBLICO, CRIAÇÃO, PLANO DE CARREIRA, REAJUSTE, SALARIO, GARANTIA, DIGNIDADE, EXERCICIO, TRABALHO.

O SR. MOREIRA MENDES (PFL – RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, recentemente, carta enviada ao meu gabinete subscrita por uma senhora domiciliada na Capital de Rondônia, Porto Velho, Dª Orestelina, fez-me parar e refletir sobre o que vem ocorrendo nos últimos anos com os servidores públicos de modo geral. Por meio dessa carta pude ouvir a voz não apenas da signatária, mas de todo esse segmento. Ao que parece, para o Governo, o servidor público transformou-se em bode expiatório de todas as mazelas que afligem a Nação.  

Tal situação vem se fazendo notar desde o Governo Collor. Como sabemos, há mais de cinco anos muitas categorias de servidores públicos não têm recebido reajuste salarial. Como convencê-los de que os seus salários – cujo valor é o mesmo que o de quase seis anos atrás – ainda são suficientes para suprir todas as suas necessidades? Como ensiná-los a fazer milagres e a dividir os seus salários em gastos com alimentação, transporte, medicamentos, água, luz, telefone, vestuário etc?  

Não tenho dúvida de que é necessário evoluir e atualizar os recursos tecnológicos, como a informática. Mas, por essa razão, será preciso também sacrificar, da forma como vem ocorrendo, os servidores públicos, sem os quais o Estado não estará instrumentado para executar as atribuições a ele destinadas na nova Constituição?  

É certo que o País padeceu, nas décadas anteriores, do mal da centralização exacerbada, que teve como conseqüência a estatização. Mas daí a passar para o extremo oposto, sem muito critério e sacrificando os servidores públicos e funcionários de empresas – algumas já bem lucrativas, mesmo sob o controle do Estado –, vai uma grande distância!  

A preocupação com a organização do serviço público também não é novidade no Brasil: começou ainda nos anos 30 com a criação do Dasp, em pleno Estado Novo, e volta à tona periodicamente com os discursos de necessidade da sua reestruturação, da sua modernização e de ampla reforma administrativa.  

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Governo conseguiu, em grande parte, o que pretendia com a recente Reforma Administrativa votada aqui no Congresso Nacional. Posso citar alguns dos mecanismos que influirão decisivamente para a governabilidade de várias esferas do Poder, principalmente no que se refere aos antes incontroláveis gastos com pessoal de algumas unidades federativas: flexibilização da estabilidade dos servidores públicos, possibilitando a demissão de servidores estáveis quando as despesas de pessoal superarem os limites estabelecidos em lei; restabelecimento de teto remuneratório absoluto para os servidores públicos e membros do Poder, em todos os níveis, válido inclusive para a soma dos rendimentos recebidos dos cofres públicos, equivalente à remuneração dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, assunto ainda em discussão na Câmara dos Deputados; fim da unicidade de regime jurídico para os servidores públicos, cuja obrigatoriedade foi excluída da Constituição.  

Agora, é imperioso repensar a eficiência e a eficácia do serviço público justamente no item mais importante: o próprio servidor, que faz mover, com mais ou menos eficiência, dependendo de suas próprias condições, a máquina administrativa. Sem o servidor, o Estado não pode existir.  

Todos sabemos que a diminuição de custos em termos absolutos pode ser uma atitude prejudicial aos próprios interesses nacionais. Algumas categorias do serviço público, nos mais de cinco anos em que seu poder aquisitivo deixou de ser atualizado, vê o seu nível de vida decair.  

Quanto à necessidade de valorização do servidor público, isso não constitui nenhuma novidade, não é bandeira apenas das oposições e já foi defendida por governantes do período autoritário, inclusive, como registrou, em aula inaugural que proferiu na Escola Superior de Guerra, em 1970, o próprio Emílio Garrastazu Médici, então Presidente do Brasil.  

Pelo visto, não temos praticamente nada a comemorar em termos de avanço no que se refere à valorização do funcionalismo público. Em outra opinião abalizada, que vem do ex-Ministro Rubens Ricupero, hoje Embaixador do Brasil em Roma, em seu artigo para a Revista do Serviço Público , número 118, portanto ainda atual, de 1994, denominado "Profissionalização do Servidor Público – Requisito para o Desenvolvimento", pode-se ler:  

 

A profissionalização do serviço público é, a meu ver, objetivo prioritário e de curto prazo, ao qual não poderão furtar-se os dirigentes máximos do Brasil. Não se pode conceber um corpo de funcionários do qual se possa exigir a prestação de bons serviços sem que se lhes possa oferecer, em contrapartida, a existência de um plano racional de carreiras, estímulos ao aperfeiçoamento e perspectivas de progressão funcional, bem como estrutura flexível de salários que os permita adequarem-se tanto ao nível de exigências para a função exercida quanto ao mérito individual devidamente aferido. A profissionalização dos servidores é uma estrada de duas vias. Deles se deve cobrar desempenho profissional. A eles se deve proporcionar as condições para que possam ter bom desempenho.  

 

É fácil constatar que, na teoria, vindo das mais diversas tendências, é comum incensar-se o servidor público. Na prática, porém, o que se vê é um massacre quase generalizado. Abrem-se algumas exceções, em termos de vantagens e remuneração para as categorias envolvidas com a fiscalização, por exemplo, mas, para a grande maioria, o que vale é o pouco caso e o esquecimento. Muitos dos que se enquadram nesse caso são justamente aqueles que têm contato direto com o grande público, para o atendimento no que se refere às atribuições específicas do Estado.  

Por isso, faço um apelo ao eminente Presidente Fernando Henrique Cardoso, a quem vimos apoiando, na maioria das importantes questões aqui apresentadas, que já está na hora de começar a valorizar o servidor público, profissionalizando-o. Já se conseguiram grandes avanços no enxugamento do setor público com as reformas e as privatizações, com a possibilidade de maior facilidade para atingir o equilíbrio fiscal, o mecanismo para conseguir a redução dos quadros excessivos com base na limitação dos gastos com pessoal e a possibilidade da dispensa de servidores estáveis com base nas novas regras.  

Está na hora, portanto, de o Governo apresentar um programa completo e acabado para a melhoria da qualidade do nosso serviço público, valorizando o servidor e dando-lhe condições, para que ele possa exercer, com dignidade, o seu trabalho. Aí se inclui a questão do salário.  

Entendemos não ser possível pensar em valorização do servidor se não houver a instituição de um plano de carreira sério, com a clara definição das classes, dos cargos, forma de provimento, requisitos para promoção – e que isso não se cinja a apenas determinadas categorias, pois é preciso que se olhe o funcionalismo como um todo.  

É conveniente frisar que o §2º do art. 39 da Constituição Federal estabelece que "A União, os Estados e o Distrito Federal manterão escolas de governo para a formação e o desenvolvimento dos servidores públicos, constituindo-se a participação nos cursos um dos requisitos para a promoção na carreira, facultada, para isso, a celebração de convênios ou contratos entre os entes federados". Se este dispositivo for levado a sério, já se terá dado um grande passo para a qualificação do servidor público e, por conseguinte, para a melhoria do Serviço Público.  

Mas, a verdadeira profissionalização implica repensar toda a política remuneratória, principalmente nas carreiras voltadas às atividades específicas do Estado. Desejo registrar que, nesse campo, o Governo Federal vem atuando com muita clareza. Muitas são as categorias que, prestando serviços em atividades típicas de Estado, já lograram reajustes ao longo desses cinco anos a que venho me referindo. Essas atividades, creio, não se restringem àquelas atividades de fiscalização e de polícia, mas também às de planejamento de políticas e de avaliação e controle, para finalidades específicas da gestão pública, que difere em muito da gestão puramente empresarial, em função do caráter social e político que lhes é inerente.  

Quanto aos cargos em comissão, hoje tidos rotineiramente como instrumento político de barganha, que possibilita exclusivamente o apadrinhamento, muitas vezes não se levando em conta o real compromisso desses servidores como trabalho, e sim o compromisso do político com essas pessoas, é necessário que se proceda à moralização, com a racionalização da estrutura administrativa, obedecendo aos mandamentos constitucionais inscritos no inciso I do §3º do art. 169, que preconiza a "redução em pelo menos vinte por cento das despesas com cargos em comissão e funções de confiança", bem como observando o disposto no inciso V do art. 37, onde se estabelece que "as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento". Essa reserva se justifica plenamente, quando se sabe que ninguém melhor para dirigir do que quem já conhece a máquina e seu funcionamento.  

Estou falando aqui de assuntos que acredito serem do conhecimento de todos os nobres Colegas, mas que considero necessário se mantenham à tona até que venham a ser solucionados.  

O profissional deve ter os conhecimentos necessários e acompanhar todas as mudanças no sentido de modernizar os seus procedimentos. Então, faz-se necessário reciclar constantemente os servidores públicos, proporcionando-lhes cursos de atualização e aperfeiçoamento, previstos na nossa Lei Maior como exigência para a promoção.  

Lembramos que, para a preparação e reciclagem da mão-de-obra empregada no Serviço Público, o Governo já dispõe de pelo menos duas instituições muito bem aparelhadas e que merecem registro: a Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e a Escola Superior de Administração Fazendária (ESAF), sem contar, por exemplo, com o Instituto Rio Branco, que tem finalidade bem mais específica, qual seja, a de preparar os servidores para a carreira da diplomacia.

 

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com melhores condições de trabalho e salários compatíveis com as atividades exercidas, pode-se ter servidores motivados e envolvidos com a instituição a que servem, implicando a satisfação do povo, que é o beneficiário direto do Serviço Público e a finalidade primordial da existência do Estado.  

Para não deixar cair no esquecimento, quero lembrar aos nobres Colegas e fazer um alerta ao Governo: é necessário, é urgente mesmo repensar o servidor público brasileiro, modernizando as suas práticas, adequando-o aos tempos atuais, assim como recuperar os seus salários, já que há mais de cinco anos muitos deles estão sem reajustes. Assim, muitas pessoas, como a Srª Orestelina, lá do meu Estado, poderão sair da situação de desespero e de desesperança em que se encontram, evitando-se, assim, situações lamentáveis e por tudo condenáveis, como as ocorridas com o Governador de São Paulo, Mário Covas, e o Ministro da Saúde, José Serra, ao que todo o Brasil assistiu estarrecido pelos noticiários televisivos dos últimos dias.  

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/05/2000 - Página 11036