Pronunciamento de Geraldo Cândido em 01/06/2000
Discurso durante a 71ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
REFLEXÕES SOBRE A REALIDADE DA POLITICA ECONOMICA E SOCIAL BRASILEIRA. PREOCUPAÇÃO COM A POSIÇÃO DO GOVERNO CONTRA O MOVIMENTO DOS SEM-TERRA. REGISTRO DO ARTIGO DO JORNALISTA ELIO GASPARI, PUBLICADO NO O GLOBO DO ULTIMO DOMINGO, INTITULADO " BALA EM LAVRADOR E ALERTA. OVO EM MINISTRO E O CAOS ".
- Autor
- Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
- Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
MOVIMENTO TRABALHISTA.:
- REFLEXÕES SOBRE A REALIDADE DA POLITICA ECONOMICA E SOCIAL BRASILEIRA. PREOCUPAÇÃO COM A POSIÇÃO DO GOVERNO CONTRA O MOVIMENTO DOS SEM-TERRA. REGISTRO DO ARTIGO DO JORNALISTA ELIO GASPARI, PUBLICADO NO O GLOBO DO ULTIMO DOMINGO, INTITULADO " BALA EM LAVRADOR E ALERTA. OVO EM MINISTRO E O CAOS ".
- Aparteantes
- Eduardo Suplicy.
- Publicação
- Publicação no DSF de 02/06/2000 - Página 11409
- Assunto
- Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. MOVIMENTO TRABALHISTA.
- Indexação
-
- CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, PRIORIDADE, POLITICA, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA PUBLICA, EXCESSO, DEPENDENCIA, CAPITAL ESTRANGEIRO, EFEITO, CRESCIMENTO, DIVIDA EXTERNA, REDUÇÃO, PARTICIPAÇÃO, PAIS, COMERCIO EXTERIOR, AUMENTO, CAPACIDADE OCIOSA, DESEMPREGO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA.
- CRITICA, EXCESSO, VIOLENCIA, REPRESSÃO, GOVERNO FEDERAL, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, REFERENCIA, OCORRENCIA, MORTE, TRABALHADOR RURAL, ESTADO DO PARANA (PR).
- LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), AUTORIA, ELIO GASPARI, JORNALISTA, CRITICA, ATUAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MARTUS TAVARES, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO ORÇAMENTO E GESTÃO (MOG), AUSENCIA, REPASSE, REAJUSTE, SALARIO, SERVIDOR PUBLICO CIVIL.
O SR. GERALDO CÂNDIDO
(Bloco/PT – RJ. Pronuncia o seguinte discurso.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a realidade brasileira evidencia que está em curso um processo que aprofunda a dependência do nosso País aos centros imperialistas, especialmente dos Estados Unidos, seja na pilhagem do patrimônio público, seja na adoção da abertura comercial irrestrita. A burguesia dependente reafirma o papel de sócia minoritária do grande capital internacional.
No marco da disputa entre os oligopólios do G-7, desenvolve-se nova rodada, concentração e centralização de capital, em que o aparelho produtivo do nosso País passa por um meteórico processo de desnacionalização. É nesse contexto que se enquadra o desastre em que as classes dominantes locais jogaram o Brasil e o nosso povo, em nome da "estabilidade". São visíveis os sinais de estagnação do crescimento econômico, a despeito das abundantes "notícias positivas" produzidas pelo Governo e difundidas pela mídia.
A economia brasileira já é a mais internacionalizada entre as dos países subdesenvolvidos. Das 500 maiores empresas multinacionais do mundo, 400 estão presentes no Brasil. Com a atual política cambial e as privatizações, a abertura indiscriminada da economia se cristalizou.
A política posta em prática pela coligação conservadora do Governo aprofunda a desnacionalização da economia brasileira e deprecia violentamente a poupança erguida por diversas gerações de brasileiros.
Verificamos que o endividamento externo atinge o patamar de US$230 bilhões e que cai a participação da economia brasileira no comércio internacional. O Governo assina sucessivos documentos aditivos ao acordo assinado com o FMI. Com isso, os índices de capacidade ociosa do aparelho produtivo geram o pesadelo do desemprego.
Como exemplo, temos o resultado das contas do Brasil divulgado pelos jornais, com o aumento nos gastos com juros da dívida externa, elevada principalmente pela colocação de bônus da República no exterior, que levou a uma piora nas contas externas do País. O déficit em transações correntes chegou a US$3,1 bilhões, o maior desde dezembro de 1998 – US$3,6 bilhões. Foram pagos US$540 milhões a mais em juros que em abril de 1999. E a subida dos juros americanos deve ampliar ainda mais essa conta para o final do ano, já que metade da dívida brasileira tem taxa de juros flutuantes.
A conta de juros ficou em US$2,41 bilhões, dos quais US$520 milhões foi a parcela paga pelo setor privado e o restante, pelo setor público. Contribuíram para o aumento os US$200 milhões em juros do empréstimo emergencial do Fundo Monetário Internacional, e o Governo pagou a maior parcela – US$10,3 bilhões, de principal - em abril, além do vencimento semestral dos encargos sobre os antigos papéis da dívida brasileira, os bradies.
Além disso, a distribuição de renda no Brasil continua aviltante. Dados da Síntese de Indicadores Sociais de 1999, do IBGE, revelam que o 1% mais rico da população detém 13,8% da renda total, enquanto os 50% mais pobres ficam com 13,5% dos ganhos.
A situação é bastante ruim até em termos de América Latina. No Brasil, o índice de Gini, que mede a concentração de renda, foi de 0,575. Quanto mais próxima de 1 for esta taxa, pior é a distribuição. O índice 1 significaria uma única pessoa dispondo de toda a renda do país. O Uruguai apresenta um Gini de 0,43; a Costa Rica e o Peru, de 0,46.
Em 1988, o Gini brasileiro era de 0,613. A redução dos últimos dez anos é considerada insignificante até pelo IBGE. Nas palavras de um diretor dessa instituição, é mais apropriado falar em concentração estável. As disparidades regionais seguem gritantes. No Maranhão, 50,7% das famílias têm renda per capita mensal de até meio salário mínimo. Em São Paulo, essa taxa cai para 9,8%. A cifra nacional é de 19,6%. O próprio significado de salário mínimo perde aqui muito do seu sentido.
A desigualdade se reflete também nas diferentes etnias da população. A média de vencimentos mensais é de 2,61 salários mínimos entre pardos; 2,71 entre negros; e 5,6 para brancos. Esses dados são consistentes com o nível educacional dessas populações. Enquanto os brancos têm, em média, 7,5 anos de estudo, os negros e o pardos vão à escola por 5,1 anos. Mais gritante: o analfabetismo afeta 42,3% dos negros e 8,4% dos brancos. A média nacional é de 13,8%.
A distribuição da riqueza é o maior entrave ao desenvolvimento do Brasil.
A persistência do problema ao longo das décadas indica que a situação não será resolvida com planos e rendas econômicos; é preciso que haja políticas ativas de distribuição de renda para enfrentar o desafio. Não se pode esperar que o passar dos séculos realize, por si e quase naturalmente, essa tarefa.
Esta síntese dos indicadores sociais em 1999, divulgada pelo IBGE, parece, usando uma frase do jornalista Clóvis Rossi, "cravar o último prego no caixão do Governo Fernando Henrique Cardoso", pois, em seu discurso de posse, em 1995, o Presidente apontou como prioridade absoluta de sua gestão combater a miséria e a desigualdade.
Cinco anos e meio depois do seu discurso de posse, o IBGE mostra que o Presidente fracassou miseravelmente na sua meta prioritária. Os miseráveis formam uma pilha formidável, a ponto de praticamente 20% das famílias viverem com renda per capita de meio salário mínimo (repito, meio salário mínimo, não chega a um inteiro, o que já é obscenamente reduzido).
Em matéria de concentração de renda, os dados do IBGE mostram que em pleno ano de 1992, o ano do i mpeachment e da confusão institucional e econômica vividas pelo Brasil, ainda assim a concentração era inferior à de 1998, último ano do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, o que, de quebra, só prova que era uma falácia a reiterada afirmação dos governistas e dos seus áulicos na mídia e na academia de que o Plano Real promovera formidável distribuição de renda. Claro, dominar a inflação é bom para todos, em especial para os mais pobres, mas nem remotamente basta para arranhar a escandalosa distribuição de renda.
O Governo fracassou, fato comprovado pela comparação entre seu próprio discurso e os dados estatísticos oficiais.
As ações do MST, com ocupação de prédios públicos, e a manifestação dos caminhoneiros demonstram que existem setores organizados que desejam mudanças rápidas na política econômica do Brasil, pois, de um lado, temos a radicalização do Movimento dos Sem-Terra, em função da dívida dos pequenos agricultores e da necessidade de assentar milhares de trabalhadores sem terra; de outro, há os caminhoneiros, que não tiveram suas reivindicações atendidas.
Em função das ações dos movimentos sociais, o Governo agiu com medidas duras: repressão e morte de trabalhadores rurais, como ocorreu no Paraná; usa a Lei de Segurança Nacional para enquadrar o MST e demonstrar, na prática, que todo o governo fraco de argumentos políticos usa armas para coagir os "inimigos" – é bom destacar: os inimigos são os trabalhadores organizados.
Cai a máscara do sociólogo, que assume o discurso da caserna, tão comum nas ditaduras militares, como o ocorrido quando da censura à entrevista de João Pedro Stédile, líder do MST, na TV Educativa do Rio de Janeiro, pela lamentável intervenção do Secretário de Comunicação do Palácio do Planalto, Andrea Matarazzo, ao impedir sua transmissão.
A iniciativa de Fernando Henrique Cardoso tem o propósito claro de propagar aparentes justificativas para ações de repressão bruta. Como as já ocorridas, todas em conformidade com a doutrina decorrente da ascendência reconhecida ao General Alberto Cardoso, no circuito palaciano, e sobre o Presidente da República.
O risco, nas palavras atribuídas a Fernando Henrique Cardoso, viria da radicalização de movimentos antagônicos que se dispõem ao enfrentamento pela violência, como o MST. Em vista disso, "o Governo prepara um conjunto de ações para coibir a violência no campo" ou, mesmo para mau entendedor, contra os sem-terra.
Existe o risco de quebra da ordem institucional no Brasil? Sim. Mais precisamente o Estado de Direito e as liberdades democráticas, que já estão em franca degeneração. Esse quadro é claro para quem sobreponha seus interesses e se disponha a vê-lo.
A situação social já está posta em ponto explosivo. A favelização, o recurso dos assaltos e roubos como meio de vida, a generalização da violência nas ruas e na juventude, a exaustão da tolerância de segmentos como os sem-terra e núcleos favelados, já em reações exaltadas, sintetizam, indiscutivelmente, o acúmulo de situações que antecedem explosões mais lastimáveis. Mesmo quem não quer reconhecer essa realidade no Brasil sente o temor de ser assaltado, de sair à noite, de andar em lugares menos movimentados, de abrir a janela do carro, o medo do menino maltrapilho. Este é o Brasil que se sabe em ponto de explosão.
Enquanto isso, o Presidente Fernando Henrique Cardoso finge não ver a realidade do País, pois afirmou na imprensa que o Brasil vai "de mal a menos mal".
Está provado, até com dados governamentais, que não há o que esperar do Governo para reverter a gravidade da situação social e seus desdobramentos na vida coletiva e na vitalidade das instituições.
Num regime de plenitude constitucional e democrática, haveria a ação compensatória, ainda que parcialmente, do Poder Legislativo. Mas no Brasil atual, não há Legislativo; quem legisla é o Governo.
Desde o início do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal referendam o que o Governo lhes manda. O Governo prefere o uso autoritário das medidas provisórias, sucedâneas dos decretos-leis; e o PSDB, o PMDB e o PFL deixam milhares delas vigorando há anos, sem a necessária aprovação ou recusa do Congresso. Do ponto de vista da relação funcional dos Poderes, o Brasil está em espécie de fujimorismo disfarçado.
A ordem constitucional, o Estado de Direto e as liberdades democráticas já estão em degeneração progressiva, embora não de todo irremediável. Mas não é o MST que deve responder por essa desgraça nacional. O referido Movimento é conseqüência e não causa da violência, porém é invocado pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso para dar aparência de legitimidade ao avanço do fujimorismo, que está sendo planejado no Planalto.
Por último, cito um poema de Berthold Brecht, que retrata bem a situação do Brasil hoje, cujo título é Elogio da Dialética :
A injustiça passeia pelas ruas com passos seguros.
Os dominadores se estabelecem por dez mil anos.
Só a força os garante.
Tudo ficará como está.
Nenhuma voz se levanta além da voz dos dominadores.
No mercado da exploração se diz em voz alta:
Agora acaba de começar:
E entre os oprimidos, muitos dizem:
Não se realizará jamais o que queremos!
O que ainda vive não diga: jamais!
O seguro não é seguro. Como está não ficará.
Quando os dominadores falarem
falarão também os dominados.
Quem se atreve a dizer: jamais?
De quem depende a continuação desse domínio?
De quem depende a sua destruição?
Igualmente de nós.
Os caídos que se levantem!
Os que estão perdidos que lutem!
Quem reconhece a situação, como pode calar-se?
Os vencidos de agora serão os vencedores de amanhã.
E o "hoje" nascerá do "jamais".
Sr. Presidente, ao encerrar o meu pronunciamento, peço a permissão para proceder à leitura de um trecho do jornalista Elio Gaspari, publicado no último domingo no jornal O Globo, e que tem a ver muito do meu pronunciamento:
Jornal O Globo , de 20/05/2000 – Texto de Elio Gaspari
Bala em lavrador é alerta. Ovo em Ministro é o caos.
O Governo está embriagado pela mistificação e pelo radicalismo verbal. Tomem-se dois exemplos: a intransigência de FFHH com os servidores públicos, verbalizada pelo Ministro do Planejamento, Martus Tavares, e a reação do Planalto ao ovo amassado no Ministro José Serra.
Os funcionários estão pedindo 62% de reposição salarial. Talvez façam negócio por 6.2%. O que está em jogo não é o percentual de um reajuste, mas a decisão do Governo de não aceitar conversa com uma classe que vem massacrando há cinco anos.
O Ministro disse que a folha do funcionalismo chegou a R$53,6 bilhões neste ano. Portanto, um reajuste de 2% significará uma despesa equivalente ao que se gasta com a merenda escolar.
Tudo bem. Já que o negócio é brincar com estatísticas, os grevistas lembram que neste ano o Governo desembolsará R$65 bilhões para pagar os juros de sua dívida. Gastará esse ervanário porque fixou e mantém os juros brasileiros no patamar mais alto do mundo. O Ministro Martus nunca foi ouvido reclamando de que os juros custam 61 vezes o que se gasta com a merenda escolar. Com uma diferença: a choldra que paga imposto prefere dar de comer às crianças do que banquetear banqueiros.
O Planalto conversa com ruralistas caloteiros, privatas quebrados e banqueiros falidos, mas não vai à mesa com os servidores. Age assim porque está jogando numa estratégia de tensão.
O melhor exemplo dessa estratégia foi verbalizado pelo Secretário-Geral da Presidência, Aloysio Nunes Ferreira, e pela liderança parlamentar do PSDB. Eles se enfureceram porque um estudante desempregado amassou um ovo no Ministro da Saúde e um manifestante bateu com um pau de bandeira no governador Mário Covas. Aloysio disse o seguinte: "Essas ações partiram de uma canalha de ânimo fascista, porras-loucas, membros de grupelhos extremistas. É um banditismo político".
Pegou pesado. As leis do País têm remédios para delitos desse tipo, e, no caso do ovo, dificilmente podem levar a uma pena maior do que a perda da primariedade por cinco anos. Se é pouco, pode-se fazer outra lei, mas essa é a que há.
Será que um ovo vale tantos adjetivos?
O ministro José Serra era presidente da UNE em 1964. A escumalha que ele representava fazia coisa pior, muito pior. Cinqüentões, todos esses baderneiros lembram-se com ternura de suas malfeitorias (cometidas num regime democrático). Da mesma forma, FFHH se lembra com carinho da baderna francesa de 1968, à qual assistiu, enlevado. Isso para não mencionar as doces recordações que os senadores Antonio Carlos Magalhães e José Sarney guardam das pancadas que tomaram da polícia do ditador Getúlio Vargas. (Sarney, no exercício da Presidência, teve o ônibus apedrejado no Rio de Janeiro. Manteve a solenidade do cargo, não disse uma palavra e, meses depois, anistiou os agressores.)
O ministro Aloysio Nunes Ferreira chama de bandidos, canalhas, fascistas e porras-loucas extremistas os baderneiros de hoje. É forte. Lutando contra a ditadura (tendo como objetivo a instalação no Brasil de um regime socialista), ele militou na Aliança Libertadora Nacional, de Carlos Marighela. Essa organização praticava aquilo que seu líder chamava de "terrorismo revolucionário". Como quadro destacado da ALN, em agosto de 1968, o atual ministro participou do assalto a um trem-pagador da ferrovia Santos-Jundiaí, do qual levaram o equivalente a US$21.600. Bandido não era. Canalha, muito menos. Fascista, nem pensar. Porra-louca, talvez. Extremista, com certeza. Se ele não era tudo isso, como é que um jovem que amassa um ovo pode vir a sê-lo?
O Governo, tão fiel aos costumes do FMI, deveria copiar também os seus modos sociais. Na cerimônia de sua despedida da direção-geral do Fundo, Michel Camdessus tomou uma torta no rosto. Se desse queixa, o agressor tomaria cadeia, pois as leis americanas são mais severas que as brasileiras. Camdessus não deu queixa. Pelo contrário, deu lição: "Risco profissional, que aceito com alegria de viver."
Como o oveiro é petista registrado, o deputado Aécio Neves quer que o PT o condene. Não o fazendo, seria cúmplice da ovada. Divertido, o doutor Aécio. Nunca pediu ao PFL (partido que participa da aliança governista) que condenasse o deputado Hildebrando Paschoal. Ele é um homem de fino trato. Não amassava ovo, serrava gente viva. O PFL, que gosta tanto da ordem, só o expulsou depois que as fotografias das vítimas da moto-serra de seu deputado circularam no Congresso.
Pode-se encarcerar os baderneiros. O que não se pode é jogar o Governo no oportunismo da histeria.
Admita-se que o certo seja mandar para o Carandiru todos aqueles que ofendem as autoridades, desrespeitam a tropa de choque e gritam palavrões para FFHH (que não reclamou quando 200 mil pessoas referiram-se à mãe do Presidente João Figueiredo no comício do Anhangabaú, em 1984.) Nesse caso, consegue-se finalmente restabelecer a ordem. Que ordem? Aquela que levou um professor da Sorbonne a governar em aliança com o Deputado Hildebrando Paschoal.
O Senador Vitorino Freire dizia que em política se pode fazer tudo, menos balançar o coreto das autoridades. Podem-se serrar miseráveis no Acre, mas não se pode amassar um ovo num ministro. A PM paranaense pode matar um lavrador (a tiro de carabina), e o Planalto pode dizer que isso deve ser tomado como um alerta. O que não se pode é balançar o coreto, porque essa é a ordem que ele mantém.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT – SP) – Senador Geraldo Cândido, V. Exª me permite um aparte?
O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT – RJ) – Com todo o prazer, Senador Eduardo Suplicy, se a Mesa permitir.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT – SP) – Gostaria de cumprimentá-lo pelo pronunciamento, primeiro, quanto à parte em que faz um diagnóstico da péssima distribuição da renda, da riqueza e da inação do Governo Fernando Henrique em relação aos seus propósitos, anunciados por ocasião de suas respectivas posses. Relativamente ao episódio no qual o responsável pela comunicação do Governo, Ministro-Chefe da Secretaria de Comunicação, Andrea Matarazzo, acabou impedindo que João Pedro Stédile, Coordenador Nacional do MST, desse uma entrevista à TV Educativa , conversei com o Ministro Andrea Matarazzo, que reconheceu que havia cometido um erro. Sugeri a S. Exª, há duas semanas, que tomasse a providência, junto à TV Educativa , de determinar a realização de nova entrevista com João Pedro Stédile, com quem inclusive conversei. O Ministro Andrea Matarazzo nos disse que iria tomar a providência. Sugeri que a entrevista fosse feita antes da reunião da Coordenação Nacional do MST com os Ministros do Governo, resultado de esforço também da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, e eu espero que realmente se realize. O Ministro, inclusive, pediu-me que eu me empenhasse com João Pedro Stédile, porque a providência seria tomada. Espero que seja breve. Cumprimento também V. Exª por nos ter brindado com esse notável artigo, com essa peça de Elio Gaspari. A recomendação que faço ao Ministro José Serra e ao Governador Mário Covas é que tenham uma atitude semelhante à do Papa João Paulo II, que visitou aquela pessoa que, mais gravemente, havia atentado contra a sua vida e com ele dialogou. Meu cumprimentos.
O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT- RJ) – Agradeço o aparte de V. Exª que, como sempre, é ponderado e bastante consciente. V. Exª menciona também a sua interferência no episódio de censura imposta ao João Pedro Stédile, do MST, o que foi lamentável. Senador Suplicy, veja que os companheiros servidores públicos estão com dificuldade de diálogo com os representantes do Governo; o Ministro Martus Tavares não quer receber sequer a coordenação do movimento dos servidores. Não querer negociar é inaceitável em uma democracia. Os representantes das entidades dos servidores estão fazendo um apelo aos Senadores e Deputados para que tentem intermediar uma negociação com os representantes do Governo. Isso demonstra que a democracia no Brasil está difícil de ser exercida.
Citei o artigo do Elio Gaspari porque ele faz referência ao episódio em que o ex-Presidente José Sarney, no Rio de Janeiro, teve o ônibus em que viajava apedrejado, e até mesmo jogaram um instrumento pesado, tipo uma machadinha, que quase atingiu o Presidente. As pessoas presas em função desse atentado foram anistiadas por ordem do então Presidente da República, num ato de grandeza, de reconhecimento de um democrata que aceita o direito de protesto contra um Governo com o qual não concordam.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) – Como o Ministro Martus Tavares estará em audiência na Comissão Mista do Orçamento, atendendo a requerimento de convocação do Senador Jader Barbalho, acredito que será o momento oportuno para que Deputados e Senadores não apenas questionem sobre os cortes orçamentários, mas também possam enfatizar o apelo que V. Exª faz, a fim de que, na mesma oportunidade e em seguida à audiência, dialogue S. Exª com os servidores públicos.
O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT – RJ) – Agradeço a tolerância e a paciência do Presidente da Mesa.
Muito obrigado.
7 J