Discurso durante a 74ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEFESA DA REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO COMO UMA FORMA DE COMBATE AO DESEMPREGO.

Autor
Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA DE EMPREGO.:
  • DEFESA DA REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO COMO UMA FORMA DE COMBATE AO DESEMPREGO.
Aparteantes
Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 08/06/2000 - Página 12186
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA DE EMPREGO.
Indexação
  • COMENTARIO, OCORRENCIA, CRESCIMENTO, AUTOMAÇÃO, PRODUÇÃO, MODERNIZAÇÃO, PARQUE INDUSTRIAL, EFEITO, AUMENTO, DESEMPREGO, PAIS.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REDUÇÃO, JORNADA DE TRABALHO, OBJETIVO, COMBATE, DESEMPREGO, ABERTURA, VAGA, TRABALHO.
  • CRITICA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DIVULGAÇÃO, INEXISTENCIA, POSSIBILIDADE, CRIAÇÃO, EMPREGO, REFERENCIA, REDUÇÃO, JORNADA DE TRABALHO.

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT – RJ. Como Líder. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho ocupado a tribuna com freqüência para trazer as minhas preocupações com relação a alguns problemas sociais que afligem o nosso País, as dificuldades por que passa a população brasileira, principalmente os trabalhadores e os assalariados de baixa renda.  

Tenho questionado o Governo, inclusive, sobre medidas em relação à saúde, educação, moradia, segurança, emprego, saneamento, melhores salários e outros setores, mas principalmente sobre a principal mazela social: o desemprego.  

 

Preocupado com essa questão, apresentei, este ano, o PLS nº 08, de 2000, que dispõe sobre a redução da jornada de trabalho para 35 horas semanais, uma bandeira de luta da classe trabalhadora de muitos anos.  

No século passado, quando, na Inglaterra, iniciou-se a revolução industrial, a jornada de trabalho chegava a ser de 16 horas diárias, inclusive para mulheres e crianças. O movimento operário começou a se organizar e, através de seus grêmios, suas corporações, principiou a luta pela redução das horas trabalhadas. Através de sua mobilização, a jornada de trabalho foi reduzida, ao final do século XIX, de 16 para 12 horas diárias. Em meados do século XX, já tínhamos conseguido reduzir essa jornada para 8 horas diárias.  

Mas a luta continuou. Com a automação da produção, a modernização do parque industrial, veio o conseqüente aumento do desemprego. E nada mais do justo que reduzir a jornada de trabalho para dar oportunidade àqueles que ficam fora do mercado em função da automação e da modernização das indústrias.  

 

Apresentei este projeto, que tem como meta a redução da jornada de trabalho, sabendo-se que não é fácil, pois iremos encontrar dificuldades, resistências. Mas esta semana, tivemos a notícia, veiculada nos jornais, de que o Presidente Fernando Henrique Cardoso, ao participar do estande do Brasil, na Feira de Hannover, na Alemanha, afirmou ser favorável à redução da jornada de trabalho para 5 horas.  

Essa importante declaração nos motivou a cobrar do Governo medidas eficazes e efetivas nesse sentido.  

O Presidente Fernando Henrique Cardoso também afirmou recentemente, em Paris, que "empresários e trabalhadores devem iniciar a discussão de propostas sobre a redução da jornada de trabalho", além de colocar o tema na pauta da imprensa nacional; Sua Excelência sinalizou uma posição simpática à legislação francesa, que reduziu de 39 para 35 horas a jornada de trabalho.  

Disse o Presidente da República que "medidas como essa podem servir de estímulo ao aumento da geração de emprego", que, segundo Sua Excelência, é "uma das suas principais preocupações sociais".  

Concordo com o Presidente quando analisa que a sociedade brasileira já está suficientemente amadurecida para travar esse debate. Reafirmo a minha avaliação de que o Congresso Nacional não pode fugir ao debate de uma proposta efetiva de combate à pobreza: a redução da jornada de trabalho.  

Lanço, desta tribuna, um desafio ao Presidente Fernando Henrique Cardoso: venha se somar a essa luta pela concretização de uma idéia que já reduziu drasticamente o desemprego na França e pode conduzir milhões de brasileiros ao mercado de trabalho, resgatando a dignidade, pois, como dizia o poeta Gonzaguinha, "sem trabalho um homem não tem honra".  

Então, Senhor Presidente da República, vamos honrar a palavra, e como a maioria dos Congressistas faz parte da base de sustentação do Governo, que seja mais um a se somar na luta pela aprovação do projeto de lei que, coerente com os meus compromissos assumidos com aqueles que me deram a possibilidade de representá-los nesta Casa, apresentei, em janeiro deste ano, o PLS nº 08/2000, que defende a jornada de trabalho de 35 horas.  

Não adianta apenas fazer belos discursos "para francês ver" e, no momento da ação concreta, contrariar as próprias palavras. O Governo deve assumir o compromisso de articular a proposta com os representantes dos trabalhadores e dos empresários, como também convencer sua base de sustentação no Congresso Nacional da importância da proposição.  

A questão do combate à pobreza polarizou por muito tempo as atenções desta Casa. Votei contra a proposta do Fundo de Erradicação da Pobreza, porque não acredito em soluções paliativas, medidas meramente compensatórias. É um equívoco apenas dar uma esmola. Temos de dar ferramentas e meios de a população subsistir com os proventos do seu trabalho.  

Sr. Presidente, Srª s e Srs. Senadores, desde a última segunda-feira, a imprensa brasileira vem dando grande destaque a essa fundamental questão. Algumas publicações, como o jornal O Globo , em editorial na terça-feira, dia 6, intitulado "Pela culatra", fazem críticas, inclusive, à abertura desse debate. O texto, embora sem citar as fontes, chamadas meramente de "organizações de trabalhadores", afirma que "o Brasil teria apenas um crescimento de 0,8% na oferta de emprego com a redução da jornada para 35 horas". Além disso, chega a fazer um verdadeiro exercício de futurologia ao prever um hipotético aumento do desemprego.  

Além de fazer um autêntico terrorismo em seu editorial, finaliza com uma apocalíptica frase: "E a redução de jornada para toda a economia seria um tiro de alto calibre pela culatra". Para O Globo, inexistem projetos no Congresso sobre o assunto.  

Felizmente, outros veículos de comunicação vêm tendo uma postura menos passional e mais jornalística. No meu Estado, cito o exemplo do jornal O Dia, um dos poucos que, correta, ética e jornalisticamente, noticiou a existência de uma matéria sobre a redução da jornada de trabalho no Congresso Nacional.  

Em sua edição da última terça-feira, O Dia apresenta a seguinte manchete: "Jornada reduzida abre 2,8 milhões de vagas". Diferentemente do concorrente, O Dia ouviu e citou a opinião de um especialista, o pesquisador da Unicamp Jorge Levy Matoso, segundo o qual o impacto da redução da jornada implicaria um aumento de 15% no total de empregos assalariados. Diz o referido pesquisador: "A projeção se baseia na experiência da França. Lá, a diminuição do tempo de trabalho de 39 para 35 horas semanais abriu 180 mil vagas, ou seja, para cada 10% de redução da jornada, temos 7% de aumento do número de empregos assalariados." Matoso ainda cita o problema das horas-extras – aliás, situação contornada pela minha proposição, que as impede, como principal entrave, cobrando uma posição firme de Fernando Henrique Cardoso. Afirmou o Professor Matoso: "O Governo tem que abandonar o discurso demagógico e fazer sua parte. Ao longo do Século XIX, diversos países reduziram a jornada, mas isso nunca aconteceu sem muita briga entre patrões e empregados. Na França, já há um consenso de que, em tempos de crise, só dá certo se o Governo intervir."  

O pesquisador da Unicamp tem razão: a Federação da Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) aceitam discutir a proposta, embora com alguma resistência. O grande empresariado deveria lembrar os ensinamentos de Henry Ford e ter em mente que o aumento da massa de consumidores lhe dará a contrapartida do aumento da produção e, conseqüentemente, da lucratividade. Ford avaliou com sabedoria que os seus trabalhadores deveriam ter meios de comprar a mercadoria por ele produzida. E, convenhamos, Ford estava longe de ter idéias socialistas.  

Aliás, havendo compreensão, vontade política e grandeza desta Casa, que pode ser o pólo impulsionador dessa discussão, poderemos levar a bom termo a execução dessa proposta.  

É bom lembrar, neste ano de Olimpíada, que o Brasil leva no peito uma triste medalha de bronze: o terceiro lugar no ranking mundial do desemprego, só perdendo para Rússia e Índia.  

Citando o editorial de terça-feira do jornal O Dia , afirmo: "Mais do que qualquer outro, o Brasil precisa fazer alguma coisa concreta para conter o avanço do desemprego. Técnicos do Governo e políticos insistem numa única fórmula: a retomada do crescimento. É pouco para uma nação que lança nas ruas dois milhões de jovens ávidos por um emprego, ao mesmo tempo em que se defronta com multidões de desempregados, estimados em dez milhões de pessoas. O Brasil não deve evitar tal debate. Quer queiram, quer não, o emprego é, e sempre será, um dos componentes vitais para acabar com a miséria. Não custa nada encarar com maturidade a discussão em torno da redução da jornada de trabalho".  

Como demonstrou o citado texto, essa é uma demanda emergencial da nossa sociedade, além de um debate inadiável.  

O ilustre Senador Antero Paes de Barros, Relator da matéria, já demonstrou clareza e espírito público ao entender que a proposição não é meramente de um parlamentar na Oposição, mas uma exigência da maioria do nosso povo.  

As recentes declarações do Presidente FHC, se forem seguidas de coerente ação política e não de mera retórica, propiciarão aos mais de dez milhões de trabalhadores o ingresso no mercado de trabalho. Portanto, creio na viabilidade do projeto por mim apresentado, pois essa responsabilidade também está em nossas mãos, qual seja, a de começar a mudar a face do nosso País.  

Convoca as Sr as e os Sr s Senadores a serem agentes da construção de um Brasil mais justo, com mais emprego e dignidade para o nosso tão sofrido povo.  

Vamos aprofundar esse debate. Levá-lo a todos os cantos da Nação. Da rica capital paulista à mais humilde cidade deste País, à pequena São José do Tapera, no Estado da querida e ilustre Senadora Heloisa Helena, Alagoas.  

Finalizo lembrando Raul Seixas: "Quando se sonha um sonho só, é apenas um sonho. Mas quando se sonha um sonho junto, já não é mais sonho, é realidade".  

Tornemos o sonho realidade.  

A Sra. Heloisa Helena (Bloco/PT – AC) – V. Exª me concede um aparte?  

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT – RJ) – Pois não, Senadora.  

A Sra. Heloisa Helena (Bloco/PT – AC) – Senador Geraldo Cândido, quero parabenizá-lo não apenas pelo pronunciamento, mas pelo esforço gigantesco que tem feito nesta Casa no sentido de, através do aperfeiçoamento da legislação, minimizar os efeitos malditos, terríveis do desemprego na vida de milhões de trabalhadores deste País. Este não é o seu único projeto, como V. Exª afirma desta tribuna. V. Exª já nos deu o privilégio de acompanhar vários projetos apresentados na Comissão de Assuntos Sociais e neste plenário, que mexem diretamente com a situação de vida de milhões de trabalhadores deste País. V. Exª, que veio de um berço tão bonito, de tanta generosidade, persistência, perseverança, coragem e esperança, que é justamente o berço do movimento sindical, aqui, como Senador, faz questão de honrar essa tradição de coragem e de esperança. Como alguns nesta Casa, V. Ex

a sabe que o desemprego é a característica mais perversa de uma sociedade capitalista — desmantela estruturas domiciliares, joga pessoas na marginalidade como último refúgio, nas drogas, na prostituição infantil —, sabe muito bem que, só no Governo Fernando Henrique, mais de três milhões e trezentos mil postos de trabalho foram destruídos. É impossível a revitalização desses postos de trabalho, pela lógica formal do mercado. Exatamente por isso a importância do projeto de V. Exª, porque, por meio dele, poderemos efetivamente aumentar o número de oferta de empregos e, assim, minimizar os efeitos tão perversos desta sociedade capitalista. Portanto, fiz questão de estar no plenário para parabenizá-lo pelo pronunciamento e pelo esforço que V. Exª tem feito nesta Casa no sentido de aprimorar a legislação, minimizando os efeitos tão perversos na vida de milhões de trabalhadoras e trabalhadores neste País.  

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT – RJ) – Agradeço V. Exª pelo aparte, que incorporo ao meu pronunciamento. Sei que com V. Exª posso contar, porque é uma companheira, uma Senadora cuja origem também é muito parecida com a minha, dos movimentos sociais. Somos sensíveis a esse problema. Infelizmente, esse não é o caso de muita gente, tenho falado sempre isso, tenho chamado a atenção desta Casa, tenho conclamado sempre os Senadores a se juntarem a nós nessa luta. Mas continuamos fazendo o nosso trabalho.  

Apresentamos projeto de alcance social importante. Além deste, o da redução da jornada de trabalho, há também o projeto que dispõe sobre a gratuidade do passe livre para os desempregados. Assim como há para os idosos, também estou propondo, por meio de um projeto de lei, que seja também dado o direito ao desempregado do passe livre pela porta dianteira do ônibus, para que possa procurar emprego, enquanto perdurar o desemprego. Também proponho a isenção do pagamento na taxa de água, luz, esgoto, para o desempregado, e outros mais.  

Acredito que nós, oriundos do proletariado, como trabalhadores, como operários, temos sensibilidade, porque, na nossa origem, vivenciamos diretamente o problema, no dia-a-dia.  

Portanto, estou aqui representando a minha classe, a classe operária e a classe proletariada do nosso País. E o faço com muito orgulho.  

Muito obrigado, agradeço o aparte de V. Exª!  

Muito obrigado, Sr. Presidente!  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/06/2000 - Página 12186