Discurso durante a 75ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL E A PRECARIEDADE DE APLICAÇÃO DOS PROGRAMAS DE RENDA MINIMA ASSOCIADOS A EDUCAÇÃO. CRITICAS A EXPLORAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA INFANTIL EM EMPREGOS DOMESTICOS.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL E A PRECARIEDADE DE APLICAÇÃO DOS PROGRAMAS DE RENDA MINIMA ASSOCIADOS A EDUCAÇÃO. CRITICAS A EXPLORAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA INFANTIL EM EMPREGOS DOMESTICOS.
Publicação
Publicação no DSF de 10/06/2000 - Página 12283
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, TELEJORNAL, INEFICACIA, IMPLEMENTAÇÃO, PROGRAMA, RENDA MINIMA, RETORNO, CRIANÇA, TRABALHO, SISAL, ESTADO DA BAHIA (BA).
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), ASSUNTO, EXPLORAÇÃO, CRIANÇA, EMPREGADO DOMESTICO, REGISTRO, SEMINARIO, INICIATIVA, ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT), DEBATE, SOLUÇÃO, PROBLEMA.
  • NECESSIDADE, CAMPANHA, CONSCIENTIZAÇÃO, FAMILIA, COMBATE, EXPLORAÇÃO, TRABALHO, INFANCIA.
  • QUESTIONAMENTO, LUIZA ERUNDINA, DEPUTADO FEDERAL, CANDIDATO, PREFEITURA, MUNICIPIO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DECLARAÇÃO, OPOSIÇÃO, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA, RENDA MINIMA.
  • REITERAÇÃO, PROPOSTA, DEBATE, CONSULTA, POPULAÇÃO CARENTE, ESCOLHA, PROGRAMA, RENDA MINIMA, DISTRIBUIÇÃO, CESTA DE ALIMENTOS BASICOS.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Senador Carlos Patrocínio, Srªs e Srs. Senadores, o Jornal Nacional de ontem divulgou matéria a respeito do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. Em reportagem realizada na zona do sisal da Bahia, mostrou a precariedade da aplicação dos Programas da Bolsa-Escola, de Erradicação do Trabalho Infantil, de Renda Mínima associado à educação, e como isso tem levado inúmeras crianças de volta ao trabalho infantil.  

O jornal Correio Braziliense , em sua edição de hoje, publica importante matéria relacionada à exploração de meninas, destacando que "363 mil crianças trabalham como domésticas em casas brasileiras".  

Em comemoração aos dez anos de instituição do Estatuto da Criança e do Adolescente, realizou-se ontem, por iniciativa da Organização Internacional do Trabalho, em Brasília, um seminário para debater as formas de erradicação do trabalho doméstico infantil.  

Passo a ler trechos da matéria publicada no jornal Correio Braziliense : 

 

No seminário, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgou estudo sobre o assunto. Se debruçando sobre os dados colhidos pelo IBGE, em 1998, pesquisadores traçaram o perfil de trabalhadores domésticos até 16 anos e as conseqüências dessa exploração na vida das crianças.  

(...) As famílias das classes média e alta empregam atualmente no serviço doméstico quase 370 mil crianças com idade inferior a 16 anos. Esse universo representa 8% de todas as formas de trabalho infantil identificadas no país. Ter uma faxineira ou babá nessa faixa etária é uma ilegalidade tão grave quanto empregar garotos na colheita do sisal ou nas carvoarias ou no corte da cana-de-açúcar. Mas apesar de estar dentro de casa, aos olhos de todos, é uma exploração bem mais difícil de ser combatida.  

(...) As quase 370 mil crianças que vivem à beira do fogão ou do berço estão dispersas em lares que não são os seus. A grande maioria, 90%, é do sexo feminino; 62% são filhas de pais pobres, de cor parda ou preta; 90% têm entre 10 e 16 anos, e pouca escolaridade. Mais de dois terços delas estão nas regiões Sudeste e Nordeste. Em números absolutos, o Centro-Oeste tem o menor contingente: 38.336 garotas. A região, porém, tem uma segunda maior taxa de incidência de trabalho infantil dentre as empregadas domésticas. As garotas representam, aqui, 36% delas. A média nacional é de 20%.  

"O trabalho doméstico das crianças se tornou um vazio na nossa luta contra o emprego infantil. Uma lacuna mais melindrosa e de difícil apreensão do que a evidência do perigo nas carvoarias", diz a coordenadora da pesquisa do Ipea, Lena Lavinas, que defende a criação de campanhas de conscientização das famílias que empregam crianças.  

Esse vazio, segundo o estudo, é motivado por hábitos antigos da sociedade brasileira e por conceito de valores pouco discutidos, embora bastante polêmicos. Lena lembra que entre as famílias de renda mas baixa ainda são comuns a "entrega de crianças para criar" e a responsabilidade precoce das meninas nos afazeres da casa. Ajudar a mãe no cotidiano do lar é, mais do que um trabalho, um ato de solidariedade familiar.  

"Diante dessas realidades, a patroa se sente até generosa em abrigar uma garota como empregada. Nenhuma outra forma de exploração tem uma questão de ética do trabalho tão polêmica. Não podemos simplesmente proibi-lo", diz o diretor-adjunto da OIT no Brasil, Jaime Mezzera. A OIT, porém, ressalta que, embora de forma bem mais sutil, as garotas empregadas no serviço doméstico são tão vítimas de violência quanto as que trabalham em outras áreas. "A exploração sexual da doméstica e a separação da família são violências com conseqüências para o resto da vida", ressalta Lena.  

O estudo também comprovou que as meninas são submetidas a jornadas de trabalho tão extensas quanto a dos adultos. Três mil garotas com menos de 10 anos trabalham 21 horas por semana, contra 14 horas das demais crianças da mesma idade ocupadas em outros empregos. A jornada aumenta à medida que elas crescem. Dos 10 aos 16 anos, chegam a trabalhar 36 horas semanais. (...)  

A extensa jornada tem reflexo na baixa escolaridade. A pesquisa constatou que o atraso escolar das meninas empregadas domésticas aumenta, ao passo que vem caindo para as demais crianças – inclusive entre as ocupadas. "Podemos concluir que o emprego doméstico é incompatível com a formação escolar", diz a coordenadora do estudo. Cerca de dois terços das meninas que residem no trabalho não freqüentam escola. Entre as que moram com suas famílias, mais de 30% não freqüentam a escola – um índice de evasão escolar que é quase o dobro da média nacional, de 17%.  

"Sem estudo elas não conseguem outro emprego. Algumas nem conseguem se manter como doméstica, pois as exigências para essa profissão estão cada vez maiores", diz a pequisadora do Ipea Ana Lúcia Sabóia. O problema é que, diante da necessidade de aumentar a renda da família, as garotas não têm escolha. E, diante das opções de trabalho, o emprego doméstico é o mais atrativo, porque tem a remuneração mais alta. No Distrito Federal, por exemplo, elas ganham 93% de um salário mínimo – outras ocupações de crianças pagam 83% de um mínimo.  

"É realmente a melhor opção para quem precisa trabalhar cedo, mas não se pode dizer que o emprego seja uma escolha", diz a presidente do Sindicato das Empregadas Domésticas de Salvador, Creusa Oliveira, 43 anos de idade e 33 de profissão. Hoje existem mais de quatro milhões de empregadas domésticas no País. Muitas entraram no mercado de trabalho em idade precoce, passaram pelas dificuldades constatadas no estudo do Ipea e hoje estão na mesma profissão, embora com uma remuneração mais alta.  

Baiana, de Morro do Chapéu – a 400 quilômetros de Salvador –, Selma Fernandes de Jesus, hoje com 27 anos, começou a trabalhar aos oito, na colheita do sisal. Executava a mesma tarefa dos seus pais e dos nove irmãos. Mas, aos 13 anos, ela insistiu e convenceu seu pai a mandá-la para uma casa de família em Salvador. (...)  

Sua vida, no entanto, não melhorou. Em Salvador, Selma não tinha um salário fixo nem recebia mensalmente. "Chegava a ficar cinco meses sem receber nenhum centavo. Quando a patroa depositava, só pagava um ou dois meses", conta.  

Selma trabalhava da hora em que acordava (6h) à hora de dormir (22h), somando 112 horas semanais. Nesse período, de cinco anos, Selma tentou voltar a estudar. Começou a cursar a primeira série, mas nem terminou o ano porque não conseguiu conciliar estudo e trabalho. "A dona da casa fazia muita confusão. Não agüentei a pressão". Hoje, quinze anos depois, Selma é diarista em Brasília e ganha cerca de R$600,00 por mês. Sua escolaridade não evoluiu da primeira série, mas ela se considera uma vitoriosa. "Tenho muito mais do que meus pais. Posso poupar meus filhos das dificuldades que enfrentei".  

 

Assim, Sr. Presidente, esse estudo, que peço seja transcrito, com os dados sobre a renda média de empregadas domésticas e de outras atividades no Brasil realizadas sobretudo por crianças, demonstra a importância de garantirmos a todas as famílias brasileiras o direito a um complemento de renda, na forma dos programas de Renda Mínima e Bolsa-Escola.  

Gostaria de transmitir à Deputada Luiza Erundina, por quem tenho grande estima - torço para que estejam Luiza Erundina e Marta Suplicy, o PT e o PSB, na reta final, em outubro próximo –, a estranheza que me causou a observação que fez, em entrevista à Folha de S.Paulo , há dois dias, de que não daria prioridade ao Programa de Garantia de Renda Mínima.  

Lembro que, em 1996, quando candidata pelo Partido dos Trabalhadores, Luiza Erundina defendeu, em seu programa, a renda mínima, que agora qualificou de neoliberal e não-prioritária, alegando que não haveria recursos suficientes. Ser contrário à renda mínima por ter sido defendida por economistas neoliberais é semelhante a ser contra o Imposto de Renda, porque é usado pelos países capitalistas.  

Luiza Erundina é uma entusiasta da Attac – Associação pela Taxa Tobin sobre as Transações Financeiras Internacionais. Justamente o Nobel de Economia James Tobin é o mais eminente entre todos os defensores ativos de uma renda garantida para todos os cidadãos.  

Dizer que São Paulo é incapaz de prover a renda mínima é aceitar o argumento dos governos que, há anos, vêm adiando a implantação em todo o País do programa. Se Campinas, Distrito Federal, Ribeirão Preto, Belo Horizonte, Belém – que aplica 2,7% do orçamento no Programa Bolsa-Escola – e outros demostraram ser possível, São Paulo é justamente o Município que mais tem condições de dar o exemplo.  

Gostaria, ainda, de ressaltar, no que diz respeito à polêmica relacionada ao dilema de distribuir cestas básicas ou uma renda como um direito à cidadania, que esse tema precisa de uma discussão aprofundada, sobretudo com os próprios potenciais beneficiários dos programas.  

Reitero a proposta que fiz ao Senador Maguito Vilela, de que, em todos os locais onde se considera instituir o programa de renda mínima ou bolsa-escola, seja feito um debate no sentido de esclarecer as pessoas e, em seguida, uma consulta para averiguar se preferem o benefício na forma de uma cesta básica ou de uma renda mínima. Tenho a convicção de que o povo, por larga margem, vai preferir escolher como gastar a deixar o Governo definir o que deve comer.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

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SEGUE DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.  

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/06/2000 - Página 12283