O SR. RONALDO CUNHA LIMA (PMDB - PB) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, queira Deus o eco das nossas vozes, tantas e reiteradas vezes levantadas nesta Casa em defesa de um sonho mais que centenário, possa, enfim, ter sido escutado. Refiro-me, caros colegas, ao Projeto de Transposição de Águas do Rio São Francisco.  

Finalmente, pelo que noticiou a grande imprensa neste final de semana, o Presidente Fernando Henrique anunciou, com convicta disposição, a decisão política do seu Governo em iniciar as obras desse projeto que não transpõe apenas águas para o sedento e sofrido semi-árido nordestino – o que por si já seria plenamente justificável - mas, também, e concomitantemente, cuidará da correção de trechos e da navegabilidade do Velho Chico e do umidecimento de suas calhas fluviais secas, permitindo o restabelecimento da flora e da fauna nativas.  

Essas medidas, acrescidas de providências que objetivem a imediata recomposição das matas ciliares e o aproveitamento ordenado de suas várzeas pelos pequenos produtores rurais, certamente que serão respostas não somente aos problemas do rio São Francisco, mas, sobretudo, serão respostas irrefutáveis às inúmeras discordâncias levantadas e defendidas por alguns dos Senadores com assento nesta Casa.  

Ademais, são absolutamente questionáveis as afirmações de que os problemas do assoreamento do rio e a destruição de suas matas ciliares seriam agravados após as obras da transposição. Levantamento recentemente concluído pelo Ministério da Integração Nacional aponta a expansão descontrolada da agricultura na bacia do São Francisco como responsável pelo desmatamento e assoreamento do rio. O mesmo estudo conclui que a construção das barragens da CHESF motivaram as erosões e o assoreamento da foz.  

Todas essas ações paralelas, mas igualmente prioritárias, serão desenvolvidas a partir da implementação de um amplo programa de revitalização do São Francisco, em fase final de elaboração pelo Ministério da Integração Nacional.  

A transposição, parafraseando o que já lhes disse em pronunciamento anterior: é um projeto que desencalha sonhos e extingue angústias. Além de estabelecer uma ação sócio-ambiental sem paralelos em nossa história recente, será, com efeito, a moldura de uma nova paisagem e o limiar de um tempo novo, de há muito retratado mas nunca antes vivido.  

A transposição é inadiável e não se pode mais esperar. Ou se transpõem águas do São Francisco, ou até do Tocantins, para salvar o Nordeste, como sábia e muito apropriadamente deseja e defende o ilustre Senador Eduardo Siqueira Campos, agora seguido em semelhante senso de oportunidade e clarividência pelo próprio Presidente Fernando Henrique, ou os nordestinos continuarão a transpor suas fronteiras, numa torrente etíope de retirantes que saem das nascentes da miséria na busca, quase sempre vã, do pão, da paz e da vida.  

Estou certo, contudo, nobres colegas, que esse canto de dor ou hino plangente haverá de se espalhar - aqui e em todo canto, e aí ouvir-se-á, sem muito espanto, o grito redentor do nordestino. E, mais, que todas essas resistências possam, enfim, ceder lugar à justeza social da obra, à oportunidade histórica e imorredoura do gesto e à irrefutável consistência técnica dos trabalhos exaustiva e cuidadosamente elaborados.  

Sinto, entretanto, para enfado d’alma e inquietação da heróica fé e esperança nordestinas, que relutâncias ainda persistem neste colendo Plenário. Em decorrência, obrigo-me a perseverar na discussão e buscar, junto aos meus pares, arrimado em estudos elaborados pelo corpo técnico do Ministério da Integração Nacional, o convencimento de que a execução do Projeto de Transposição de Águas em nada prejudicará o rio São Francisco, senão vejamos:  

Haverá um aumento da garantia de água no semi-árido setentrional. Hoje, mesmo considerando a construção dos açudes previstos ou que faltam para a região, só é possível dispor de 3% da água garantida para um contingente superior a 30% da população do semi-árido, na área do Projeto;  

Não haverá nenhum prejuízo ao São Francisco, no tocante ao seu volume d’água, dada a baixa vazão a ser retirada. O único prejuízo, na verdade, ocorrerá sobre a geração da CHESF e eqüivalerá a 3% da demanda atualmente produzida, mas somente a partir de 2010, quando todas as bombas estiverem instaladas;  

Esse prejuízo, por seu turno, será facilmente compensável com a futura construção do Parque Térmico a Gás Natural, previsto no Plano 2015 da ELETROBRÁS (três usinas já em implantação) e com a geração da 2a. etapa de Tucuruí;  

Ressalte-se, e chamo a atenção das Senhoras e dos Senhores Senadores para o fato de que os Estados do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte já consomem, hoje, 25% da água do rio São Francisco na forma de energia: e o que desejam, entretanto, é utilizar apenas 10% desse valor sob a forma de água, substituindo a energia por outras fontes;  

Na verdade, e é preciso que isso seja dito, a Transposição já foi feita pelas linhas de transmissão de energia da CHESF. Trata-se de um impacto energético não sobre o rio São Francisco, mas sobre todo o Nordeste e o País, já que o Sistema Elétrico Nacional é interligado;  

Um outro fator desmistificador das teses contrárias ao Projeto é que a transposição fica à jusante 200 km da barragem de Sobradinho - que regulariza o São Francisco. Não causando, obviamente, nenhuma interferência quanto ao uso da água à montante de Sobradinho (Minas Gerais e Bahia), tampouco no trecho navegável do rio – que termina em Petrolina.  

Se não bastassem os argumentos já perfilados e, certamente já suficientemente esclarecedores dos equívocos que se transformaram em "intransponíveis" obstáculos para materialização desse sonho que não se sonha só, é que o Projeto melhorará a qualidade da água dos açudes e promoverá uma sinergia hídrica representada pela água que deixará de ser evaporada. Vejam os senhores que para cada m³ de água bombeada do São Francisco haverá um ganho de outro tanto obtido dos açudes, vez que esses poderão operar muito mais eficientemente do que sem a Transposição.  

Há, ainda, um outro dado a ser enfocado: é que a obra beneficiará em diversos fatores que repercutem diretamente na melhoria da qualidade de vida, uma população de cerca de 7 milhões de pessoas. O equivalente a mais de 1/3 dos habitantes do semi-árido nordestino. Tornando, por conseguinte, absolutamente legítima e incontestável a afirmação de que não há no âmbito do Governo Federal nenhum outro projeto planejado para o Nordeste, que seja tão abrangente e lhe traga tantos benefícios sociais.  

Pois bem; louvável, sábia e oportuna a decisão do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Assim como se torna imperativo de registro a destacável contribuição do Ministro Fernando Bezerra e sua equipe, para que chegássemos a esse instante histórico da vida nacional. Registre-se, de igual forma, a não menos meritória contribuição dos ex-Ministros: Aloísio Alves, Cícero Lucena e Fernando Catão, Ovídio de Angelis, só para falar nos que mais recentemente deram suas parcelas de colaboração para ensejar ou tornar real essa cruzada nordestina que vem desde o engenheiro cearense Tristão de Lima, em l866, até os dias atuais.  

Se a minha oração - quase em tom de súplica - e os esclarecimentos às dúvidas e aos questionamentos técnicos reiteradamente trazidos à essa Casa pelos que democraticamente divergem do Projeto, não os tenha convencido, cumpre-me, embalado na mesma crença e convicção, pedir amparo e socorro à eloqüência, ao talento e ao conhecimento de quantos – e não são poucos - companheiros Senadores que dividem comigo, nesta Casa, a defesa desse inadiável e indispensável Projeto.  

Estou certo e confiante que sobrarão vozes em apoiamento não a mim, tampouco ao meu modesto discurso, mas à causa que por sua longevidade, necessidade e justeza, conclama-nos à consciência dos compromissos públicos que todos e cada um assumimos nas praças públicas pela defesa dos que vivem a mercê da miséria e à sombra insone e ameaçadora do infortúnio e da autodestruição.  

Busco concluir! Devo certificar-lhes, contudo e nesse propósito, que o Relatório de Viabilidade Técnico-Econômica já está sendo editado e deverá estar disponível para consulta após sua divulgação, fato que deverá ocorrer até o final deste mês.  

Já o Relatório dos Estudos Ambientais (EIA-RIMA) tão exaustivamente cobrado nesta Casa e fora dela, também deverá ser entregue ao IBAMA nos próximos dias e caberá ao IBAMA a responsabilidade por sua aprovação.  

O custo estimado ou previsto é da ordem de 2,8 bilhões, o equivalente ao gasto do Governo Federal com as Frentes de Emergência na última seca. Assim, conclui-se, facilmente, que o Projeto será pago apenas com as despesas que deixarão de ocorrer no futuro – com as Frentes – durante as próximas e previsíveis secas.  

Esses recursos, Sras. e Srs. Senadores, serão suficientes para a construção dos Eixos Norte e Leste. Os canais desses eixos estão projetados para uma vazão de 99m³/s e 28m³/s, respectivamente. A vazão máxima real será 10% inferior a essas pois não haverá bombeamento na hora do pico de energia elétrica – de 18:00 às 22:00horas. Já a vazão média bombeada será da ordem de 64m³/s, vez que não haverá bombeamento quando os açudes estiverem razoavelmente cheios.  

Esses números estão longe de causar espécie ou alarme. Tal vazão, na verdade, equivale a nada mais do que 3% do volume disponibilizado no rio São Francisco pelo reservatório de Sobradinho que, como já disse, regulariza o rio. Trata-se, pois, de um Projeto que transportará volumes: as vazões variáveis em função da necessidades (ocorrência ou não de secas).  

Devo concluir! Mas meus ouvidos atentos parecem ouvir vozes surdas inquirindo-me sobre as obras de Engenharia, ou de pedra e cal como me acostumei a chamar quando fui Prefeito da bela e pujante Campina Grande.  

Responder-lhes-ei, é certo! O Projeto básico de Engenharia está sendo elaborado e será concluído até o final do ano. Esse Projeto juntamente com a Licença do IBAMA permitirá a licitação das obras ainda neste exercício de 2000 ou até fevereiro de 200l, como nos informou a Assessoria do Ministério da Integração Nacional.

Já não falta mais vontade ou determinação política para realização da obra. Falta, sim, o equacionamento das divergências predominantes, a aliança dos Estados nordestinos, pois a Transposição há que ser encarada como solução e nunca como problema. Ela será, sem dúvida, a mais venturosa e saneadora ação para o combate ao mais crônico e aflitivo problema do Nordeste – a falta d’água.  

O encontro de hoje entre os Governadores dos Estados beneficiados e o Ministro Fernando Bezerra, haverá de se transformar num verdadeiro e indissolúvel Pacto em defesa da Transposição do São Francisco . 

Hoje, também, e neste preciso momento, está sendo apresentado na Câmara dos Deputados o parecer do Grupo de Trabalho sobre a Transposição do São Francisco, pelo competente e ilustre Deputado paraibano, Marcondes Gadelha.  

Em seu consubstanciado e irretocável parecer, o eminente Deputado e ex-Senador Marcondes Gadelha conclui, entre outros aspectos, que o balanço hídrico do Nordeste, se deixado apenas por conta da natureza, jamais voltará ao equilíbrio. E que a importação de água seria a única forma capaz de regular ou solucionar esse desequilíbrio, sendo que o manancial mais próximo, mais abundante, de acesso mais barato e de menor impacto ambiental é o rio São Francisco.  

Ainda em seu parecer, o Deputado Gadelha afirma que a Transposição do São Francisco é obra inadiável e deve integrar um grande projeto hídrico estruturante para a região, onde se inclui a revitalização do rio e a sua interligação com a bacia do Tocantins.  

Concluo, Sr. Presidente, colegas Senadores, afirmando que a Transposição é um sonho acalentado por milhões de nordestinos e a sua materialização, agora firmemente prenunciada, mudará a paisagem, a vida e a história daquela gente heróica, que suplanta através da crença e da fé as agruras e vicissitudes do seu quase sempre fastidioso dia-a-dia.  

Serão os rios persistindo em seus caminhos. A bonança tomando o lugar do flagelo. A esperança e a fé, sempre presentes nos corações nordestinos, abrindo passagem para um novo e alentador tempo.  

Os açudes, e quem sabe até as mesas, estarão doravante fartos e generosos. E o povo de sorrisos abertos, não lembrará jamais da angústia e do sofrimento perene, símbolos de sua bravura e de sua resistência.  

A Transposição de Águas do Rio São Francisco é irrecusável. Essa obra é, repito, inadiável. O Projeto pode e deve começar já, pois, como iluminadamente sentenciou o poeta Vandré: Quem sabe faz a hora não espera acontecer!  

Muito obrigado.  

V