Pronunciamento de Ronaldo Cunha Lima em 27/06/2000
Discurso durante a 84ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
HOMENAGEM AO CENTENARIO DE NASCIMENTO DO PROFESSOR ANISIO TEIXEIRA.
- Autor
- Ronaldo Cunha Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
- Nome completo: Ronaldo José da Cunha Lima
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- HOMENAGEM AO CENTENARIO DE NASCIMENTO DO PROFESSOR ANISIO TEIXEIRA.
- Publicação
- Publicação no DSF de 28/06/2000 - Página 13845
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
-
- HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, ANISIO TEIXEIRA, PROFESSOR, ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, RENOVAÇÃO, EDUCAÇÃO, BRASIL.
O SR. RONALDO CUNHA LIMA
(PMDB - PB) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, ao celebrarmos, nesta Sessão Solene, o centenário de nascimento do Professor Anísio Spínola Teixeira, temos o ensejo de homenagear a memória de um dos mais importantes educadores brasileiros de todos os tempos. Pois o mestre baiano, reconhecido como grande atualizador e reformador do ensino em nosso País, imprimiu sua contribuição tanto no mister educacional quanto nos campos filosófico e cultural.
Anísio Teixeira manteve linear a convicção de que, para se exercer a democracia, é imprescindível preparar democratas; e frisava que somente se preparam democratas através da educação. Com efeito, a educação transforma o homem, daquilo que ele é, naquilo que ele deve se tornar, valorizando-o ao fazê-lo desenvolver suas potencialidades. Quando não consegue estudar, um ser humano fica desprovido de sua verdadeira dimensão. Daí por que Anísio Teixeira enfatizava que homens livres se formam por meio da educação; e que o enfraquecimento da democracia costuma vicejar em Estados inertes e apáticos no tocante às prerrogativas educacionais do seu povo. Sob este prisma, não é difícil conciliar a educação e a cultura numa órbita comum, porque os desígnios de ambas eliminam os contrastes nas aproximações, malgrado tenham elas valorações específicas. Para soerguer uma cidadania lúcida no atinente a seus direitos e deveres, a educação e a cultura são duas vertentes de realidade única.
Admitamos que a educação, sendo passiva, depende dos elementos fornecidos pela cultura. Nessa linha conceptiva, é a cultura, na plena implicação dos resultados que incrementa no contexto societário, que desperta valores, os quais são a seguir incorporados pela educação. Por essência, a cultura é revolucionária e a educação é conservadora. Sendo assim, o ideal é aquilo que preconizou Anísio Teixeira: sistematizar a educação sem permitir que dita sistematização se oponha à natureza da cultura. Noutras palavras, pertence à cultura o ato criador, justificante do desenvolvimento, responsável pelas artes e pela intelectualização das experiências; e pertence à educação o ato transmissor, já materialmente acoplado ao saber. Em suma, a educação transmite o que a cultura cria. Nem haveria de ser diferente, se é pela cultura que a educação começa: a educação é a cultura escolarizada na sua modalidade transescolar que se compõe com instrumentos de comunicação cultural.
Anísio Teixeira assinalou que a educação e a cultura não podem ser planejadas sem visão de futuro; e que, por isto, as decisões nas áreas educacional e cultural acarretam inevitável carga política na escolha das opções: a fórmula terminal de asfixia do tirocínio administrativo são as diretrizes abúlicas em aludidas áreas. Com essas noções de operosidade, lutou para implantar uma educação ao alcance de todos, no afã de levar às escolas e às universidades, camadas da população brasileira que não tinham acesso a elas. Jamais tergiversou na crença de que, com o progresso, ganha funcionalidade o que se aprende nas escolas e universidades, sendo pertinente usá-las como instituições aprofundantes do referido progresso; e jamais abdicou da certeza de que a educação promove as pessoas, eliminando as situações de iniqüidade e ajudando na superação das circunstâncias infra-humanas. Portanto que, para ele, educar era o respeito à dignidade e à autodeterminação dos indivíduos em seu total dimensionamento. Veja-se que o legítimo sentido da educação está associado a um ato libertário; e que este adestramento da liberdade contém sólido propósito regenerador das disparidades sociais injustas. Basta lembrar que os sistemas educacionais possuem vasto potencial para induzir mutações socioeconômicas, atenuando ou acabando sofrimentos, desajustes e dramas individuais.
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, pela ação vigorosa de Anísio Teixeira, primeiro como Diretor-Geral de Instrução e depois como Secretário da Educação e Cultura do antigo Distrito Federal, acentuaram-se de modo positivo as influências das idéias e técnicas pedagógicas norte-americanas (além de Bacharel em Direito, ele se graduara em Ciências da Educação pela Universidade Columbia, onde foi discípulo de Jonh Dewey), e tiveram avanços marcantes os serviços educacionais pelo surgimento de instituições de largo alcance, bem assim pelos processos inovadores de administração escolar e pela mais criteriosa aplicação dos métodos científicos à problemática educacional. Entre 1932 e 1935, Anísio Teixeira pôs em execução iniciativas e reformas com as quais infundiu magistral impulso ao ordenamento escolar do então Distrito Federal, dando-lhe, pelo bloco de medidas adotadas, uma latitude de providências cujo ineditismo logo assumiu feição modelar para o restante do País. Sobretudo modelar pela maneira de entender o labor educacional: uma tarefa de tamanha magnitude que nela improcedem posturas absenteístas.
Com a pujança criativa de sua personalidade empreendedora, Anísio Teixeira ampliou o complexo escolar, deixando-o quanto possível completo. Entrementes, enriqueceu o programa escolar e a especialização dos professores primários para melhor colocar em prática as metas formuladas; nivelou o ensino técnico e profissional ao ensino secundário, articulando-o com o secundário geral, a fim de permitir sua equivalência cultural e a transferência de alunos de um para outro curso; reorganizou o ensino normal com o fito de erguer a formação profissional do mestre a nível superior, tendo como base os estudos propedêuticos; remodelou o aparelhamento técnico dos serviços de administração do ensino, objetivando habilitá-los a preencher as suas funções técnicas, administrativas e de pesquisa científica; e criou, em 1935, a universidade do à época Distrito Federal. Outrossim, de 1946 a 1947, foi Conselheiro para o ensino Superior na UNESCO, em Londres; foi ainda Diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos e catedrático de Administração Escolar na Faculdade Nacional de Filosofia. Por último, após ter sido o autor intelectual do projeto da Universidade Brasília, foi o seu primeiro reitor.
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores: Sintetizando e rematando a notável e paradigmática trajetória do educador Anísio Spinola Teixeira no transcurso do seu centenário de nascimento, podemos pinçar das idéias que cultivou como autor de obras do quilate de "Vida e Educação", "Em Marcha para a Democracia" e "A Educação e a Crise Brasileira", uma coesão instigante. Coeso a ponto de ainda instigar pelas etapas da trilha que pavimentou, o ideário pedagógico por ele exercitado é passível de exegeses variegadas; e uma das interpretações que talvez fosse viável tentar seria esta:
A par da instrução (que nos adestra para o profissionalismo) e da educação (que aperfeiçoa nossas vocações), temos um terceiro agente que é a cultura (fonte do conhecimento generalizante). Conhecer é transitar pelo caminho que conduz ao esclarecimento: um ser humano esclarecido descobre em si mesmo a capacidade de compreender; e é a compreensão que fornece os dados subjetivos para ele se solidarizar com os percalços do grupo no qual está integrado. Porquanto disporá dos recursos que a participatividade aponta para conscientizá-lo do que se intitula espírito público. Sendo espírito público a denominação daquilo que transforma o homem-indivíduo em homem-plural: noutras palavras, cidadão sensível ao solucionamento das penúrias da sociedade.
Eis, Senhoras e Senhores Senadores, o contributo modesto com o qual procurei nesta oportunidade enaltecer a relevância de Anísio Teixeira para a educação brasileira; relevância de um mestre por excelência, cujo legado educacional hoje muito justamente reverenciamos aqui no Senado da República.
Muito obrigado.