Discurso durante a 89ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ALERTA PARA A POSSIBILIDADE DE QUE OS ACIDENTES AMBIENTAIS ENVOLVENDO A PETROBRAS SEJA UMA TRAMA PARA DESMORALIZAR A EMPRESA E JUSTIFICAR A SUA PRIVATIZAÇÃO. CRITICAS A ATUAL DIRETORIA DA PETROBRAS.

Autor
Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE. PRIVATIZAÇÃO.:
  • ALERTA PARA A POSSIBILIDADE DE QUE OS ACIDENTES AMBIENTAIS ENVOLVENDO A PETROBRAS SEJA UMA TRAMA PARA DESMORALIZAR A EMPRESA E JUSTIFICAR A SUA PRIVATIZAÇÃO. CRITICAS A ATUAL DIRETORIA DA PETROBRAS.
Publicação
Publicação no DSF de 02/08/2000 - Página 15515
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE. PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ACIDENTES, PREJUIZO, MEIO AMBIENTE, RESPONSABILIDADE, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), SUSPEIÇÃO, SABOTAGEM, OBJETIVO, PRIVATIZAÇÃO.
  • DENUNCIA, DIRETORIA, ECOLOGIA, IMPUNIDADE, RESPONSAVEL, INSUFICIENCIA, MÃO DE OBRA, OLEODUTO, POLITICA, REDUÇÃO, QUADRO DE PESSOAL, TERCEIRIZAÇÃO.
  • DEFESA, DEMISSÃO, DIRETORIA, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho certeza, a História julgará a direção da Petrobrás, pouco comprometida com o nosso meio ambiente. Assim finalizei o meu pronunciamento no dia 29 de junho deste ano. Mas me sinto na obrigação de retomar o assunto, devido aos recentes acontecimentos envolvendo aquela que é a nossa maior empresa, patrimônio de todo o povo brasileiro.  

Como todos se recordam, o vazamento do dia 18 de janeiro de 2000 causou um estrago imenso na Baía de Guanabara. Lembro que, naquela época, a Associação dos Engenheiros da Petrobrás – Aepet - chegou a levantar a possibilidade de haver uma sabotagem contra a empresa para poder justificar a sua privatização, ou seja, haveria um processo para desmoralizar a empresa e, a partir daí, privatizá-la. Isso não parece nenhum absurdo, porque os acidentes têm se tornado uma rotina na Petrobrás. Após o acidente de janeiro, ocorreram vários acidentes no período de cinco meses. Assim nos parece que a teoria dos engenheiros da Aepet começa a tomar corpo, porque é impossível que dentro de uma empresa que tem um corpo de segurança treinado possa haver tantos acidentes em tão curto espaço de tempo.  

Os danos ambientais causados pelos acidentes serão pagos pelo contribuinte. As multas da Petrobrás aplicadas em virtude dos acidentes estão sendo pagas pelo povo brasileiro. Portanto, é importante chamar a atenção desta Casa e da Nação brasileira para a possibilidade de uma trama para desmoralizar a empresa e justificar a sua privatização.  

"O custo dos danos ambientais é maior ou menor que o de evitá-los, preveni-los?" A indagação feita pelo jornalista Washington Novaes, em artigo publicado no dia 28 de julho no Jornal O Estado de S.Paulo , é bastante pertinente. O texto apresenta dados bastante interessantes sobre a questão em foco.  

"O Ministério do Meio Ambiente, Ibama, Ipea e um conjunto de centros de pesquisa de universidades brasileiras vão juntar esforços para saber quanto vale o patrimônio biológico brasileiro, que uma estimativa preliminar do Ibama avalia em R$4 trilhões, ou seja, cinco vezes o produto interno anual do País. Não há o que se estranhar, pois o Brasil detém entre 10% e 20% da diversidade biológica do Planeta. Cabe perguntar quanto custará tudo isso para a empresa – as multas, as reparações de danos e a paralisação de atividades – e se esse custo será maior ou menor do que teria sido preciso aplicar para evitá-lo e preveni-lo."  

Novaes também cita-nos alguns exemplos na área do petróleo ocorridos no exterior:  

"No Equador, intensifica-se o noticiário de que a exploração na selva deste País gera níveis insustentáveis de contaminação do ar e das águas e eleva o número de abertos e de câncer. Na Nigéria, pela segunda vez em poucas semanas, explode um oleoduto e mata pelo menos 40 pessoas, provavelmente por furtos de combustível. No primeiro acidente, morreram 300 pessoas. Na Europa, as seqüelas do despejo de 40 mil toneladas no mar da Bretanha pelo petroleiro Erika levou a União Européia a tratar de regras mais rígidas para o licenciamento de navios que trafegam em águas dos países-membros. Já se fala até em proibição de tráfego de petroleiros de casco simples, incapazes de resistir à rachadura e ao vazamento. E estudam-se novos padrões mínimos de classificação para embarcações a serem seguidos pelas sociedades classificadoras."  

Aliás, os critérios internacionais de certificação precisam de urgente reavaliação. Um pouco antes do vazamento de quase 4 milhões de litros de óleo no rio Iguaçu, no Paraná, a Refinaria de Araucária recebeu um selo ISO 14.001, mas esse prêmio ambiental foi manchado por esse acidente. Logo após mais uma tragédia, o Ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, informou à imprensa que "pesadas multas" foram aplicadas à Petrobrás, cerca de 150 milhões de reais. Cabe uma pergunta: quem na verdade vai arcar com essa despesa? Evidentemente, o cidadão contribuinte irá pagar mais uma conta, que representa o descaso e a incompetência da Direção da Petrobrás.  

Ainda sobre a política de multas, gostaria de dizer que uma enquete foi realizada pelo jornal Gazeta Mercantil e publicada na última segunda-feira. A pergunta era: "A aplicação de multa milionária à Petrobras encerra o caso do vazamento de óleo no Paraná?" Dos internautas consultados, 71,4% disseram que não; 11,9% afirmaram ser necessário indenizar todos os prejudicados e 3,9% responderam que sim, pois, segundo eles, foi uma fatalidade e a Petrobrás precisa continuar servindo o país. Os outros 12,8% deram outras respostas. A consulta teve 603 participações.  

Para a Associação dos Engenheiros da Petrobrás - Aepet, as causas do vazamento que poluiu os rios Barigüi e Iguaçu foram as mesmas que provocaram o derramamento de óleo na Baía de Guanabara. A afirmação está contida no documento que a Aepet transformou em "press-release" e encaminhou aos grandes jornais do eixo Rio – São Paulo. Desprezado pela grande mídia, o texto assinalou que a "repetição de falhas absolutamente idênticas indica o descaso com que o presidente, os diretores e os conselheiros da estatal tratam a questão ambiental."  

O trabalho alinhava as falhas ocorridas nos dois casos (o primeiro no duto que liga a Refinaria Duque de Caxias à Ilha d´Água e o segundo na Refinaria Getúlio Vargas, no Paraná) e sustenta que é preciso punir severamente os que não sabem preservar o patrimônio público, "ainda mais quando, segundo o noticiário da imprensa, os responsáveis pela omissão recentemente se autoconcederam aumento de 100%". O trabalho explica que o sistema automático de verificação de pressão não funcionou e que há carência de mão-de-obra para acompanhar a transferência de óleo combustível, tanto na Reduc quanto no terminal São Francisco do Sul, em Santa Catarina. Tudo isso foi denunciado pelos sindicatos de petroleiros do Rio de Janeiro e do Paraná. De acordo com o documento, após o desastre da Baía de Guanabara, o Presidente da estatal, Henri Philipe Reichstul, chamou para si a responsabilidade sobre a questão ambiental. Depois do acidente do Paraná, por coerência, não deveria autodemitir-se?  

Para se ter uma idéia do descaso total da direção da empresa com a preservação ambiental, gostaria de lembrar e apresentar nesta tribuna o documento "O novo desafio começou", Plano Estratégico do Sistema Petrobras 2000/2010, Esse documento, elaborado pela direção da Petrobrás antes do desastre da Baía de Guanabara, fala em ambiente de negócio, e não em defesa do meio ambiente. Há previsão de um projeto, até o ano 2010, de crescimento e rentabilidade, porém nada existe sobre a questão ambiental, ou melhor, para não passar em branco, o material traz uma linha sobre o assunto: "respeito e preservação ao meio ambiente".  

Ocorrido o acidente, a direção da Petrobrás realizou um seminário e preparou o documento "Programa de Excelência em Gestão Ambiental e Segurança Operacional", que classifico como bonita peça de marketing, porque não tem nada importante sobre a defesa do meio ambiente. Fez isso só para justificar a sua posição e dizer à sociedade que a Petrobrás tem respeito à preservação ambiental. Até o momento, a empresa só investiu 30% do que prevê o programa, que estipulou para este ano investimentos da ordem de 619 milhões de reais. Cerca de 180 milhões de reais foram destinados basicamente ao Rio de Janeiro; nas demais unidades de refino, a manutenção continuou no mesmo ritmo.  

Sr. Presidente, caso não ocorresse o grande desastre do Paraná, a direção da Petrobrás iria, certamente, descumprir o seu próprio programa ambiental. E não foram poucos os acidentes. Segundo a organização SOS Mata Atlântica, desde o dia 17 de dezembro do ano passado, sete acidentes foram provocados pela Petrobrás, os quais ocorreram em Salvador, Rio de Janeiro, São Sebastião, no litoral paulista, e Paraná. Além dos dados citados, o Sindipetro do Rio de Janeiro denunciou outros dois acidentes no Maranhão e no Amazonas.  

Na semana passada, em um duto enterrado a um metro de profundidade, no Município de Paracambi, no Rio de Janeiro, houve um vazamento da substância tóxica MTDE, um aditivo da gasolina, proibido no Rio de Janeiro. Essa constância de tragédias anunciadas tem uma causa objetiva. A política de redução de pessoal da empresa, fato constantemente denunciado pelos sindicatos, como o do Paraná. Segundo informações do Presidente do Sindipetro Paraná, Carlos Seidel, em 1995, a Repar tinha 900 trabalhadores e, no ano passado, 580. Portanto, houve uma redução de cerca de 40%.  

Para complementar essa política de desmonte, existe a prática da terceirização. Com isso, a empresa deprecia e desprestigia a mão-de-obra qualificada, seus técnicos que têm vasta experiência e conhecem a empresa.  

A Petrobrás anunciou que vai implementar, cada vez mais, a terceirização como forma de evitar os acidentes. Isso significa desqualificar os técnicos, a mão-de-obra qualificada, que operam dentro do sistema Petrobrás.  

A mais recente novidade é que a Petrobrás vai instalar no país oito centros de emergência, com o objetivo de combater os acidentes. Esses centros serão terceirizados e terão contratos no valor de 17 milhões de reais. Sete companhias estrangeiras e uma nacional disputam o processo, mas a diretoria da Petrobrás não quer revelar quais são.  

É preciso lutar pela preservação da Petrobrás, que é patrimônio do povo brasileiro. A atual direção não tem capacidade nem autoridade moral para administrá-la. Portanto, já deveria ter sido demitida. Ou será que teremos de chorar ainda, muitas vezes, por causa do óleo derramado?  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/08/2000 - Página 15515