Discurso durante a 91ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

COMENTARIOS SOBRE ARTIGO DO PROFESSOR JOSE DE SOUZA MARTINS, INTITULADO "REFORMA AGRARIA - O IMPOSSIVEL DIALOGO SOBRE A HISTORIA POSSIVEL", PUBLICADO NA COLEÇÃO CADERNOS DA TERRA, DO MINISTERIO DA REFORMA AGRARIA.

Autor
Romero Jucá (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • COMENTARIOS SOBRE ARTIGO DO PROFESSOR JOSE DE SOUZA MARTINS, INTITULADO "REFORMA AGRARIA - O IMPOSSIVEL DIALOGO SOBRE A HISTORIA POSSIVEL", PUBLICADO NA COLEÇÃO CADERNOS DA TERRA, DO MINISTERIO DA REFORMA AGRARIA.
Publicação
Publicação no DSF de 04/08/2000 - Página 15776
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • ELOGIO, EVOLUÇÃO, REFORMA AGRARIA, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RAUL JUNGMANN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO AGRARIO, APOIO, ASSENTAMENTO RURAL, REGULARIZAÇÃO, POLITICA FUNDIARIA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, JOSE DE SOUZA MARTINS, PROFESSOR, SOCIOLOGO, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), ANALISE, HISTORIA, PROCESSO, REFORMA AGRARIA, BRASIL.

O SR. ROMERO JUCÁ (PSDB - RR) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em nosso País, não há quem duvide da importância da reforma agrária como um dos focos centrais da agenda nacional. São décadas e mais décadas – apenas para ficarmos no século XX – que se arrastam fazendo desse tema presença constante no debate político brasileiro. Apesar dessa presença recorrente, apesar de tudo o que se diz e se propõe a seu respeito, foi preciso que chegássemos ao Governo Fernando Henrique Cardoso para que a questão da terra fosse finalmente assumida com competência técnica, racionalidade e a indispensável decisão política para resolvê-la.  

Conquanto ainda prevaleçam formas distintas – e, muitas vezes, antagônicas – de percepção do problema, só mesmo os muitos desinformados ou aqueles que se deixaram cegar pela paixão ideológica não conseguem reconhecer o notável avanço que, nesses últimos anos, a reforma agrária conheceu entre nós. De uma lado, as milhares de famílias camponesas assentadas em terras cuja ocupação o Poder Público conseguiu regularizar, possibilitando a esses trabalhadores a segurança necessária para ganharem sua vida com dignidade. De outro, num processo de admirável convergência e complementaridade, o esforço de se proceder ao mapeamento da propriedade rural no País, por meio do qual será possível anular títulos fraudados ao longo de nossa História. E, por fim, a execução de uma política de apoio aos assentados, de modo a garantir-lhes condições para o bom desempenho, em termos de produção, nas áreas que lhes foram entregues.  

A propósito dessa realidade, não há como desmerecer o trabalho de extraordinária magnitude empreendido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, conduzido com maestria e lucidez pelo Ministro Raul Jungmann. Da mesma forma, por elementar senso de justiça, há que se reconhecer a sensibilidade para o problema que o Presidente da República sempre demonstrou possuir, aliando-a ao seu saber acadêmico e à firme decisão de vê-lo resolvido, ou, no mínimo, conferir-lhe os elementos indispensáveis ao encaminhamento de sua solução definitiva.  

Faço esses comentários, Sr. Presidente, como preâmbulo ao registro que hoje desejo fazer nesta Casa. Trata-se da publicação de um alentado artigo, escrito por renomado especialista no assunto, José de Souza Martins, professor do Departamento de Sociologia da maior e mais conceituada instituição universitária brasileira, a Universidade de São Paulo.  

O texto a que me reporto recebeu instigante título: "Reforma Agrária – O Impossível Diálogo Sobre a História Possível", tendo sido publicado inicialmente na Tempo Social, Revista de Sociologia da USP , edição de fevereiro de 2000. Em boa hora, em mais uma acertadíssima decisão, resolveu o Ministério do Desenvolvimento Agrário republicá-lo e dar-lhe maior divulgação, integrando-o à sua coleção Cadernos da Terra.  

Sem medo de estar fazendo concessão ao exagero, ouso dizer estarmos diante de um texto seminal sobre um tema tão complexo como o da reforma agrária ou, como enfatiza o próprio autor, o da questão agrária em nosso País. Da primeira à última linha o que se vê é uma análise irrefutável de todo um processo histórico que, no mais das vezes, pecou por lançar sobre o problema da terra olhares enviesados, interesses inconfessos, deturpações ocasionadas pela ideologia e pela paixão partidária, além do primarismo quanto ao domínio técnico do assunto.  

Estou convencido, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que a leitura do artigo do Professor José de Souza Martins deve ser a lição de casa de todos os que, no Brasil, desempenham funções públicas ou que partilham responsabilidades decisórias, dos que se debruçam mais diretamente sobre o tema e, muito especialmente, dos que se jactam de conhecê-lo, mas que sobre o qual apenas derramam uma precariíssima compreensão de sua latitude e complexidade.  

Dividido em quatro partes, o denso texto elaborado pelo sociólogo da USP foi brilhantemente sintetizado pelo Ministro Raul Jungmann, na apresentação da obra: inicialmente, "uma caracterização do contexto estrutural e histórico que constitui uma questão agrária , em oposição a ações e programas de reforma agrária"; a seguir, "analisa o processo histórico por meio do qual, principalmente a partir dos anos 50, constata-se um enfraquecimento da questão agrária, à medida em que ela se torna marginal em vez de central no processo de desenvolvimento brasileiro"; em terceiro lugar, "discute as concepções radicalmente diferentes do que constitui uma reforma agrária, entre, de um lado, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST), a Igreja e os Partidos de Oposição, e, de outro, o Governo"; por fim, concluindo seu trabalho, explicita "o caráter cíclico da reprodução da questão agrária no Brasil de hoje e trata da questão de quê reforma agrária é possível no presente quadro histórico".  

Das inúmeras informações contidas no artigo, emolduradas por uma análise serena e firme, ficam lições preciosas. Não posso deixar de aqui registrar as palavras com as quais Souza Martins encerra seu trabalho, lembrando onde se revelam "os efeitos simplificadores da história e limitadores de uma práxis conseqüente em relação à questão agrária: na falta de uma providência prática em relação ao futuro e às gerações futuras, dada a aparente impossibilidade de encaminhar a questão de outro modo no presente".  

Impossível não concordar com o autor quando afirma: "Certamente, é possível um pacto nacional de todos em relação às necessidades do futuro, em relação a um problema social e histórico que é, de fato, um problema suprapartidário, como o foi o da escravidão no século passado. Partidarizá-lo não é, propriamente, prestar um serviço aos pobres da terra e, certamente, menos o é reformar o passado".  

Aí está, Sr. Presidente, a conclusão perfeita! Por essa e outras razões é que me senti impelido a fazer este registro, na certeza de que o texto do Professor José de Souza Martins mais do que ser lido, é para ser meditado!  

Era o que eu tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/08/2000 - Página 15776