Discurso durante a 96ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERÇAÕES SOBRE O DOCUMENTO FINAL DA CONFERENCIA DOS POVOS E ORGANIZAÇÕES INDIGENAS DO BRASIL.

Autor
Romero Jucá (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • CONSIDERÇAÕES SOBRE O DOCUMENTO FINAL DA CONFERENCIA DOS POVOS E ORGANIZAÇÕES INDIGENAS DO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 11/08/2000 - Página 16599
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • DEFESA, IMPORTANCIA, PRESERVAÇÃO, CULTURA, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, COMUNIDADE INDIGENA, PAIS, INVESTIMENTO, SAUDE, EDUCAÇÃO.
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, CONFERENCIA, COMUNIDADE INDIGENA, PAIS, MUNICIPIO, COROA VERMELHA, SANTA CRUZ CABRALIA (BA), ESTADO DA BAHIA (BA), OBJETIVO, DEBATE, SITUAÇÃO, INDIO.
  • COMENTARIO, DOCUMENTO, RESULTADO, CONFERENCIA, COMUNIDADE INDIGENA, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, OBJETIVO, ELABORAÇÃO, PROJETO, GARANTIA, DIREITOS, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, INDIO, PAIS.

O SR. ROMERO JUCÁ (PSDB - RR) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em defesa da causa indígena tem sido uma constante na minha atuação nesta Casa, como representante do Estado de Roraima.  

A preservação da cultura dos povos indígenas muito representa para mim, tanto por minha experiência profissional anterior como dirigente do principal órgão governamental encarregado da política indígena, como por convicção pessoal como defensor dos direitos dos povos indígenas.  

Tenho defendido o desenvolvimento integrado das comunidades indígenas, a convivência pacífica e fraterna entre índios e não-índios, evitando-se os conflitos, buscando o entendimento que conduza às soluções necessárias para a questão indígena, com paz e justiça para os índios e para outras populações.  

Tenho defendido a melhoria das condições de vida dos povos indígenas, a solução pacífica para a demarcação e regularização de suas terras, a educação escolar dos índios e medidas específicas para o atendimento integral e diferenciado na área de saúde, respeitando as características e diversidade dos povos silvícolas.  

Já participei pessoalmente do encaminhamento de diversas propostas conciliadoras dos interesses conflitantes entre índios e não-índios de comunidades de Roraima para demarcação de terras, sempre buscando soluções pacíficas para a situação fundiária do Estado que tenho a honra de aqui representar.  

Daí o meu interesse permanente por todos os assuntos relacionados à questão indígena, sempre tendo em vista a melhoria das condições de vida e do bem-estar social dos nossos irmãos índios.  

Nos dias 18 a 21 de abril último, a aldeia dos índios Pataxós, em Coroa Vermelha, Santa Cruz Cabrália, no Estado da Bahia, foi sede de um dos mais importantes acontecimentos para os índios brasileiros: a Conferência dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil , que reuniu 140 diferentes povos, com mais de 3.600 representantes indígenas.  

O Documento Final da conferência faz um duro relato da situação do índio do Brasil, mostrando o longo e penoso caminho de seus povos, desde o Descobrimento até aos nossos dias.  

O Documento Final representa o trabalho de muitas pessoas, durante mais de um ano, e engloba um resumo das reflexões, propostas e conversas trazidas das comunidades indígenas, com o objetivo de elaborar um novo projeto para o índio na sociedade brasileira.  

Os diversos grupos indígenas participantes da conferência apresentaram um relato de suas condições e da realidade em que vivem, com discussões em grupos, divididos por Estados do Brasil.  

As principais propostas e exigências dos povos indígenas foram apresentadas, discutidas, sintetizadas, escritas em cartazes que ficaram expostos no espaço de conferência e, posteriormente, foram sintetizadas e transformadas no Documento Final , aprovado em sessão plenária, no dia 21 de abril de 2000.  

"O Documento Final da Conferência dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil é um importante instrumento de luta, para ser discutido em todas as comunidades indígenas, para ser conhecido e assumido pelas entidades que apoiam a nossa causa e para ser atendido pelas autoridades deste país" , como bem resume a publicação que me foi encaminhada pelas entidades indígenas.  

A Marcha Indígena 2000 foi um dos mais importantes acontecimentos da luta dos povos indígenas do Brasil. Foi um longo processo de preparação nas aldeias, que envolvendo mais de uma centena de povos e diversas organizações indígenas, mobilizando mais de três mil pessoas de todas as regiões do Brasil.  

Tivemos caravanas indígenas provenientes das fronteiras da Amazônia, dos sertões do Nordeste, do Pantanal Mato-grossense, dos territórios indígenas do Sul e Sudeste.  

Essas caravanas cruzaram o Brasil, dialogando com as populações dos mais diversos lugares do País e recebendo apoio de muitas comunidades: 34 cidades, ao longo do trajeto da caminhada, fizeram manifestações favoráveis aos direitos dos índios.  

Ao longo desses 500 anos, o Brasil se caracterizou como uma sociedade extremamente injusta e discriminatória, principalmente em relação aos índios, aos negros e aos pobres.  

A perversa distribuição de renda que se construiu ao longo de 500 anos perpetuou situações iníquas, que passaram a ser tratadas com naturalidade, como se fossem fatos banais e toleráveis.  

O Brasil não pode ingressar no universo das nações desenvolvidas se continuar a tratar o índio não como um brasileiro e nosso irmão, mas como um cidadão de segunda classe.  

Precisamos urgentemente assegurar aos povos indígenas a demarcação e regularização de todas as suas terras, garantindo e protegendo suas reservas.  

Precisamos ampliar as áreas demarcadas que são insuficientes para a garantia do sustento e crescimento das famílias indígenas, retirar todos os invasores das terras indígenas demarcadas e recuperar as áreas degradadas, poluídas e devastadas por eles.  

Precisamos apoiar os povos indígenas ressurgidos, garantindo as terras necessárias para sua vida e desenvolvimento, proteger os povos isolados contra a invasão de seus territórios e respeitar o direito ao usufruto dos recursos naturais contidos em suas terras.  

Precisamos encontrar uma solução racional para a situação de municípios que se instalaram ilegalmente em áreas indígenas.  

Sr. Presidente, não estamos, absolutamente, defendendo a paralisação do nosso desenvolvimento econômico em prol da preservação do habitat indígena; no entanto, precisamos encontrar uma solução racional para a construção de hidrelétricas, hidrovias, ferrovias, rodovias e gasodutos, evitando que essas obras produzam efeitos negativos irreparáveis ao meio ambiente e aos povos indígenas.  

Defendemos a aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas, que tramita no Congresso Nacional desde 1991, assim como o fim de todas as formas de discriminação e outras formas de violência contra o índio.  

Precisamos defender a cultura, as tradições, as línguas e as religiões de todos os povos indígenas do Brasil.  

Para isso, defendemos a reestruturação e o fortalecimento do órgão que cuida da política indigenista, e sua vinculação direta à Presidência da República, para que a causa dos índios possa realmente ter a prioridade que merece.  

Precisamos assegurar saúde e educação aos povos indígenas sem que isso signifique ruptura com seu passado cultural nem desrespeito aos costumes dos diversos povos.  

Precisamos assegurar a participação ativa das lideranças indígenas na formulação das políticas públicas em relação a seus povos, para que se possa realmente respeitar sua cultura e atender às necessidades específicas de cada região do País.  

O Documento Final da Conferência dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil apresenta um conjunto de reivindicações justas e necessárias para a vida dos nossos irmãos indígenas, aparentemente conflitantes com a política indigenista do Governo Federal. Estou convencido, porém, de que não existe conflito entre os objetivos da política do Presidente Fernando Henrique Cardoso em relação aos índios e aqueles indicados nesse Documento Final

O que existe realmente é a impossibilidade prática de o Brasil saldar no curto prazo seu imenso passivo social, tanto para com os índios, como em relação aos negros e aos pobres.  

Quero aqui reafirmar o meu apoio aos povos indígenas de todo o Brasil e expressar minha solidariedade com as conclusões do Documento Final da Conferência dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil, com o meu testemunho pessoal de que o Presidente Fernando Henrique Cardoso está firmemente empenhado em assegurar a integridade territorial e o patrimônio cultural dos povos indígenas do Brasil.  

Muito obrigado.  

 

natvÔ


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/08/2000 - Página 16599